Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0720357
Nº Convencional: JTRP00040192
Relator: ALZIRO CARDOSO
Descritores: AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
ADIAMENTO
FALTA DE ADVOGADO
Nº do Documento: RP200703270720357
Data do Acordão: 03/27/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 244 - FLS 189.
Área Temática: .
Sumário: Não tendo a marcação de julgamento sido precedida de acordo prévio com os mandatários, basta a simples falta de algum deles para conduzir ao adiamento, não se aplicando neste caso, o preceituado no art. 155.ºn.º5 do CPC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1.Relatório
B………., Lda intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum ordinário contra C………., pedindo que esta seja condenada:
a) A pagar-lhe o crédito no montante de 62.279,70€, assim como o valor dos juros de mora, calculados à taxa legal, sobre a quantia de 58.738,04€, que se venceram desde a data da p.i. (13.5.2004) até efectivo e integral pagamento;
b) A reconhecer que lhe assiste o direito de fazer seu o sinal de € 20000, pela ora Ré prestado, uma vez que esta não cumpriu a obrigação assumida na cláusula 6.3. da declaração junta como doc. nº 08, pelo que, nos termos ajustados na correspondente cláusula 6.4.3. tal quantia reverte para a Autora a título de indemnização e como cláusula penal;
c) A declarar que lhes assiste (Autora) o direito a, em termos definitivos e até efectivo e integral pagamento do seu correspondente crédito, manter a posse e propriedade dos dois indicados bens móveis, com fundamento no ajustado entre as ora Autora e Ré, particularmente com fundamento no facto de ambas terem ajustado que o respectivo contrato entre ambas celebrado foi levado a efeito com convenção de reserva de propriedade a favor da vendedora, a Autora, até que ocorresse o pagamento do seu correspondente preço.
A Ré contestou invocando a excepção do pagamento e concluindo pela improcedência da acção e, em reconvenção, pediu: a) que seja declarado que nada deve à Autora; b) que seja declarado que nada deve e que a Ré é a única e exclusiva dona dos bens/material constantes da factura nº 2612 e que, sobre tais bens não incidem quaisquer responsabilidades, seja de que tipo ou natureza for; c) seja declarado e ordenado à Autora para que esta proceda à entrega à Ré dos bens constantes da factura nº 2612, na casa desta, sita na Rua Dr. ………., Lote ., em ………., ………., devendo os mesmos estar em perfeito estado de funcionamento, o que se requer seja ordenado à Autora.
A Autora/reconvinda replicou pugnando pela improcedência da defesa por excepção e da reconvenção deduzida pela Ré e pedindo a condenação desta como litigante de má fé, em multa e indemnização.
Treplicou ainda a Ré defendendo a improcedência do pedido de condenação como litigante de má fé.
Foi proferido despacho saneador, seleccionaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória, não tendo havido reclamações.
Designada data para julgamento, o ilustre mandatário da Ré não compareceu na data designada, tendo comunicado a impossibilidade de comparência por motivo de diligências marcadas para a mesma data, requerendo o adiamento da audiência.
O pedido de adiamento foi indeferido por despacho proferido no início da audiência, do qual foi interposto recurso, admitido como agrado com efeito meramente devolutivo, tendo a Ré apresentado oportunamente a respectiva alegação.
Concluído o julgamento, foi proferida a decisão sobre a matéria de facto constante de folhas 245.
Finalmente foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e a reconvenção improcedente, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de € 58.082,33, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde 6/2/2004 até efectivo e integral pagamento, às taxas aplicáveis aos créditos de empresas comerciais, reconhecendo que assiste à Autora o direito de fazer seu o montante de € 20.000,00, prestado pela Ré a título de indemnização e como cláusula penal, bem como o direito de, até efectivo e integral pagamento do seu correspondente crédito sobre os bens em causa, manter a posse e propriedade dos dois bens móveis objecto do contrato celebrado entre ambas. Condenou ainda a Ré como litigante de má fé na multa de 2.500 Euros.

Inconformada a Ré interpôs recurso que foi admitido como apelação e efeito meramente devolutivo, tendo na sua alegação formulado as seguintes conclusões:
1- O tribunal a quo decidiu mal e ilegalmente quando a fls. 222 decidiu dar inicio à audiência de discussão e julgamento sem a presença do ilustre mandatário da Ré. Sendo que,
2- O tribunal a quo violou o estabelecido nos arts. 155º n.º 5 e 651º n.º 1, al. d) do C.P.C;
3- A notificação expedida em 23-02-2005 pelo tribunal a quo, nos termos do art. 155º foi indevida e ilegalmente efectuada, porquanto a morada que consta na procuração forense de fls. como morada para se proceder às notificações é Rua ………., n.º .., ………. ….-… ………. e não ………., n.º .., ….., .... ………; Aliás,
4- Conforme se poderá constatar nos autos todas as peças processuais emitidas pelo mandatário da Ré consta como morada Rua ………., n.º .., ….., ….-… ……….;
5- O mandatário da Ré tempestivamente informou o Tribunal a quo da impossibilidade de estar presente – fax de fls. dos autos;
6- Por carta expedida pelo tribunal a quo em 25/11/2005 o mandatário da Ré foi notificado da Acta da audiência de julgamento do dia 17/11/2005, conforme documento junto ao requerimento de fls. que foi enviado para o Tribunal a quo por correio registado em 20/12/2005;
7- Existe discrepância entre o conteúdo da acta de que o mandatário da Ré foi notificado por carta expedida em 25/1172005 e a acta de fls. dos autos, discrepância essa que se consubstancia no facto de que a cata que o mandatário da Ré foi notificado nada consta sobre o ilustre mandatário da autora ter prescindido do depoimento de parte da Ré. Porém, na acta de fls. dos autos (de que o mandatário não foi notificado) já consta que o ilustre mandatário da Autora prescindiu do depoimento de parte da Ré;
8- Violou assim o Tribunal a quo o estabelecido no art. 155º n.º 5 e 651º n.º 1, al. d) do CPC, tendo indevida e ilegalmente dado inicio à audiência de discussão e julgamento sem a presença da Rè. Sendo que,
9- Quando um acto tenha de ser anulado, anular-se-ão também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente (art., 201º n.º 2 do CPC). Pelo que,
10- Todos os actos praticados em sede de audiência de discussão e julgamento efectuada em 17 de Novembro de 2005, bem assim como a própria audiência de discussão e julgamento realizada em 17 de Novembro de 2005, deverão ser considerados nulos e/ou anulados e sem quaisquer efeitos jurídicos ou outros, bem assim como todos os actos e diligências subsequentes e que decorrem daqueles, nomeadamente a decisão sobre a matéria de facto dada como provada e não provada e a sentença de fls. dos autos, que igualmente deverão ser considerados nulos e/ou anulados e sem quaisquer efeitos jurídicos ou outros;
11- Nos termos e para efeitos do art. 748º do CPC, a ora apelante diz que mantém interesse que esse V. T. da Relação se pronuncie sobre o recurso de Agravo de fls. cujas alegações foram tempestivamente apresentadas e constam de fls. . Assim, deverá o V. T. da Relação pronunciar-se sobre tal recurso de Agravo, o que se requer.

Não houve contra-alegações.

1. 2. Questões a decidir:
Em face das conclusões da Recorrente, a questão a decidir consiste essencialmente em saber se a audiência de julgamento devia ter sido adiada com fundamento na falta do mandatário da Ré e se, por ter sido realizada a audiência sem a sua presença, deve ser anulado o processado subsequente.

2. Fundamentos
1. De facto
A 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas que, de forma habitual, sistemática e com escopo lucrativo, se dedica à compra e venda de máquinas de bordar industriais e de acessórios e outros componentes para a indústria têxtil.
2. A Ré também é comerciante, dedicando-se à fabricação de bordados.
3. A Autora e a Ré outorgaram, entre si, um contrato que designaram de "contrato de compra e venda de bens móveis sob reserva de propriedade", datado de 23/12/2002, que consta de fls. 34 a 36 dos autos de procedimento cautelar apensos e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
4. Nesse contrato a Autora (que interveio como vendedora) e a Ré (que outorgou na qualidade de compradora) ajustaram - entre si - basicamente o seguinte: que a Autora era dona, legítima proprietária e possuidora de uma máquina de bordar electrónica de marca" ……….", correspondente ao modelo ………., de quatro cabeças, com quinze cores e com campo de bordado de 450x520/520 milímetros, completa de acessórios, mas sem bastidores de bonés, com o número de série: ……. e de um software de picagem, de modelo ………. (cf. Cláusula 2a do Contrato);
5. A ora Autora, na qualidade de vendedora, e a ora Ré, na qualidade de compradora, se obrigaram a vender e comprar, respectivamente, aqueles dois supra identificados bens móveis;
6. A venda de tais bens seria efectuada pelo preço de € 41.101,43 (a dita máquina de bordar) e de € 5.350 (o dito software de picagem), aos quais acresceria o valor do correspondente imposto de I.V.A., à taxa de 19% (cf. a respectiva cláusula 3ª);
7. Tal venda seria titulada na factura nº 2612, pela Autora emitida, com data de 23/12/2002, com data de vencimento em 22/01/2003 e com o montante global de € 55.277,20 (cf. o parágrafo Único da respectiva cláusula 3a do dito contrato);
8. A ora Ré/Compradora reconheceu ter recebido a dita factura, pela ora Autora emitida, tendo-a, então, conferido, examinado e achado conforme, confessando-se devedora, à ora Autora/Vendedora, do montante nela inscrito (cf. Parágrafo Único da respectiva Cláusula 3a);
9. Por força da celebração do dito contrato, a compradora, ora Ré, adquiriu o direito à entrega daqueles dois bens móveis, que reconheceu ter recebido, examinado e achado conformes (cf. a respectiva Cláusula 4a);
10. Sem prejuízo do direito ao recebimento daqueles bens, foi expressamente convencionado que a titularidade do direito de propriedade sobre tais bens permaneceria na esfera jurídica da vendedora (ora Autora), até que viesse a ocorrer o efectivo e integral pagamento dos preços correspondentes (cf. a respectiva cláusula 4a);
11. O integral pagamento daqueles preços, do montante global de € 55.277,20, consubstanciava uma obrigação de natureza pecuniária e deveria ser realizado pela compradora (ora Ré) da seguinte forma: - a titulo de sinal e princípio de pagamento, naquela data (23/12/2002), a ora Ré procedeu à entrega de uma primeira prestação, do montante de € 20.000,00, titulada no cheque n.º ………. do D………., pós-datado para o dia 08/01/2003, por si sacado, a favor da vendedora/ Autora e a esta entregue, pelo que a Autora, reconheceu tê-lo recebido e se comprometeu a não o apresentar a pagamento antes da data nele aposta; - Uma segunda prestação, do montante de € 9.277,20, que a ora Ré se comprometeu pagar em 10/09/2003, mercê da cobrança do cheque n.º ………. do D………., que - então - a ora Ré, preencheu, assinou e entregou, à ora Autora, pós-datado para o dia 10/09/2003 e que a ora Autora desde logo reconheceu ter recebido e se comprometeu a não apresentar a pagamento antes da data nele aposta; - uma terceira e última prestação, do montante de € 26.000,00, que a ora Ré se comprometeu a pagar, mercê da cobrança do cheque n. … do D………. e que _ então - também emitiu (a favor da Vendedora/ Autora), assinou e entregou à ora Autora, pós-datado para o dia 10/10/2003 e que a ora Autora reconheceu ter recebido e se comprometeu a não apresentar a pagamento antes da data nele aposta ( cf. a respectiva cláusula 5a do citado contrato); - Foram, ainda, acordadas as demais cláusulas constantes do contrato, designadamente a eleição deste Tribunal como sendo o Tribunal com competência para apreciar e dirimir quaisquer eventuais diferendos ou litígios emergentes da celebração daquele contrato, assim como o estabelecimento de um acordo (ao abrigo do disposto no art. 934º do Código Civil) no sentido de que a eventual falta de tempestivo pagamento de quaisquer das três sobreditas prestações de capital implicava o imediato vencimento das demais[1].
12. Apresentados a pagamento, o Banco sacado recusou efectuar o pagamento dos cheques nº ……….. e nº ……….., titulando, respectivamente, o montante de € 9.277,20 e € 26.000,00, com fundamento em falta de provisão na correspondente conta bancária sacada, conforme documentos constantes de fls. 38 e 39 dos autos de procedimento cautelar apensos e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
13. A Autora e a Ré subscreveram a declaração datada de 21/11/2003, constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
14. Na referida declaração a Ré, como 1a outorgante, declarou, em suma, o seguinte: que, na qualidade de compradora, tinha celebrado, com a ora Autora (vendedora) o "Contrato de Compra e Venda de Bens Móveis sob Reserva de Propriedade" (datado de 23/12/2003);
15. Tal contrato tinha sido celebrado no contexto que, de seguida (cf. cláusula 2a da dita "Declaração"), sumariamente, passou a descrever: - que a ora Ré " necessitou de adquirir os bens móveis (uma máquina de bordar electrónica de marca "………." e um software de picagem)", "... pelo que, com tal intuito, entrou em contacto com ..." a ora Autora "... tendo em vista apurar dos termos e condições em que as correspondentes aquisições poderiam vir a ser realizadas";
16. Na ocasião em que o tal contrato foi celebrado, a ora Ré não dispunha do dinheiro suficiente para, contra as respectivas entregas, proceder ao imediato e integral pagamento dos correspondentes preços (do montante global de € 55.277,20, já com I.V.A.);
17. Na ocasião, a ora Ré tinha em curso - no Centro de Emprego do concelho de F………. - um Projecto de Financiamento (Proc. n.º 10/ILE/02), instaurado no âmbito do designado de Projecto De Estimulo à Oferta De Emprego, a que alude a Portaria n.º 196-A/2001, conforme documento constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos;
18. Para que tal projecto fosse aprovado e para que, por via disso, a ora Ré pudesse vir a beneficiar do formulado pedido de financiamento, a ora Ré necessitava de comprovar que - até ao dia 31 de Dezembro de 2002 - tinha, efectivamente, realizado toda uma série de investimentos com capitais próprios, designadamente que tinha adquirido (e pago) os dois sobreditos bens móveis identificados no sobredito "Contrato De Compra E Venda De Bens Móveis Sob Reserva De Propriedade"; Ou seja, para que o mencionado Projecto de Financiamento fosse deferido, a ora Ré necessitava, nomeadamente, de dispor da Factura e do Recibo de Quitação daqueles dois bens móveis, de modo a - exclusivamente para aqueles efeitos - ficar habilitada a comprovar que havia realizado o investimento correspondente aos preços de cada um daqueles dois bens móveis;
19. Em face disso e tomando também em consideração que, na ocasião, a ora Ré não dispunha do dinheiro ou capital suficiente para proceder ao imediato e integral pagamento dos dois sobreditos bens móveis - ao equacionarem em que termos e condições poderiam vir a contratar as suas aquisições, pela ora Ré, as partes ali Outorgantes (no caso, as ora Autora e Ré) debateram-se, desde logo, com os seguintes problemas: - por um lado, a ora Ré necessitava (exclusivamente para os efeitos descritos no item anterior) de demonstrar que aqueles bens se lhe encontravam facturados e recibados e, por outro, a ora Autora precisava de acautelar que, embora, eventualmente, pudesse vir a emitir as correspondentes Factura e Recibo, os respectivos direitos de posse e de propriedade apenas viessem a ser transmitidos para a esfera patrimonial da ora Ré depois de verificado o efectivo pagamento dos indicados preços.
20. Então, como meio de superar tais obstáculos e fazendo fé na ora Ré, a ora Autora acabou por aceitar corresponder à solicitação da ora Ré, pelo que se dispôs emitir e entregar-lhe as correspondentes Factura (n. ° 2612, emitida em 23/12/2002, em nome da Ré, com o montante de € 55.277,20) e Recibo de Quitação (n. ° 8208, com idêntica data e montante). Não obstante isso e como meio de assegurar que, efectivamente, a ora Ré lhe viria a pagar, na íntegra, o ajustado preço de € 55.277,20 (já com I.V.A.), ajustaram (sempre a pedido da Ré) - entre si - celebrar o referido" Contrato De Compra e Venda De Bens Móveis Sob Reserva De Propriedade";
21. Desse modo, assim entendidas, foram os dois supra identificados bens móveis entregues à ora Ré, embora tivesse ficado consignado que a ora Autora reservou _ para si e até efectivo e integral pagamento dos respectivos preços - os correspondentes direitos de posse e de propriedade, conforme documento constante de nºs. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos;
22. Em contrapartida, a ora Ré obrigou-se a cumprir o plano de pagamento descrito naquele "Contrato De Compra e Venda de Bens Móveis Sob Reserva de Propriedade", tendo, na ocasião (23/12/2002) da sua celebração, entregue, à ora Autora e a titulo de sinal e de principio de pagamento, a quantia de € 20.000,00, bem como os dois mencionados Cheques pós-datados, de € 9.277,20 (com data de 10/09/2003) e de € 26.000,00 (com data de 10/1012003), destinados ao pagamento das ali convencionadas segunda e terceira prestações;
23. Entretanto, a ora Autora procedeu à tempestiva apresentação a pagamento daqueles dois cheques pós-datados, mas não foi bem sucedida, uma vez que os seus pagamentos lhe foram recusados pelo Banco sacado, com fundamento em "falta de provisão na conta sacada", o que importou - para a ora Autora - toda uma série de despesas e encargos bancários, do montante global de € 516,74 e que, aliás, já se encontram titulados nas Notas de Débito nºs. 57, 58 e 59, que a ora Autora emitiu e entregou à ora Ré, que - desde logo - também se confessou devedora daquela quantia de € 516,74;
24. Tendo em conta que, então, a ora Autora tinha em seu poder 04 Cheques assinados e entregues pela Ré, a saber: A) Cheque n.º ………. de € 9.277,20; B) Cheque n.º ………. de € 26.000,00); C) Cheque n.º ………., de € 516,74; D) Cheque n.º ………., de € 2.228,39;
25. Tendo em conta o enunciado contexto e dada a impossibilidade de a ora Ré cumprir o aludido plano de pagamento (com as consequências decorrentes do facto de, por sua exclusiva culpa, se encontrar em mora), em 31/10/2003 e por intermédio da sua Ilustre Advogada, Dra. E………. participou à ora Autora que necessitava que esta lhe restituísse os dois citados Cheques devolvidos por falta de provisão, para os poder justificar junto do Banco de Portugal e para, por via disso, obter a aprovação de um financiamento bancário, cujo deferimento, alegadamente, se encontrava dependente - tão só - da restituição (e justificação junto do Banco sacado e do Banco de Portugal) “daqueles dois Cheques”, conforme documento constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos;
26. De modo a convencer a ora Autora a anuir àquela solicitação, a ora Ré disponibilizou-se, inclusivamente, a - provisoriamente e até verificação do integral pagamento do preço dos dois referidos bens móveis - sacar e aceitar uma Letra de Câmbio de € 38.082,33, Letra essa que seria avalizada por pessoa idónea e de abonação suficiente;
27. Apesar disso e em face das reservas suscitadas pela ora Autora, esta acabou por aceder àquela solicitação;
28. Aquela aceitação, por parte da ora Autora, assentou numa série de condições (absolutamente determinantes e essenciais para a formação da sua decisão de aceitação): Que a ora Autora procederia - de imediato - à restituição, à ora Ré dos dois referidos Cheques que lhe foram devolvidos por falta de provisão; - Que, até efectivo e integral pagamento do crédito (de € 38.082,33) da ora Autora, esta mantinha - na sua esfera jurídica e com exclusão de outrem - os direitos de posse e de propriedade sobre os dois sobreditos bens móveis, conforme documento constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos;
29. A ora Ré se comprometeria a proceder ao integral pagamento daquele crédito, na sede social da ora Autora, no prazo de 90 dias, a contar da data (07/11/2003) de outorga daquela "Declaração";
30. O eventual decurso do prazo referido no item anterior, sem que (seja porque motivo fosse) se verificasse o efectivo e integral pagamento daquele crédito da ora Autora implicaria as seguintes consequências: - A ora Ré deveria proceder à imediata restituição dos ditos bens móveis à sua proprietária e possuidora, ora Autora; - A imediata exigibilidade do sobredito crédito da ora Autora, acrescido dos correspondentes juros moratórios, vencidos e vincendos; - A obrigação de a ora Ré proceder, a titulo de cláusula penal, ao pagamento de uma indemnização, a favor da ora Autora, indemnização essa correspondente à perda do montante (€ 20.000,00) pela ora Ré, prestado a titulo de sinal e principio de pagamento dos preços de cada um dos dois referendados bens móveis, conforme documento constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos.
31. A 2a outorgante, ora A., declarou aceitar a declaração nos termos exarados, conforme documento constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos.
32. A Autora emitiu e entregou à Ré o recibo nº 8208, no qual conferiu a plena quitação do pagamento do preço titulado na dita Factura nº 2612, referindo ter recebido o valor de € 55.277,20, conforme documento constante de fls. 81.
33. A Autora procedeu à entrega nas instalações da Ré dos dois bens móveis referidos em 2.1.4. (uma máquina de bordar electrónica de marca "………." e um software de picagem), tendo, inclusivamente, procedido à sua montagem e instalação.
34. A Ré procedeu ao pagamento à Autora da ia prestação de € 20.000,00, entregue a titulo de sinal e principio de pagamento.
35. A ora Autora forneceu, a crédito, à Ré os artigos titulados nas facturas nºs 445 de € 2.288,39) e 1389 (de € 28,39) e as notas de débito nºs. 57 (de € 12,17), 58 (de € 447,16), 59 (de € 57,41), 79 (de € 12,17), 84 (de € 24,34) e 86 (de € 12,17).
36. A Autora despendeu a quantia de € 578,64 para reaver os bens móveis (a máquina de bordar electrónica de marca "………." e o software de picagem) na sequência da decisão proferida no procedimento cautelar comum apenso.
37. O recibo de quitação constante de fls. 81 foi emitido no contexto enunciado na declaração constante de fls. 43 a 46 dos autos de procedimento cautelar apensos e destinado, tão só, a permitir que a ora Ré pudesse alcançar o deferimento do referido Projecto de Financiamento que alegou ter em curso no Centro de Emprego de F………. .
38. O preço acordado para a venda do Software de picagem foi de € 12.000,00 + I.V.A, à taxa legal de 19%.
39. Na factura 2612 ficou previsto um desconto de pronto pagamento de 6650 euros.

2.2. De direito
Recurso de Agravo
Sendo a apelação e os agravos que com ela tenham subido julgados pela ordem da sua interposição, há que conhecer em primeiro lugar do objecto do recurso de agravo, tanto mais que a procedência deste prejudica o conhecimento do recurso de apelação.
Assim, começamos por conhecer do Agravo interposto do despacho que inferiu o pedido de adiamento da sessão da audiência de julgamento designada para o dia 17/11/2005.
É a seguinte a factualidade relevante para a apreciação do referido agravo:
Por despacho de folhas 186, datado de 22-02-05, notificado aos mandatários das partes, por cartas expedidas com a indicação de que, em caso de impedimento e mediante prévio acordo com os restantes mandatário, poderiam no prazo de 5 dias propor datas alternativas, foi designado o dia 17-11-2005, pelas 14 horas para a audiência de julgamento.
Através de requerimento apresentado no dia 17-11-85, o mandatário da Ré informou que em virtude de diligências marcadas para a mesma data no Tribunal de Rio Maior e na ..ª Vara Cível de Lisboa, não lhe era possível comparecer, requerendo a designação de nova data para a audiência de julgamento.
Aberta a audiência, após interrupção para averiguar, via telefónica, sobre a data da notificação do mandatário da Ré para as diligências indicadas no requerimento em que invocou a impossibilidade de comparência e pediu o adiamento, proferiu o seguinte despacho:
“Apreciando o requerimento hoje apresentado pelo ilustre mandatário da Ré ainda hoje, pelas 11.52 horas, constatamos que no mesmo, o ilustre mandatário da R. alega estar impedido de se encontrar presente neste tribunal por não ter o dom da ubiquidade, esclarecendo que tem diligências designadas para o dia de hoje nos tribunais e em processos, os quais identifica.
Conforme o solicitado aos tribunais em causa, e informação prestada constata-se que no processo cível identificado o ilustre mandatário da R. foi notificado para essa diligência em 26/10/2004, e para o processo crime, que alegadamente corre termos em Rio Maior, foi notificado em 27/10/2005.
Nestes autos, conforme se constata no exame a fls. 188, o ilustre mandatário da R. foi notificado em 23/2/2005 para, nos termos do art. 155º do C.P.C., tomar conhecimento da data agendada pelo tribunal e dispor da mesma, de acordo com o que essa norma processual admite.
Analisando o processado, não consta dos autos que até hoje o ilustre mandatário da R. tenha, quer no prazo do artigo 155º, n.º 2 do C.P.C., quer no prazo que seria exigível de acordo com o n.º 5 do mesmo artigo, comunicado a este tribunal qualquer impedimento, nomeadamente aquele que só hoje transmitiu a este tribunal.
Em nosso entender, por isso, a comunicação ainda hoje feita é extemporânea e não está demonstrado que possa consistir impedimento, tendo em conta que nestes autos se cumpriu o disposto no artigo 155º, n.º 2, do CPC.
Em face do exposto, nos termos do disposto no art. 651º, n.º 5 do C.P.C., dá-se inicio à audiência de julgamento com a produção da prova, aguardando-se que, no prazo legal, seja cumprido a parte final desse último dispositivo, para os efeitos tidos por convenientes. Notifique”.

A questão a decidir consiste em saber se como defende a Ré a designada audiência de julgamento deveria ter sido adiada, em face da não presença do seu mandatário que comunicou a impossibilidade de comparência.
Vejamos:
Estabelecia o art. 155º do CPC (na redacção do art. 7º, nº 9, do DL nº 320-B/2000, de 15 de Dezembro, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2001), por um lado, que a fim de prevenir o risco de sobreposição de datas de diligências a que devam comparecer os mandatários judiciais, deve o juiz providenciar pela marcação do dia e hora da sua realização, mediante acordo prévio com aqueles (nº 1).
E, por outro que, não podendo a marcação ser feita nos termos do número anterior, devem os mandatários impedidos em consequência de outro serviço judicial já marcado comunicar esse facto ao tribunal, no prazo de cinco dias, propondo datas alternativas, após contacto com os restantes mandatários interessados, caso em que o juiz, ponderadas as razões aduzidas, poderá alterar a data inicialmente fixada (nºs 2 e 3).
E, finalmente, que os mandatários judiciais devem comunicar prontamente ao tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua não presença e que determinem o adiamento da diligência marcada (nº 5).
A primeira situação prevista nos nºs 1 a 3 do art. 155º do CPC ocorre quando a marcação da diligência em geral operou por acordo prévio entre o tribunal e os mandatários, seja em contacto directo, seja por contacto indirecto, isto é, com a intermediação de funcionário judicial.
Por sua vez, a segunda situação ocorre quando não tenha havido contacto prévio do tribunal com os mandatários, caso em que a data de designação da diligência se configura como potencialmente provisória durante cinco dias.
Com efeito, durante esses cinco dias, contados da data da notificação dos mandatários das partes, o tribunal tem de ponderar que eles possam vir comunicar o seu impedimento em consequência de outro serviço judicial já marcado e cada um, após contacto com o(s) outro(s), propor a realização da diligência em data ou datas alternativas.
No caso de os mandatários, no prazo de cinco dias, declararem a sua disponibilidade para a data indicada pelo juiz para a diligência ou nada declararem, deve entender-se, tendo em conta o seu dever de cooperação relativo à informação da existência de impedimento, tratar-se, no primeiro caso de acordo expresso, e no segundo de acordo tácito – art. 217º, nº 1, CC (cf. neste sentido o Ac. da RL de 7/11/2002, CJ, Tomo V, pág. 71).
Designada a data da diligência nesse quadro de cooperação, devem os mandatários judiciais comunicar prontamente ao tribunal quaisquer circunstâncias impeditivas da sua presença e que impliquem o adiamento da diligência marcada – art. 155º, nº 5, do CPC.
Conexionado com o citado art. 155º, está o disposto no art. 651º, nº 1, als. c) e d), também do CPC, que se reporta ao adiamento da audiência de julgamento por falta de comparência de algum dos mandatários das partes.
Estabelece o art. 651º, nº 1, al. c) que, feita a chamada das pessoas que tenham sido convocadas, a audiência é aberta e só é adiada, por uma vez, no que interessa considerar, se:
- o juiz não tiver providenciado pela marcação mediante acordo prévio com os mandatários judiciais, nos termos do art. 155º, e faltar algum dos advogados [al. c)];
- faltar algum dos advogados que tenha comunicado a impossibilidade da sua comparência, nos termos do nº 5 do art. 155º [al. d)].
Pressupõem ambos os normativos que não tenha ocorrido qualquer adiamento da audiência e o último normativo (al. d)) a falta de comparência de algum mandatário das partes na data designada para a audiência de julgamento e a sua pronta comunicação ao tribunal da impossibilidade de comparência.
Decorre, assim, das als. c) e d) do nº 1 do art. 651º, que, nas hipóteses a que se referem haverá um adiamento da audiência de julgamento por virtude de falta de comparência de algum ou de alguns dos mandatários das partes, reportando-se a al. c) à situação em que o juiz designa a data sem a diligência de acordo prévio com os mandatários, implicando a falta de algum deles o adiamento automático da audiência e a al. d) à situação de o juiz haver designado a data da audiência de julgamento na sequência da sua diligência tendente ao acordo sobre a data da respectiva designação com os mandatários, dependendo o seu adiamento por falta de comparência de advogado do facto de ele haver comunicado atempadamente ao tribunal – até à abertura – a sua impossibilidade de comparecer.
Por sua vez, o nº 5 do art. 651º (na redacção anterior à introduzida pelo DL nº 38/2003, de 8 de Março, com início de vigência em 15/09/2003 – art. 23º -, mas com aplicação restrita “nos ou relativamente aos processos instaurados a partir de 15 de Setembro de 2003 – art. 21º), regula a hipótese de falta de advogado à audiência de julgamento fora dos casos previstos nas als. c) e d) do nº 1.
Nessa situação, estabelece-se que deve proceder-se à gravação dos depoimentos das testemunhas presentes, podendo o advogado faltoso, após a audição do registo dos depoimentos, requerer nova inquirição, excepto se a sua falta for julgada injustificada, ou se não tendo havido marcação da audiência por acordo, não tenha sido dado cumprimento ao disposto no art. 155º, nº 5, do CPC.
Resulta, portanto, da primeira parte do nº 5 do art. 651º, ser pressuposto da sua aplicação o facto de a audiência não dever ser adiada por virtude do funcionamento do disposto nas als. c) e d) do nº 1.
Na sua anterior redacção do artigo 651º, este preceito permitia pura e simplesmente o adiamento, por uma só vez, da audiência com base na falta de algum advogado. A única “sanção” a que o advogado estava sujeito era a comunicação da falta ao respectivo mandante (nº 1, al. c)).
Mas, tendo em conta a já referida intenção legislativa de impedir os sucessivos adiamentos das audiências (era normal faltar algum dos advogados à primeira audiência), aquele estado de coisas veio a ser alterado pelo Dec. Lei nº 183/2000, de 10/8. Como se diz no preâmbulo deste diploma, “uma outra grande causa de morosidade processual consiste na utilização de práticas processuais dilatórias, através da manipulação das previsões dos casos de adiamentos das audiências de julgamento, as quais são agora restringidas para que deixe de ser prática corrente o adiamento da primeira marcação”.
E assim é que, de acordo com a redacção introduzida ao art. 651º por aquele diploma, feita a chamada das pessoas que tenham sido convocadas, a audiência é aberta, só sendo adiada, para além do mais que aqui não tem interesse:
c) Se o juiz não tiver providenciado pela marcação mediante acordo prévio com os mandatários judiciais, nos termos do art. 155º, e faltar algum dos advogados;
d) Se faltar algum dos advogados que tenha comunicado a impossibilidade da sua comparência, nos termos do nº 5 do artigo 155º.
Estão aqui previstas duas situações, claramente distintas, em que pode haver lugar ao adiamento da audiência com base na falta de algum advogado.
A primeira delas (al. c)) aplica-se aos casos em que o juiz não providenciou pela marcação da audiência mediante acordo prévio com os mandatários judiciais, nos termos do art. 155º, e faltar algum advogado.
A segunda delas (al. d)) aplica-se aos casos em que falte algum dos advogados e ele comunique a impossibilidade da sua comparência, nos termos do nº 5 do art. 155º.
Donde se conclui que o legislador manifestou a intenção de restringir os adiamentos, mas quando chegou ao momento de colocar em forma de lei a sua intenção, recuou nitidamente, permitindo os adiamentos praticamente nos moldes em que ocorriam anteriormente.
No caso dos autos, a data para a audiência de julgamento não foi designada mediante prévio acordo com os mandatários das partes.
O ilustre mandatário da Ré não deu cumprimento ao disposto no n.º 5, do artigo 155º do CPC, na medida em que só no próprio dia do julgamento, informou, por fax, a impossibilidade de comparência, por ter outras diligências agendados para a mesma data. Fica desse modo afastada a possibilidade do julgamento ser adiado com fundamento na citada alínea d), do artigo 651º.
Mas não tendo a marcação do julgamento sido precedida de acordo prévio com os mandatários, bastava a simples falta de algum deles para conduzir ao adiamento, não se aplicando neste caso, o preceituado no artigo 155º, n.º 5. É o que linearmente se infere da redacção introduzida pelo legislador a cada uma daquelas alíneas c) e d).
Na verdade, na alínea d), o legislador fez expressa menção à necessidade de a impossibilidade de comparência ter de ser comunicada nos termos do n.º 5, do artigo 155º. Já não fez tal exigência em relação à hipóteses prevenida na alínea c). Nesta o legislador bastou-se com a falta de “algum dos advogados”.
No caso dos autos, tratando-se de uma primeira marcação e não tendo havido acordo prévio com os mandatários com vista à designação da data da audiência, a falta do ilustre mandatário da Ré, era motivo suficiente para provocar o adiamento, nos termos da aludida al. c) do n.º 1 do art. 651º, na redacção do citado Dec. Lei n.º 183/00.
Não se tendo decidido, assim, cometeu-se uma nulidade que influiu no conhecimento da causa, já que, procedendo-se á audiência de julgamento, não foi nela observado o princípio do contraditório.

Tem, por isso, de ser revogado o despacho recorrido e bem assim a efectuada audiência de julgamento e a sentença recorrida, a fim de ser designada nova data para a audiência de discussão e julgamento dos autos.

3. Decisão
Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao agravo e, em consequência, revoga-se o despacho recorrido, pelo que se anula a efectuada audiência de discussão e julgamento e bem assim a sentença recorrida, a fim de ser designada nova data para audiência, seguindo-se os demais termos.
Custas pela agravada.
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Porto, 27 de Março de 2007
Alziro Antunes Cardoso
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
José Gabriel Correia Pereira da Silva

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[1] Conforme documento constante de fls. 34 a 36 dos autos de procedimento cautelar apenso.