Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0730129
Nº Convencional: JTRP00040528
Relator: DEOLINDA VARÃO
Descritores: REJEIÇÃO DE RECURSO
HONORÁRIOS
ADVOGADO
LIQUIDEZ
CRÉDITO
Nº do Documento: RP200707120730129
Data do Acordão: 07/12/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA EM PARTE.
Indicações Eventuais: LIVRO 727 - FLS 62.
Área Temática: .
Sumário: I – O art. 690º-A, nº/s 1 e 2, do CPC impõe às partes um ónus rigoroso, cujo incumprimento acarreta a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento das conclusões.
II – As obrigações do advogado para com o seu cliente são de meios e não de resultado, pelo que perder uma acção ou um incidente não constitui, necessariamente, erro de ofício, o que pressupõe que o advogado tenha agido com ignorância, inépcia ou negligência, na execução do mandato.
III – O crédito por honorários – que não o relativo às despesas efectuadas pelo advogado, na execução do respectivo mandato – só se torna líquido com a sentença judicial que fixe o respectivo montante.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
B………. instaurou acção declarativa com forma de processo ordinário contra C………., D………., E………. e F………. .
Pediu que os réus fossem condenados solidariamente a pagar-lhe a quantia de € 151.638,43, acrescida da quantia de € 1.761, 51 de juros vencidos e dos vincendos contados sobre aquela primeira importância até efectivo e pagamento.
Como fundamento, alegou, em síntese, que, no âmbito da sua actividade profissional, prestou serviços aos avós e pais dos aqui réus e, posteriormente, a estes como herdeiros, serviços esses que culminaram em acção judicial, tendo os réus revogado a procuração que haviam assinado e nunca tendo liquidado a nota de honorários oportunamente remetida pelo autor. Alegou ainda que de toda a sua actividade – que levou à procedência do pedido formulado pelos réus – adveio para os réus um grande benefício patrimonial.
Os réus contestaram, alegando, em síntese, que desconheciam a actividade do autor no que se refere às relações com os seus antepassados; que a responsabilidade destes nunca poderá ser solidária uma vez que as suas quotas na herança não são idênticas; que os juros não podem ser peticionados desde a interpelação dos réus; que a acção interposta pelo autor, como mandatário, apresentou algumas falhas técnicas que pode por em causa, presentemente, o direito dos réus; e que a actividade desenvolvida pelo autor importará, no máximo, no pagamento da quantia de € 15.000,00 a título de honorários.
Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou os réus a pagar ao autor a quantia de € 153.399,94, acrescida dos juros vencidos sobre a quantia de € 151.638,43, contados desde a data da propositura da acção, à taxa anual de 4% até efectivo e integral pagamento, na proporção de 6/12 a cargo da ré C………., 4/12 a cargo da ré D………. e 1/12 a cargo de cada um dos réus E………. e F………. .

Inconformados, os réus recorreram, formulando, em síntese, as seguintes
Conclusões
1ª – O tempo que um advogado despende com um processo é elemento relevante para a fixação dos honorários. Daí o laudo ter tido a necessidade de avançar com um número de horas de trabalho e o tribunal recorrido ter levado tal facto à base instrutória.
2ª – No procedimento do laudo, foi pedido ao autor que indicasse o número de horas de trabalho despendidas e este não o fez (resulta do laudo esta constatação).
3ª – Face a esta lacuna, no laudo partiu-se do resultado para a sua fundamentação, tal qual fato feito à medida. Como o valor médio hora no período de tempo em apreço era de 15 contos, dividindo o capital por 125, temos as 2 000 horas de trabalho.
4ª – Dos trabalhos discriminados na nota de honorários não se pode inferir tão avultado número de horas de trabalho despendidas.
5ª – O número de horas previsível é muitíssimo menor.
6ª – E engloba trabalho do advogado e trabalho de poio – levantar guias, entregar peças, etc., com preços de custo bem diferentes.
7ª – A pendência exagerada do processo por muitos anos não implica o dispêndio de horas de trabalho do advogado na exacta medida da pendência.
8ª – As diligências judiciais e as peças apresentadas nos autos pelo autor, bem como os tempos mortos havidos estão documentados na acção principal a que estes autos são apensos e deles não resulta tamanho dispêndio de tempo.
9ª – As muitas diligências que o autor refere ter tido junto da Câmara Municipal foram infrutíferas.
10ª – Estando apurado que, logo no início dos anos 90, o Município não ia cumprir a condição a que se obrigara por ter decidido ocupar a área a urbanizar com um arruamento, as negociações só poderiam versar ou uma solução alternativa noutro terreno dos pais das apelantes ou uma compensação em dinheiro.
11ª – E nunca o autor falou na primeira hipótese, e só [falou] na segunda depois do trânsito da acção declarativa. Desconhece-se, pois, qual o objecto de tantas reuniões.
12ª – A decisão recorrida afirma que se provaram os pressupostos em que o laudo se baseou, o que é conclusão infundada.
13ª – Não se apurou que o autor dependeu 2 000 horas de trabalhos. Apurou-se que despendeu muitas horas, mas muitas horas, para além de ser conclusivo, pode ser 100 horas, 200 horas, etc.
14ª – A resposta ao quesito 16º-A tem de ser dada como não escrita.
15ª – A resposta ao quesito 1º tem de ser restritiva, já que o depoimento da única testemunha que respondeu à matéria do quesito – G………. – é um depoimento inseguro, parcial, que não resistiu ao contraditório.
16ª – O autor intentou a necessária acção de fixação de prazo, mas só em 28.06.91, quando o assunto lhe foi colocado em 1987 (F) e G), o que só por si implicou uma paragem na resolução do assunto de 4 anos.
17ª – A acção teve sucesso, foi bem delineada, mas é de dificuldade mediana.
18ª – A acção principal teve duas omissões que foram fatais – a falta de registo da acção e a falta de interpelação da H………. .
19ª – À data da propositura, o terreno já estava ocupado pela H………. e era essencial que o caso julgado lhe fosse oponível.
20ª – E o registo da acção teria também evitado que o terreno fosse adquirido por usucapião.
21ª – O objectivo dos apelantes de reaverem o seu terreno tornou-se impossível.
22ª – O trabalho do autor não foi concluído e, não obstante, o autor raciocinou como se estivesse concluído.
23ª – A acção não foi contestada, o que facilitou muitíssimo a tarefa do autor. A acção teve um incidente de justo impedimento e apelação e o acompanhamento de revista.
24ª – Apurando-se que a Câmara não cumprira a condição, a acção teria necessariamente de proceder.
25ª – Os juros de mora só são devidos a partir da liquidação do montante dos honorários pela decisão da 1ª instância.
26ª – Os honorários do autor devem ser fixados em € 15.000,00.

O autor contra-alegou, suscitando a questão prévia do incumprimento, pela ré, do ónus de conclusão e, no mais, pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II.
Questão prévia do incumprimento do ónus de conclusão
Dispõe o artº 690º, nº 1 do CPC que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual concluirá, de forma sintética, pela alteração dos fundamentos em que pede a alteração ou anulação da decisão.
Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem conter as especificações referidas no nº 2 do mesmo normativo, entre as quais a indicação das normas jurídicas violadas (al. a).
Nos termos do nº 4 do mesmo artº 690º, quando as conclusões faltem, sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o nº 2, deve o relator convidar o requerente a apresentá-las, completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, sob penas de não se conhecer do recurso na parte afectada.
Segundo Alberto dos Reis[1], a exigência de conclusões, estabelecida no artº 690º, só se cumpre quando o recorrente fecha a sua minuta pela enunciação de proposições que sintetizem, com precisão e concisão, os fundamentos do recurso.
No caso, concordamos em que as conclusões não são um modelo de precisão, mas permitem que se entenda qual é o objecto do recurso, de tal forma que não se achou que fosse necessário dar cumprimento ao disposto no nº 4 do normativo citado.
Embora os réus não digam expressamente quais são as normas jurídicas que entendem que foram violadas, fazem referência aos critérios legais para a determinação do montante dos honorários, que, no essencial, é o que está em causa no recurso.
Pelo exposto, entende-se que foi cumprido o mencionado ónus, pelo que nada obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
*
III.
O tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos:
O autor é advogado, inscrito na respectiva Ordem, com a cédula nº ….. e faz da advocacia profissão habitual e lucrativa. (A)
No exercício daquela actividade profissional, a partir do ano de 1987, passou a patrocinar I………. e mulher AB………, nos mais diversos assuntos do seu interesse. (B)
Em particular no conflito que mantiveram com a CM de .........., que não alcançou decisão definitiva até ao falecimento de ambos, ocorrido em 07.04.19 e 18.01.00, respectivamente. (C)
Por isso, deduziu o competente incidente de habilitação dos ora réus, filhas – C………. e D………. - e netos daqueles seus constituintes, tendo, em consequência, passado a exercer o patrocínio destes. (D)
Por escritura de 05.07.85, outorgada no notariado privativo da CM de ………., os pais e avós dos ora réus aceitaram vender àquela Câmara, pelo preço de 4.523.000$00, uma parcela de terreno com a área de 11.780 m2, a destacar do seu prédio rústico “J……….”, sito no ………., freguesia de ………., inscrito sob o artº 152 da referida freguesia, condicionada pelos vendedores à “…condição de a Câmara Municipal autorizar os vendedores a construírem no prédio rústico assinalado a cor verde ...., prédios nas Condições do Plano de Urbanização a aprovar para o local.”. (E)
Transcorrido o ano de 1985 e todo o de 1986 sem que a CM tivesse satisfeito a obrigação assumida, em meados de 1987, os ascendentes dos ora réus consultaram e incumbiram o autor de, em sua representação, obter o cumprimento da condição estipulada. (F)
Com vista a obter da CM de ………. o cumprimento da condição aposta na escritura referida em E), o autor efectuou um avultado número de diligências, melhor especificadas na nota de honorários junta de fls. 25 a 41 dos autos, que consistiram na troca de múltipla correspondência com o Presidente da CM de ………. e com os clientes, diversas deslocações à CM para reuniões, uma das quais com o Presidente, análise de plantas e obtenção de documentos, conferências e reuniões no Departamento de Urbanização, além de sucessivas conferências com os clientes para lhes dar conhecimento da situação. (1º e 9º)
O autor contactou o gabinete de arquitectura dos arquitectos K………. e L………. a fim de que estes elaborassem um estudo de implantação para a área na qual a CM se obrigara a autorizar a construção que serviria de suporte ao referido PU. (2º)
Tal implicou diversas reuniões com os referidos arquitectos e deslocações à CM. (4º)
As diligências vindas de enunciar prolongaram-se pelos anos de 1987/88/89/90 até que, no princípio de 1991, o autor logrou apurar a razão do incumprimento da Câmara: esta pretendia alargar a via de acesso à H………. e para tal efeito iria absorver parte substancial do terreno em que aos vendedores fora prometido poder construir. (7º)
Consultado o Arq. L………., foi ele peremptório em afirmar que qualquer construção deixava de ser possível na área em causa, isto é, que a CM jamais iria dar cumprimento à condição da venda. (8º)
Teve ainda de intervir na defesa do mencionado terreno de parte do qual a empresa M………. parecia querer apropriar-se, o que implicou correspondência com a N………., SA, proprietária da obra. (10º)
Em 28.06.91, o autor instaurou contra a CM de ………. acção de fixação judicial de prazo que correu termos sob o nº …/91, pela .ª Secção do .º Juízo Cível deste Tribunal. (G)
O autor realizou todo o acompanhamento deste processo, o que implicou o estudo da contestação, diversas deslocações à Câmara para pedir e levantar certidão, que juntou aos autos, e bem assim ao Tribunal. (H)
A referida acção veio a ser julgada inteiramente procedente por sentença de 04.10.91 que fixou à CM o prazo de 6 meses “... para que a requerida cumpra a sua obrigação apresentando portanto um Plano de Urbanização para construção no referido terreno dos requerentes.”. ; (I)
A CM interpôs recurso de apelação, apresentou as respectivas alegações que o autor analisou, elaborando extensa resposta àquelas. Deslocou-se ao Tribunal da Relação do Porto para entrega desta e liquidação dos inerentes preparos. (J)
O acórdão de 18.05.92 do Tribunal da Relação do Porto decidiu: “fixar em seis meses o prazo para a Câmara Municipal de ………. fixar as condições de construção, no que diz respeito ao número de prédios, área, densidade de ocupação e destino dos edifícios a implantar no dito terreno dos apelados.”. (L)
Em 04.01.94, o autor propôs a acção de que estes autos são apenso. (M)
Nos autos referidos em M), foi deduzido pela ré CM um incidente de justo impedimento. (N)
O autor deduziu oposição ao incidente referido em N). (O)
A acção de que estes são apenso esteve sem qualquer despacho entre 04.10.94 e 10.09.97, o que motivou o autor a apresentar, em 12.09.97, um requerimento invocando denegação de justiça. (P)
Designada para 05.11.97, a diligência de produção de prova do incidente, [foi] adiada por requerimento do ilustre mandatário da CM, e teve lugar em 04.02.98, vindo em 20.02.98 a ser proferida douta decisão que julgou improcedente o aludido incidente. (Q)
Desta [decisão] interpôs recurso de agravo a CM de ………., a cujas alegações o autor respondeu (fls. 105 e segs.), após pormenorizado estudo e larga investigação jurisprudencial. (R)
Notificado em 27.05.98 do despacho que julgou confessados os factos articulados pelos seus constituintes, o autor apresentou, em 08.06.98, as alegações a que alude o artº 484º, nº 2 do CPC. (S)
Concluso no dia imediato, ficou o processo a aguardar fosse proferida sentença até 18.09.99, que julgou improcedente a acção. (T)
Perante a improcedência da acção referida em T) o autor marcou audiência com o Prof. Dr. O………., deslocando-se à P………. para lhe fazer uma exposição detalhada da situação processual. (11º)
Por dele ter colhido opinião favorável, elaborou as alegações do recurso de apelação, e consultou o Dr. O………., em ………., acerca do acerto da posição nelas defendida. (12º e 13º)
O autor interpôs recurso de apelação cujo andamento acompanhou, deslocando-se ao Tribunal para entrega das alegações, para pagamento da taxa de justiça, para impulsionar a subida dos autos ao Tribunal da Relação, o que só em 09.04.00 veio a acontecer. (U)
O recurso de agravo da decisão do incidente de justo impedimento, sofreu ainda um atraso pela deficiência das conclusões da agravante - que o autor oportunamente suscitara - vindo nele a ser proferido em 31.10.00 acórdão que, revogando a sentença, julgou procedente o justo impedimento. (V)
O autor interpôs recurso de agravo para o STJ e após um longo e porfiado estudo, elaborou as alegações que constituem fls. 175 a 198, realizando as correspondentes deslocações ao Tribunal da Relação para entrega do requerimento de interposição do recurso, das alegações, pagamento da taxa de justiça. (X)
Analisou a longa resposta da CM, cujo conteúdo inviabilizava qualquer género de resposta e, por fim, por acórdão do STJ de 19.04.01, foi revogado o acórdão do Tribunal da Relação e ordenada a baixa dos autos a este Tribunal para que conhecesse do objecto do recurso de apelação. (Z)
Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.11.01, foi decidido o recurso de apelação e a acção julgada inteiramente procedente. (AA)
Para a hipótese de a sentença vir a ser confirmada em 2ª instância, o autor obtivera já daquele Professor a promessa da elaboração de um parecer a coadjuvar as alegações do recurso de revista. (14º)
A CM interpôs recurso de revista para o STJ e admitido este, com efeito devolutivo, requereu o autor o traslado das peças processuais necessárias à instauração da execução. (BB)
Notificado das alegações do recurso de revista, o autor deslocou-se, de novo, a ………., para conferenciar com o Dr. O………. em ordem a aferir da vantagem da junção de parecer. (15º)
Atenta a delicadeza e complexidade da questão e a importância dos valores em discussão, o autor realizou pormenorizado estudo jurisprudencial e doutrinário, após o qual, produziu uma longa resposta. (CC)
A CM juntou aos autos certidão de óbito de I………., o que determinou para o autor a necessidade de deduzir, em 15.04.02, o respectivo incidente de habilitação de herdeiros. (DD)
A CM contestou a referida habilitação. (EE)
O autor respondeu à contestação mediante requerimento de 14.05.02, vindo, por douto despacho de 28.05.02 do Conselheiro Relator a ser julgado provado e procedente o incidente e, em consequência, habilitados os ora réus. (FF)
A CM de ………. arguiu a nulidade da decisão do incidente de habilitação e requereu a rectificação de um lapso de escrita. (GG)
A mais estes dois incidentes teve o autor de responder em extensos e fundamentados requerimentos que integram fls. 57 a 62 do respectivo apenso. (HH)
Quer a rectificação, quer a nulidade foram indeferidas por despacho de 27.06.02, a fls. 65/67. (II)
Por acórdão do STJ de 08.10.02, a fls. 305 e segs. do processo principal, foi negado provimento ao recurso de revista interposto pela CM e confirmado o acórdão do Tribunal da Relação. (JJ)
O autor suportou na totalidade os encargos processuais - no montante de € 883,43 - bem como todas as despesas de natureza administrativa e com as deslocações efectuadas - no valor de € 750,00 -, melhor discriminadas na nota de despesas e honorários que vai juntar-se e aqui se dá por integralmente reproduzida para os legais efeitos. (QQ)
Os serviços profissionais prestados pelo autor implicaram, para além dos constantes dos autos, conferências constantes com os clientes. (RR)
O autor trocou vária correspondência com a CM no intuito de ser encontrada uma solução plausível e urgente para a questão. (16º)
O autor despendeu muito tempo com o processo em apenso durante os vários anos em que esteve relacionado com o mesmo, não só em actos processuais como em actos de tentativa de resolução amigável do mesmo. (16ºA)
A acção intentada pelo autor em nome dos pais e avós dos réus não foi interposta contra a H………., entidade que ocupava a propriedade, e que veio a deduzir embargos de terceiro, os quais foram julgados procedentes, decisão transitada em julgado. (ss)
Por acórdão do STJ datado de 24.01.06 e proferido no apenso D) em que era embargante a Q……….. e embargados os aqui réus, e em que era objecto da acção o prédio descrito em E), foram os embargos julgados procedentes. (fls. 588 e seguintes do apenso D)
Em 1999, a APDL atribuiu a uma parcela de terreno com 6.700 m2, localizada a cerca de 400 m da que pertence aos réus, localizada na outra Avenida que circunda a H………., confinante com o S………., o valor de 250.000.000$00. (SS)
O terreno em causa localiza-se em área de intensa expansão urbanística, dotada de todas as infraestruturas (larga avenida pavimentada a betuminoso, redes de abastecimento de electricidade, água, drenagem de esgotos, estação depuradora, telefones). (17º)
O terreno situa-se próximo da avenida de acesso à H………. - ………. - na qual, do lado oposto, se encontra construído um enorme empreendimento urbanístico T………., constituído por . enormes blocos habitacionais com .. pisos e outro, junto à via pública, formado por . blocos com .. pisos cada um. (18º)
Próximo da rotunda onde desemboca a referida Avenida, estão construídos o S………. e uma série de armazéns que albergam as mais diversas indústrias. (19º)
Se os réus pudessem dispor do terreno para o transaccionar no livre mercado da oferta e procura, obteriam por ele um valor que oscilaria entre € 2.000.000,00 e € 2.258.000,00. (20º)
A 27.11.02, foi endereçada ao autor pelos réus carta em que lhe transmitiam a revogação do mandato conferido, confirmada por notificação de 10.12.02 do correspondente requerimento junto aos autos. (LL)
Em 27.07.04, o autor remeteu, sob registo postal com aviso de recepção, a cada um dos réus, para os endereços por eles indicados nas procurações outorgadas (a fls. do apenso de habilitação) a respectiva conta de despesas e honorários. (MM)
Apenas a 1ª ré a recebeu, tendo os demais, não obstante os avisos postais recebidos, recusado o seu levantamento. (NN)
Todos os réus tomaram conhecimento da aludida nota de despesas e honorários, seja por o teor da mesma lhes ter sido dado a conhecer pela ré C……….., seja por virtude de expressa comunicação do seu mandatário comum, reconhecendo-o de forma inequívoca. (OO)
E todos eles se recusaram a proceder à sua liquidação. (PP)
Os réus são socialmente tidos como pessoas abastadas, possuindo vários prédios rústicos, nomeadamente nas freguesias de ………., de ………., no concelho da ………. . (21º)
Os réus, em conjunto, e entre os anos de 2002 a 2004, obtiveram um rendimento colectável global de cerca de € 1.042.821, 03. (22º)

Com interesse para a decisão, estão ainda provados os seguintes factos:
Em 05.02.03, os ora réus instauraram execução para entrega de coisa certa contra a CM de ………., por apenso à acção ordinária …/94, pedindo a entrega do prédio referido em E). (apenso C)
Em 24.03.03, por apenso à execução acima referida, a Q………. – H………. deduziu os embargos de terceiro referidos em SS). (apenso D)
Naqueles autos de embargos de terceiro, foram considerados provados, além de outros, os seguintes factos:
Em 17.05.85, a CM de ………. e a U………. subscreveram o protocolo, constando do mesmo que, para a construção de um grande ………. a Câmara de ………. cede à U………. um terreno com a área total de 216.000m2, a entregar por fases, comprometendo-se a CM a iniciar de imediato o processo de aquisição amigável.
Em 04.07.91, foi celebrada uma escritura de compra e venda em que foram outorgantes a CM de ………. e a H………. .
Naquela escritura, foi dito pela CM de ………. que, por deliberação tomada em reunião de 13.02.85, aprovada pela Assembleia Municipal em 06.05.85, a referida Câmara aprovou a celebração de um protocolo com a U………., nos termos do qual o Município de ………. se obrigou a ceder àquela U………., para efeitos de construção de um ………., um terreno demarcado na planta junta a esse protocolo.
Mais foi dito que a CM, em reunião de 27.02.91 deliberou autorizar a cessão da posição contratual da U………. para a H………. .
Mais declarou o Município de ………. que vendia à H………., pela importância de 4.412.020$00, uma parcela de terreno com a área de 74.780 m, inscrita na matriz rústica sob os artigos 150, 152, 210, 212 e 213 e parte omissa e descrita na CRP de Matosinhos sob o nº 00752/140389 de ………., e destinada à instalação do H1………., e outras actividade associativas.
Na CRP de Matosinhos, por registo de 14.03.89, foi descrito o prédio a que ficou a corresponder o nº … da freguesia de ………., com a área de 74.780 m2, o qual englobou o prédio inscrito na matriz rústica sob o nº 152, referido supra, constando também inscrita a aquisição dos diversos prédios anexados para a constituição desse novo prédio pelo Município de ………. . (fls. 58 e 59 do apenso D)
Em 17.03.03, foi registada provisoriamente a aquisição, por compra, das referidas parcelas (designadamente da nº 152), a favor da H………. . (fls. 58 e 59 do apenso D)
*

IV.
São questões a decidir (delimitadas pelas conclusões da alegação dos apelantes - artºs 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC):
- Se deve ser considerada como não escrita a resposta ao quesito 16º-A;
- Se a resposta ao quesito 1º deve ser restritiva;
- Se o valor dos honorários deve ser fixado em € 15.000,00;
- Se os juros de mora são devidos apenas a partir da sentença da 1ª instância.

1. Resposta ao quesito 16º-A
Pergunta-se no quesito 16º-A se, com os serviços prestados aos réus, a seus pais e a seus avós, o autor despendeu 2 000 horas.
Respondeu-se: “Provado que o autor despendeu muito tempo com o processo em apenso durante os vários anos em que esteve relacionado com o mesmo, não só em actos processuais como em actos de tentativa de resolução amigável do mesmo”.
Dizem os réus que a resposta se deve considerar como não escrita, por ser conclusiva.
Ter-se respondido ao quesito da forma como se respondeu significa que não se apurou o número exacto de horas que o autor despendeu com o processo. Portanto, em rigor, e tendo em conta a forma como o quesito está formulado, a resposta deveria ter sido “Não provado”.
Por outro lado, a conclusão de que o autor despendeu muito tempo com o processo, quer em actividades processuais, quer em actos de resolução amigável do mesmo, pode extrair-se da demais factualidade provada, designadamente das als. G) a JJ) e RR) e das respostas aos quesitos 1º, 2º, 4º, 7º a 13º, 15º e 16º.
Sendo assim, a resposta negativa ao quesito ou a eliminação da resposta têm exactamente as mesmas consequências que a sua manutenção: falta de prova do número exacto de horas que o autor despendeu com o processo e conclusão de que despendeu muito tempo nas actividades ali mencionadas.
A eliminação da resposta é assim irrelevante, pelo que se mantém.

2. Resposta ao quesito 1º
O quesito 1º tem a seguinte redacção:
“Com vista a obter da CM de ……….. o cumprimento da condição aposta na escritura referida em E), o autor efectuou um avultado número de diligências, melhor especificadas na nota de honorários junta de fls. 25 a 41 dos autos, que consistiram na troca de múltipla correspondência com o Presidente da CM de ………. e com os clientes, diversas deslocações à CM para reuniões, uma das quais com o Presidente, análise de plantas e obtenção de documentos, conferências com o Arquitecto V……….., reunião no respectivo Departamento de Urbanização, além de sucessivas conferências com os clientes para lhes dar conhecimento da situação?”
Aquele quesito foi dado como provado, com excepção das conferências com o Arquitecto V………. .
Sustentam os réus que a resposta ao quesito 1º deve ser restritiva, sem explicarem qual é a restrição que pretendem.
Aquela resposta assentou nos depoimentos das testemunhas G………., X………., Y………. e Z………. e no teor dos documentos de fls. 17 a 24 (cfr. fls. 289, 301 e 302).
Para impugnarem a resposta ao quesito 1º, os réus limitaram-se a dizer que o depoimento da única testemunha que respondeu ao quesito – G………. – é inseguro, parcial e não resistiu ao contraditório.

Dispõe o artº 712º, nº 1, do CPC que a decisão sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 690º-A, a decisão sobre a matéria de facto;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas.
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que decisão assentou.
Nos termos do artº 690º-A, nº 1 do CPC, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes de processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
No caso previsto na al. b) do nº 1, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas, tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no nº 2 do artº 522º-C (nº 2 do citado artº 690º-A).
O citado artº 690º-A, nºs 1 e 2 impõe às partes um ónus rigoroso, cujo incumprimento acarreta a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento das conclusões[2].
No caso, os depoimentos das testemunhas foram gravados, encontrando-se devidamente assinalados nas actas de audiência de julgamento o início e o termo de cada depoimento, em conformidade com o disposto no artº 522º-C, nº 2 do CPC.
Os réus deram cumprimento parcial ao ónus imposto na al. a) do nº 1 do artº 690º-A (indicam o quesito cuja resposta querem ver alterada, mas não dizem em que sentido querem que seja alterada), e cumpriram o disposto na al. b) do mesmo nº 1; mas não deram cumprimento ao ónus imposto no nº 2 do normativo citado: não indicaram o depoimento da testemunha G………. por referência ao assinalado na acta.
O que implica a imediata rejeição do recurso na parte respeitante à impugnação da resposta ao quesito 1º.

3. Montante dos honorários
Dispunha o artº 65º do EAO aprovado pelo DL 84/84 que “Na fixação dos honorários deve o advogado proceder com moderação, atendendo ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, à importância do serviço prestado, às posses dos interessados, aos resultados obtidos e à praxe do foro e estilo da comarca”.
Os critérios enumerados naquele normativo não tinham carácter taxativo, pelo que se podia atender na fixação do montante dos honorários a outras circunstâncias objectivas e subjectivas que se entendesse serem relevantes.
“A importância em honorários do advogado não se afere somente pelo trabalho material, mas essencialmente pelo intelectual, no esforço despendido para a satisfatória resolução do problema jurídico no interesse do constituinte, e na seriedade com que esse problema é tratado”[3].
De qualquer forma, os critérios enumerados no nº 1 do artº 65º do EAO eram indicadores importantes para a determinação do montante dos honorários e, de entre eles, assumiam maior relevância a dificuldade do assunto, o tempo gasto, a importância do serviço prestado e a sua influência no resultado final[4].
Quanto ao estilo da comarca, este era formalizado pelas tabelas de honorários aprovadas anualmente pelas Delegações Comarcãs da Ordem dos Advogados, funcionando os valores ali estipulados como “mínimos”.
O nº 3 do artº 100º do actual EAO (aprovado pela Lei 15/05 de 26.01) tem a seguinte redacção:
“Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais”.
Como se vê, o actual EAO manteve, na essência, a redacção do anterior, pelo que se pode continuar a entender que os critérios ali enumerados não são taxativos, mas alargou o seu elenco, incluindo alguns dos que a jurisprudência já vinha considerando relevantes, tal como acima se expôs, nomeadamente, a urgência do assunto, o grau de criatividade intelectual e as responsabilidades assumidas.
Substitui também a expressão “estilo da comarca” por “usos profissionais”, o que não impede que as tabelas da OA continuem a funcionar como indicadores.
Como se diz no Ac. do STJ de 17.02.05[5], citado na sentença recorrida, o “resultado da causa” é algo que, ainda que a título de “success fee” não pode ser valorado autonomamente como honorário ou retribuição, mas é apenas, e tão só, de sua natureza, um factor a ter em conta na fixação dos honorários.
O que resulta, desde logo, do disposto no artº 66º, al. c) do EAO de 84 (e no artº 101º, nº 2 do actual EAO) que proíbe a “quota-litis”, ou seja a fixação do valor dos honorários exclusivamente em função do resultado obtido na questão.
Neste aspecto, importa ainda reter que é devida justa remuneração por todas as diligências feitas por mandatário judicial, ainda que improfícuas e que os honorários são devidos mesmo quando a acção se perde na totalidade[6].

No caso em apreço, existe laudo do Conselho Geral da OA.
“O laudo do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, junto a acção de honorários, deve ser considerado como um parecer – peça escrita, sem eficácia probatória, cuja função útil é a de contribuir para esclarecer o julgador”[7].
Assim, o laudo junto aos autos não tem natureza vinculativa, sendo de livre apreciação pelo julgador, que deve fixar os honorários de acordo com os critérios enunciados no EAO e de outros que entenda serem relevantes.
Porém, “Os laudos do Conselho Geral da Ordem dos Advogados sobre honorários, … são elaborados por profissionais do mesmo ramo de actividade do agente cujos serviços prestados se pretendeu quantificar sob o ponto de vista económico, e é manifesto que ninguém melhor do que os seus subscritores têm conhecimentos técnicos susceptíveis de permitir aferir, com um elevado grau de precisão, o valor económico àqueles correspondente.
E sendo o laudo subscrito por unanimidade dos seus membros, será manifesta estultícia pôr em dúvida a justeza das considerações e conclusões no mesmo expendidas.”[8].
Face ao exposto, o laudo do Conselho Geral da OA é também mais um elemento para considerar o montante dos honorários pedidos pelo autor.

Em suma: na fixação do montante dos honorários, para além da ponderação dos elementos do EAO, deve atentar-se no laudo da AO e devem considerar-se critérios de equidade, intervindo aqui um juízo com uma certa componente de discricionariedade no sentido civilístico do termo – poderes do julgador no preenchimento das normas contendo conceitos indeterminados[9].

No caso em apreço, o mandato foi conferido para a obtenção do cumprimento pela CM de ………. da condição estipulada no contrato de compra e venda que aquela havia celebrado com os ascendentes dos réus em 05.07.95.
Através daquele contrato, os ascendentes dos réus venderam à CM de ………. uma parcela de terreno a destacar de um prédio rústico, pelo preço de 4.523.000$00, com a condição de a CM os autorizar a construírem prédios no referido prédio rústico, nas condições do Plano de Urbanização a aprovar para o local.
Sustentam os réus que os honorários do autor devem ser reduzidos de € 150.000,00 para € 15.000,00 face ao resultado obtido, uma vez que, apesar de, na acção principal, ter sido declarada a ineficácia do referido contrato de compra e venda, devido ao incumprimento pela CM da condição estipulada, e de esta ter sido condenada a entregar a parcela de terreno aos réus, bem como a pagar-lhes uma sanção pecuniária compulsória pelo atraso na entrega, acabou a CM por ficar impedida de cumprir aquela obrigação, por, entretanto, a parcela de terreno ter sido adquirida pela H………., por usucapião.
Dizem ainda que o resultado teria sido outro, se o autor:
- face ao incumprimento pela CM da condição estipulada no contrato, verificado logo no início dos anos 90, tivesse negociado uma solução alternativa noutro terreno dos ascendentes dos réus ou uma compensação em dinheiro;
- tivesse registado a acção principal;
- tivesse feito intervir a H………. na acção principal.

O mandatário é obrigado, além do mais, a praticar os actos compreendidos no mandato segundo as instruções do mandante (artº 1161º, al. a) do CC).
Relacionada com aquela obrigação, está a obrigação específica do advogado para com o seu cliente prevista no artº 83º, nº 1, al. d) do EOA aprovado pelo DL 84/84 (aplicável ao caso em apreço): estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que seja incumbido utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade (al. d).
Havendo violação da al. d) do nº 1 do artº 83º, ocorre o chamado “erro de ofício” que constitui o advogado, quer em responsabilidade civil para com o cliente porque importa culpa e cumprimento defeituoso das obrigações que para ele resultaram do mandato, quer em responsabilidade extracontratual porquanto consubstancia culpa e viola o normativo citado.
Quando os actos compreendidos no mandato revestem complexidade e exigem conhecimentos técnicos específicos, como sucede com a maior parte dos actos praticados por um advogado no exercício das suas funções, a obrigação de seguir as instruções do mandante tem de ser entendida em termos hábeis: nestes casos, o mandatário pode estar impedido de seguir “à letra” as instruções do mandante pela própria especificidade técnica dos actos que tem de praticar.
Neste aspecto particular, há que ter presente que as obrigações do advogado para com o seu cliente são de meios e não de resultado, pelo que, perder uma acção ou um incidente não constitui necessariamente erro de ofício. “...sendo o direito uma ciência especulativa, não pode exigir-se ao advogado que ele tenha necessidade de seguir o mesmo critério que o juiz que elaborou a decisão e que, na maior parte dos casos, o advogado desconhece mesmo qual seja.”[10]
Assim o advogado não será responsabilizado por ter perdido uma acção, que tratou com zelo, mesmo que tivesse cometido erro de direito ou de facto, se em tal erro pudesse incorrer um advogado normal, em face das circunstâncias do caso[11].
Para que haja erro de ofício é necessário que o advogado tenha agido com ignorância, inépcia ou negligência na execução do mandato.

No caso, o erro de ofício não é invocado como fundamento da responsabilidade contratual do autor, mas apenas tendo em conta o seu reflexo no resultado da acção e, consequentemente, no valor dos honorários.

Vejamos então os pontos concretos da actuação do autor que os réus põem em causa:
A) Está efectivamente provado que, no início de 1991, já o autor tinha conhecimento de que a CM nunca iria cumprir a condição estipulada no contrato porque afectara parte substancial do terreno em causa ao alargamento da via de acesso à H………., o que tornara impossível a construção na área (cfr. as respostas aos quesitos 7º e 8º).
O autor estava mandatado para obter o cumprimento da condição estipulada no contrato, não tendo os réus alegado que, perante a situação de incumprimento por parte da CM, tivessem dado instruções específicas ao autor para negociar uma contrapartida noutro prédio ou uma compensação em dinheiro.
Apesar disso, os autos contêm abundante prova de que, antes de avançar com a solução judicial, o autor tentou negociar com a CM, prolongando-se essas negociações pelos anos de 1987 a 1991, como se alcança das respostas aos quesitos 1º, 2º, 4º, 7º, 8º, 9º e 10º.
Decorridas aquelas negociações, optou então o autor por instaurar acção pedindo a declaração de ineficácia do contrato e de quaisquer actos de oneração ou disposição da parcela de terreno que a CM tivesse praticado, e a condenação da CM a entregar o terreno aos réus, bem como a pagar-lhes uma sanção pecuniária compulsória pelo atraso na entrega. Previamente, o autor teve de instaurar uma acção judicial de fixação de prazo, uma vez que no contrato de compra e venda não fora fixado prazo para o cumprimento da condição.
A consequência da falta de verificação de uma condição suspensiva é precisamente a ineficácia do negócio que a ela se subordinou, como melhor se explica nos Acórdão desta Relação e do STJ de fls. 237 e seguintes e 305 e seguintes da acção principal, que julgaram a acção procedente, e para os quais remetemos. Não se discute pois a bondade da solução jurídica encontrada pelo autor, que teve acolhimento nos referidos arestos.
Com a declaração da ineficácia do negócio, os réus obteriam a restituição da parcela de terreno que venderam à CM, passando a dele poder dispor livremente e a dele retirarem os benefícios que entendessem; não se vislumbra em que medida as soluções negociadas preconizadas pelos réus os beneficiariam mais do que a restituição do seu prédio.
Os réus só não vieram a obter a restituição do prédio, apesar da procedência total da acção, porque, entretanto, este foi adquirido, por usucapião, pela H………. .
O que nos remete para o segundo aspecto da actuação do autor focado pelos réus.
B) Segundo os réus, o registo da acção principal teria obviado à aquisição da propriedade da parcela de terreno pela H………. por usucapião.
Diz o artº 2º, nº 1, al. b) do CRP que estão sujeitos a registo os factos jurídicos que determinem a constituição, o reconhecimento, a aquisição ou a modificação dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão.
Por sua vez, diz o artº 3º, nº 1, al. a) do mesmo Código que estão igualmente sujeitas a registo: a) as acções que tenham por fim, principal ou acessório, o reconhecimento, a constituição, a modificação ou a extinção de algum dos direitos referidos no artigo anterior.
Ora, a acção principal, se bem que tenha como causa de pedir a ineficácia de um negócio jurídico, não deixa de ter como fim acessório o reconhecimento do direito de propriedade dos réus sobre a parcela de terreno que haviam vendido à CM: a declaração de ineficácia do contrato de compra e venda, tem como consequência o retorno da parcela de terreno ao património dos autores, cuja aquisição pela CM já estava registada a favor desta desde 14.03.89.
Nos termos das normas de registo predial acima citadas, a acção estaria sujeita a registo.
Mas, no que respeita ao caso dos autos, esse registo teria sido inócuo.
Vejamos porquê:
O registo não releva para efeitos do disposto no artº 291º do CC porque este normativo só se aplica aos casos de nulidade ou anulabilidade do negócio. Além disso, a ineficácia do negócio por incumprimento de condição suspensiva tem a norma própria do artº 274º, nº 1 do mesmo Diploma, que comina com a ineficácia todos os negócios realizados na pendência da condição.
O registo também não interessa nos termos e para os efeitos do disposto no artº 271º do CPC porque a aquisição por terceiro a que este normativo se refere é a aquisição efectuada depois do registo da acção. Ora, no caso, a H……….. adquiriu a parcela de terreno em 04.07.91 e a acção foi instaurada em 04.01.94.
E o registo da acção só seria idóneo a impedir a aquisição por usucapião da parcela pela H………. em duas situações: a) se a posse da H………. se tivesse iniciado em data posterior ao registo porque, neste caso, os réus beneficiariam da presunção do registo com data anterior (artº 1268º, nº 1 do CC); b) se a H………. tivesse adquirido a parcela em data posterior ao registo da acção, porque, neste caso, estaria a possuir de má fé (cfr. artº 1260º, nº 1) e o prazo da usucapião passaria a ser de 20 anos (artº 1296º do CC), que ainda não se teriam completado à data da instauração dos embargos de terceiro (24.03.03).
Assim, ainda que o autor pudesse ter antecipado a possibilidade da aquisição por usucapião da parcela de terreno por um terceiro, tendo em conta os factos acima mencionados, o registo da acção não teria impedido a aquisição da parcela por usucapião pela H………. . O que, aliás, se alcança da fundamentação dos acórdãos desta Relação e do STJ proferidos no apenso dos embargos de terceiro instaurados pela H………. (respectivamente, a fls. 473 e seguintes e 588 e seguintes do apenso D).
C) Já a intervenção da H………. na acção principal tinha relevância porque contra ela seria formulado o pedido de entrega do prédio e, à data da instauração da acção, não tinha decorrido ainda o prazo para a aquisição por aquela associação do direito de propriedade da parcela por usucapião. Sem poder provar a aquisição originária, tendo sido declarado ineficaz o negócio que titulava a aquisição derivada e não tendo presunção registral a seu favor [a H………. só registou a parcela em 17.03.03], a H………. não teria provado o seu direito de propriedade sobre a parcela em causa e teria sido condenada a entregá-la aos réus.
Porém, o requerimento da intervenção da H………. tem como pressuposto que o autor conhecesse, ou devesse conhecer, que a H………. tinha comprado a parcela à CM em 04.07.91.
Ora, os réus nada alegam nesse sentido e os autos principais não contêm quaisquer elementos que nos permitam concluir que o autor tinha aquele conhecimento. Note-se que a compra foi feita já depois de o autor ter instaurado a acção de fixação judicial de prazo (28.06.91), ou seja, depois de ter terminado as negociações com a CM com vista à obtenção de um consenso.
Não estando provado que o autor soubesse que a H………. já tinha adquirido a parcela de terreno, não lhe era exigível que instaurasse a acção também contra ela, por forma a acautelar o efeito útil normal da mesma.

Por todo o exposto, entendemos que o autor agiu como teria agido qualquer advogado normal em face das circunstâncias do caso, não se evidenciando o erro de ofício que os réus lhe imputam.
E, tendo em conta aquelas circunstâncias, o resultado obtido foi o resultado possível, pelo que, ponderando o mesmo como um dos factores relevantes para a determinação do montante dos honorários, entendemos que não desvaloriza o trabalho do autor, e, por isso, não contribui para a redução daquele montante, muito menos, no sentido preconizado pelos réus.

Dos demais factores que foram tidos em conta na determinação do montante dos honorários, põem os réus em causa o número de horas despendidas, alegando que o laudo de fls. 225 e seguintes fez uma estimativa de 2 000 horas de trabalho gasto e que tal não se provou.
Neste ponto, importa reter a factualidade descrita nas als. G) a JJ) e RR) e das respostas aos quesitos 1º, 2º, 4º, 7º a 13º, 15º e 16º.
Dessa factualidade só pode extrair-se a conclusão que foi extraída no laudo e que foi acolhida na sentença recorrida.
Para eles remetemos, nomeadamente, quando se diz que “…ao longo dos mais de quinze anos, o senhor advogado desenvolveu trabalho com um carácter praticamente permanente no acompanhamento e nas diversas intervenções judiciais e extrajudiciais, mas sempre no âmbito da defesa e promoção dos interesse que lhe estiveram confiados. Os factos que damos como assentes, revelam que a questão implicou um relevante investimento de tempo” (laudo – fls. 236).
E “…tal facto [as 2 000 horas de trabalho] foi tido em conta mais como factor de equidade do que com base em uma quantificação rigorosa de horas despendidas pelo autor. Com efeito sabemos que ao longo dos cerca de 15 anos em que o autor tratou deste caso trabalhou no mesmo com afinco e com persistência, com várias horas de tempo dedicados ao mesmo, quer em actos processuais como em negociações extra-judiciais que, como vimos, foram sempre tentadas e sempre com a hipótese real de ser obtido acordo. Recorda-se que se não exige que ao longo destes anos o trabalho tenha sido uniformemente repartido. Exige-se apenas a prova da realização de um acompanhamento técnico dado pelo advogado e com justificação, o que foi demonstrado – quer os actos processuais quer, recorde-se, os trabalhos extra-processuais que foram sempre realizados com um objectivo que era alcançável” (sentença – fls. 336).
Ou seja: sem ter sido feita uma prova efectiva de que o autor gastou 2.000 horas de trabalho, os elementos constantes dos autos permitem que o julgador equacione aquele gasto em termos de equidade para formular o juízo sobre o valor dos honorários, tendo em conta a componente de discricionariedade que tal juízo implica.

Assim, afastados os óbices colocados pelos réus da desvalorização do resultado obtido e da falta de prova das 2 000 horas de trabalho, não se nos evidenciam razões para fixar os honorários em valor inferior ao que foi sugerido no laudo da OA, valorizando-o nos termos que acima expusémos – tal como foi entendimento da sentença recorrida, que, nesta parte, se confirma.

5. Momento da constituição em mora
O tribunal recorrido condenou os réus a pagar juros de mora, quer sobre o montante dos honorários, quer sobre o montante das despesas, desde a data do recebimento pelos réus da nota de honorários (30.07.04).

O devedor constitui-se em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a obrigação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido (artº 804º, nº 2).
A simples mora constitui o devedor na obrigação indemnizar o credor pelos danos que lhe causou (nº 1 do normativo citado); nas obrigações pecuniárias, essa indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (artº 806º, nº 1).
Quanto ao momento da constituição em mora, dispõe o artº 805º, nº 3, 1ª parte que, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto não se tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.
A iliquidez, traduzida na circunstância de o montante da indemnização a satisfazer pelo devedor não estar ainda apurado, determina a inexistência de culpa daquele no atraso do cumprimento da prestação a seu cargo, a menos que a referida iliquidez decorra de causa que lhe seja imputável, cessando então a regra in illiquidis non fit mora.
No contrato de mandato, o legislador apenas contemplou a incidência de juros moratórios a cargo do mandante relativamente às despesas feitas pelo mandatário e por este consideradas indispensáveis no exercício das suas atribuições (artº 1167º, al. c)) e nada estatuiu quanto a qualquer indemnização de igual natureza no que respeita à retribuição a satisfazer pelo mandante ao mandatário (artº 1167º, al. b)).
Sendo assim, o crédito de honorários não é líquido, uma vez que, quer a lei, quer as partes, não fixaram antecipadamente o seu montante ou o critério da sua determinação, e, por isso, não basta, para haver mora, que o mandante seja interpelado para o pagamento.
Por outro lado, não age culposamente o mandante que se recuse a pagar uma conta de honorários que ache exorbitante.
Com efeito, embora o quantitativo referente aos serviços prestados aos réus se tenha tornado líquido para o autor, através da sua notificação àqueles, tal liquidez não se comunica à retribuição do contrato de mandato, já que se está perante um crédito determinado apenas pelo autor, podendo ser divergente o juízo dos réus sobre a forma de cálculo utilizada para a liquidação.
Assim, o crédito por honorários só se torna líquido com a sentença judicial que fixe o respectivo montante
O entendimento acima expresso no sentido da iliquidez do crédito de honorários não é um dislate – como diz o autor nas contra-alegações – mas é sim o entendimento maioritário da jurisprudência[12], que perfilhamos, com o devido respeito pela posição contrária[13].
Como se lê no Ac. do STJ de 12.06.03[14], a decisão judicial que funciona como um verdadeiro “acto liquidador” é a sentença da 1ª instância e não a decisão final transitada em julgado (em caso de sucessivos recursos).
“A sentença de condenação, fixando a indemnização devida ao lesado, é uma ordem de pagamento imediato emanada do tribunal; se o condenado não cumprir, porque recorreu da decisão, mas vier a decair no recurso, ele deve ser considerado em mora, com todas as consequências decorrentes da situação (artº 804º e ss) desde a data da condenação – e não apenas a partir do trânsito em julgado da decisão. De contrário, se não fosse aplicável ao lesante que decai no recurso a doutrina dos nºs 1, 2 e 3 do artº 806º, ele teria sempre alguma coisa a lucrar com a interposição do recurso – quer tivesse, quer não tivesse, fundamento para a sua oposição”[15].
Quanto às despesas reclamadas, constituem um crédito líquido, face ao disposto no citado artº 1167º, al. c), pelo que sobre elas incidem juros de mora a partir da data da interpelação, nos termos do artº 805º, nº 1.
Os réus devem pois ser condenados a pagar juros de mora sobre o montante de € 150.000,00 desde a data da sentença proferida na 1ª instância e sobre o montante de € 1.638,43 desde 30.07.04.
*

V.
Pelo exposto, acorda-se em julgar em parte procedente a apelação, revogando-se parcialmente a sentença recorrida e, em consequência:
- Condenam-se os réus a pagar ao autor a quantia de € 151.638,43 (cento e cinquenta e um mil seiscentos e trinta e oito euros e quarenta e três cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal de 4% ao ano, a calcular desde a data da sentença da 1ª instância sobre a quantia de € 150.000,00 e desde 30.07.04 sobre a quantia de € 1.638,43, na proporção indicada na sentença;
- Absolvem-se os réus do restante pedido.
Custas em ambas as instâncias pelo autor e pelos réus na proporção do decaimento.
***

Porto, 12 de Julho de 2007
Deolinda Maria Fazendas Borges Varão
Manuel Lopes Madeira Pinto
António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha

______________________________________
[1] CPC Anotado, V, 363.
[2] Neste sentido, Lopes do Rego, Comentário ao CPC, 466, Lebre de Freitas, CPC Anotado, 3º vol., 53 e Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 2ª ed., 143, nota 274.
[3] Ac. desta Relação de 22.01.96, www.dgsi.pt.
[4] Neste sentido, ver o Ac. desta Relação de 26.09.95, www.dgsi.pt.
[5] www.dgsi.pt.
[6] Acs. do Conselho Superior da OA de 14.01.83 e 27.11.74, ROA 43º, 227 e 35º, 284, respectivamente.
[7] Ac. desta Relação de 28.11.02, www.dgsi.pt.
[8] Ac. desta Relação de 03.05.01, www.dgsi.pt.
[9] Cfr. os Acs. do STJ de 13.01.00 e 01.03.07, www.dsgi.pt.
[10] Moitinho de Almeida, Responsabilidade Civil dos Advogados, 23.
[11] Orlando Guedes da Costa, Direito Profissional do Advogado, 5ª ed., 393.
[12] Cfr. o Ac. do STJ de 12.06.03, Proc. 1580/03 – 2ª Secção, os Acs. desta Relação de 22.01.96, 03.05.01, 18.11.02, 27.03.03 e 20.04.06 e da RL de 13.10.91, todos em www.dgsi.pt. .
[13] De que é exemplo o Ac. do STJ de 17.02.05, acima citado e ainda os Acs. do STJ de 12.02.02 e desta Relação de 23.05.02 – todos em www.dgsi.pt.
[14] Citado na nota anterior.
[15] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 2ª ed., 973.