Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0326177
Nº Convencional: JTRP00035251
Relator: HENRIQUE ARAÚJO
Descritores: PRETERIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL
COMPETÊNCIA
Nº do Documento: RP200403230326177
Data do Acordão: 03/23/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: .
Sumário: I - É da competência exclusiva dos Órgãos da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (Comissão Arbitral) a acção anulatória das deliberações sociais da mesma.
II - A preterição do tribunal arbitral voluntário constitui excepção dilatória, cujo conhecimento não é oficioso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO :

I. RELATÓRIO

“X....., SAD”, com sede no Estádio....., em....., e “W....., SAD”, com sede na....., no....., propuseram na -ª Vara Cível, -ª Secção, do....., a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a “Liga Portuguesa de Futebol Profissional”, com domicílio da Rua da...., no....., pedindo que se declare nula e sem qualquer validade e eficácia a deliberação tomada na Assembleia Geral da Ré, em 19 de Outubro de 2001, que aprovou a criação de diversos escalões para fixação de compensações financeiras de diferente valor entre os clubes e SAD’s associados da Ré, a composição de cada escalão e o valor das respectivas comparticipações financeiras. Subsidiariamente, para a hipótese do pedido principal não proceder, pedem as Autoras que a referida deliberação seja anulada.
Fundam o pedido de nulidade da deliberação na violação do princípio constitucional da igualdade e o pedido subsidiário de anulação na figura do abuso de direito.

A Ré contestou, invocando, para o que ao caso interessa, a excepção da preterição do tribunal arbitral, e escudando-se, para esse efeito, na violação da convenção de arbitragem.

Na réplica, as Autoras responderam à referida excepção, pugnando pela sua improcedência.

Por decisão proferida no dia 27.05.2003, foi julgada procedente a excepção dilatória da preterição do tribunal arbitral, absolvendo-se a Ré da instância.

Não conformadas com o sentido dessa decisão, dela recorreram as Autoras.
O recurso foi admitido como sendo de agravo, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo (v. fls. 353).

Nas respectivas alegações de recurso, as agravantes pedem a revogação da decisão impugnada, formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:
I. A sentença recorrida entende que, com o recurso dos tribunais comuns na matéria dos autos, as recorrentes preteriram a Comissão Arbitral da Liga. Contudo
II. Os Estatutos da Liga contêm dois artigos distintos sobre a competência da Comissão Arbitral, pelo que é fundamental averiguar o respectivo campo de aplicação.
III. A alínea b) do art. 54º dos estatutos da Liga atribui à Comissão Arbitral competência para dirimir litígios entre a Liga e os clubes membros ou entre estes, compreendidos no âmbito da associação (o sublinhado é nosso).
IV. O art. 55º dos estatutos da Liga, pelo seu lado, atribui à Comissão Arbitral – com exclusão de qualquer outra – a jurisdição para dirimir litígios compreendidos no âmbito da Associação e emergentes dos Estatutos e Regulamento Geral.
V. O âmbito do art. 55º tem necessariamente de ser mais restrito que o da alínea b) do art. 54º, sob pena de se concluir por uma péssima técnica normativa, conclusão improvável dada a qualidade dos redactores, onde se incluíam numerosos juristas, nomeadamente magistrados de carreira e advogados.
VI. Para determinar o âmbito de aplicação específica do art. 55º - que estabelece uma competência exclusiva – há que interpretar as diferenças na redacção dos preceitos em causa, e dessas diferenças retirar um sentido útil.
VII. A norma do art. 54º dos estatutos refere o âmbito da associação (com “a” minúsculo), e não inclui qualquer limitação quanto à origem dos conflitos. Aponta, pois para todo e qualquer litígio, proveniente de violação de lei, dos estatutos ou do regulamento geral, tenha ou não a ver com os fins específicos para que a associação foi criada.
VIII. A norma do art. 55º dos estatutos, pelo contrário, refere o âmbito da Associação (com “A” maiúsculo) – apontando por isso para os fins específicos desta concreta Associação (organizar o futebol e as competições profissionais) – e exige que os litígios sejam emergentes dos Estatutos ou do Regulamento Geral.
IX. Ao contrário do que entende a douta sentença recorrida, não está em causa a norma estatutária que obriga à comparticipação das despesas da Liga.
X. Está em causa uma deliberação social da Assembleia Geral da Liga que pretende fixar contribuições desiguais por parte dos clubes e SAD’s para o orçamento da Liga. Não está em causa o futebol, nem a organização das competições, nem qualquer obrigação estatutária. Está em causa a violação dos preceitos legais e constitucionais na fixação dos critérios de repartição do montante da comparticipação nas despesas de funcionamento da Liga.
XI. Não estando em causa o futebol nem as suas competições, e tratando-se de uma violação da lei, a competência da Comissão Arbitral não é exclusiva, admitindo-se o recurso aos tribunais comuns.
XII. A deliberação ora posta em crise não é susceptível, nem indirectamente, de se dar cumprimento ao objectivo da Liga de organização das competições de carácter profissional que se disputem no âmbito da FPF.
XIII. A sentença recorrida violou os arts. 54º e 55º dos Estatutos da Liga de Futebol Profissional, o artigo 236º do Código Civil e o n.º 5 do art. 20º da Constituição da República Portuguesa.

Nas contra-alegações de fls. 390 e ss., a Ré defende a manutenção do decidido em 1ª instância.

O Mmº Juiz manteve a decisão sob recurso (v. fls. 409).

Foram colhidos os vistos legais.
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Uma vez que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das recorrentes - - arts. 684º, n.º 3 e 690º do CPC - a única questão a debater é a de saber se se verifica, efectivamente, a excepção dilatória da preterição do tribunal arbitral.

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II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Os factos que podem interessar ao recurso são os que seguem :
1. A Liga Portuguesa de Futebol Profissional é uma associação de direito privado e órgão autónomo da Federação Portuguesa de Futebol, que tem como fins principais, entre outros, a promoção e defesa dos interesses comuns dos seus membros e a gestão dos assuntos inerentes à organização e prática do futebol profissional e das suas competições, além da organização e regulamentação das competições de carácter profissional que se disputam no âmbito da Federação Portuguesa de Futebol.
2. A Liga Portuguesa de Futebol Profissional é composta por clubes e SAD’s que disputam competições de natureza profissional, designadamente os campeonatos da I Liga e da II Liga.
3. As Autoras (agravantes) são sociedades anónimas desportivas (SAD’s).
4. São associadas de pleno direito da Ré Liga, encontrando-se em pleno gozo dos seus direitos.
5. A Liga Portuguesa de Futebol rege-se pelos Estatutos juntos, por fotocópia, a fls. 119 e ss., pelos Regulamentos que de acordo com os ditos Estatutos forem emitidos, e pela demais legislação aplicável.
6. No dia 19.10.2001 teve lugar uma reunião ordinária da Assembleia Geral da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, conforme fotocópia da respectiva acta de fls. 154 a 171, reunião essa em que, por maioria de votos dos associados e com os votos contra das aqui Autoras (agravantes), foi deliberada a fixação de novos montantes de comparticipações financeiras mensais a pagar à Liga Portuguesa de Futebol Profissional pelos Clubes e SAD’s seus associados, com início retroagido a Julho de 2001, de acordo com os seguintes escalões e valores :

I Liga

I. W..., SAD, Y…, SAD e X..., SAD - Esc. 3.000.000$00 (€ 14.963,94)
II. D..., SAD, G..., SAD e R..., SAD - Esc. 1.400.000$00 (€ 6.983,17)
III. Restantes Clubes - Esc. 750.000$00(€ 3.740,98)

II Liga

Todos os Clubes - Esc. 50.000$00 (€ 249,40)

7. Dão-se, neste lugar, por integralmente reproduzidos, os documentos de fls. 82 e 154 a 171.

O DIREITO

A Liga Portuguesa de Futebol Profissional é uma associação de direito privado, que se rege pelos Estatutos, pelos Regulamentos que de acordo com eles forem emitidos, e pela legislação aplicável – art 1º dos Estatutos.
Essa associação tem como fins principais :
a) exercer as competências como órgão autónomo da Federação Portuguesa de Futebol de acordo com a Lei de Bases do Sistema Desportivo;
b) promover a defesa dos interesses comuns dos seus membros e a gestão dos assuntos inerentes à organização e prática do futebol profissional e das suas competições;
c) organizar e regulamentar as competições de carácter profissional que se disputem no âmbito da Federação Portuguesa de Futebol;
d) explorar comercialmente as competições por si organizadas, sem prejuízo da liberdade de contratação dos clubes e SAD’s nas matérias que só a eles digam respeito – v. art. 5º dos Estatutos.

São associados da Liga, obrigatória e exclusivamente, todos os clubes ou sociedades desportivas que disputem competições de natureza profissional, como tal definidas em diploma legal adequado – v. art. 7º dos Estatutos.
Constitui obrigação dos associados, entre outras, contribuir para as despesas da Liga, pagando pontualmente as quotas e outros encargos que sejam fixados, e acatar as deliberações dos órgãos da Liga, procedendo em conformidade com elas – v. art. 10º, n.º 1, als. g) e h).
São órgãos da Liga : a Assembleia Geral, sua Mesa e Presidente; o Presidente da Liga; a Direcção; a Comissão Executiva; o Conselho Fiscal; a Comissão Arbitral, a Comissão Disciplinar; e a Comissão de Arbitragem – v. art. 12º dos Estatutos.
A Assembleia Geral é formada por todos os associados no pleno exercício dos seus direitos e as suas deliberações são tomadas por maioria absoluta de votos dos associados presentes, salvo os casos das deliberações que envolvam alterações dos estatutos (3/4 do número total de votos) ou que se pronunciem sobre a dissolução da Liga (3/4 do número total dos associados) – v. arts. 24º e 35º dos Estatutos.

À Comissão Arbitral compete, nos termos do art. 54º dos Estatutos :
“a) Julgar os recursos interpostos das deliberações disciplinares da Comissão Disciplinar, nas matérias estritamente respeitantes às infracções disciplinares previstas no Capítulo V dos Estatutos;
b) Dirimir os conflitos entre a Liga e os clubes membros ou entre estes, compreendidos no âmbito da associação”.
No art. 55º dos Estatutos vem prescrito que:
“A Liga e os clubes seus associados reconhecem expressamente a jurisdição da Comissão Arbitral com exclusão de qualquer outra, para dirimir todos os litígios compreendidos no âmbito da Associação e emergentes, directa ou indirectamente, dos presentes Estatutos e Regulamento Geral”.
Feito este necessário excurso pelos Estatutos da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, focando apenas as normas estatutárias que nos auxiliarão na decisão, tentaremos seguidamente situar a concreta questão colocada no recurso.
Antes, porém, importa referir que a Liga, enquanto pessoa colectiva de direito privado (associação), está ainda sujeita ao regime dos artigos 157º a 184º do Código Civil.

Na reunião ordinária do dia 19.10.2001, a Assembleia Geral da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, observando a ordem de trabalhos oportunamente difundida pelos associados, foi deliberado, por maioria de votos dos associados e com alguns votos contra, nomeadamente os das agravantes, fixar os novos montantes de comparticipações financeiras mensais a pagar à Liga Portuguesa de Futebol Profissional pelos Clubes e SAD’s seus associados, com início retroagido a Julho de 2001.
As agravantes pretendem que o Tribunal declare a nulidade ou, subsidiariamente, a anulação de tal deliberação, por a mesma violar o princípio constitucional da igualdade e por estar ferida de abuso de direito.
A agravada sustenta que essa impugnação deve ser feita na Comissão Arbitral, de acordo com as regras dos arts. 54º e 55º dos Estatutos, tendo feito proceder, na 1ª instância, a excepção dilatória da preterição de tribunal arbitral. Daí o recurso das agravantes.

O art. 212º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, na versão de 1982, tal como na de hoje (art. 209º, n.º 2), previa a existência de tribunais arbitrais.
A Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, (Lei de Bases da Arbitragem Voluntária - LAV), materializou o quadro normativo de afirmação desta nova realidade jurisdicional.
No art. 1º desse diploma dispõe-se:
“Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, qualquer litígio que não respeite a direitos indisponíveis pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros”.
E o n.º 2 do mesmo artigo preceitua:
“A convenção de arbitragem pode ter por objecto um litígio actual, ainda que se encontre afecto a tribunal judicial (compromisso arbitral), ou litígios eventuais emergentes de uma determinada relação jurídica contratual ou extracontratual (cláusula compromissória)”.
Assim, a convenção arbitral é um negócio jurídico bilateral, na medida em que resulta da convergência da vontade das partes – v. Ac. STJ de 18.01.2000, no processo n.º 99A1015, em www.stj.pt.
Por esse facto é que os tribunais arbitrais voluntários são considerados instituições de natureza privada. Mas, por participarem no exercício da função jurisdicional, reconhece-se às suas decisões força de caso julgado e força executiva – cfr. art. 26º da Lei 31/86. Como lapidarmente se escreveu no Ac. do STJ de 18.01.2000, no processo n.º 99A1015, em www.stj.pt, citando Francisco Cortez, “A Arbitragem Voluntária em Portugal”, em “O Direito”, pág. 555, “a arbitragem voluntária é contratual na sua origem, privada na sua natureza, jurisdicional na sua função e pública no seu resultado”.

Será, então, que a matéria versada nos autos é da exclusiva competência do tribunal arbitral ?
Com o devido respeito por opinião contrária, parece-nos que sim.
A competência do tribunal afere-se pelo pedido do autor, ou seja pelo quid disputatum.
O que as agravantes pretendem com a presente demanda é a declaração de nulidade ou, subsidiariamente, a anulação da deliberação da assembleia geral da agravada, tomada na reunião ordinária do dia 19.10.2001, que fixou os novos montantes das comparticipações mensais dos associados.
A deliberação tomada pela assembleia de uma associação é um negócio jurídico unilateral, plural e heterogéneo. Unilateral, por emanar de uma só pessoa (a pessoa colectiva); plural, por no processo da sua formação intervirem os diversos associados da pessoa colectiva; e heterogénea, por expressar, segundo o princípio da maioria, a luta de vontades divergentes dos vários associados.
Os associados têm o direito de se opor a qualquer deliberação ilegal que viole ou contrarie a lei geral ou a lei especial do corpo colectivo (estatutos), pedindo que se anule a deliberação ilegal.
Diz, com efeito, o art. 177º do CC que “as deliberações da assembleia geral contrárias à lei ou aos estatutos, seja pelo seu objecto, seja por virtude de irregularidades havidas na convocação dos associados ou no funcionamento da assembleia, são anuláveis.
O Prof. Ferrer Correia ensina que “é de interesse público que as ilegalidades cometidas pela assembleia geral, no seu deliberar, sejam denunciadas – e é sobretudo da acção dos próprios sócios (solicitados e movidos pelo zelo dos seus interesses particulares) que a lei fia a realização daquele objectivo” – RLJ, ano 96º, pág. 162.
Sempre que o conteúdo de uma deliberação colida com uma norma legal que exprima uma tutela jurídica de interesse primacialmente público, concluir-se-á que essa deliberação pode ser invalidada.
Ora, a ilegalidade apontada pelas agravantes, de cuja substancialidade aqui não cuidaremos, é a de que a referida deliberação viola, antes que tudo, o princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP, que se integra no elenco dos preceitos respeitantes aos direitos, liberdades e garantias.
Como decorre expressamente do art. 18º, n.º 1, da CRP, os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas. São normas imperativas e inderrogáveis que limitam a autonomia privada.
Segundo as agravantes, a deliberação da Ré integra, ainda, abuso de direito.
O abuso de direito é, igualmente, proibido por lei – v. art. 334º do CC. No campo específico das deliberações sociais, o abuso de direito verifica-se quando aquelas são tomadas não em função do fim social da pessoa colectiva, mas antes no interesse particular dos vários associados que constituem a maioria.
São estas as causas do pedido de impugnação da deliberação social da Ré.
Não nos podemos, porém, abstrair do que está em jogo.
Aquilo que motiva o pedido de invalidade da deliberação da Ré é a fixação do aumento, alegadamente ilegal, das comparticipações financeiras mensais dos associados.
Essa matéria fazia parte da ordem de trabalhos da assembleia, conforme o atestam o aviso convocatório da assembleia e a própria acta desta – v. ponto 2. da ordem de trabalhos (fls. 82) e acta de fls. 155 e ss.
E não temos a menor dúvida de que tal matéria versa sobre direitos disponíveis e inscreve-se no leque de situações de natureza financeira previstas nos estatutos da Ré, dizendo respeito às relações desta com os seus associados, maxime às obrigações destes para com aquela. Basta atentar-se ao que dispõem as alíneas g) e h) do art. 10º dos Estatutos, acima referidas, para se concluir que a questão tratada na deliberação diz efectivamente respeito à actividade associativa, emergindo directamente dos Estatutos da Ré.
Ora, o art. 55º desses mesmos estatutos convenciona a competência exclusiva do tribunal arbitral para os litígios compreendidos no âmbito da Associação e emergentes, directa ou indirectamente, dos Estatutos e do Regulamento Geral.
Assim, em nosso entender, a convenção arbitral abrange a acção anulatória da deliberação social da Ré, estando o conhecimento desta cometido à Comissão Arbitral – v., neste mesmo sentido, o Ac. da Relação de Lisboa, de 15.04.1986, CJ, Ano XI, Tomo 2, pág. 110.

A preterição do tribunal arbitral voluntário constitui excepção dilatória, cujo conhecimento não é oficioso – arts. 494º, n.º 1, al. j) e 495º do CPC. É que, como sustenta Raul Ventura, “Convenção de Arbitragem”, ROA n.º 46, pág. 301, “da convenção de arbitragem nasce um direito potestativo para cada uma das partes, cujo conteúdo consiste na faculdade de fazer constituir um tribunal arbitral para julgamento de certo litígio que, à data da convenção, tanto pode ser actual como futuro. Correlativamente, cada uma das partes fica sujeita a uma vinculação”. Assim, na convenção arbitral, ambas as partes ficam constituídas no ónus de, querendo ver decidido litígio que se compreenda no seu objecto, preferirem a jurisdição arbitral, privada, à jurisdição pública. Por isso, se porventura, apesar da existência de convenção de arbitragem, uma das partes no litígio demandar a outra em tribunal judicial, o juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância, por ocorrer a excepção dilatória da preterição do tribunal arbitral – v. Lopes dos Reis, “Questões de arbitragem Ad-Hoc II”, ROA, n.º 59, pág. 292.
Tendo a Ré arguido, como lhe competia, a referida excepção, bem andou o Mmº Juiz a quo ao decidir pela sua procedência, dado que, por um lado, o litígio não está por lei submetido ao tribunal judicial ou à arbitragem necessária, estando, por outro lado, o seu objecto compreendido no âmbito dos direitos disponíveis,.
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III. DECISÃO

Em conformidade com o exposto, nega-se provimento ao agravo confirmando-se a decisão da 1ª instância.

Custas pelos agravantes.

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PORTO, 23 de Março de 2004
Henrique Luís de Brito Araújo
Alziro Antunes Cardoso
Albino de Lemos Jorge