Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00034885 | ||
| Relator: | VIRIATO BERNARDO | ||
| Descritores: | JULGAMENTO TRIBUNAL COLECTIVO NULIDADE ARRENDAMENTO CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL CEDENTE CESSIONÁRIO RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL | ||
| Nº do Documento: | RP200206200230901 | ||
| Data do Acordão: | 06/20/2002 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recorrido: | T J STA MARIA FEIRA | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE. | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO - LIVRO 522 - FLS. 79. | ||
| Área Temática: | DIR PROC CIV. DIR CIV - DIR CONTRAT. | ||
| Legislação Nacional: | CPC95 ART646 N1 C N2. | ||
| Sumário: | I - Não tendo sido requerida a intervenção do colectivo nem a gravação da audiência final, o julgamento pelo Tribunal Colectivo não acarreta a sua nulidade. II - A cessão ilegal da posição contratual pela arrendatária, com a cumplicidade dos cessionários a quem foi transmitido o arrendamento, torna lícito e adequado responsabilizar todos eles pelos prejuízos sofridos pelos autores, danos do prédio, enquanto estiveram privados da sua posse. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - Gualter .......... e mulher, Aida ........., propuseram a presente acção ordinária na comarca de ..........., contra Ermelinda ......... e José ........... e mulher, Maria ......., pedindo a condenação solidária destes a pagarem-lhe uma indemnização de 2.461.080$00 acrescida de juros à taxa legal a partir da citação ou, subsidiariamente, a condenação da 1ª R. a pagar-lhe a quantia de 30.000$00 e os 2°s RR. a parte restante de 2.431.080$00, e, numa segunda opção, a condenação da 1ª R. e dos 2°s RR. em montantes iguais que perfaçam a quantia global de 2.461.080$00, em qualquer dos casos sempre acrescidas dos juros nos termos sobreditos para o pedido principal). Para tanto, alegaram, em síntese: - que são donos do prédio urbano que identificam nos arts. 1 ° e 2° da p. i.; - que este prédio estava arrendado à R. Ermelinda, a qual em parte dele exercia o comércio de mercearia e vinhos; - que em 22/12/80 tal R. cedeu aos segundos RR., ilicitamente, a sua posição pelo preço de 30.000$00; - que na sequência disso os segundos RR. passaram a ocupar o prédio ilicitamente, habitando uma parte e exercendo o comércio noutra, ininterruptamente até 6/12/88; - que em 1981 intentaram acção de despejo contra a primeira R. tendo obtido ganho de causa e que quando foi executado o despejo os segundos RR. vieram deduzir embargos que foram julgados improcedentes por sentença confirmada pelo Ac. da Rel. do Porto de 17/5/88; - que só a partir de 6/12/88 é que ficaram com possibilidade de exercerem o direito de dar de arrendamento o prédio referido; - e que foi com a imiscuição ou impedimento quanto ao gozo do imóvel acordado e provocado pelos RR. "que deixaram de auferir 2.461.080$00, uma vez que conseguiriam arrendar a parte comercial por 12.000$00 e parte habitacional por 7.000$00 mensais". A primeira Ré contestou nos termos constantes de fls. 60 e sgs., excepcionando com a ineptidão da petição inicial, inexistência de causa de pedir e prescrição do direito de indemnização e impugnando depois os factos alegados pelos AA.. Os segundos RR. contestaram nos termos constantes de fls. 41 e sgs., excepcionando a prescrição do direito de indemnização e impugnando também os factos alegados pelos AA.. Os AA. replicaram nos termos constantes de fls. 67 e sgs., pugnando pela improcedência das excepções. Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção da ineptidão da petição inicial, e procedente a excepção da prescrição do direito de indemnização invocado pelos AA., tendo-se, em consequência, absolvido os RR. do pedido. Desta decisão foi interposto recurso pelos AA. para o Tribunal da Relação do Porto que confirmou aquela decisão. Deste acórdão do Tribunal da Relação foi pelos AA. interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual, considerando que na presente acção está em causa apurar de responsabilidade contratual (e não responsabilidade extracontratual ou delitual, como se conjecturou nas decisões proferidas pela 1ª instância e pelo Tribunal da Relação), revogou a decisão do Tribunal da Relação e ordenou o prosseguimento dos autos. Proferido despacho saneador e organizada a especificação e questionário, seguiram os autos seus termos, vindo a ser feito julgamento com intervenção do Tribunal Colectivo e por fim, proferiu-se sentença que julgou parcialmente procedente a acção, absolvendo os RR José ........ Sá e mulher, Maria ........ do pedido contra eles formulado e condenou a Ré Ermelinda ........ a pagar a quantia de 84.817$50, correspondente a 423,07 Euros acrescida de juros legais a partir da citação às sucessivas taxas legais, absolvendo a Ermelinda do restante pedido. As custas ficaram a cargo dos AA e da Ré Ermelinda na proporção do decaimento. Inconformados com a sentença dela vieram apelar os Autores bem como a Ré Ermelinda, em recurso subordinado. Ambos os Recorrentes apresentaram alegações que finalizaram com as seguintes conclusões: A – Dos Recorrentes Autores: 1) Ao julgar-se em audiência de julgamento em Tribunal Colectivo e não em Tribunal singular cremos que por erro judicial violou-se a garantia do princípio da repartição das competências e a garantia do direito subjectivo público de todo o cidadão (artigo 32º nº 7 da Constituição) e o direito de defesa da posição jurídica legal de todo o cidadão (art. 205. nº 2 da Constituição). 2) Ao contrário da sentença recorrida, a nosso ver, os réus Sá Rodrigues e mulher deverão ser responsabilizados e condenados no pedido da presente acção porquanto ao aceitarem, por escritura de trespasse, a posição contratual da ré- Ermelinda e moverem embargos de terceiro para se oporem à execução do mandado de despejo movida contra aquela Ermelinda passaram a ser imperativamente {art. 481.0 n. 1 a) CPC} ocupantes de má fé da casa dos AA. 3) Nesta circunstância factual de violação do princípio da boa fé mostra-se provado que os réus José ....... e mulher violaram os deveres impostos por ordem pública (art. 800º nº 2 do Cod. Civil), violação assim praticada que prova - além da responsabilização de presunção (art. 799º C. Civ.) da ré Ermelinda como locatária - que a tais ocupantes também deve ser assacada responsabilização pelo pedido na presente acção. 4) Os réus José ...... e mulher, colocados na posição contratual de cedência que a ré Ermelinda lhes fez através de escritura de trespasse fls. 22 dos autos: facto 11) e como ocupantes do assim cedido desde Dezembro de 1980 aí vivendo aí praticando comércio (cf. factos provados n° 10 e II de fls. 21-v e 22 dos autos), embora não se integrassem no sinalagma genético locatício, no entretanto fixaram-se e, por isso integraram-se no sinalagma funcional (arts. 800º n° 2, 799º e 798º do Código Civil) da relação contratual locatícia que aquela Ermelinda tinha para com os AA, e, por isso é que, em nosso critério se lhes deve assacar a responsabilização contratual em causa. 5) Segundo cremos, ao entender-se a expressão - «... a responsabilidade imputada aos réus se insira ou vá buscar a sua fonte no campo da responsabilidade contratual» (cf. fls. 216-v dos autos e Ac. STJ) - no sentido de que no douto Acórdão do Supremo se quis decretar que os réus José ........ e mulher também são responsáveis pelo pedido em questão, então nesse caso, o Senhor Juiz de 1ª instância, com o devido respeito, violou o caso julgado material decretado pelo Supremo Tribunal de Justiça. 6) O quesito 5.°, na nossa óptica, afigura-se de direito. Nele se pergunta: "o arrendamento do prédio em A) no ano de 1981 seria efectuado pela renda mensal de 12.000$00 (anual de Esc.: 144.000$00) para o comércio e pela renda de escudos 7.000$00 (Esc..: 84.000$00) para habitação?" . Ora o arrendamento seria efectuado pela renda mensal de "é um conceito de direito ou uma conclusão que haveria de resultar de factos a articular pela parte, e a provar, de acordo com a regra do ónus da prova (art. 342.° Cod. Civ.). Assim articulado contém apenas um juízo de valor, uma mera conclusão. Por isso, a sua formulação é indevida (511.° CPC); a resposta dada deve ser considerada não escrita (art. 646.° n. 4 CPC) e Ac. BMJ 362 pág. 526 e 310 pág. 259 e 388 pago 625). 7) Se é certo que a formulação dos quesitos 2 e 5 resulta da forma como foi articulada tal matéria nos arts. 10, 11 e 12 da p.i. (em parte conclusiva), a resposta dada pelo Tribunal a quo (no caso de este entender como necessária mais qualquer explicativa factual para além da situação, constituição e acessos internos e externos do prédio provados a fls. 32 dos autos: expressos no Acórdão da Relação do Porto onde se contém a constituição do prédio, as divisões, tamanho e área, se tem andar, há quanto tempo teve comércio, se teve perto dele o campo de futebol) poderia ter sanado esta eventual irregularidade se tivesse acrescentado mais alguma explicativa factual. - A resposta dada ao quesito 2 e 5 é imprecisa, não clara, contém matéria conclusiva. A situação concreta é muito diferente e é contraditória com os elementos factualmente provados existentes nos autos a fls. 32. 8) É notório que é fundamentalmente relevante, para concluir do valor mensal do arrendamento a efectuar, ter em conta os factos provados a fls 32 dos autos: aferir das circunstâncias concretas da situação ou localização do prédio dos AA. em relação proximidade das indústrias, à estrada central ou lateral na qual se situa ou não a ida e) vinda para os empregos; a constituição do prédio no sentido de apurar se tem 1 só ou 5 ou 6 divisões, se tem só rés do chão ou se também tem andar e garagem. Ou seja, a resposta tanto ao quesito 2.0 como ao quesito 5.0 é imprecisa, não clara e contém matéria conclusiva, deficiência que demonstra que tal matéria deve ser de novo reapreciada (art. 712.0 CPC). 9) A respostas conclusivas dadas aos quesitos 2 e 5 estão em contradição com os factos provados nos autos: com o da constituição, situação (do prédio em causa), acessos internos e externos e grau de afectação e proximidade ao comércio (fls 32 nos 13, 14, 15, 16 e 17 dos autos); com o de que os réus José ....... e mulher fizeram tudo por tudo para se manterem no prédio o mais longo possível período de tempo (fls 21-v e 22 nos 10 e 11 dos autos); e com o de que a década em que lá estiveram e a dos 3/4 anos seguintes foi a época de maior desafogo financeiro de tais réus. 10) A deterioração do prédio dos AA., em vez de, em nosso critério, ser prova ainda de maior responsabilização dos réus José ....... e mulher [arts. 481.º al. a) C.P.C. e 1271.º e 1260º nº 1 a contrario e nº 2 do C. Civ.], no entretanto na sentença recorrida, foi o contrário: tal deterioração até contribuiu para lhes retirar a responsabilização do pedido na presente acção já que (a mesma deterioração) foi a base da convicção do Tribunal de 1.3 instância para a resposta aos quesitos 2 e 5 (fls 415 e 416 dos autos). 11) Ao contrário da sentença recorrida, na nossa óptica a prestação pecuniária indemnizatória terá de ser actualizada através do índice de preços ao consumidor (art. 551 n° 1 C. Civ): tudo cfr. referimos na Alegação do aspecto jurídico da causa (fls. 420 a 428 dos autos). 12) Ao contrário da sentença recorrida, a prestação pecuniária indemnizatória deverá ainda ser actualizada para o dobro e ser proveniente de a ré Ermelinda se ter constituído em mora (art. 1045º C.Civ). 13) Com o devido respeito, considerar o valor de renda de 500$00 mensais como o mais ajustado ao prédio em causa, na década de 1980, para cálculo de prestação pecuniária indemnizatória de 84.817$50: a nosso ver, é uma ilegalidade e até uma imoralidade, porque é um choque violento contra o comportamento da ocupação ilícita do imóvel pelos réus José ......... e mulher que se atreveram a mover embargos de 3º como manobra dilatória para lá permanecerem o mais longo período de tempo; contra o facto de a década de 80 e os 8 ou 9 anos a seguir ter sido a melhor época lucrativa financeira para tais ocupantes - já que em 22.7.1985 compraram terreno (fls. 394, 395 dos autos), em 5/10/1988 acabaram de construir (fls 409 dos autos) casa de habitação de valor patrimonial de 3.060.000$00 (fls 409-v dos autos), em 27.4.1994 (fls 322 dos autos) acabaram de ampliar tal casa para o valor tributário de 17.820.000$00 (fls 322-v dos autos), a 17.7.99 compraram ASTRA- opel por 3.543.000$00 (fls 327 e 319 dos autos, e vieram a pedir por duas vezes nos autos o pedido de apoio judiciário. 14) Os elementos existentes no processo e aqui descritos nestas nossas anteriores conclusões levariam a uma decisão diversa, da sentença de 1.8 instância, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas, o que constitui violação do artigo 712.º n. 1 alínea b) do Cod. Proc. Civil. Conclui pedindo se dê como não escrita a resposta aos quesitos 2º e 5º por ser de direito e meramente conclusiva, contraditória, imprecisa e não clara com factos descritos existentes no processo; ser reapreciada a matéria de facto provada por documentos existentes nos autos, ser revogada a sentença recorrida de forma a ser substituída por outra que condene a ré Ermelinda no pedido não apenas parcialmente mas na totalidade e condene também os Réus José ........ e mulher na totalidade do pedido. B – Da Recorrente Ré Ermelinda: 1 - A responsabilidade contratual da apelada já foi devidamente sancionada através da acção de despejo intentada pelos apelantes, pelo que não pode agora ser de novo sancionada. 2 - Não sendo ela quem habitava ou usufruía o arrendado mas sim os trespassários, nada podia fazer para que a entrega deste se fizesse rapidamente. 3 - Até porque não deduziu nem foi parte nos embargos de terceiro, não podendo ser responsabilizada pelos eventuais e compreensíveis atrasos decorrentes do normal decurso do processo. 4 - A responsabilidade da apelada terminou com a cedência do arrendado. 5 - Qualquer indemnização a que os apelantes tivessem direito era nesta acção (de despejo) que deveria ter sido solicitada. 6 - Os apelantes só ficaram privados do recebimento das rendas porque o quiseram, já que as mesmas foram sempre depositadas e encontram-se à sua disposição na Caixa Geral de Depósitos. 7 - A actualização das rendas não consta do pedido dos apelantes pelo que não deveria ter sido contemplada como foi na sentença recorrida. 8 - Não foi especificado nem ficou assente que os apelados eram os donos e legítimos possuidores do prédio urbano em questão, pelo que o seu pedido tem que improceder. 9 - A douta sentença recorrida violou e fez incorrecta aplicação ao caso sub judice dos arts. 798° e 1038° do C. Civil e do art. 56°, n° 2 do R.A.U, pelo que deve ser revogada, absolvendo-se a ré Ermelinda do pedido. Nas contra-alegações os Recorrentes mantêm os seus pontos de vista expressos nas alegações. Os Recorridos José ......... e mulher pugnam pela confirmação da sentença recorrida. Corridos os vistos cumpre decidir. II - Factos apurados: 1 - Encontra-se inscrito na matriz sob o art. ..... o prédio urbano constituído por casa térrea de habitação, de rés-do-chão e 1º andar, com terreno e quintal, sita no lugar do ........, freguesia de .........., a confinar do Sul com a estrada, do Nascente com o caminho para antigo campo de futebol e do Poente com Maria Celeste ....... e antes de Armando ........ [A) da especificação]; 2 - Os autores moveram uma acção de despejo, que correu os seus termos sob o nº ../.. do .. juízo e .. secção deste tribunal, contra a ora 1ª Ré, Ermelinda ......., na qual foi proferida sentença, já transitada em julgado, a julgar procedente a acção e a declarar resolvido o contrato de arrendamento referido na p.i. e condenada a Ré Ermelinda ......... a entregar o arrendado aos autores Gualter ...... e Aida ......., livre e devo luto de pessoas e bens [B) da especificação]; 3 - Na sentença supra referida ficou provado sob os nºs 1 e 3 que por contrato verbal a ali Ré Ermelinda tomou de arrendamento o prédio identificado em 1 [C) da especificação]; 4 - E sob os nº 11 e 12 da mesma peça processual que tal Ré, sem autorização e consentimento dos Autores, cedeu em Dezembro de 1980 o arrendado, bem como o estabelecimento nele existente, a Maria ......... e José ........, mediante o pagamento de 30.000$00 [D) da especificação]; 5 - Em virtude da cedência anteriormente referida os RR. José ....... e sua mulher passaram a ocupar o prédio, habitando-o e nele praticando o comércio [resposta ao quesito 1°]; 6 - Os ora RR. José ......... e mulher instauraram contra os ora Autores embargos de terceiro aquando da passagem de mandados de despejo na sequência da decisão referida no ponto 2, que correram os seus termos sob o nº ../.. do .. Juízo e foram julgados improcedentes por sentença transitada em julgado [E) da especificação]; 7 - A entrega das chaves do arrendado ao A. efectuou-se em 6/12/88 [F) da especificação ]; 8 - O arrendamento do prédio referido no ponto 1 no ano de 1981 seria efectuado pela renda mensal de pelo menos 500$00 (quinhentos escudos), independentemente de ser para comércio ou para habitação [resposta ao quesito 2°]; 9 - Os AA. ficaram privados da quantia mensal anteriormente referida no ponto 8 em virtude dos factos referidos nos anteriores pontos 4 e 7 [resposta ao quesito 5°]. III - Mérito dos recursos: Como é sabido, as conclusões das alegações delimitam o âmbito do recurso – cfr. arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1, ambos do Código do Processo Civil (CPC). De referir ainda que o Tribunal não tem de conhecer das de razões ou fundamentos em que as partes ancoram as suas pretensões, antes e tão só, tem de decidir as questões pertinentes que lhes sejam apresentadas. No caso em apreço, os AA. pedem a condenação dos RR. a pagar-lhe a quantia de 2.461.080$00, alegando ter sido esta a quantia global que ficaram privados de auferir a título de rendas nas quais contabilizam rendas provenientes do arrendamento para comércio e do arrendamento para habitação do seu prédio correspondente ao espaço de tempo decorrido entre 22 de Dezembro de 1980 e 6 de Dezembro de 1988, durante o qual "ficaram impedidos de exercerem o direito potestativo de, através de um novo contrato, dar de arrendamento a outrem o prédio, como na altura era seu propósito" . Considerou o Sr. Juiz a quo, que a questão de direito está circunscrita à apreciação de responsabilidade contratual como já decidido nestes autos pelo acórdão do STJ, pelo que só responderá contratualmente para com os AA. quem com eles contratou ou seja, a Ré Ermelinda. Como tal, porque os RR. José ....... e mulher não são parte em qualquer contrato com os AA., há que concluir pela improcedência da acção quanto aos RR. José ......... e mulher, que vieram a ser absolvidos do pedido. Já se viu que a condenação da Ré Ermelinda não satisfaz os AA, quer pelo reduzido quantitativo, quer porque pugnam pela condenação também dos outros RR. Por sua vez a apelante Ermelinda pretende que a sentença seja revogada, com a sua absolvição do pedido. A - Isto posto, começaremos por tomar conhecimento do recurso principal dos Autores. Apresentaram estes longas, complexas e vastas conclusões (arredias do figurino legal que apela à síntese, à simplicidade, à clareza e à singeleza – cfr. art. 690º, 1 e 4 do CPC). Tais alegações podem sintetizar-se nas seguintes questões, a saber: 1ª - Erro Judicial com violação do princípio do Juiz natural, devido à intervenção do Tribunal Colectivo; 2ª - Os RR José ......... e mulher devem ser responsabilizados e condenados no pedido, além da condenação da Ré Ermelinda; 3ª - O quesito 5 integra matéria de direito pelo que a respectiva resposta deve ter-se por não escrita; 4ª - A resposta aos quesitos 2 e 5 é imprecisa, contém matéria conclusiva e está em contradição com os factos provados nos autos, devendo ser reapreciada; 5ª - Actualização da prestação pecuniária indemnizatória com pagamento do dobro em virtude da mora da Ermelinda. Apreciemos, pois, tais questões. 1ª - Erro judicial com violação do princípio do Juiz natural, devido à intervenção do Tribunal Colectivo. Consideram os Recorrentes que já se encontrava em vigor o DL nº 375-A/99 de 20 de Setembro, que alterou o art. 512º do CPC, que determina que a secretaria notifique as partes para requererem a gravação da audiência final ou a intervenção do Tribunal Colectivo, e nenhuma das partes requereu a sua intervenção. Dispõe o art. 8º do DL nº 375-A/99 de 20 de Setembro, no seu nº 1, que o disposto no artigo 646º do CPC, na redacção daquele diploma - que no seu nº 1 estabelecia que a discussão e julgamento da causa são feitos com intervenção do tribunal colectivo se alguma das partes a tiver requerido -, é apenas aplicável às causas em que “ainda se não tenha iniciado o prazo para requerer a intervenção do tribunal colectivo”. É este o caso. Contudo, nenhuma das partes requereu o julgamento em Tribunal Colectivo. Ora não é admissível a intervenção do Tribunal Colectivo, no caso das alíneas a), b) e c), do nº 1 do art. 646 do CPC na aludida redacção: destas só a última alínea, a c), pode ter interesse nesta caso. O nº 2,. alínea c) reza: Não tem lugar a intervenção do tribunal colectivo, “nas acções em que alguma das partes haja requerido, nos termos do art. 522-B a gravação da audiência final. Mas também ninguém requereu a gravação, daí que “a contrario” se pode defender essa intervenção. Doutra forma cai-se num impasse. O julgamento acabou por se efectivar com intervenção do Tribunal Colectivo. O que é defensável, sendo que no caso, se trata de uma acção de indemnização com processo comum e forma ordinária, que deu entrada em Juízo em 16/10/91. De resto, sempre se dirá que a intervenção do tribunal colectivo em vez do juiz singular, até representou uma formalidade mais solene que em nada afectou a posição das partes, antes, certamente, contribuiu para uma melhor apreciação da matéria de facto, o que se traduzirá em superior realização da justiça. De qualquer forma, haveria que aproveitar o julgamento da matéria de facto e sentença. Lê-se no Manual de Processo Civil de Antunes Varela , Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, 2ª edição a pág. 649, que “... se tiverem sido julgadas pelo Juiz singular (seja ele o Juiz da causa seja o juiz incumbido da decisão final) questões que deviam tê-lo sido pelo tribunal Colectivo, o julgamento será anulado, atenta a omissão de garantias fundamentais que representa a falta de intervenção do órgão colegial”. E em nota de rodapé acrescenta: "a distribuição de atribuições entre as entidades que participam no julgamento da causa e (o tribunal colectivo de um lado; e o juiz presidente do outro) não se confunde com a competência, que é a repartição jurisdicional entre vários tribunais da mesma espécie e categoria". Assim o reconheceu o assento do STJ de 18/7/47, BMJ 2, pág. 210) segundo o qual “não importa incompetência absoluta do tribunal a decisão do tribunal sobre questões de direito”. E idêntico juízo comportam os casos em que o colectivo infundadamente intervenha ou deixe de intervir na acção: Manuel de Andrade, Noções ..., pág. 290, nota 1. Por tudo o exposto, improcede esta questão. 2ª - Os RR José ........ e mulher devem ser responsabilizados e condenados no pedido, além da condenação da Ré Ermelinda; Neste aspecto o Sr. Juiz entendeu não dever responsabilizar os referidos RR em virtude de ter considerado que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) ao decidir que a responsabilidade de que se tratava era de natureza contratual, e como estes RR nada contrataram com os AA estavam ao abrigo de qualquer responsabilidade em termos indemnizatórios, daí ter-se condenado só a Ré Ermelinda e não os demais RR. Aqui têm razão os RR. De facto o STJ decidiu no acórdão de fls. 216 dos autos que “... no caso presente, todo o comportamento de antijuridicidade assacado pelos autores aos Réus, assenta na violação, pela ré Ermelinda, do contrato de arrendamento de que era titular, através da cedência da posição contratual que fez aos demais réus, e daí que a responsabilização imputada aos réus insira ou vá buscar a sua fonte no campo da responsabilidade contratual...", citando Vaz Serra – Obrigação de indemnização no BMJ 84, pág. 7.” E acrescenta: “...a responsabilidade aqui erigida é de natureza obrigacional, por todo o comportamento de antijuridicidade assacado aos Réus, pelos autores, resultar da violação pela ré Ermelinda do contrato de arrendamento, celebrado entre esta e os demandantes, através de ilegal cedência da sua posição contratual aos outros réus e, daí, que a responsabilização lhes é imputada "vá buscar a sua fonte ao campo da responsabilidade contratual"». E continua: «É claro que este entendimento assenta, quanto aos Réus José ....... e mulher, cessionários da posição contratual da Ré Ermelinda, ao fim a ao cabo na ideia, hoje com larga projecção na nossa doutrina, de que é possível responsabilizar-se terceiro pelo incumprimento da obrigação, desde que se verifiquem quanto a eles os requisitos exigidos por lei”, citando Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1980, 1º vol. 115, 256 e 283; Pessoa Jorge; Direito das Obrigações 1971, I, pág. 188; Ferrer Correia, Da responsabilidade de terceiro no não cumprimento de obrigações na RLJ98º, 15, 25 e segs. . A fls.255-v dos autos, tal Acórdão refere ainda : «Definida, assim, como obrigacional a responsabilidade exigida aos Réus, interessa, quanto antes, enumerar os seus pressupostos» . «São eles: "inexecução da obrigação (acto ilícito) a culpa, o prejuízo, a causalidade», citando Galvão Telles, Direito das Obrigações 3ª edição, pág. 277. A fls 255-v e 256 dos autos, o mesmo acrescenta : «...os Autores carreararn factos suficientes para se dever considerar como preenchidos, a este nível, todos os requisitos indicados.” E a f1s. 256 : «Quanto à inexecução da obrigação, ela deflui da violação do contrato de arrendamento pela Ré Ermelinda, com a cumplicidade dos outros Réus, a quem ela cedeu ilegalmente a sua posição contratual, nos termos que resultam das sentenças proferidas na referida acção de despejo e no mencionado processo de embargos e que se devem considerar como partes integrantes da petição inicial. Deste acto ilícito teriam segundo os AA resultado prejuízos descriminados em pormenor na petição, decorrentes inclusive dos RR se terem mantido na posse do arrendado após a resolução do arrendamento e de terem por isso e não só, à custa dos legítimos proprietários, de vantagens patrimoniais sem justificação para isso, do mesmo passo que impediram aqueles de retirar do prédio, os rendimentos que naturalmente produziria.” Decorre pois, desta longa transcrição, com a qual concordamos, das duas decisões do STJ inseridas nestes autos, que é lícito e adequando responsabilizar quer a Ré Ermelinda, quer os RR José ......... e mulher nos termos referidos. Procede, pois, esta questão, que irá repercutir-se na sentença. 3ª - O quesito 5 integra matéria de direito pelo que a respectiva resposta deve ter-se por não escrita. Este quesito tem a seguinte redacção: Os autores ficaram privados das quantias referidas em 2º a 4º em virtude dos factos referidos em B), D), E) e F)? A resposta a este quesito foi a seguinte: Provado apenas que os autores ficaram privados da quantia referida na resposta ao quesito 2º em virtude dos factos referidos em B) D) e F). Não vislumbramos que o quesito e a sua resposta mereçam a crítica que lhe é dirigida. Entende-se, pois, de a ambos manter. 4ª - A resposta aos quesitos 2 e 5 é imprecisa, contém matéria conclusiva e está em contradição com os factos provados nos autos, devendo ser reapreciada; Acerca do quesito 5º já se respondeu. O quesito 2º tem a seguinte redacção. “O arrendamento do prédio referido em A) no ano de 1981 seria efectuado pela renda mensal de esc. 12.000$00 (anual 144.000$00) para o comércio e pela renda de Esc.7.000$00) para habitação?”. Tal quesito teve a seguinte resposta: Provado apenas que o arrendamento do prédio referido em A) no ano de 1981 seria efectuado pela renda mensal de pelo menos 500$00 (quinhentos escudos) independentemente de ser para comércio ou para habitação. Também aqui não vemos razão para alterar a resposta a tal quesito que se nos afigura correctamente elaborado. Improcede, pois, também esta questão. 5ª - Actualização da prestação pecuniária indemnizatória com pagamento do dobro em virtude da mora da Ermelinda. Quanto a esta questão entendemos não haver elementos suficientes nos autos que nos permitam enveredar pela tese aqui defendida. A responsabilização da ré e dos outros RR há-de ser feita no quadro traçado pelo STJ, em termos de responsabilidade contratual e atendendo às quantias a título de renda, devidamente ajustadas, consoante as sucessivas actualizações legais, como foi feito. Improcede, pois, também esta questão. Assim, em suma haverá, quanto a este recurso, deverá alterar-se a sentença recorrida por forma a fazer actuar a indemnização contratual como terceiros, dos RR José ......... e mulher, conjuntamente com a Ré Ermelinda – cfr. art. 513º do Código Civil. B - Conclusões do recuso subordinado da Ré Ermelinda: 1 - A responsabilidade contratual da apelada já foi devidamente sancionada através da acção de despejo intentada pelos apelantes, pelo que não pode agora ser de novo sancionada. 2 - Não sendo ela quem habitava ou usufruía o arrendado mas sim os trespassários, nada podia fazer para que a entrega deste se fizesse rapidamente. 3 - Até porque não deduziu nem foi parte nos embargos de terceiro, não podendo ser responsabilizada pelos eventuais e compreensíveis atrasos decorrentes do normal decurso do processo. 4 - A responsabilidade da apelada terminou com a cedência do arrendado. 5 - Qualquer indemnização a que os apelantes tivessem direito era nesta acção (de despejo) que deveria ter sido solicitada. 6 - Os apelantes só ficaram privados do recebimento das rendas porque o quiseram, já que as mesmas foram sempre depositadas e encontram-se à sua disposição na Caixa Geral de Depósitos. Atendendo às circunstâncias da ilícita cedência do locado aos RR por banda da Ré Ermelinda, e à própria actuação destes aludidas uma e outra, na matéria apurada, mormente nos nºs 2 a 6, e face à procedência já decidida da 2ª questão, conforme supra referido, relativa ao recurso dos AA, na qual se decidiu pela responsabilização de todos os RR, incluindo a Ermelinda, ficam prejudicadas ou tornam-se inconsequentes as conclusões 1 a 6. 7 - A actualização das rendas não consta do pedido dos apelantes pelo que não deveria ter sido contemplada como foi na sentença recorrida. Na verdade a actualização das rendas foi alegada largamente na petição – no essencial, nºs 9 a 13 daquela peça -, e foi tomada em consideração para o cálculo final indemnizatório, conforme resulta da sentença, e com toda a propriedade.. 8 - Não foi especificado nem ficou assente que os apelados eram os donos e legítimos possuidores do prédio urbano em questão, pelo que o seu pedido tem que improceder. Esta questão está ultrapassada face às decisões anteriores, designadamente quando decidiu à petição inicial, que se considerou não sofrer de ineptidão. De resto, o pedido e a causa de pedir estão cobertos pelo caso julgado formal, o que impede a sua alteração. 9 - A douta sentença recorrida violou e fez incorrecta aplicação ao caso sub judice dos arts. 798° e 1038° do C. Civil e do art. 56°, n° 2 do R.A.U, pelo que deve ser revogada, absolvendo-se a Ré Ermelinda do pedido. Não se mostram violados os preceitos aqui em causa, nem é caso da absolvição da Ré, como já resultava do conhecimento do recurso principal. Improcedem, assim, as questões aqui colocadas , e o próprio recurso.. IV – Decisão: Face ao exposto e tudo ponderado decide-se alterar a sentença recorrida, condenando também os RR José ......... e mulher, Maria ........, conjuntamente com a Ré Ermelinda .......... Custas por Recorrentes e Recorridos na proporção do vencido, relativamente à recurso principal.. As custas do recurso subordinado são devidas pela Recorrente Ermelinda. Atender-se –á ao apoio judiciário concedido. Porto, 20 de Junho de 2002 José Viriato Rodrigues Bernardo João Luís Marques Bernardo António José Pires Condesso |