Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
10814/09.0TBVNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO LIMA COSTA
Descritores: CASA DA MORADA DE FAMÍLIA
Nº do Documento: RP2011120710814/09.0TBVNG.P1
Data do Acordão: 12/07/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: A casa de morada de família própria de um dos ex-cônjuges não deve ser atribuída em arrendamento ao outro, a seu pedido, quando o dono da mesma careça dela e não tenha meios económicos para encontrar outra habitação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo 10814/09.0TBVNG
Juiz Relator: Pedro Lima da Costa
Primeiro Adjunto: Des. Filipe Caroço
Segundo Adjunto: Des. Maria Amália Santos

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.
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B… instaurou no dia 4/11/2009 acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra o seu marido C…, pedindo que se decrete o divórcio.
Entre outros elementos, a autora invoca que o casamento ocorreu em 7/7/2003, que não têm filhos comuns e que estão separados de facto desde, pelo menos, Março de 2009, tendo o réu saído da casa de morada de família, sita em Vila Nova de Gaia, para ir viver em Lisboa.
Na tentativa de conciliação os cônjuges declararam que era intenção de cada um deles divorciarem-se, mas não estavam acordados nas matérias de alimentos entre os cônjuges, atribuição da casa de morada de família e elenco dos bens comuns.
Não obstante essas divergências, o processo passou a seguir os termos do divórcio por mútuo consentimento, nos termos dos arts. 1778-A e 1779 do Código Civil (CC).
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Ouvidos os cônjuges nas matérias em que não existia acordo, a autora apresentou alegações escritas, as quais só se reproduzem em seguida, em termos sumariados, na parte que se reporta à atribuição da casa de morada de família e pensão de alimentos:
A autora é reformada por invalidez e aufere mensalmente pensão de 246,36€, seu único rendimento,
A autora padece diversos problemas de saúde e subsiste com a ajuda de vizinhos, os quais lhe oferecem alimentos;
A autora necessita de pensão de alimentos mensal de 150€, sendo certo que o réu vive de forma mais desafogada do que a autora, auferindo o réu subsídio de desemprego, mas continuando a trabalhar e a auferir vencimento no final do mês;
Quanto à casa de morada de família, os dois cônjuges vivem desde 1999 numa fracção autónoma que é bem próprio do réu;
É a autora quem, desde Março de 2009, se encontra a viver sozinha nessa casa, não tendo possibilidade de arrendar ou adquirir outra casa;
O réu vive e trabalha em Lisboa, não tendo qualquer necessidade de utilização dessa casa;
Deverá ser atribuído à autora o uso da casa;
Se assim se não entender, deverá tal casa ser arrendada à autora, ao abrigo do art. 1793 do CC e do art. 1413 do Código de Processo Civil (CPC).
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Por seu turno, o réu apresentou alegações escritas que se reproduzem em seguida, em termos sumariados, na parte que se reporta à atribuição da casa de morada de família e pensão de alimentos:
A mudança do réu para Lisboa, por força do mau relacionamento conjugal, foi temporária, indo o réu residir para casa de uma irmã;
O réu teve trabalho a termo certo até Novembro de 2009, auferindo 600€ mensais ilíquidos, mas actualmente [25/1/2010] encontra-se desempregado e sem qualquer rendimento;
O réu não tem condições económicas para prestar alimentos à autora;
O réu tem encargo mensal de cerca de 300€ com a “prestação da sua casa”;
A casa de morada de família foi adquirida pelo réu antes da celebração do matrimónio e é bem próprio dele;
O réu pretende regressar rapidamente à cidade do Porto e só tem a casa em questão, não tendo outro sítio para viver;
A autora tem um filho que reside próximo dela, indivíduo que reside sozinho e cuja casa tem espaço suficiente para ambos;
A casa deve ser atribuída ao réu.
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Procedeu-se a julgamento, com inquirição de três testemunhas.
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Na sentença – registada em 2/2/2011 – foi decretado o divórcio entre a autora e o réu, por mútuo consentimento, foi julgada improcedente a pretensão da autora para que o réu lhe prestasse pensão de alimentos, não se considerou que existissem bens comuns a partilhar e decidiu-se atribuir a casa de morada de família à autora, pagando a autora ao réu a verba mensal de 50€, a título de renda.
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O réu apelou da sentença só para o efeito de ser revogada a parte da decisão que atribuiu a casa de morada de família à autora, devendo tal casa ser atribuída ao réu.
Formula as seguintes conclusões:
a) A casa de morada de família é propriedade do Recorrente;
b) O Recorrente está desempregado, auferindo um valor mensal de € 460,00;
c) O Recorrente tem uma despesa mensal fixa que, actualmente, ascende a € 205,00, para a aquisição da sua casa, que é a casa de morada de família;
d) O Recorrente tem, por isso, uma situação mensal patrimonial líquida no valor de € 255,00, com a qual tem de que fazer face a todas as despesas de saúde, alimentação, vestuário, água, luz, telefone, entre outras;
e) O Recorrente não tem qualquer outra habitação para onde possa ir morar;
f) O Recorrente não tem outros bens que lhe possibilitem adquirir ou arrendar outra habitação para morar;
g) O Recorrente vive, actualmente, por amizade, ou por piedade, sem sítio certo, em casa de alguns amigos;
h) A Recorrida aufere a quantia mensal de € 246,00;
i) A Recorrida tem uma despesa mensal com despesas de saúde no valor de € 34,00;
j) A situação patrimonial líquida do Recorrente é, por isso, € 40,00 a mais do que recebe a Recorrida;
l) A diferença da situação patrimonial líquida entre os dois cônjuges não permite assegurar qual dos dois necessita mais da casa de morada de família;
m) É, por isso, necessário atender-se a outros critérios, designadamente a culpa no divórcio ou a possibilidade da existência de outra casa para onde qualquer um dos cônjuges possa ir viver;
n) O divórcio foi decretado sem culpa de qualquer dos cônjuges;
o) A Recorrida tem um filho que vive sozinho numa casa perto de si, com condições para a acolher;
p) O Recorrente não tem qualquer outra habitação para onde possa ir viver;
q) Se se mantiver a decisão proferida pelo Tribunal a quo o Recorrente não tem outra casa para ir viver;
r) Se a casa de morada de família for atribuída ao Recorrente (seu proprietário), a Recorrida tem a casa do filho, que mora perto de si, para onde pode ir morar;
s) O filho está obrigado a prestação de alimentos à Recorrida, nos termos do artigo 2009º do CC;
t) A casa de morada de família só pode ser atribuída como arrendamento a um dos cônjuges se aquele que é proprietário desta habitação não ficar em situação económica que o impossibilite de aceder a outra habitação;
u) De acordo com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, o Recorrente ficará com uma situação patrimonial líquida de € 300,00;
v) Com este rendimento, o Recorrente não consegue, objectivamente, comprar ou arrendar outra casa e fazer face a todas as restantes despesas correntes (alimentação, vestuário, saúde, entre outras);
x) Mantendo-se a decisão recorrida, o proprietário da casa de morada de família (o Recorrente) ficará, inevitavelmente, na rua;
z) A decisão proferida pelo Tribunal a quo colocou o Recorrente numa situação de profunda injustiça;
aa) A Recorrida fica a habitar a casa de morada de família, pagando € 50,00 de renda ao Recorrente;
ab) O Recorrente fica a pagar ao banco € 155,00 por mês, devidos pela aquisição da casa de morada de família;
ac) O Recorrente paga para que a Recorrida possa ter uma habitação condigna (que lhe pertence a ele), mas fica sem casa para viver;
ad) A decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo violou, por isso, o artigo 1793º do CC e o artigo 65º da Constituição, dado que, no caso vertente, não existia nenhuma situação que justificasse, por critérios de justiça, a atribuição da casa de morada de família à Recorrida;
ae) A decisão de que se recorre deve, assim, ser alterada, atribuindo-se a casa de morada de família ao Recorrente, seu proprietário.
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Nas contra-alegações, a autora apresenta as seguintes conclusões:
1º A douta sentença proferida contém em si todos os elementos necessários para uma sã e justa decisão dos autos, tendo efectuado uma adequada ponderação dos interesses em discussão.
2º Resultou provado nos autos nomeadamente que:
a) (A Autora) Encontra-se reformada por invalidez, auferindo 246,36€ por mês;
b) É pessoa doente, padecendo de doença do foro oncológico, lúpus, diabetes e cardiopatia;
c) A Autora vive com ajuda de familiares e amigos.
Ora,
3º O “Tribunal poderá atribuir a casa de morada de família, como arrendamento, ao cônjuge que mais dela precisar”.
Sendo que,
4º O recorrente está de momento desempregado e aufere a título de subsídio de desemprego a quantia de 460€. A recorrida está reformada por invalidez e aufere uma pensão mensal no valor de 246€.
5º Matematicamente, a situação do recorrente é sempre mais favorável que a da Autora, tendo disponível mensalmente um rendimento que é sempre superior em cerca de 70% ao rendimento da Autora.
Acresce que,
5º A Autora é pessoa doente e inválida, razão pela qual não pode trabalhar. A sua capacidade de ganho está completamente embotada, sendo nulas as suas perspectivas de melhoria financeira.
6º Já o recorrente encontra-se desempregado, mas espera-se que essa situação não se mantenha. Na certeza que a sua saúde lhe permite procurar emprego e trabalhar, podendo, por meio do trabalho, ver alteradas e melhoradas as suas condições financeiras.
7º Quanto ao mais, os recorrentes estão na mesma situação: se a Autora pode socorrer-se do seu filho (com problemas sócio-económicos graves), o recorrente poderia socorrer-se da irmã, funcionária da Assembleia da República...
E assim sendo,
8º Uma ponderação adequada dos valores em crise na situação sub iudice, com recurso a critérios de proporcionalidade e racionalidade, demanda sempre a mesma solução: o cônjuge que mais necessita da habitação, aquele cuja situação se mostra mais precária e mais provável seja que assim se mantenha, é a Autora.
Pelo que,
9º É manifesto que a douta sentença em crise não merece qualquer censura, devendo ser mantida por V. Excelências.
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Foram colhidos os vistos legais.
A questão a decidir prende-se com a atribuição da casa de morada de família.
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Na sentença, consideraram-se provados os seguintes factos:
1 – Autora e réu casaram civilmente em 7/7/2003.
2 – Não têm filhos comuns.
3 – A autora reside na …, Lote .., …, …, Vila Nova de Gaia, sendo essa casa pertença do réu.
4 – Encontra-se reformada por invalidez, auferindo 246,36€ por mês.
5 – Tem despesas medicamentosas que rondam os 34€ por mês.
6 – É pessoa doente, padecendo de doença do foro oncológico, lúpus, diabetes e cardiopatia.
7 – A autora vive com a ajuda de familiares e amigos.
8 – O réu actualmente está desempregado, auferindo cerca de 460€ a título de subsídio de desemprego.
9 – Em 2009 foi viver para Lisboa, por aí ter encontrado emprego, mas como ficou desempregado retornou ao Porto em Abril de 2010, não tendo casa próxima na área desta cidade, para além da referida em 3.
10 – Com prestação para amortização de empréstimo para aquisição de habitação despende cerca de 205€ por mês.
11 – O filho da autora reside próximo dela.
Ainda se declarou na sentença que “Os demais factos alegados ou não obtiveram adesão de prova, ou eram conclusivos, ou continham matéria de direito”.
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O art. 1793 nº 1 do CC estabelece: “Pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada de família, quer essa seja comum quer própria do outro, considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal”.
As especificidades adjectivas desse incidente constam no art. 1413 do CPC, seguindo os termos dos processos de jurisdição voluntária. Destaca-se no âmbito desse tipo de processos a norma do art. 1410 do CPC: “Nas providências a tomar o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna”.
A sentença recorrida estabelece, como critério abstracto, que a casa é atribuída ao ex-cônjuge que tiver maior necessidade dela.
Mas, depois, a sentença não concretiza que a autora necessita mais da casa do que o réu, limitando-se a declarar que a autora é pessoa doente, que vive com reforma de 246€ e com a ajuda de terceiros e que reside na casa em apreço, sendo, na comparação entre a condição económica da autora e do réu, a autora quem está mais desfavorecida, juízo este que acaba por vir a não ser totalmente sustentado quando se conclui, noutro trecho, que à autora só não é atribuída pensão de alimentos pela circunstância de o réu “não tenha qualquer possibilidade de lhos prestar”. As possibilidades económicas insuficientes do réu justificam que não tem de prestar alimentos à autora, como a escassez de meios económicos do réu impedem que este seja obrigado a entregar a sua casa à autora, já que se trata do único bem que lhe permite suprir a sua necessidade de habitação.
Divisa-se, nos fundamentos da sentença, um juízo meramente implícito de a autora necessitar mais da casa do que o réu, mas esse juízo não está afirmado em termos que se reputem como suficientes para se lhe entregar a casa ao abrigo de arrendamento potestativo, isso à luz do critério que se enuncia, além de ser juízo pouco compatível com a asserção de o réu só não ter de pagar alimentos à autora por não ter meios económicos para os satisfazer.
Nos fundamentos da decisão não consta, em termos que se possam entender como minimamente explícitos, que a autora precisa mais da casa do que o réu, o que se constitui como insuficiência básica para se tomar a decisão de atribuição da casa à autora, com arrendamento potestativo.
O réu, embora não se canse de realçar como a decisão relativa à casa de morada de família é absurda, irrazoável, injusta, ilegal e inconstitucional, acaba, numa primeira fase dos seus argumentos de apelação, por concordar que o critério de decisão se prende com qual dos ex-cônjuges precisa mais da casa.
Sucede que no caso dos autos nem sequer se deve ponderar qual dos ex-cônjuges precisa mais da casa.
O critério de comparação das necessidades não deve funcionar.
Vejamos.
A maior necessidade por parte de um dos ex-cônjuges, relativamente à necessidade que o outro tenha, é um critério comparativo que o transcrito art. 1793 nº 1 adopta, mas não é critério único, como se extrai da expressão “nomeadamente”, inserta no trecho “considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges”.
O critério de necessidade muito mais se adensa quando se verifica a circunstância de se não ter outra casa a que recorrer e de se não terem meios económicos próprios que facultem a obtenção dessa outra casa, ainda que, num dos casos, se receba 50€ por mês de renda.
Provou-se que tanto a autora como o réu se encontram nesse limiar primário de necessidade.
Num contexto em que um e outro precisam da casa em apreço para satisfazer necessidade de habitação e que tanto um como outro não podem suprir, por meios próprios, essa necessidade através de outra casa, o que predomina é a condição do réu como dono de tal casa.
Provou-se que o réu precisa da sua casa – um bem próprio – e que não tem meios económicos para obter outra casa.
Nesse contexto, a decisão só pode ser a de entregar a casa ao dono.
Com efeito, nem a transcrita norma do art. 1793 nº 1 e a não vinculação a critérios de legalidade estrita, nem solução alguma conveniente e oportuna, permitem o resultado de o dono de uma casa de habitação, que efectivamente se encontra no limiar primário de só através de tal casa suprir a sua necessidade de habitação, se ver expropriado do direito de habitação – numa acepção aproximada da do direito real menor de direito de habitação previsto no art. 1484 do CC – dessa casa por utilidade particular, utilidade essa consubstanciada em maior necessidade da mesma casa por banda do ex-cônjuge desse proprietário.
Ainda menos permitem tal resultado num horizonte temporal indefinido, possivelmente perpétuo para o réu, sempre sem desconsiderar, e sem nunca esquecer, a possibilidade de a autora, doente e inválida, ficar sem casa para viver, mas, por outro lado, num âmbito em que o art. 2016 nº 1 do CC obriga cada cônjuge a prover à sua subsistência depois do divórcio.
A circunstância de essa expropriação por utilidade particular facultar ao réu uma renda mensal é incólume na atribuição da casa quando não é com essa renda que o réu logra obter meios económicos para alcançar outra casa: a renda é falsa solução quando, mesmo com o seu recebimento, persiste necessidade de habitação que não pode ser satisfeita, necessidade essa própria do réu/dono/senhorio.
O carácter extremado da decisão faculta ao réu que afirme “(…) o recorrente paga [um saldo líquido] para que a recorrida viva numa casa, mas fica sem casa para viver”.
Assente que o réu precisa da sua casa para satisfazer as suas necessidades de habitação e que não tem outra casa ou meios económicos próprios para providenciar essa outra casa alternativa, ainda que receba 50€ mensais de renda, deixa de se poder recorrer ao critério comparativo que manda atribuir a habitação que foi casa de morada da família a quem dela mais precisa: a necessidade absoluta do dono é o critério suficiente, imperativo e único para a casa lhe ser atribuída, sem se dever ponderar necessidade da ex-cônjuge, no âmbito de necessidades relativas de um e de outro.
O arrendamento potestativo previsto no art. 1793 do CC é instituto jurídico de aplicação muito limitada quando é instituído em benefício de um ex-cônjuge a incidir sobre casa de habitação que é bem próprio do outro ex-cônjuge, nunca podendo ser instrumento de efectiva privação de casa alguma que satisfaça as necessidades de habitação que sejam próprias deste proprietário.
O Prof. Leite Campos, numa citação que ainda permanece actualizada, num quadro legislativo em que deixou de existir divórcio-sanção, refere in “Lições de Direito da Família e das Sucessões”, pág. 305: “Parece, assim, chocante que ela [a casa de morada de família] possa ser atribuída mesmo ao [ex-] cônjuge que dela não é proprietário, como permite o art. 1793. Trata-se de um caso de expropriação forçada do uso da casa, que se deve considerar inconstitucional. Mas que, para além disso, tem de ser atendido com particulares precauções e no quadro do sistema de divórcio-sanção previsto no Código Civil (…). E de qualquer modo, só em casos excepcionais o tribunal deverá entregar a casa de morada de família ao cônjuge que não seja o seu proprietário”.
O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/12/1998, in CJ/STJ, 1998, tomo III, pág. 164, refere que “a casa de morada de família própria de um dos ex-cônjuges só pode ser atribuída em arrendamento ao outro, a seu pedido, caso o dono da mesma não fique em situação económica de não lhe permitir encontrar habitação”, bem como refere “deve ainda dar-se especial relevo à propriedade da casa, pois, se ela pertencer ao outro ex-cônjuge, só em casos excepcionais será de estabelecer a relação de arrendamento, uma vez que o destino normal dos bens é serem usufruídos pelos seus donos”.
Sem perder de vista que a autora pode ficar sem casa alguma para viver, nem por isso se verificam condições excepcionais que lhe facultariam o arrendamento potestativo da casa que é só do réu, num quadro em que também o réu/proprietário único precisa da casa para nela viver e sem que esse réu logre obter casa alternativa, receba ou não 50€ por mês de renda.
Nesse quadro, a necessidade da autora não pode ser ponderada.
Procede a apelação.
Para o efeito do sumário previsto no art. 713 nº 7 do CPC deixa-se exarado:
Para os efeitos da atribuição da casa de morada de família subsequente ao decretamento do divórcio, não deve ser decretado o arrendamento potestativo previsto no art. 1793 do Código Civil quando se prove que os dois ex-cônjuges necessitam de tal casa para satisfazer a correspondente necessidade de habitação e que tanto um como outro não podem suprir, por meios económicos próprios, essa necessidade através de outra casa, predominando, nessa situação, a condição de proprietário exclusivo que um dos ex-cônjuges tem sobre a casa, atribuindo-se-lhe tal casa.
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Em face do exposto, acordam os Juízes em julgar totalmente procedente a apelação e revogam a sentença só no trecho em que se decidiu atribuir a casa de morada de família à autora e em que se decidiu que a autora pagaria ao réu a verba mensal de 50€, a título de renda.
Mais decidem os Juízes atribuir a casa de morada de família ao réu.
Custas pela autora.

Porto, 7/12/2011
Pedro André Maciel Lima da Costa
Filipe Manuel Nunes Caroço
Maria Amália Pereira dos Santos Rocha (Dispensei o visto)