Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0526617
Nº Convencional: JTRP00038670
Relator: CÂNDIDO LEMOS
Descritores: HIPOTECA
JUROS
Nº do Documento: RP200601100526617
Data do Acordão: 01/10/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Área Temática: .
Sumário: I- Os juros a que o art. 693.º n.º2 do CC se refere (juros que a hipoteca garante) serão os que imediatamente se seguem ao incumprimento, sem possibilidade de convenção em contrário.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

Na ...ª Vara Mista de V. N. Gaia, B...... e C........., residentes em Santa Marinha, da comarca movem os presentes embargos de executado à execução para pagamento de quantia certa que a si e a outros é movida por D....... e E......... S.A., com sede em Lisboa e Delegação no Porto, pedindo que na procedência destes, sejam os mesmos absolvidos do processo executivo e na hipótese de virem apenas a ser julgados total/parcialmente improcedentes, sejam indemnizados das benfeitorias realizadas na fracção adquirida, relegando-se a sua fixação para execução de sentença. Mais requerem a condenação da exequente como litigante de má fé.
Contestam estes, afirmando a razão dos embargantes a tudo o que exceda a quantia do capital (€25.060,68), acrescida de três anos de juros e despesas.
Fixado o valor da causa, foi proferido saneador-sentença que julgou os embargos parcialmente procedentes, reduzindo a responsabilidade dos embargantes à quantia de €45.359,82, garantido pelo imóvel hipotecado, prosseguindo a execução os seus termos, tendo-se em atenção o ora decidido.
Inconformados os embargantes/executados apresentam este recurso de apelação e nas suas alegações formulam as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto da sentença de fls. que, em síntese, julgou parcialmente procedentes os embargos de executados deduzidos, reduzindo o pedido exequendo garantido pelo imóvel hipotecado ao montante de €45.359,82 (quarenta e cinco mil trezentos e cinquenta a nove euros e oitenta e dois cêntimos).
2. Ora, salvo o devido respeito, não podem os Recorrentes, concordar com o entendimento explanado na sentença recorrida na parte em que considera igualmente garantida pela hipoteca que incide sobre o imóvel de que são proprietários e legítimos possuidores a Quantia relativa a três anos de juros, num total de €-20.299,14.
3. Nos termos do previsto no nº 1 do art. 693º do C.C., a hipoteca assegura, tão somente, os acessórios do crédito que constem do registo,
4. Sendo certo que, no que à obrigação de juros concerne, nos termos do disposto no nº 2 do supra aludido art. 693º do C.C., "tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos".
5. "A norma (artigo 693º n.º do Código Civil) que proíbe que a hipoteca abranja os juros relativos a período superior a três anos é de interesse e ordem pública, podendo ser invocada por qualquer interessado e conhecida oficiosamente pelo tribunal” - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 23.10.2001, in www.dgsi.pt.
6. Assim sendo resulta que a hipoteca constituída sobre as fracções adquiridas pelos Recorrentes apenas garante os juros relativos a três anos - como, de resto, assim conheceu a sentença recorrida -.
7. Ora quanto à concretização do momento a que se deve ter por reportado o aludido período de três anos - de forma a aferir desde quando e até quando gozam aqueles juros referentes ao aludido período de três anos de garantia hipotecária -, não se pode concordar com a sentença recorrida na medida em que esta admite que tais três anos podem ser uns quaisquer três anos.
8. Se é facto que do teor literal do nº 2 do art. 693º do C.C. não decorre a expressa determinação do momento concreto a partir do qual se deva ter por iniciado o aludido período de três anos hipotecariamente garantidos, não é aceitável que o aludido período de três anos se refira a qualquer período três anos, independentemente da duração do incumprimento por parte do devedor, devendo ser considerados outros elementos de interpretação, como sejam o elemento teleológico, o elemento histórico e o elemento sistemático.
9. Tal questão foi amplamente debatida no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23.10.2001, in www.dgsi.pt de acordo com o qual "Temos por certo que o dies a quo deste período de três anos não tem de ser o da data dos financiamentos por mais que uma razão: em primeiro lugar, se o financiamento não vier a beneficiar de garantia real, designadamente hipoteca, não poderão ser reclamados nem o capital nem os juros, por a tanto obstar o disposto no art. 865º, nº 1, do CPC; depois, ainda que os financiamentos beneficiem de contemporânea hipoteca, só o registo desta confere eficácia aos acessórios, aos juros que constem do registo; por último, bem podem as partes convencionar data diferente para o vencimento de juros e enquanto estes se não vencerem não pode o credor reclamar o seu pagamento. Portanto, a data dos financiamentos não é, forçosamente - e não será normalmente – a data de início de contagem dos três anos a que se refere o nº 2 do art. 693º do CC. Atento o visto efeito constitutivo ou condição de eficácia do registo da hipoteca podíamos ser tentados a iniciar a contagem do período legal precisamente na data do registo da hipoteca que se pretende fazer valer. Mas também não é certo que assim possa ser. Se as partes tiverem convencionado data de vencimento dos juros, só a partir de tal data eles são exigíveis e, como tal, só desde então pode contar-se o prazo de três anos de garantia cujo decurso permite ao credor registar nova hipoteca sobre os juros em dívida (art. 693º, nº 3, CC). Resta-nos pois como data de início de contagem dos três anos durante os quais os juros beneficiam de garantia o dia de vencimento e consequente exigibilidade dos juros (sublinhado nosso)".
10. Assim, e em aplicação deste entendimento, tendo a referida hipoteca sido constituída/registada em 03.05.1982, o vencimento da primeira prestação deu-se em 8 de Janeiro de 1984, pelo que apenas de encontram garantidos hipotecariamente os juros - remuneratórios e moratórios - que se venceram desde essa data até 08.01.1987.
11. Isto porque, "os três anos a que se refere o nº 2 do artigo 693 do Código Civil são os três primeiros anos a seguir ao vencimento dos primeiros juros", Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05.03.1992, in www.dgsi.pt; vide, ainda, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30.10.2001, in www.dgsi.pt.
12. Ora, como refere a própria Recorrida no art. 8º do requerimento executivo, a 1ª Executada não pagou a prestação que se venceu em 28.02.1985, o que determinou o imediato vencimento de toda a dívida e respectivos juros, pelo que, e no limite, ter-se-á de considerar que, quanto muito, a hipoteca garante os juros que se tenham vencido entre 28.02.1985 e 28.02.1988.
13. Assim sendo, os juros que se tenham vencidos a partir de 08.01.1987, no máximo e por mera hipótese académica, 28.02.1988, não gozam de qualquer garantia em especial, designadamente da decorrente da hipoteca constituída sobre as fracções de que os Recorrentes são proprietários e legítimos possuidores.
14. Decorrido o aludido prazo de três anos, só mediante convenção de nova hipoteca - no caso, inexistente, pelo menos onerando as fracções em questão - seria possível "cobrir" mais juros em dívida (cfr. art. 693º nº 3).
15. Resulta, assim, ser entendimento jurisprudencialmente unânime que a circunstância de do nº 2 do art. 693º do C.C. não constar a referência expressa a qualquer momento concreto a partir do qual se deva ter por iniciada a contagem do período em questão, certo é que a mesma é determinada mediante a aplicação das regras gerais do direito - para as quais, como é óbvio, não é necessário haver referência expressa -, seja, a contagem deverá ter lugar a partir do momento em que os - primeiros - juros forem exigíveis, sendo certo que tal exigibilidade pode ser determinada quer por disposição legal, quer por disposição convencional (como foi o caso).
16. Entendimento diverso - no sentido do consubstanciado na sentença recorrida -, sempre levará a soluções que não se podem ter por pretendidas pelo legislador.
17. Assim, se os três anos a que alude o nº do art. 693º do C.C. pudessem ser quaisquer três anos, então também, na letra de tal interpretação, caberia o entendimento de que tais três anos poderiam ser anos interpolados, seja, escolhidos à la carte.
18. Abona, ainda, em favor do entendimento sufragado no presente recurso o facto de o nº 3 do art. 693º do C.C. conceder ao credor hipotecário a possibilidade de requerer o registo de nova hipoteca em relação aos juros em dívida que excedam as três anuidades.
19. Cometendo a lei ao credor hipotecário o ónus de, periodicamente requerer junto da competente Conservatória do Registo Predial novo registo de forma a que a totalidade dos juros que se vão vencendo fiquem hipotecariamente garantidos, o que só se justifica considerando que o período inicial e legalmente garantido se reporta aos três primeiros anos.
20. Acresce ainda que, a análise do elemento histórico do artigo 693 n.º 2 C.C., conduz a idêntica conclusão.
21. Na verdade, o art. 900º do Código de Seabra (redacção do Decreto nº 19.126) preceituava que, quanto aos juros, devendo também constar do registo a sua taxa, a hipoteca abrangia os vencidos no último ano e no corrente para o efeito de, independentemente do registo, terem as vantagens dela, o que queria dizer que os únicos juros que gozavam da vantagem da hipoteca a que respeitavam, sem registo prévio (entenda-se, sem carecer de registo autónomo) eram os do último ano e do corrente, que era aquele em que se fazia a graduação dos créditos/ execução.
22. É assim notório que o citado art. 900º traduzia uma preocupação em limitar o montante de juros garantidos pela hipoteca que incidia sobre o bem dado em garantia a um período concreto e susceptível de determinação por terceiros.
23. Ora, a aludida disposição, ao estabelecer aquela limitação aos juros do ano anterior à citação para a execução, além dos vencidos durante esta, acabou por conduzir a soluções contrárias aos princípios que presidiram à sua redacção (cfr. Vaz Serra "Hipoteca", BMJ, 62, 1957, pág. 245 ),
24. Pelo que a nova norma - seja o artigo 693º n.º 2 - teve, na sua génese, a consideração de todos os inconvenientes suscitados pela redacção dada àquele art. 900º, e daí que, se devam ter "(...)em conta os anos obrigacionais, porque o registo especial para o crédito de juros faz-se naturalmente por anos dessa espécie. Desde que a concessão de certo lapso de tempo, pelo qual os juros beneficiam da consideração dada ao capital, se funda na conveniência de facultar ao credor o meio preciso para que ele se não sinta necessitado de executar o devedor logo que este deixe de pagar os juros, os anos a encarar devem ser os anos obrigacionais, únicos a que o credor pode atender” Vaz Serra, op. cit., pág. 246.
25. A alteração legislativa verificada e plasmada na redacção que, assim, foi dada ao art. 693º do C.C., teve subjacente a intenção de fazer acoplar ao capital inicial garantido por força da hipoteca constituída o período respeitante a três anos obrigacionais de juros, estabelecendo, desta forma, um corte com a anterior admissibilidade de garantia dos juros vencidos na pendência de processo executivo (que poderão ser designados por juros processuais).
26. Mas não teve a intenção de estabelecer um qualquer período de três anos obrigacionais, sem delimitação ou definição temporais.
27. Mais ainda: a solução ora consagrada teve em vista evitar que o credor hipotecário, colocado perante situação de incumprimento, se visse, desde logo, compelido a propor a competente acção de execução, sob pena de deixar de gozar de garantia sobre o seu crédito - solução a que conduzia a redacção do aludido art. 900º -.
28. Assim, também por via da análise do elemento histórico, subjazem razões determinativas da consideração de que o período de três anos referido no nº 2 do art. 693º do C.C. tem o seu início definido e determinado, não correspondendo, assim, a uns quaisquer três anos (à la carte).
29. Por isso, sem qualquer fundamento a tese sufragada na sentença recorrida,
30. Pois, por um lado, porque houve, de facto, intenção legislativa em proceder à fixação de prazo a partir do qual se deve ter por iniciada a contagem do período de três anos e, por outro, a questão da limitação da garantia hipotecária ao aludido período não deve, nem pode, ser perspectivada do ponto de vista do devedor, pois que, de facto, a circunstância de a lei prever tal limitação em nada colide ou diminui a responsabilidade deste,
31. Já que, garantidos hipotecariamente ou não, os juros sempre poderão ser imputados àquele devedor - simplesmente não gozam da garantia acrescida que lhes é dada pela hipoteca -.
32. Por isso, o credor hipotecário, dentro dos três anos posteriores à exigibilidade da obrigação de juros - partindo de um cenário de incumprimento - sempre terá ao seu dispor a possibilidade de ou accionar judicialmente o devedor e respectivo garante, ou fazer registar nova hipoteca referente ao período imediatamente subsequente.
33. O que não é legalmente admissível, é fazer recair sobre o garante hipotecário, terceiro adquirente do bem hipotecado, as consequências da inacção e inércia do credor.
34. Inexistindo dúvidas de que tal período de três anos se reporta aos primeiros três anos contados desde a data da exigibilidade da respectiva obrigação (de juros), certo é que dispõe o nº 1 do art. 698º do C.C. que "sempre que o dono da coisa (..) hipotecada seja pessoa diferente do devedor, é-lhe lícito opor ao credor (...) os meios de defesa que o devedor tiver contra o crédito (...)'; sendo que entre tais meios de defesa, conta-se a prescrição.
35. Ora, o caso sub judice analisa-se em dois direitos: o direito ao capital e o direito às prestações singulares de juros, e "cada um está sujeito à sua prescrição própria. No caso de um empréstimo, o direito de reaver o capital prescreve passados 20 anos após o seu vencimento; os furos periódicos, porém, decorridos 5 anos sobre o seu vencimento próprio”; Correia das Neves, "Manual dos Juros", Almedina, pág. 193.
36. Nos termos da alínea d) do art. 310º do C.C., prescrevem no prazo de cinco anos os furos convencionais ou lesais, ainda que ilíquidos, sendo que, "O regime da prescrição de curto prazo do artigo 310 alínea d) do Código Civil, é aplicável tanto aos juros moratórios como aos juros remuneratórios”; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 01.10.1996, in www.dgsi.pt.
37. Nesta conformidade, há que atender que os três anos relativos a juros garantidos pela hipoteca constituída sobre as fracções adquiridas pelos Recorrentes se encontram prescritos, prescrição que, nos termos e para os efeitos do vertido no art. 303º do C.C., foi expressamente invocada pelos Recorrentes, invocação essa que aqui se reitera.
38. Nos termos da regra geral do nº 1 do art. 306º do C.C., o prazo de prescrição de cinco anos começou a contar-se a partir do momento em que a obrigação é exigível, pelo que, no limite, ter-se-á que considerar que os juros relativos ao aludido período de três anos se tornaram exigíveis desde 28.02.1985 (data do incumprimento do 1º Executado, o que determinou o vencimento imediato das demais prestações),
39. Pelo que, como desde a data de 28.02.1985 e até 20.02.1990 não se verificou qualquer facto susceptível de, nos termos dos arts. 318º e segs. e 323º e segs. determinar a suspensão ou a interrupção do prazo prescricional de cinco anos, a 28.02.1990, os juros relativos ao período de três anos que se encontrava garantido hipotecariamente prescreveram, facto cuja invocação se reitera.
40. Assim sendo, por via dos efeitos de tal prescrição, conclui-se que as fracções oneradas com garantia hipotecária de que os Recorrentes são donos e legítimos proprietários apenas respondem/garantem o capital inicialmente em dívida (€: 25.060,68),
Pugna pela revogação da sentença recorrida na parte em que considerou responder o imóvel hipotecado de que os Recorrentes são proprietários e legítimos possuidores pela quantia correspondente aos três anos de juros, num total de €20.299,24., determinando-se, nessa conformidade, a redução do pedido exequendo ao montante de €20.060,68.
Contra-alega o exequente em defesa do decidido.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Na 1.ª Instância foram tidos como provados os seguintes factos:
-a) Por inscrição de 3 de Maio de 1982, com o n.º 41.517, de folhas 58v.º do livro C-58, foi registada hipoteca voluntária do prédio n.º 62.624, descrito a folhas 196 v. do livro B-162, tendo por sujeito activo o E........, empresa pública, e como sujeito passivo a sociedade “F......., Lda.”, garantindo um empréstimo no valor de 15.000.000$00, com o juro anual de 23%, acrescido em 2% no caso de mora, e também as despesas emergentes do contrato, até ao montante de 6.000.000$00, e com o montante máximo garantido do capital e acessórios de 26.850.000$00.
-b) Por inscrição de 22 de Julho de 1982, com o n.º 41.824, de folhas 31 do livro C-59, foi ampliada a inscrição supra referida, elevando-se a taxa de juro em mais 2%, com o valor máximo de 900.000.$00, mantendo-se a elevação de 2% em caso de mora.
-c) Por inscrição de 6 de Setembro de 1988, com o n.º 107047, foi registada a aquisição, por compra a “F......., Lda., a favor de B........ das fracções “I” e “V”, do prédio n.º 68164, de folhas 76 v. do livro B-179, desanexado do prédio 62624, de folhas 196 v. do livro B-162.
-d) O contrato que fundamentou o registo supra descrito foi celebrado, perante o notário, por “F......., Lda. e B......... no dia 12 de Janeiro de 1984.
-e) Em 13 de Dezembro de 1993, foi registada a acção interposta pelo E......., S.A. contra B.......... Pinto e mulher C........ e “F........, Lda. na qual se pedia a declaração de falsidade dos títulos de distrate que serviram de base ao cancelamento das hipotecas n.ºs 40338, folhas 44, C-55, 41517, folhas 58v.º, livro C-58 e 41824, folhas 31, livro c-59, e a nulidade dos registos de cancelamento das mesmas.
-f) No dia 8 de Maio de 2001 foi levada a registo a decisão judicial que declarou a nulidade dos registos de cancelamento das hipotecas que oneram as fracções “I” e “V” do prédio n.º 68164, folhas 76v.º, do livro B179.
-g) Do empréstimo referido em a) encontra-se em dívida o montante de € 25.060,68 (vinte e cinco mil e sessenta euros e sessenta e oito cêntimos), vencido no dia 28.02.1985.
Sendo estes os factos tidos como assentes, cumpre conhecer do objecto do recurso, delimitado como está pelas conclusões das respectivas alegações (arts. 684.º n.º3 e 690.º n.º1 do CPC).
São-nos colocadas duas questões:
- Contagem dos três anos de juros abrangidos pela garantia da hipoteca; e
- Prescrição destes.
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Contagem dos “juros relativos a três anos”.
O artigo 693.º do Código Civil refere “1. A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo. 2. Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos.”
Aqui discute-se quando se iniciam estes três anos.
Em confronto a tese da sentença e da apelada, que entendem que são três dos anos de vencimento, independentemente do seu início, com a tese dos apelantes que defendem que os três anos se devem iniciar com o vencimento da primeira prestação (8 de Janeiro de 1984) ou então com o vencimento dos primeiros juros ou início do incumprimento (28 de Fevereiro de 1985).
Quanto a nós, entendemos que os três anos serão os que imediatamente se seguem ao incumprimento, aí se iniciando os primeiros juros. No caso dos autos, os juros em causa dizem respeito ao período que vai de 28 de Fevereiro de 1985 a 28 de Fevereiro de 1988.
Deste modo se adere ao que foi decidido no Acórdão desta Relação de 23 de Outubro de 2001, no processo 1318/2001 da 2.ª secção e em que foi relator o hoje conselheiro Afonso Correia. Aliás também as alegações reproduzem partes essenciais do mesmo, pelo que seria despiciendo estar aqui a repetir tal matéria.
De essencial, temos que é de interesse e ordem pública a extensão da garantia pelo prazo máximo de três anos.
Em causa o interesse de terceiros, eventuais adquirentes do imóvel ou que no mesmo vejam garantia dos seus créditos. Todos os acessórios do crédito (despesas, cláusula penal, etc.), incluindo os juros convencionados têm de constar do registo com a finalidade de dar a conhecer a situação do mesmo. Entendeu o legislador que os três anos são o suficiente para vencer a inércia do credor e não deixar acumular demasiados juros sem o seu conhecimento.
Afastadas as hipóteses de início de contagem quer do financiamento, quer do registo da hipoteca, aparece como mais curial a data do vencimento da obrigação, ou seja, do seu incumprimento. À mesma conclusão chegou o Acórdão da Relação de Lisboa de 5 de Março de 1992, in BMJ, 415-712.
Diga-se que mesmo as decisões que a apelada apresenta em defesa da sua tese, salvo o devido respeito, não contrariam o aqui entendido.
O Acórdão da RP de 10 de Março de 2005, no processo 1088/05 da 3.ª secção, Relator Amaral Ferreira, não localiza no tempo os três anos, frisando que os juros só abrangem os três anos.
O Acórdão da RG de 29 de Setembro de 2004, processo 1048/04-2.ª,Relator Gomes da Silva, diz que se trata dos três anos imediatos após a entrada em mora.
O Acórdão do STJ de 6 de Junho de 2000 (a data das contra-alegações está errada) no Processo 00A440, Relator Cons. Lopes Pinto, apenas refere que não é proibido reclamar juros superiores a três anos, sendo que só estes estarão a coberto da garantia.
Adere-se, pois, à posição bem defendida nas alegações, não aceitando o decidido, nesta parte.
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Prescrição.
Face à posição assumida na sentença não se teria de conhecer, como não se conheceu, da prescrição invocada e estabelecida no art. 310.º, alínea d, do CC (prescrevem em cinco anos os juros convencionais ou legais). Como aí se disse, tendo a acção executiva dado entrada em juízo em 18 de Março de 2002, os juros em causa poderão ser os dos três anos anteriores.
Porém, face ao antes decidido e ao entendimento de que os juros em causa dizem respeito ao período de 28 de Fevereiro de 1985 a 28 de Fevereiro de 1988, os cinco anos já teriam decorrido quando a acção foi proposta. Não vem invocada, nem se verifica qualquer causa de suspensão (art.318.º do CC) ou de interrupção (art. 323.º) da invocada prescrição.
Assim se decide julgar procedente a excepção de prescrição dos juros em causa, restando apenas à exequente o direito ao capital em falta, ou seja, a quantia de €25. 060,68.

DECISÃO:
Nestes termos se decide julgar totalmente procedente a apelação, revogando-se a parte impugnada da sentença e ordenando-se o prosseguimento da execução contra os executados para cobrança da quantia de €25. 060,68.
Custas pela apelada.

Porto, 10 de Janeiro de 2006
Cândido Pelágio Castro de Lemos
Alberto de Jesus Sobrinho
Mário de Sousa Cruz