Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0631891
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PELAYO GONÇALVES
Descritores: RECLAMAÇÃO
Nº do Documento: RP
Data do Acordão: 03/21/2006
Votação: .
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO.
Decisão: INDEFERIDA.
Indicações Eventuais: LIVRO 662 - FLS. 111.
Área Temática: .
Sumário:
Reclamações: Rec. 433
1891/06 - 3ª Sec.

No ….º Juízo Cível do Porto, ….º Juízo – ….ª secção, na acção que nele pende termos sob o nº. …../03, veio B……… instaurar incidente de habilitação de herdeiros por óbito do réu C……. contra D……. e E……., tendo estes requeridos deduzido oposição.
Sobre este incidente foi proferido douta decisão que o julgou totalmente improcedente e absolveu os requeridos do pedido contra eles formulado.
Mas condenou estes nas custas do incidente, sem prejuízo do pedido de apoio judiciário concedido a Requerida, citando os art. 453º, nº.1 e 446º, nº.1 do CPC – v. fls. 13 a 17.
Do decidido veio o requerido D….. interpor recurso por não se conformar “com o segmento da Douta decisão de fls. 70 que o condena nas custas” – v. fls. 21.
O Mmº Juiz não recebeu tal recurso por a decisão desfavorável para o recorrente não ser de valor superior a metade da laçada do seu Tribunal citando o art. 678º, nº.1 do CPC – v. fls. 23.
Não se conformou o requerido D……. coma rejeição do sue recurso pelo que se valeu da faculdade conferida pelo art. 688º do mesmo Código, reclamando dela para o Presidente do Tribunal da Relação da área.
As alegações que nos dirige a expor as razões que, no seu entender, permitem o recebimento do recurso são do seguinte teor:
“1- Na pendência de acção de despejo faleceu o arrendatário 1º D……, C……, o Autor deduziu incidente de habilitação de herdeiros, com o valor igual ao do despejo (11671,92€) contra o 2º Réu, aqui Requerido, e outra, para ocuparem o lugar do decesso. Por escritura pública de 13/1/2005 o Requerido repudiou a herança do digo, escritura que juntou com a contestação ao incidente, em 14/1/2005.
2- A Decisão de 9/11/2005 a fls. 66 e seg. julgou improcedente o incidente de habilitação de herdeiros absolvendo os Requeridos, porém decidiu “ …. ser de condenar os requeridos nas custas processuais não obstante a improcedência do incidente, porquanto foram os mesmos que a eles deram causa: na verdade, só após a instauração do incidente de habilitação e a notificação / citação para deduzirem oposição, vieram aqueles repudiar a herança” (doc nº.1)
3- Inconformado com o segmento da Decisão de 9/1172005 que o condenou nas custas, o Requerido D……. interpôs em 28/11/2005 recurso de apelação (doc nº.2).
4- O despacho de 14/12/2005 diz que a Decisão de 9/11/2005 não é desfavorável para o Requerido em valor superior a metade da alçada do Tribunal, logo é insusceptível de recurso ordinário e rejeita-o (cfr. art. 678º nº.1 do CPC) – doc. nº.3. Com o que se discorda.
5- As custas compreendem a taxa de justiça e os encargos (art.1º nº.2 do CCJ)
Dispõe o nº.1, 2 e 3 do art. 16º do CCJ que taxa de justiça aplicável ás questões incidentais, e no caso à habilitação “… é fixada pelo juiz…” entre 1 UC e 20 UC”, que “Nos casos previstos no número anterior … pode o juiz, de forma fundamentada, dispensar do pagamento de taxa de justiça “e que “ …… se, até à elaboração da conta, o juiz não fixar o valor da taxa de justiça ou não dispensar do seu pagamento, o montante daquela será automaticamente fixado…”
6- O preceito do nº.1 do art. 678º nº.1 do CPC dispõe “Só é admissível recurso ordinário nas causas de valor superior à laçada do tribunal de que se recorre desde que as decisões impugnadas sejam desfavoráveis para o recorrente em valor também superior a metade da alçada….; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atender-se-á somente ao valor da causa”.
7- O valor da alçada dos Tribunais da 1ª Instância é de 3740,98 € (art. 24º nº.1 da lei nº. 3/99 de 13/1).
8- Aplicando estes princípios ao caso, alcança-se que a Decisão de 9/11/2005 não fixou o valor da taxa de justiça, que pode ser fixada até à elaboração da conta em valor de 1 a 20 U.C.
Há assim uma fundada dúvida acerca do valor da sucumbência!
E, assim sendo, a lei (art. 678º nº.1 do CPC) manda atender somente ao valor da causa que é de 11671,92 €, valor que é superior à alçada do Tribunal da 1ª Instância.
9- O despacho de rejeição de 14/12/2005 aqui reclamado violou e interpretou erradamente o disposto no art. 16º do CCJ e nº.1 in fine do art. 678º do CPC, sendo certo que tal interpretação violou os princípios do estado de direito, do acesso ao direito e aos tribunais e do duplo grau de jurisdição plasmados nos art. 2º, 20º e 209º nº.1 a), e, tal interpretação por ser desconforme com o texto e princípios constitucionais viola o art. 204º todos da CRP.
Termos em que deve o despacho de 14/12/2005 ser alterado e o recurso de 28/11/2005 admitido assim se fazendo a melhor e a mais sã justiça.”

O Mm. Juiz manteve a sua decisão e não houve resposta da parte contrária.
Cumpre decidir.
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A regra geral em matéria de recurso é a contida no art. 678º, nº.1 do CPC que estabelece, por um lado, a irrecorribilidade das decisões proferidas em processos de valor situado dentro da alçada do Tribunal de que se recorre e, por outro lado, também a irrecorribilidade das decisões proferidas em processos de valor superior à referida alçada desde que não sejam desfavoráveis para o recorrente em valor superior a metade do valor da alçada do Tribunal de que se recorre.
Em matéria cível a alçada dos Tribunais da Relação é de 3.000.000$00 (€ 14.963,90) e a dos Tribunais de 1ª Instância é de 750.000$00 (€ 3.740,18) – Lei 3/99, de 13/01, art. 24º e DL 323/01, de 17/12, art. 3º.
Esta regra geral tem as excepções previstas nos nº.2 a 6 desse artigo 678º e, ainda, aquelas eventualmente previstas em lei especial.
A existência de limitações de recorribilidade, designadamente através do estabelecimento de alçadas (de limites de valor ao qual um determinado Tribunal decide sem recurso), funciona como mecanismo de racionalização do sistema judiciário, permitindo que o acesso à justiça não seja, na prática, posto em causa pelo colapso do sistema, decorrentes da chegada de todas (ou da esmagadora maioria) das decisões aos diversos “patamares” de recurso – v. Ac. Trib. Const., de 29/7/03, Proc. 623/23002, 3ª Sec.
Como expressamente resulta da Lei, o valor a tomar em conta será o de desfavorecimento para o recorrente, que terá sempre de ser superior a metade da alçada do Tribunal – citado art, 678º, nº.1.
O certo é que a condenação nas custas do incidente que ocorreu no caso presente não goza de qualquer excepção ao regime geral – neste sentido v. Ac. R.L. de 16/6/98, da R.P. de 19/10/99, do Vice Presidente da R.L. de 1/11/00, do mesmo de 23/05/01 e da R.L. de 1/6/01 in DGSI.
No caso dos autos o Reclamante foi condenado nas custas do incidente sem que fosse fixado expressamente o valor da taxa de justiça, nos termos do art. 16º, nº.1 do CCJ.
Como o Reclamante apenas pretendia recorrer da condenação nas custas do incidente, o seu desfavorecimento é o correspondente ao seu valor, pois que a tal limitou o objecto do seu recurso, como lhe permite o art. 684º, nº.3 do CPC.
Ora, não pode somar o Reclamante ao valor de que pretende ser absolvido, que será pouco, ao valor da cação, para efeitos de interposição de recurso.
Na verdade o nº.3 do citado art. 16º do CCJ é expresso que “… se o juiz não fixar o valor da taxa de justiça ou não dispensar o seu pagamento, o montante daquela será automaticamente fixado em metade do valor da taxa de justiça do processo, não podendo, no entanto, exceder o valor de 2Ucs”
A decisão de que se pretende recorrer não é admissível de recurso por falta de alçada.
O Mm. Juiz fez correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais no despacho reclamado, não sendo admissível de qualquer censura.
Nomeadamente, não foram violados os preceitos legais indicados no nº. 10 das suas alegações e, ainda menos, da CRP como atrás referimos.
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Nestes termos, sem necessidade de maior fundamentação, por escusada, INDEFIRO a presente reclamação.
Custas pelo Reclamante.
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Porto, 21 de Março de 2006

O Vice-Presidente

Rui Fernando da Silva Pelayo Gonçalves
Decisão Texto Integral: