Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00041668 | ||
| Relator: | SOUSA LAMEIRA | ||
| Descritores: | DANOS EQUIDADE LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA | ||
| Nº do Documento: | RP200809290854677 | ||
| Data do Acordão: | 09/29/2008 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | CONFIRMADA. | ||
| Indicações Eventuais: | LIVRO 350 - FLS. 182. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | Face à incerteza do valor dos danos que ficaram efectivamente demonstrados, o Tribunal deve relegar a sua liquidação para execução de sentença, mas só no caso de não puder fixar logo o seu montante, ainda que com recurso à equidade. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | RECURSO de APELAÇÃO Nº 4677/08 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO 1- No Tribunal Judicial da Comarca de Paços de Ferreira, a Autora B……………., residente na Rua ………., nº …., ……., Paços de Ferreira, instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma ordinária contra C…………. e mulher, D……………, residentes em …………, …….., Lousada, E……………., residente em …….., ………, Lousada, o Município de Paços de Ferreira, com sede na cidade de Paços de Ferreira, “F…………., S.A.”, com sede na …….., nº ……., Lisboa, e “G………….., S.A.”, com sede na …….., nº …. – ….º, Lisboa, alegando resumidamente: Que sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais em montante que refere, na sequência de acidente ocorrido enquanto eram realizadas obras de reparação e conservação na Escola Primária de ……, sita em ……., Paços de Ferreira, onde a A. prestava serviços, consistente na circunstância de ter sido atingida na cabeça por um caibro que se desprendeu das mãos do 2º R., um dos trabalhadores que executava tais obras no telhado do 1º andar do edifício da escola, obras essas que não estavam sinalizadas, isoladas ou entaipadas. As obras em causa foram efectuadas na sequência de um contrato celebrado entre o 3º R., proprietário da escola e dono da obra, e o 1º R. marido, que se dedicava à data à realização de obras de construção civil, e por intermédio dos funcionários deste, entre os quais o 2º R.. O 1º R. marido exerce esta sua actividade por conta própria, sendo com os lucros auferidos com a mesma que sustenta o seu agregado familiar, do qual faz parte a 1º Ré mulher, e que criou e aumentou o património comum do casal. O 1º R. marido tinha transferido para a 4ª Ré a responsabilidade pelos danos causados a terceiros no âmbito da sua actividade; por sua vez o 3º R. tinha transferido para a 5ª Ré a responsabilidade por danos causados a terceiros no âmbito de um contrato de seguro de “Responsabilidade Civil – Autarquias”. Conclui pedindo a condenação dos Réus a pagar-lhe a quantia de € 150.942,93, bem como a quantia mensal correspondente a ½ do salário mínimo nacional para o serviço doméstico, a liquidar em execução de sentença e “pelo que se deixou referido nos antecedentes artºs 57, 58, 59 e 60”, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento – esclarecendo a A. nos arts. 44º e 45º da petição inicial que o 3º R. e as 4ª e 5ª RR. são chamados à acção “através da pluralidade subsidiária, prevista no art.º 31-B do Cod. Proc. Civil”, sendo os pedidos formulados principalmente contra os 1ºs e 2º RR. e subsidiariamente contra os restantes RR. 2 – A fls. 52, a A., por termo, desistiu da instância no que concerne ao R. E…………., a qual foi homologada por sentença de fls. 53, sendo, consequentemente, aquele R. absolvido da instância. 3 – Os 1ºs Réus contestaram, nos termos constantes de fls. 150 a 152, impugnando os factos alegados pela A. quanto ao modo como ocorreu o acidente e quanto aos danos daí resultantes, alegando ainda que o recinto da obra estava completamente vedado, tendo sido a A. quem, sem qualquer autorização, sem aviso e sem motivo justificativo se introduziu no interior de tal recinto, pelo que o acidente se deveu a inteira responsabilidade e culpa desta. 4 – O 3º R. contestou, nos termos constantes de fls. 95 a 97, invocando a excepção da sua ilegitimidade para a acção, por ter celebrado um contrato de empreitada com o 1º R. marido, de acordo com o qual este executou a obra com total autonomia, sem qualquer relação de dependência para consigo, sendo este o único responsável por eventuais danos causados a terceiros, e impugnando os factos alegados pela A. quanto ao modo como ocorreu o acidente e quanto aos danos daí resultantes, defendendo igualmente ser a A. a única responsável pela ocorrência do mesmo. 5 – A 4ª Ré contestou, nos termos constantes de fls. 68 a 71, confirmando a existência de um contrato de seguro com o 1º R., mas alegando que este apenas cobria os riscos provenientes da utilização das duas máquinas identificadas no art. 3º da contestação, pelo que o acidente dos autos não se encontra coberto pela apólice de seguro em causa, devendo ser absolvida da instância, enquanto parte ilegítima, até porque apenas foi demandada pela A. em regime de pluralidade subsidiária, nos termos do art. 31º-B do C.P.C.; esta Ré invocou ainda que o limite máximo do capital seguro era, à data do acidente, de 2.000.000$00 por sinistro e anuidade, e impugnou, por desconhecimento, os factos alegados pela A. quanto à forma como ocorreu o acidente e às consequências do mesmo. 6 – A 5ª Ré, por sua vez, contestou, nos termos constantes de fls. 54 a 56, impugnando, por desconhecimento, os factos alegados pela A. e alegando ainda que apenas em 10/04/2001 celebrou um contrato de seguro de responsabilidade civil com o 3º R., inexistindo qualquer seguro à data dos factos, defendendo a sua absolvição “desde já”. 7 – A A. replicou, mantendo as posições inicialmente assumidas e concluindo como na p.i. 8 – Tendo sido dispensada a realização de uma audiência preliminar, elaborou-se despacho saneador julgando-se improcedentes a excepção de ilegitimidade passiva do 3º R. e conheceu-se parcialmente de mérito relativamente às 4ª e 5ª RR., absolvendo-se do pedido as aludidas RR., “F………….., S.A.” e “G…………, S.A.”. Seleccionou-se a matéria de facto assente e a base instrutória (fls. 189 a 193), a qual não foi objecto de reclamação. Procedeu-se seguidamente a julgamento tendo a matéria da base instrutória merecido as respostas que constam do despacho de fls. 540 a 545, o qual não foi objecto de reclamação. De seguida foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência condenou “os RR. C………….. e Município de Paços de Ferreira a pagar à A. a quantia de € 32.784,84 (trinta e dois mil setecentos e oitenta e quatro euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 7% desde a citação até 30/04/2003 e à taxa de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde 01/05/2003 até integral pagamento”. 9 – Apelou o Réu Município de Paços de Ferreira, nos termos de fls. 603 a 616, formulando as seguintes conclusões: 1ª- A Resposta dada ao Quesito 18 não traduz com rigor quer a ideia pela qual a porta ali referida não foi entaipada, quer os motivos e as pessoas que podiam por ela passar. 2ª- Na verdade tal porta ficou fechada à chave e não entaipada, para permitir ao pessoal da limpeza da Escola o acesso exclusivo aos produtos de limpeza que se guardavam numa pequena arrecadação, para lá da porta, mas no interior do edifício sem atingir a zona das obras. 3ª- Deve por isso tal resposta ser alterada como se propõe no desenvolvimento do texto destas alegações. 4ª- Também a resposta ao Quesito 20 deverá ser alterada para PROVADO, tendo em conta o que as testemunhas, inclusive testemunhas da própria A., disseram em juízo. 5ª- Segundo tais depoimentos todo o pessoal que trabalhava para a Escola, tinha conhecimento das obras que estavam em curso e sabiam, também que não podiam aceder à zona das obras enquanto os trabalhos do empreiteiro estavam em execução. 6ª- O que permite concluir que a A., como tarefeira contratada pela Escola, a trabalhar ali há já alguns meses, sabia ou, pelo menos, não podia ignorar que não podia aceder ao local onde ocorreu o sinistro. 7ª- Pelo que é patente a culpa causal da A. na verificação do acidente de que foi vitima, o que, nos termos do art. 570 do C.C. é motivo de exclusão da responsabilidade do Recorrente. 8ª- Quando assim se não entenda, o que só em hipótese se admite, sempre haveria lugar à responsabilidade da Directora da Escola, por negligenciar quanto ao escrupuloso cumprimento, por parte do pessoal da Escola, do acordo celebrado entre a Directora, o empreiteiro e a Apelante. 9ª- O que não faz sentido é responsabilizar os RR quando nada de positivo e concreto se lhe imputa dentro do quadro dos deveres que lhes competiam no caso. Note-se que aos RR. não competia fiscalizar o comportamento do pessoal da Escola, pelo que a sua absolvição impõe-se. 10ª- Não há razão legal para o Tribunal recorrer à equidade no que respeita ao cálculo dos danos sofridos pela A., a título de perdas salariais. O montante indemnizatório devido, a tal título deve ser liquidado em execução de sentença. 11ª- Quanto ao montante dos lucros cessantes, em resultado da incapacidade permanente da A., deverá ser calculada em face do que a A. auferia na Escola, como tarefeira a tempo parcial, e não, tendo em conta o salário mínimo nacional, porquanto ignorando-se no processo se a A., fora das horas de serviço na Escola, trabalhava ou não para terceiros, o cálculo efectuado pelo Tribunal constitui um enriquecimento sem causa para a A., à custa dos RR. Conclui pedindo a procedência do recurso e a revogação da sentença recorrida, absolvendo-se o apelante do pedido total, ou por culpa da lesada, ou por culpa de quem competia impedir que o pessoal da escola acedesse ao local do sinistro. De qualquer modo sempre o montante indemnizatório a titulo de lucros cessantes é exagerado, pelo que deve ser reduzido, tendo em conta o que a A. auferia como tarefeira a tempo parcial 10 – A Autora ofereceu contra-alegações e apresentou recurso subordinado tendo formulado as seguintes conclusões: 1ª- A matéria de facto não deve ser alterada porquanto representa a síntese perfeita da prova produzida na audiência de julgamento. 2ª- Da prova produzida e gravada resulta, claro e inequívoco, que a obra não estava isolada; que a aqui recorrida não foi avisada da impossibilidade de aceder ao local da obra; que também não foram afixados avisos genéricos nesse sentido. 3ª- O Réu recorrente e o seu co-réu violaram as normas de segurança a que se refere a douta sentença e constituíram-se na obrigação de indemnizar a aqui recorrida por todos os danos que sofreu. 4ª- Que esses danos foram insuficientemente fixados na douta sentença recorrida e que devem agora ser quantificados na quantia de 40.000 euros (sendo 20.000,00 pelo dano futuro e 20.000,00 euros pelos danos não patrimoniais). Conclui pedindo que o recurso principal não mereça provimento e seja provido o recurso subordinado condenando-se os RR C…………… e o Município de Paços de Ferreira na quantia de 40.000,00 Euros, acrescida de juros à taxa de 7% desde a citação até 30/04/03 e à taxa de 4% até efectivo pagamento. II - FACTUALIDADE PROVADA Encontram-se provados os seguintes factos: 1. Em 20 de Outubro de 1999, o 1º R. marido dedicava-se, com carácter habitual e lucrativo, à realização de obras da construção civil [resposta ao ponto 1º da base instrutória]. 2. Na sequência da apresentação para o efeito a concurso e da subsequente adjudicação da obra em questão, o 1º R. marido celebrou com o Município de Paços de Ferreira o contrato, datado de 30 de Outubro de 1998, cujos exactos termos constam de fls. 98 a 137 dos autos, mediante o qual se obrigou a proceder à 2ª fase da obra respeitante à ampliação da Escola Primária (EB1) de …….., em ……., ……, nesta comarca, e que consistia nos acabamentos interiores da ampliação que tinha sido efectuada por outro empreiteiro na 1ª fase, mediante uma contrapartida monetária [resposta aos pontos 2º e 14º da base instrutória]. 3. No desenvolvimento desse contrato, o 1º R. marido, por si e empregados seus, sob a sua direcção e autoridade, deu início às obras referidas no ponto anterior na dita escola primária [resposta ao ponto 3º da base instrutória]. 4. Por essa altura, a A. prestava serviço na referida escola, em regime de prestação eventual de serviço a tempo parcial e desde 20 de Setembro de 1999 [resposta ao ponto 4º da base instrutória]. 5. No dia 20 de Outubro de 1999, cerca das 14 horas e 45 minutos, a A. deslocava-se a pé, no logradouro do edifício da referida escola, na parte posterior deste [resposta ao ponto 5º da base instrutória]. 6. Enquanto a A. caminhava alguns metros afastada da parede exterior posterior da escola, o empregado do 1º R., C…………., trabalhava no segundo andar do edifício da Escola e no momento desmontava os caibros (peças de madeira que vão da cumeeira do telhado que recebe o assentamento das ripas) [resposta ao ponto 7º da base instrutória]. 7. Um dos caibros, com cerca de 70 cm de comprimento, 3 cm de largura e 1,5 kg de peso, que era transportado pelo E………….., descendo pelo andaime, para a varanda do 1º andar, desprendeu-se das suas mãos, bateu no peitoril da varanda e daí caiu na cabeça da A., que, no momento, passava no local, situado a cerca de 3 metros de distância da saída do edifício da Escola para o logradouro [resposta ao ponto 8º da base instrutória]. 8. O acidente ocorreu numa zona do estaleiro montado pelo R. C………… na parte posterior do edifício da escola, área essa que se encontrava devidamente vedada com rede de arame “malha-sol” suportada por barrotes de madeira [respostas aos pontos 15º e 16º da base instrutória]. 9. Quer o R. C…………., quer um funcionário da Câmara Municipal de Paços de Ferreira haviam acordado directamente com a directora da escola a interdição do acesso à zona dos trabalhos e estaleiro da obra [resposta ao ponto 17º da base instrutória]. 10. Este acesso só era passível de se fazer, pelo interior, através de uma porta existente no interior do edifício escolar, pela qual se acedia a um corredor onde ficava situada, do lado esquerdo, a arrecadação, corredor esse que terminava então na saída para o exterior referida no ponto seguinte, cuja chave se encontrava colocada num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa, e à qual tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, nomeadamente para ir buscar produtos de limpeza [resposta ao ponto 18º da base instrutória]. 11. A saída para o exterior existente após a porta referida no ponto anterior da base instrutória não se encontrava selada ou entaipada ou, por qualquer forma, interditada à passagem de pessoas [resposta ao ponto 10º da base instrutória]. 12. Todas as outras passagens pelo interior do edifício estavam vedadas com tapumes devidamente colocados para esse efeito [resposta ao ponto 19º da base instrutória]. 13. O R. C………….. só pôde dar início às obras depois de verificado o isolamento, nos termos referidos nos pontos 9, 10 e 12, pelo funcionário da Câmara Municipal de Paços de Ferreira responsável pela fiscalização da obra [respostas ao ponto 22º da base instrutória]. 14. O acesso à obra por parte dos trabalhadores e outras pessoas directamente intervenientes na obra que era levada a cabo era feito pelas traseiras do edifício escolar, e na linha de ligação deste com a escola os acessos e portas existentes não providos de chave foram entaipados [resposta ao ponto 23º da base instrutória]. 15. Como consequência directa e necessária da queda do caibro sobre a sua cabeça, a A. sofreu um traumatismo crânio-encefálico, com ferida inciso-contusa da região occipital do crânio e fractura linear da metade direita do osso occipital [resposta ao ponto 24º da base instrutória]. 16. Tais lesões acarretaram-lhe uma incapacidade absoluta para o trabalho desde a data do acidente até ao dia 16 de Maio de 2000 [resposta ao ponto 35º da base instrutória]. 17. Como consequência directa e necessária, resultaram para a A. sequelas permanentes e irreversíveis, ou de reversibilidade duvidosa, tais como a abolição da capacidade sensorial do olfacto e a abolição da capacidade sensorial do paladar [respostas aos pontos 25º e 26º da base instrutória]. 18. Em consequência das sequelas referidas no ponto anterior a A. ficou a padecer de uma I.P.P. geral, genérica e indiferenciada, de 15% [resposta ao ponto 29º da base instrutória]. 19. Numa escala ascendente de 1 a 7, a A. sofreu um “quantum doloris” de grau 3 [resposta ao ponto 39º da base instrutória]. 20. A A. nasceu em 24 de Maio de 1958 [A) da matéria de facto assente]. 21. A A. trabalhava como tarefeira na referida escola, em tempo parcial, auferindo no ano de 1999 a quantia de 393$00/hora e no ano de 2000 (durante o qual trabalhou até 02/02) a importância de 433$00/hora [resposta ao ponto 30º da base instrutória]. 22. A A. esteve internada no Hospital de Penafiel (Padre Américo) de 20 a 24 de Outubro de 1999 e realizou tratamentos no Hospital de S. João [respostas aos pontos 32º e 33º da base instrutória]. 23. E foi assistida por um médico no Centro Médico e de Enfermagem de Paços de Ferreira [resposta ao ponto 34º da base instrutória]. 24. Antes da ocorrência do sinistro, a A. já padecia de algumas limitações, quer do ponto de vista físico, nomeadamente, uma limitação da audição, quer sob o ponto de vista mental [respostas aos pontos 43º e 44º da base instrutória]. 25. Essas limitações afectavam o nível de eficiência pessoal e profissional daquela [resposta ao ponto 45º da base instrutória]. III – DA SUBSUNÇÃO – APRECIAÇÃO Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir. O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente, artigo 684 nº 3 do Código de Processo Civil. Do Recurso Principal A) As questões concretas de que cumpre decidir no presente recurso são as seguintes: 1ª- Deve a matéria de facto ser alterada no sentido apontado pelo Recorrente, ou seja deve ser modificada a resposta dada ao quesito 18 e o quesito 20 deve merecer a resposta de Provado? 2ª- Verifica-se a culpa da Autora na produção do acidente pelo que deve ser excluída a culpa do Réu/recorrente? 3ª- Deve a Direcção da Escola ser responsabilizada? 4ª- Não podia o Tribunal recorrer à equidade no que respeita ao cálculo dos danos sofridos pela Autora a título de perdas salariais? 5ª- Quanto ao montante dos lucros cessantes, em resultado da incapacidade permanente da A., deverá ser calculada em face do que a A. auferia na Escola, como tarefeira a tempo parcial, e não, tendo em conta o salário mínimo nacional, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa para a A., à custa dos RR.? B) Vejamos a 1ª questão. 1- Como é sabido, a decisão do tribunal da 1ª instância sobre a matéria de facto só pode ser alterada pela Relação nos casos previstos no artigo 712 do Código de Processo Civil. E, nos termos n.º 1 do artigo 690-A do CPC “quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”. Acrescenta o n.º 2 do mesmo preceito “no caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522-C”. “Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento”, n.º 2 do artigo 522 do CPC. Nos presentes autos a prova produzida encontra-se gravada, tendo o Recorrente procedido à indicação dos depoimentos (é evidente que pretende a alteração das respostas com base nos depoimentos das testemunhas que indica nas suas alegações e cujo depoimento parcialmente transcreve, ou seja H………….., I………….., J…………. e K…………. bem como no depoimento de parte de C………….) em que fundamenta a sua divergência com a decisão recorrida. Afigura-se-nos que o Recorrente deu integral cumprimento ao n.º 1 do artigo 690-A do CPC pelo que se encontram verificados os pressupostos processuais legais para a reapreciação da prova, artigos 712 n.º 1 al. a) e b) e 690-A ambos do Código de Processo Civil. 2- Analisemos. Será que assiste razão ao Recorrente em pretender ver alteradas as respostas dadas aos quesitos que indica (18 e 20)? Importa ter em atenção que a apreciação da prova produzida está necessariamente ligada ao valor que o Julgador atribui não só a cada depoimento (visto não só de forma isolada mas também quanto apreciados globalmente) bem como ao valor que igualmente atribui aos diversos documentos que lhe são submetidos bem como às diligências que realizou. Estamos em face de um problema de valoração da prova produzida em audiência. Nos termos do artigo 655 n.º 1 do Código de Processo Civil o Tribunal aprecia livremente as provas produzidas, decidindo o Juiz segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto. Tal preceito consagra o princípio da prova livre, o que significa que a prova produzida em audiência (seja a prova testemunhal ou outra) é apreciada pelo julgador segundo a sua experiência, tendo em consideração a sua vivência da vida e do mundo que o rodeia. Prova Livre que nas palavras do Prof. Alberto dos Reis “quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei”, CPC, Anotado, vol. IV, p. 570.[1] E, não podemos esquecer que o julgador deve “tomar em consideração todas as provas produzidas”, artigo 515 do Código de Processo Civil, ou seja a prova deve ser apreciada globalmente. A prova testemunhal, atenta a sua falibilidade, impõe cuidados acrescidos na sua avaliação a fim de poder ser devidamente valorada. Ponderando este principio da prova livre deve o julgador motivar os fundamentos da sua convicção, de forma a permitir o controlo externo das suas decisões. Acresce que a gravação sonora (e mesmo a posterior transcrição escrita) não permite captar todos os elementos que influenciaram a decisão do julgador. Na verdade, as testemunhas por vezes têm reacções e comportamentos que apenas podem ser percepcionados e valorados por quem os presencia, não sendo possível à Relação através da gravação (ou transcrição) reapreciar o processo como o julgador formulou a sua convicção. “Há, na verdade, uma profunda diferença entre a posição do Juiz que, dirigindo a audiência, assiste à prestação dos depoimentos, ouvindo o que as testemunhas dizem e vendo como se comportam enquanto ouvem as perguntas que lhes são feitas e a elas respondem, e a outra, bem diversa, daquele que apenas tem perante si a transcrição, nas alegações, do teor dos depoimentos e a possibilidade de ouvir as respectivas gravações sonoras (cf. Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos dobre o Novo Código de Processo Civil”, LEX, 1997, pp. 399-400, António Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, 2ª ed. Pp. 270-271 e Acórdão do STJ de 19.04.2001, Proc. N.º 435/01)”, Ac. do STJ de 12/03/2002, Proc. N.º 697/01. O Juiz da 1ª instância é quem se encontra em melhor posição para avaliar e decidir quanto ao valor a atribuir a determinado depoimento. Essencial é o modo e a forma como os factos provados se encontram fundamentados, ou seja ao modo como o Sr. Juiz motivou as respostas dadas à matéria de facto, ao modo como fundamentou a sua convicção, uma vez que os juízes têm o dever de fundamentar de motivar as suas decisões para que possam ser controladas por aqueles a quem se destinam. Por último não podemos deixar de chamar a atenção que os recursos em sede de matéria de facto visam apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento. “O recurso em matéria de facto não se destina a um novo julgamento, constituindo apenas um remédio para os vícios do julgamento em primeira instância” Fórum Justiciae, Maio 99. Por isso, se repete, a possibilidade de recurso em matéria de facto prevista no artigo 712 do CPC tem como finalidade garantir a correcção do apuramento da matéria de facto. Todavia “a sindicância à convicção do julgador da 1º instância, a realizar por este tribunal de recurso, apenas se mostra adequada quando a mesma se apresenta manifestamente contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Deve ter-se presente que ao tribunal de 2ª instância não pode ser exigido que procure uma nova convicção sobre depoimentos de pessoas cuja presença física lhe está ausente, mas indagar se a convicção formada no tribunal recorrido tem suporte razoável naquilo que a gravação demonstra”.[2] 3- Feitas estas considerações é tempo de descermos ao caso concreto. O Recorrente entende que os quesitos supra apontados, nos quais se perguntava: Quesito 18º: “Este acesso só poderia processar-se através de uma porta existente no interior do edifício escolar cuja chave se encontrava na posse dos professores responsáveis pela direcção da escola”? Quesito 20º: No dia 20 de Outubro de 1999, pelas 14 horas e 45 minutos, a Autora sabia que estava proibida de aceder ao local onde decorriam as obras?, devem ver as suas respostas alteradas devendo a matéria de facto passar a ter a seguinte resposta: Quesito 18: “Provado que esse acesso só era passível de se fazer, pelo interior através de uma porta existentes no interior do edifício escolar, pela qual se acedia a um corredor onde ficava situada, do lado esquerdo, a arrecadação, corredor esse que terminava então na saída para o exterior referida no ponto 10º da base instrutória, cuja chave se encontrava colocada num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa, e á qual tinham acesso apenas as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, para ir buscar produtos de limpeza.” Quesito 20º: Provado A matéria de facto havia merecido as seguintes respostas: Quesitos 18º: “Provado que esse acesso só era passível de se fazer, pelo interior através de uma porta existentes no interior do edifício escolar, pela qual se acedia a um corredor onde ficava situada, do lado esquerdo, a arrecadação, corredor esse que terminava então na saída para o exterior referida no ponto 10º da base instrutória, cuja chave se encontrava colocada num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa, e á qual tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, nomeadamente para ir buscar produtos de limpeza.” Quesito 20º: Não Provado Perante a prova indicada afigura-se-nos que não assiste razão ao recorrente em pretender ver alterada a matéria de facto. Vejamos o quesito 18. No que concerne ao depoimento de parte do 1º réu C……………, (parcialmente transcrito a fls. 604) o qual deve obedecer ao estatuído nos artigos 522 e ss do CPC, não é possível retirar a conclusão pretendida pelo Recorrente. Sem esquecer que todo o depoimento de parte é livremente apreciado pelo julgador temos que ter em consideração que o depoimento de parte apenas pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento e visa obter a confissão de um facto. Na parte em que o depoente não confessa um facto que lhe é desfavorável o depoimento de parte é livremente apreciado pelo julgador. Feitos estes considerandos e lido o depoimento de fls. 604 e 605 não se vislumbra que o mesmo possa fundamentar a pretendida alteração. Aliás, apesar das insistências do Douto Mandatário, o depoente não afirma se havia ou não dísticos a proibir o acesso pela porta em causa nem que a essa porta apenas tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, para ir buscar produtos de limpeza. De igual modo, do depoimento da testemunha H…………. não se retira que á porta em causa apenas tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, para ir buscar produtos de limpeza. Lido o seu depoimento a fls. 605 e verso o que resulta é coisa diversa, ou seja o empreiteiro não vedou a porta em causa e optou por entregar uma chave á Sr.ª Directora porque esta tinha lá detergentes de que necessitava. Não diz que apenas tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, para ir buscar produtos de limpeza. Acresce que a este quesito foram inquiridas outras testemunhas, designadamente L……………, M……………., I………… e J……………., referidas expressamente na fundamentação das respostas aos quesitos. Aliás a testemunha I………….. contradiz expressamente a testemunha anterior quando refere que a chave não ficou na sua posse mas sim no local referido na resposta dada ao quesito 18, ou seja “num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa”. Também a testemunha M……….. afirma que as funcionárias não estavam “proibidas” de aceder por aquela porta mas sim que deviam ter cuidado com as obras. Entendemos que não existem razões para alterar a resposta dada ao quesito 18. No que concerne ao quesito 20 entende o Recorrente que a resposta de não provado traduz pura e simplesmente o contrário daquilo que a prova reluz no processo. Mas não lhe assiste razão. Tal como afirma o Recorrente nenhuma testemunha afirmou que a Autora sabia que estava proibida de aceder ao local onde decorriam as obras. As testemunhas que indica, concretamente a testemunha I…………., cujo depoimento está parcialmente transcrito a fls. 607 e verso, J…………., cujo depoimento está parcialmente transcrito a fls. 608 a 611 e K………….., cujo depoimento está parcialmente transcrito a fls. 611 verso a 612 são vagas e imprecisas. A I…………. afirma muitas vezes que não se recorda, não se lembra, e apesar de afirmar genericamente que estavam todos avisados já não se lembrava de como é que o tinha feito. Do depoimento da J…………. também não é possível retirar a pretendida conclusão. Aliás, este depoimento na parte que se encontra transcrito, começa com uma afirmação de que “havia” por parte de todos a noção empírica, directa, informada da impossibilidade ou da proibição de entrar no recinto da obra. Mas a resposta é apenas “havia”, quem faz a restante afirmação é o Douto Mandatário e as restantes respostas são vagas. Perguntada sobre se “sabiam quem é que tinha transmitido essas” a resposta não é peremptória, limita-se a dizer que “na altura quem transmitia era a directora da escola e todas as pessoas que existiam na escola sabiam que isso acontecia”. Ora não afirma expressamente que a directora tenha transmitido a ordem de proibição de acesso ao local e muito menos que o tenha feito á Autora. As restantes respostas, que nos dispensamos de reproduzir, também não permitem concluir pela prova da materialidade em questão. Aliás, a testemunha nem sabia onde estavam as chaves, nem se recordava se assistiu ou não ás instruções dadas pela Sr.ª Directora. Se não se recorda se assistiu como sabe que elas foram dadas? E a quem? Por último o depoimento da testemunha K………….. não refere minimamente se a Autora sabia que estava proibida de aceder ao local onde decorriam as obras. Apenas refere que o local estava completamente vedado e que era proibido passar no local, não sabendo explicar as razões dessa proibição. Face aos depoimentos das testemunhas não vemos razões para alterar o decidido. O recorrente não demonstra que haja um erro na resposta dada, que os depoimentos digam coisa diversa do que foi dado como provado. Não vemos, perante aqueles depoimentos apreciados em conjunto, como é que tais depoimentos podem abalar ou contraditar a fundamentação expressa na decisão recorrida. E tal fundamentação é bem expressa e eloquente. A Sr.ª Juiz refere claramente quais as provas em que baseou. Indica as declarações prestadas pelas testemunhas, que identifica e analisa, conjugados tais depoimentos com toda a prova produzida. Trata-se de uma fundamentação esclarecedora não só sobre as provas que serviram de suporte às respostas dadas mas também à forma e modo como a Sr.ª Juiz formou a sua convicção. Devemos ponderar que nos termos do artigo 653 do CPC, número 2, “a matéria de facto é decidida por meio de acórdão ou despacho, se o julgamento incumbir a juiz singular; a decisão proferida declarará quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador”. Como se disse os Juízes têm o dever de fundamentar devidamente as suas decisões que não sejam de mero expediente. Esse princípio está consagrado não só na Lei Fundamental (artigo 205 da CRP) mas também em diversos preceitos do CPC, de que é exemplo o citado artigo 653 do CPC (veja-se também o artigo 158 do CPC). O julgador deve motivar as respostas aos quesitos indicando as razões que o levaram a decidir em determinado sentido. Deve concretizar qual o meio de prova que o convenceu de certo facto. Deve ainda “referir, na medida do possível, as razões da credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova”.[3] A motivação das respostas aos quesitos deve referir, não só os meios concretos de prova, mas também as razões por que eles se tornaram credíveis e decisivos para o julgador. Este dever de fundamentar as decisões tem a virtualidade de permitir o controle externo das mesmas, permitindo que as partes, principais destinatários daquelas e os cidadãos em geral sejam convencidos da bondade e da certeza de tais decisões. No despacho que respondeu à matéria de facto a Mmª Juiz a quo fundamenta aquela resposta, esclarecendo quais são os depoimentos que teve em consideração. Como se disse, o despacho em análise referiu quais os concretos meios de prova que serviram de suporte à sua decisão mas também as razões pelas quais eles se não tornaram credíveis e porque foram decisivos para que o julgador decidisse no sentido apontado. A Mmª Juiz a quo fundamentou, motivou, as respostas à matéria de facto fazendo uma análise crítica das provas testemunhais, ponderando igualmente os documentos juntos. Nada há a censurar neste ponto. Não se vislumbram razões para alterar a matéria de facto relativamente às respostas dadas aos quesitos tendo em consideração os depoimentos das testemunhas em causa. Em suma, temos que, face à prova testemunhal não pode a matéria de facto ser alterada. Desta forma, não vemos razões para nos afastarmos do decidido em 1ª instância. Em resumo, a factualidade provada e não provada não pode ser colocada em crise pelos depoimentos das invocadas testemunhas, pelo que se impõe a improcedência desta questão arguida pelo Recorrente. C) Resolvida a primeira questão vejamos a segunda: Verifica-se a culpa da Autora na produção do acidente pelo que deve ser excluída a culpa do Réu/recorrente? Como se deixou dito supra B) a matéria de facto não merece censura. Perante a factualidade provada não se vislumbra qual a razão para atribuir à Autora qualquer culpa na produção do acidente. A culpa na definição dada pelo Prof. Galvão Telles, in "Manual de Direito das Obrigações", pág. 196, é a imputação psicológica de um resultado ilícito a uma pessoa. Se se produz um evento contrário à lei e esse evento é psíquico ou moralmente imputável a certo indivíduo diz-se que este agiu com culpa. No Código Civil a culpa é apreciada em abstracto (artigo 487º, n.º 2 e 799, n.º 2). Nos termos da lei a culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso. Provou-se que a A. prestava serviço na escola, em regime de prestação eventual de serviço a tempo parcial e desde 20 de Setembro de 1999 e que no dia 20 de Outubro de 1999, cerca das 14 horas e 45 minutos, se deslocava a pé, no logradouro do edifício da referida escola, na parte posterior deste. Quando aí caminhava foi atingida na cabeça por um pedaço de madeira que era transportado por um empregado do 1º Réu nas condições descritas na resposta dada ao quesito 8º. Perante estes factos não é possível imputar qualquer culpa à Autora. È certo que também se provou que o acidente ocorreu numa zona do estaleiro montado pelo R. C………… na parte posterior do edifício da escola, área essa que se encontrava devidamente vedada com rede de arame “malha-sol” suportada por barrotes de madeira e que quer o R. C……….., quer um funcionário da Câmara Municipal de Paços de Ferreira haviam acordado directamente com a directora da escola a interdição do acesso à zona dos trabalhos e estaleiro da obra. Todavia estes factos não são susceptíveis de imputar um juízo de censura ao comportamento da Autora. A autora acedeu ao local pelo interior, através de uma porta existente no interior do edifício escolar, pela qual se acedia a um corredor onde ficava situada, do lado esquerdo, a arrecadação, corredor esse que terminava então na saída para o exterior referida no ponto seguinte, cuja chave se encontrava colocada num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa, e à qual tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, nomeadamente para ir buscar produtos de limpeza [resposta ao ponto 18º da base instrutória]. Não acedeu ao local através da rede ou violando uma qualquer proibição (pelo menos tal facto não se provou). Como bem, se refere na decisão recorrida, estando provada a culpa dos Réus (recorrente e empreiteiro) incumbia a estes provar que a Autora também teve culpa na produção do acidente e que a sua culpa atingiu um grau de gravidade tal que excluía (ou pelo menos reduzia) a responsabilidade dos Réus, (cfr. Artigo 570 n.º 1 do Código Civil). Deste modo podemos concluir que, face aos factos provados, não é possível imputar qualquer culpa à Autora no desenvolver do acidente de que foi vítima. Impõe-se, assim, a improcedência desta questão. D) Deve a Direcção da Escola ser responsabilizada? Para que a Escola ou a sua Direcção pudessem ser responsabilizadas necessário se tornava que tivessem de algum modo agido com culpa. Não iremos repetir o que se deixou dito sobre a natureza da culpa. Importa aqui salientar que a Escola ou a sua Direcção não eram partes no contrato celebrado entre o Réu recorrente, dono da obra e o empreiteiro. O Réu Recorrente e o empreiteiro é que são os responsáveis pelos danos causados a terceiros, um enquanto dono da obra e outro enquanto empreiteiro. O lesado apenas a estes pode pedir responsabilidades não a um terceiro (a escola) estranho ao contrato. Acresce que, nos termos desse contrato era ao réu empreiteiro quem competia realizar os trabalhos necessários a garantir a segurança das pessoas que trabalhavam na obra bem como do público em geral. É certo que se provou que o R. C…………… e um funcionário da Câmara Municipal de Paços de Ferreira haviam acordado directamente com a directora da escola a interdição do acesso à zona dos trabalhos e estaleiro da obra e que este acesso só era passível de se fazer, pelo interior, através de uma porta existente no interior do edifício escolar, pela qual se acedia a um corredor onde ficava situada, do lado esquerdo, a arrecadação, corredor esse que terminava então na saída para o exterior referida no ponto seguinte, cuja chave se encontrava colocada num prego existente na parede, acima e ao lado da porta em causa, e à qual tinham acesso as funcionárias que precisavam de ir à arrecadação, nomeadamente para ir buscar produtos de limpeza. Provou-se ainda que a saída para o exterior existente após a porta referida no ponto anterior da base instrutória não se encontrava selada ou entaipada ou, por qualquer forma, interditada à passagem de pessoas e que o R. C………….. só pôde dar início às obras depois de verificado o isolamento, nos termos referidos nos pontos 9, 10 e 12, pelo funcionário da Câmara Municipal de Paços de Ferreira responsável pela fiscalização da obra. Mas estes factos não são, por si só, suficientes para ilibar os Réus da sua responsabilidade (com base na sua culpa) imputando essa mesma culpa à escola. Por último, a Autora é estranha ás relações entre a Escola, ou a sua direcção, e os Réus. Deste modo podemos concluir que, face aos factos provados, não é possível imputar qualquer responsabilidade à Escola ou à sua Direcção. Impõe-se, assim, a improcedência desta questão. E) Importa decidir a quarta questão: Não podia o Tribunal recorrer à equidade no que respeita ao cálculo dos danos sofridos pela Autora a título de perdas salariais? Defende o Recorrente que o Tribunal devia, no que concerne ao montante indemnizatório devido a título de perdas salariais, ter relegado a sua liquidação para execução de sentença. Não lhe assiste razão. Dispõe o artigo 661 n.2 do CPC que “Se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que se liquidar em execução de sentença, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida”. Afigura-se-nos que o Tribunal “a quo” fez correcta interpretação dos normativos legais, concretamente do citado artigo 661 n.º 2 do CPC, cujos princípios se aplicam a todas as acções declarativas. Na verdade a Autor logrou demonstrar, tal como havia alegado, que tinha sofrido danos apenas não conseguindo provar e apurar “concretamente” o seu valor. Da redacção de tal preceito resulta que o tribunal deve (e estamos aqui perante um poder dever do Juiz e não perante um poder discricionário) condenar no que se liquidar em execução de sentença sempre que se encontrem reunidas duas condições: A primeira que o réu tenha efectivamente causado danos ao autor e a segunda que o montante desses danos não esteja determinado na acção declarativa por não terem sido concretamente apurados (como foi o caso).[4] Mas também se tem entendido que o Tribunal “apenas deve remeter as partes para a liquidação em execução de sentença se não puder ter recorrido às regras da equidade.[5] Podemos concluir que face à incerteza do valor dos danos, que ficaram efectivamente demonstrados, o tribunal deve relegar a sua liquidação para a execução de sentença, mas só no caso de não puder fixar logo o seu montante, ainda que com recurso à equidade.[6] Esta se nos afigura a solução, não só mais conforme e adequada ao espírito e à razão da norma, como também a mais justa. Por tudo o que se deixou afirmado entende-se que também neste ponto não merece censura a decisão recorrida, impondo-se a improcedência desta questão. F) Resta decidir a última questão: 5ª- Quanto ao montante dos lucros cessantes, em resultado da incapacidade permanente da A., deverá ser calculada em face do que a A. auferia na Escola, como tarefeira a tempo parcial, e não, tendo em conta o salário mínimo nacional, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa para a A., à custa dos RR.? Também neste ponto não assiste razão ao Recorrente. Resulta da factualidade provada que a Autora em consequência das sequelas derivadas do acidente ficou a padecer de uma I.P.P. geral, genérica e indiferenciada, de 15%. A A. trabalhava como tarefeira na referida escola, em tempo parcial, auferindo no ano de 1999 a quantia de 393$00/hora e no ano de 2000 (durante o qual trabalhou até 02/02) a importância de 433$00/hora. Trabalhava, pois, a tempo parcial desconhecendo-se o número exacto de horas que trabalhava. Quando à Autora foi fixada a IPP de 15%, em Maio de 2000, já não trabalhava na escola, desconhecendo-se se o fazia noutro local. Desconhecendo-se o real vencimento da Autora deve o julgador socorrer-se do salário mínimo nacional para efeitos de atribuição da indemnização pela perda da capacidade de ganho, resultante da IPP de que ficou a padecer. Não se vislumbra que o recurso ao salário mínimo nacional implique qualquer enriquecimento sem causa para a A., à custa dos RR. Entendemos que os cálculos efectuados não se mostram desajustados. O que está em litígio é o valor justo por tal indemnização (pela perda da capacidade de ganho, resultante da IPP de que ficou a padecer), no quadro concreto em análise. Pensamos ser entendimento pacífico que na fixação do montante indemnizatório pela perda da capacidade de ganho resultante da Incapacidade se deve ter em consideração, para além do grau de incapacidade, o salário do lesado, o tempo provável de vida activa do lesado, a sua idade bem como as suas despesas pessoais. Deste modo a indemnização a atribuir deverá representar um capital produtor de rendimentos que cubra a diferença entre a situação anterior ao acidente e a actual, sendo certo que o mesmo deverá estar esgotado no final da vida activa do lesado por forma a evitar-se um injusto enriquecimento do lesado à custa do lesante.[7] Para alcançar esta justa indemnização o tribunal não deve estar limitado pelo uso de fórmulas matemáticas, sendo certo que para além da utilizada na sentença recorrida (aliás devidamente fundamentada nos seus termos) outras existem igualmente válidas para a determinação do justo montante. As fórmulas matemáticas devem servir essencialmente como instrumento de trabalho e não como critérios de determinação rígidos, pois teremos sempre de nos socorrer das regras da equidade. Tendo em consideração estes critérios de equidade não se vislumbra que o recurso ao salário mínimo nacional constitua para a Autora um enriquecimento sem causa. Deste modo improcede também esta questão e, consequentemente impõe-se a improcedência do recurso de Apelação do réu Município de Paços de Ferreira. G) Resta decidir o recurso subordinado Neste apenas uma questão se coloca, ou seja a quantificação dos danos sofridos pela Autora. Devem estes ser agora quantificados na quantia de 40.000 euros (sendo 20.000,00 pelo dano futuro e 20.000,00 euros pelos danos não patrimoniais), como pretende a Recorrente ou pelo contrário deve manter-se a quantia determinada pela decisão recorrida? No que concerne aos danos futuros e face ao que ficou dito supra F), para a qual remetemos, entendemos que não merece censura a decisão recorrida. Relativamente aos danos morais afirma Vaz Serra, B.M.J., n.º 83 "a satisfação ou compensação dos danos morais não é uma verdadeira indemnização no sentido de um equivalente do dano, isto é, um valor que reponha as coisas no seu estado anterior à lesão. Trata-se de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, uma vez que este, sendo ofensa moral, não é susceptível de equivalente". É sempre difícil arbitrar uma indemnização nestes casos; é impossível traduzir em termos pecuniários o dano causado pelo acidente na pessoa da Autora. Não sendo estes prejuízos avaliáveis em dinheiro, a atribuição de uma soma pecuniária correspondente legitima-se, não pela ideia de indemnização ou reconstituição, mas pela de compensação (Mota Pinto, in ob. já cit.). Conforme ensinam Pires de Lima e Antunes Varela in "Código Civil Anotado", vol. I, 1982, 3ª ed., pág. 474, "o montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda, etc.". E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso, da criteriosa ponderação. Posto isto vemos como é delicada a atribuição de um valor para satisfação dos danos morais. Teremos de nos socorrer dos valores usados pela Jurisprudência. Ponderando os danos morais sofridos pela Autora melhor descritos supra (danos que se traduzem claramente num dano moral que, pela sua gravidade, a qual é aferida por critérios objectivos, é digno de tutela jurídica e consequentemente indemnizável) e considerando os critérios estabelecidos nos artigos 494,496 e 566 todos do Código Civil, reconhecendo a dificuldade na determinação do montante justo para indemnizar os danos não patrimoniais da lesada, tendo em consideração os danos sofridos e os critérios legais indicados, entendemos ser justo e equitativo o montante indemnizatório referenciados pela decisão recorrida ou seja a quantia de 17.500 Euros a título de danos morais sofridos pela Autora. Em suma e em conclusão, impõe-se, também, a improcedência do recurso da Autora. Nada há, pois, que alterar na decisão recorrida. Em suma e em conclusão, impõe-se a improcedência das conclusões dos Recorrentes e consequentemente de ambos os recursos de apelação (principal e subordinado). IV - Decisão Por tudo o que se deixou exposto e nos termos dos preceitos citados, acorda-se em: 1º- Julgar improcedente o recurso de Apelação do Réu Município de Paços de Ferreira e em consequência confirmar a decisão recorrida. 2º- Julgar improcedente o recurso de Apelação da Autora B………….. e, em consequência confirmar a sentença recorrida. Custas do recurso principal pelo Réu e do recurso subordinado pela Autora. Porto, 29 de Setembro de 2008 José António Sousa Lameira António Eleutério Brandão Valente de Almeida José Rafael dos Santos Arranja ___________ [1] Importa ter sempre presente que o princípio da livre apreciação da prova está intimamente conexionado com o principio da oralidade, como bem salientava o Prof. Alberto dos Reis “a oralidade, entendida como imediação de relações (contacto directo) entre o juiz que há-de julgar e os elementos de que tem de extrair a sua convicção (pessoas, coisas, lugares) é condição indispensável para a actuação do princípio da livre convicção do juiz, em oposição ao sistema de prova legal”. E, citando Chiovenda terminava “ao juiz que haja de julgar segundo o principio da livre convicção é tão indispensável a oralidade, como o ar é necessário para respirar” CPC, Anotado, vol. IV, p. 566 e ss [2] Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 08.01.2007, proferido no processo n.º 6721/2006 da 5ª secção de que foi Relator o Desembargador Caimoto Jácome e o qual subscrevemos como adjunto. [3] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil p. 636 [4] Neste sentido o Ac. RC de 1.7.1980, BMJ 301, 469 “ Para que alguém possa ser condenado a pagar a outrem o que se liquidar em execução de sentença, necessário é que o julgador tenha perante si duas certezas) que a primeira pessoa tenha causado danos à segunda; b) que o montante desses danos não esteja averiguado na acção declarativa, desde logo, por não haver “elementos para fixar o objecto ou a quantidade”” [5] Aliás, tem-se entendido que apenas se deve relegar para execução de sentença se não for possível fixar uma justa indemnização recorrendo às regras da equidade, Cfr. entre outros o Ac. RP de 13.12.1990, CJ 5º, 216 “ Não sendo possível fixar o valor exacto dos danos a indemnizar, não deve esse facto excluir a efectivação do direito à indemnização, pois compete ao tribunal a sua fixação segundo um juízo de equidade face às circunstâncias do caso concreto.”; Ac. STJ de 3.12.1998, BMJ 482-180; Ac. STJ de 25.3.2003, in www.dgsi. [6] Como expressivamente afirmou o Conselheiro Silva Paixão “Do cotejo destes normativos resulta que só é possível deixar para liquidação em execução de sentença a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora se prove a sua existência, não existam os elementos indispensáveis para fixar o seu quantitativo, nem sequer recorrendo à equidade. O que é essencial é que esteja provada a existência dos danos, ficando dispensada apenas a prova do respectivo valor.”, Ac. STJ de 3.12.98, supra citado. [7] “Segundo um dos critérios auxiliares, tal julgamento tenderá a chegar a uma quantia em dinheiro que corresponda a um capital gerador de um rendimento equivalente ao que o lesado irá deixar de auferir, mas que se extinga no final do período provável de vida activa ( cfr., entre outros, acórdãos deste STJ de 04/12/1998, 15/12/98, 06/07/2000 e 25/06/2002, in, respectivamente, BMJ 478-344, CJ/STJ, Ano VI, Tomo III, pag. 57, CJ/STJ, Ano VIII, Tomo I, pag. 144, CJ/STJ, Ano X, Tomo II, pag. 128)”, Ac. STJ de 20.11.2003, CJ/STJ, Ano XI, Tomo III, pag. 149 e ss. |