Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0553153
Nº Convencional: JTRP00038201
Relator: ORLANDO NASCIMENTO
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
SANÇÃO
DEPÓSITO
Nº do Documento: RP200506200553153
Data do Acordão: 06/20/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Área Temática: .
Sumário: I- Se o recorrente autoliquida a taxa de justiça e o Tribunal entende que foi depositada quantia inferior à devida, sem restituir a que foi depositada, tal não pode equivaler a omissão de pagamento.
II- Em tal circunstancialismo o Tribunal onde foi praticado o acto deve admitir o pagamento da quantia da falta, suportando o recorrente a sanção pecuniária prevista no art. 690º-B, nº1, do Código de Processo Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes que constituem o Tribunal da Relação do Porto.

RELATÓRIO
No âmbito da acção declarativa sumária que B.............. move a C.............., distribuída 15/09/2003, em foi proferida sentença julgando a acção procedente e condenando o Réu.
Inconformado, este interpôs recurso de apelação, tendo procedido a autoliquidação da taxa de justiça devida e tendo depositado a quantia de 120,15 euros em 14/10/2004.
A secretaria notificou-o, oficiosamente, para proceder ao pagamento da taxa de justiça, no valor de 133,50 euros e multa de igual montante, nos termos do art.º 690.º - B, n.º 1 do C. P. Civil.
O Réu apresentou requerimento pugnando pela correcção da taxa de justiça depositada, alegando ter enviado as suas alegações de recurso por correio electrónico, pelo que beneficia da redução prevista no art.º 15.º do C. C. Judiciais. Mais alega que, não sendo esse o entendimento seguido, então deverá depositar apenas a diferença entre a quantia depositada e a quantia sem redução.
O Mm.º Juiz indeferiu o requerido, considerando não ser aplicável o disposto no art.º 15.º, n.º 1 do C. C. Judiciais devendo o apelante depositar a totalidade da taxa de justiça, citando para o efeito o disposto no art.º 763.º, n.º 1 do C. Civil, acrescida da respectiva multa.

Inconformado com essa decisão, o Réu dela interpôs recurso, recebido como agravo, pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por outra que determine que o recorrente nada deve a titulo de taxa de justiça inicial pela interposição de recurso de apelação apresentado nos autos, e por já ter liquidado mais do que o devido a este titulo, ou se assim não se entender, que determine o pagamento da quantia em falta a titulo de taxa de justiça inicial, no montante de 13,35 euros, bem como isente o recorrente do pagamento de qualquer multa, formulando as seguintes conclusões:
1. O aqui recorrente juntou às suas alegações de recurso de apelação apresentadas nos autos por correio electrónico em 19 de Outubro de 2003, o talão comprovativo de autoliquidação por Multibanco da respectiva taxa de justiça inicial, aí constando que procedeu ao pagamento a este titulo da quantia de 120,15 euros;
2. O autor atribuiu à acção o valor de 9.134,37 euros, por ser este o montante aí peticionado, tendo a respectiva sentença final condenado o aqui recorrente a pagar ao autor a quantia de 3.676,63 euros, acrescida dos respectivos juros de mora, o que tudo perfaz a titulo de condenação e sucumbência a quantia não superior a 5.000,00 euros;
3. Com o recurso de apelação interposto iniciou – se uma nova instância, sendo o valor da causa determinado pela sucumbência, que nos presentes autos se cifra em cerca de 5.000, euros;
E, por isso,
4. O valor a autoliquidar a titulo de taxa de justiça inicial devida no recurso interposto, e ainda que sem qualquer redução, é a que respeita aos valores compreendidos entre 3.750,01 euros a 7.500,00 euros, e no montante de 1,25 UC, ou seja no montante de 111,25 euros;
5. Tendo o aqui recorrente pago a quantia de 120,15 euros a título de taxa de justiça inicial devida pelo recurso interposto, verifica-se que pagou mais do que o devido, e correspondente à quantia de 111,25 euros; Desta forma,
6. Ao decidir no despacho de que se recorre que o aqui recorrente omitiu o pagamento de taxa de justiça inicial, a Meritíssima Senhora Juiz a quo violou o preceituado nos artigos 11.º e 13.º do Código das Custas Judiciais; Ainda que assim não fosse, e sem prescindir,
7. O aqui recorrente autoliquidou através de Multibanco a respectiva taxa de justiça inicial, o que fez dentro dos parâmetros indicados para o valor da acção (l500,01 a 15.000,00 euros), e pelo valor de 120,50 euros, atenta a circunstância de que tendo remetido para Tribunal as suas alegações de recurso mediante correio electrónico, o que declarou expressamente na parte final do articulado de
Alegações, e juntou o respectivo documento comprovativo, entendeu ser de aplicar aqui a redução da taxa de justiça inicial em um décimo, de acordo com o art.º 15º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais; De facto,
8. A peça processual correspondente às alegações de recurso de apelação, foi a primeira e única peça processual apresentada nos autos pelo recorrente no âmbito de vigência do art.º 15º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais, com a redacção que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27/12, e a única com possibilidade de beneficiar da redução de um décimo da taxa de justiça aí prevista, porque transmitida por via electrónica;
9. Ao decidir no sentido de que o aqui recorrente omitiu o pagamento de taxa de justiça inicial, pois que a redução de um décimo da taxa de justiça, prevista no actual artigo 15º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais, e mercê da opção do envio das peças processuais por correio electrónico, se circunscreve aos casos em que durante todo o processo o mandatário da parte pratique actos através deste meio, encontrando-se excluída a sua aplicação aos processos em que, já se fez uso a outros meios de transmissão de dados que não a electrónica, a Meritíssima Senhora Juiz a quo violou o preceituado nos artigos 14º, n.º 3, 15º, n.º 1 e 16.º do Código das Custas Judiciais; E, desta forma,
10. A taxa de justiça inicial autoliquidada pelo recorrente no valor de 120,15 euros, e cujo talão comprovativo se encontra junto às alegações de recurso de apelação, está correctamente efectuado, e de acordo com o preceituado no art.º 15º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais; Ainda sem prescindir,
11. Se assim não se entender, por se considerar que o recorrente não pode beneficiar da redução de um décimo de taxa de justiça previsto no art.º 15º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais, o certo é que nunca estaríamos perante uma omissão "tout court" do pagamento de taxa de justiça, mas no máximo perante um cálculo errado da mesma; e assim,
12. Se se entender que o valor a autoliquidar a titulo de taxa de Justiça Inicial era o correspondente a 1,5 UC, ou seja 133,50 euros, e por não gozar da redução de um décimo, sempre haveria que liquidar o valor em falta, ou seja 13,35 euros;
Na verdade,
13. Esta situação encontra-se manifestamente omissa, tanto nas regras processuais civis, como nas regras das custas processuais, já que o que se pune é a omissão total e absoluta do pagamento de taxa de justiça inicial, o que não sucede nos presentes autos e, desta forma, o recorrente deveria ter sido notificado para corrigir o lapso na contabilização da taxa em divida, assim procedendo ao pagamento, por guia ou através de “depósito autónomo” por Multibanco, da quantia em falta, ou seja 13,35 euros;
14. E o mesmo se diga quanto à multa aplicada, pois que fazendo-se uma interpretação teleológica e extensiva do preceituado no artigo 28.º do Código das Custas Judiciais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224 -A/96, de 26/11), aqui aplicável, por ser a mesma em vigor à data da interposição da presente acção, o que o legislador pretendeu punir foi a falta do pagamento atempado de taxa de justiça, sancionando esta omissão com o pagamento de quantia equivalente ao valor de taxa de justiça devida e, assim, o faltoso no pagamento parcial deste valor, e caso não a liquide, deverá suportar multa equivalente ao mesmo; Isto é,
15. Na circunstância do aqui recorrente não liquidar os 13,35 euros em falta, deverá ser condenado a pagar multa de idêntico montante de 13,35 euros;
Até porque,
16. A hipotética multa visaria reprimir um comportamento censurável traduzido na omissão total e plena de taxa de justiça, o que conforme exposto não é o caso dos autos; E, assim,
17. Ao decidir que o aqui recorrente foi correctamente notificado para proceder ao pagamento integral da taxa de justiça devida pela interposição de recurso de apelação e no montante de 1,5 UC (133,50 euros), acrescido de multa de igual valor, a Meritíssima Senhora Juiz a quo violou o preceituado nos artigos 150.º -A, 512.º -B e 690.º -B do Código de Processo Civil, e artigo 28.º do Código das
Custas Judiciais.

FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
A matéria de facto a considerar é a acima descrita, sendo certo que a questão a decidir se configura como questão de direito.

O DIREITO
O conhecimento deste Tribunal de 2.ª instância, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto do recurso, é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente como, aliás, dispõem os art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1 e 2 do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 660.º, n.º 2 do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso).
Não obstante a extensão das conclusões da apelação, as questões submetidas ao conhecimento deste Tribunal consistem, tão só, (a) em saber qual o montante da taxa de justiça devida pela interposição do recurso de apelação por parte do agravante, (b) se o disposto no art.º 15.º do C. C. Judiciais lhe é aplicável; (c) e, não o sendo quais as consequências do comportamento do agravante ao depositar a quantia de 120, 15 euros.
Quanto à primeira questão, afirma agora o agravante que a taxa de justiça devida, é no valor de 111,25 euros uma vez que, nos termos do disposto no art.º 11.º do C. C. Judiciais, a sucumbência se situa em quantia não superior a 5.000 euros.
Esta é uma questão nova que o agravante não suscitou na primeira instância e da qual não conheceu o Tribunal a quo, pelo que não haverá que conhecer dela.
Não obstante, sempre diremos que não foi esse o critério seguido pelo agravante ao efectuar a liquidação que o levou a depositar a quantia de 120,15 euros.
Para esta, o agravante, que não procedeu ao cálculo do valor da sucumbência (como agora também não o faz limitando-se a oferecer uma estimativa) e que não o indicou, como agora lhe impõe o art.º 11.º, n.º 1 do C. C. Judiciais, seguiu o critério do valor da causa, deduzido de 10%.
E atento o objecto do agravo, que não compreende essa questão, será esta a taxa de justiça a considerar.
Quanto à segunda questão, a saber, se a redução da taxa de justiça prevista no art.º 15.º do C. C. Judiciais é aplicável ao caso sub judice.
Como do próprio texto desse preceito consta, o mesmo consagra uma redução especial da taxa de justiça para os casos em que os mandatários “...optem pelo envio de todos os articulados, alegações, contra-alegações e requerimentos de prova através de correio electrónico ou outro meio de transmissão electrónica de dados...”.
Essa opção deve ser expressamente efectuada no primeiro acto processual praticado por escrito pela parte (n.º 3 do art.º 15.º) e mantém-se ao longo do processo sob pena de a parte incorrer nas cominações próprias da omissão de pagamento da taxa de justiça (n.º 4 do art.º 15).
A redução da taxa de justiça em causa é estabelecida para todo o processo, não respeitando a cada um dos actos processuais individualizados, de per si, mas a todos esses actos no seu conjunto.
No presente processo, o agravante não tinha efectuado a opção a que se reporta o art.º 15.º, n.º 1 do C. C. Judiciais pelo que, independentemente da relevância da questão de saber se o poderia ter feito, atento o disposto nos art.ºs 14.º, e 16.º, n.º 2 do Dec. Lei n.º 324/2003 de 27/12, não podia beneficiar da redução da taxa de justiça estabelecida nesse preceito.
Quanto à terceira questão, a saber, quais as consequências do comportamento do agravante ao depositar a quantia de 120, 15 euros, inferior à que era devida.
O Tribunal a quo decidiu que o acto do agravante corresponde à omissão, pura e simples, de deposito da taxa de justiça, citando para o efeito o disposto no art.º 763.º, n.º 1 do C. Civil, pelo que deveria o mesmo depositar a totalidade da taxa de justiça devida, acrescida da respectiva multa, nos termos do disposto no art.º 690.º – B, n.º 1 do C. P. Civil.
Não lhe assiste razão.
De facto, o agravante depositou a quantia de 120,15 euros, que considerou a adequada, e a mesma não lhe foi devolvida, v. g. por não corresponder à que era devida.
Não é aceitável qualquer entendimento que considere essa quantia perdida, cativada ou, de qualquer modo, integrada no património da entidade que gere as quantias relativas a taxa de justiça.
Essa quantia foi entregue pelo agravante com destino ao pagamento da taxa de justiça e só nessa qualidade poderá ser retida, como foi, pela referida entidade.
Assim, o agravante não omitiu o depósito da taxa de justiça mas, tão só, depositou menos que o devido.
Em face dessa situação, deverá depositar apenas a diferença entre aquilo que já depositou e o que devia ter depositado, suportando a respectiva sanção pecuniária, prevista no art.º 690.º - B, n.º 1 do C. P. Civil [Atento o disposto no art.º 14, n.ºs 2 e 3 do Dec. Lei n.º 324/2003 de 27/12 é este o preceito aplicável e não o art.º 28.º do Código das Custas Judiciais aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224 -A/96, de 26/11, como pretende o agravante] uma vez que só neste momento completará o depósito devido.
É este o entendimento a que aportamos interpretando o disposto no citado preceito à luz dos critérios interpretativos estabelecidos pelo art.º 9.º do C. Civil em especial a regra de bom senso interpretativo consagrada no seu n.º 3.
O agravante deverá, assim, depositar 13,35 euros em ordem a completar o valor da taxa de justiça devida, que é de 133,50 euros, acrescida de uma UC, que é o mínimo da multa cominada para tal situação.

Procedem, pois, em parte e nos termos expostos, as conclusões do agravante.

DECISÃO

Pelo exposto acordam os Juizes deste Tribunal da Relação em conceder provimento parcial ao agravo, revogando o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que ordene a passagem de guias com as quantias supra referidas.
Custas pelo agravante (art.º 446.º, n.º 1, in fine, do C.º Civil).

Porto, 20 de Junho de 2005.
Orlando dos Santos Nascimento
José António Sousa Lameira
José Rafael dos Santos Arranja