Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0810638
Nº Convencional: JTRP00041322
Relator: ANDRÉ DA SILVA
Descritores: APARELHOS DE MEDIÇÃO
MARGEM DE ERRO
Nº do Documento: RP200805070810638
Data do Acordão: 05/07/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 527 - FLS 176.
Área Temática: .
Sumário: O não uso do juízo científico de conhecimento público ínsito na Norma “NF X 20 71 da AFNOR”, adoptada ao controlo metrológico, traduz um erro notório na apreciação da prova, face ao conhecimento do Tribunal das margens de erro de medição que aqueles aparelhos permanentemente comportam.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 638/08
Processo n.º …/06.2GBSTS, .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso

Relator: Des.º André da Silva
Adjuntos: Des.º Francisco Marcolino
Des.º Ângelo Morais


Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto
I
Relatório

A decisão de 1ª instância: - Tribunal Singular X
- Tribunal Colectivo


No .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso foi proferida a seguinte decisão:

“a) condenar o arguido B………., como autor material de um crime de “condução de veículo em estado de embriaguez”, p. e p. no art.º 229º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 3,00 (três euros), o que perfaz a multa global de € 300,00 (trezentos euros);
b) na sanção acessória de inibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 6 (seis) meses, nos termos do art.º 69º, n.º 1, al. a), do Cód. Penal”.

2º - Recurso:

Não conformado com tal decisão o Exm.º Magistrado do M.ºP.º veio interpor recurso e na sua motivação conclui da seguinte forma:

“1. O arguido declarou em audiência pretender confessar os factos que lhe eram imputados e, após o cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 344º do Código de Processo Penal, confessou integralmente e sem reservas tais factos tendo sido, por isso, dispensada a produção da prova relativa aos mesmos.

2. Face àquela confissão integral e sem reservas por parte do arguido, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 344º do Código Processo Penal, dos factos que lhe eram imputados.

3. E não se verificando nenhuma das excepções previstas no n.º 3 do mesmo artigo.

4. Estava o Tribunal obrigado a, em cumprimento do disposto na alínea a) do seu n.º 2, e para além e na decorrência da decidida dispensa da demais produção de prova a respeito.

5. Dar como provados os – e todos os – factos que ao arguido vinham imputados,

6. Ou seja, que nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na acusação conduzia o veículo aí aludido com uma taxa de álcool no sangue de 1,40 g/l, de forma livre, deliberada, consciente de infringir a lei, no intuito de conduzir na via pública tal veículo e bem sabendo que havia ingerido antes bebidas alcoólicas.

7. E, consequentemente, julgar procedente por provada a acusação deduzida e proferir decisão condenatória pela prática pelo arguido do crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 69º, n.º 1, a) e 292º, n.º 1 do Código Penal, por que vinha acusado com referência à TAS de 1,40 g/l.

8. Não fazendo, dando como não provado que o arguido apresentasse uma TAS de 1,40 g/l.

9. Considerando apenas provados, os factos imputados, que o arguido conduzia o referido veículo automóvel pela via pública com uma TAS de 1,30 g/l no sangue, taxa esta corrigida por não ter sido aplicada, no caso concreto a taxa de erro máximo admissível aplicável aos alcoolímetros por força da recomendação da Organização Internacional de Metrologia e na sequência da Portaria n.º 748/94 de 13/08.

10. Violou o Meritíssimo Juiz de Direito “a quo” o disposto nos referidos artigos 69º, n.º 1, a) e 292º, n.º 1, do Código Penal e 344º, n.º 2, a) do Código Processo Penal.

11. Sendo certo que nos pontos 5 e 6 da Portaria n.º 748/94, de 13/AGO/1994 referida na decisão recorrida, o Ministério da Indústria e Energia aprovou Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros “(…) destinados a medir a concentração de álcool por análise do ar alveolar expirado”.

12. Estabelecendo que, para efeito das operações de controlo metrológico de tais instrumentos traduzidas na aprovação de modelo e primeira verificação, por um lado, e na verificação periódica, por outro, “(…) os erros máximos admissíveis … são (…)”, respectivamente e pela ordem indicada, “(…) os definidos pela forma NF X 20-701 (…)” e “(…) uma vez e meia (…)” aqueles,

13. Menos certo não é que no caso dos autos não está nem foi posta em causa a regularidade da aprovação ou a verificação do alcoolímetro em questão nem as condições da sua utilização nos procedimentos em análise, indicadas aliás no auto de notícia/acusação – cfr. artigo 389º, n.º 3 do Código Processo Penal.

14. O intérprete e aplicador da lei tem de presumir que o legislador, ao regular a matéria relativa á condução sob o efeito do álcool, conhecia todos os pressupostos das soluções adoptadas, incluindo os mecanismos de determinação das taxas relevantes para efeitos sancionatórios.

15. Não podendo as orientações e determinações respeitantes aos procedimentos relativos à fiscalização do trânsito e à remessa ao Ministério Público, para os efeitos legalmente previstos, quanto a cada situação concreta, dos autos de notícia sobre situações de facto que, em face dos resultados obtidos através dos mecanismos legalmente previstos, sejam enquadráveis nas previsões dos artigos 291º e 292º, do Código Penal.

16. Prever, “contra legem”, quaisquer margens de tolerância ou margens de erro relativamente aos resultados obtidos através dos mecanismos legalmente previstos, devendo a respeito ser recusadas quaisquer orientações ou instruções que não decorram da lei.

17. Pelo que bem andou, assim, in casu, a GNR-BT ao, face ao facto do teste de alcoolemia efectuado ao arguido através dos mecanismos para o efeito legalmente previstos ter resultado apurada a existência de uma TAS de 1,40 g/l,

18. Dando cumprimento ao disposto nos artigos 254º, n.º 1, a), 255º, n.º 1, a), 256º, 381º, n.º 1 e 387º, n.º 2 do Código Processo Penal.

19. Tendo sido igualmente correcta a verificada subsequente apresentação do arguido para julgamento em processo sumário, nos termos e para os efeitos das disposições conjugadas dos artigos 69º, n.º 1, a) e 292º, n.º 1 do Código Penal e 381º, n.º 1, 382º, n.º 2, 385º e 389º do Código Processo Penal.

20. A douta sentença recorrida deverá assim ser revogada e substituída por outra que, dando por integralmente provada a matéria de facto ao arguido imputada na acusação contra ele deduzida,

21. O condene pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 69º, n.º 1, a) e 292º, n.º 1 do Código Penal, por que vinha acusado com referência a uma TAS de 1,40 g/l.
Fazendo-se assim, Justiça!”.
3º - Resposta:

Respondeu ao recurso o arguido pedindo que seja negado provimento ao mesmo.

A fls. 84 foi admitido o recurso.

Os autos subiram a este Tribunal Superior e aqui o Sr. PGA emite parecer no sentido da procedência do recurso.

Cumpriu-se o disposto do art.º 417º, n.º 2 do CPP e nada mais foi requerido.

Procedeu-se à audiência de julgamento com a observância legal formalismo sendo:

4º - Os factos provados os seguintes:

“No dia 8 de Abril de 2006, pelas 00h30, o arguido conduzia o ciclomotor de matrícula 2-STS-..-.. na via pública, mais concretamente na ………., ………., Santo Tirso, apresentando, nessa altura, uma T.A.S. de pelo menos 1,30 g/.

O arguido actuou livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que tinha ingerido bebidas alcoólicas em excesso e que a condução de veículos a motor na via pública com aquela taxa de álcool no sangue era proibida e punida por lei.

O arguido é casado, trabalha como jardineiro, auferindo cerca de € 403,00 (quatrocentos e três euros) /mês, recebendo de rendimento de inserção social cerca de € 320,00 (trezentos e vinte euros) /mês, a sua esposa encontra-se desempregada, e tem dois filhos a seu cargo.

O arguido confessou os factos e averba as condenações constantes de fls. 53 a 56 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido”.

5º- Factos não provados:

“Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a boa apreciação da causa”.

6º - Motivação:

“O Tribunal formou a sua convicção, na confissão integral e sem reservas do arguido, nas suas declarações no que diz respeito às suas condições pessoais e sócio-económicos, bem como no talão de fls. 7 (deduzido ao valor dele constante o valor de erro máximo admissível dos equipamentos de fiscalização, de acordo com a Portaria n.º 748/94, de 13/08, por remissão para a norma NF X 20-701), e no C.R.C. de fls. 52 a 56, quanto às condenações averbadas pelo arguido”.
II
Fundamentação

As questões a decidir são apenas duas:

- Se o Meritíssimo Juiz tinha de considerar provado face à confissão do arguido a taxa de alcoolemia de 1,40 g/l a que foi submetido e não podia fazer uso da recomendação da O.I.M. e constante da Portaria n.º 784/94 de 13/08.

- Ao fazer uso das margens de erro do resultado obtido a decisão é contra legem.

O recurso apesar de delimitado pelas conclusões extraídas da motivação que constituem as questões suscitadas pelo recorrente e que o Tribunal de Recurso tem de apreciar – ver arts.º 412º, n.º 1 e 424º, n.º 2 do CPP, acórdão do STJ de 19/06/96 in BMJ n.º 458, pág. 98 e Professor Germano Marques da Silva in Curso de Processo Penal III, 2ª Edição, pág. 95 também tem que ponderar os vícios e nulidades de conhecimento oficioso ainda que não invocados pelos sujeitos processuais – arts.º 410º, 412º, n.º 1 e 403, n.º 1 do CPP, mas que sempre terão de resultar “do texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum” (art.º 410º, n.º 2 do CPP) “não podendo o Tribunal socorrer-se de quaisquer outros elementos constante do processo.

Analisando:

Como consta da acta de fls. 50 o arguido confessou integralmente os factos e sem reservas. Importa saber se a confissão integral e sem reservas impõem ao Juiz que considere os factos confessados integralmente. A resposta é dada pela própria norma do art.º 344º do CPP e, é negativa.

Dado que o caso dos autos é semelhante com o constante do acórdão desta Relação – 1ª Secção Criminal in recurso 479/08 elaborado pelo Exm.º Desembargador Doutor José Carreto, como Relator, e cujo conteúdo é aceite por nós passa-se a transcrever o mesmo:

A resposta é negativa pois que:

“- do nº2 b) resulta que a confissão implica a passagem de imediato ás alegações orais, e se o arguido não dever ser absolvido por outros motivos, á determinação da sanção, (sublinhado nosso), o que contraria a ideia ínsita de que confessando os factos teria de ser condenado;

- do nº 3 b) a confissão não implica a consideração dos mesmos como provados, se o tribunal suspeitar, do carácter livre da confissão ou tiver dúvidas sobre a verdade dos factos confessados.

E no nº4 estabelece que o Tribunal naquelas circunstâncias decide, mesmo perante a confissão se e em que medida tem lugar quanto aos factos confessados a produção de prova

Na sequência dessa regulamentação e inerente ao poder do juiz, que decide em sua livre convicção, fruto da sua independência e imparcialidade, e por isso é que “Quer na hipótese de confissão integral e sem reservas – com ou sem verificação dos óbices descritos no nº3 do artº 344º do CPP- quer no caso de confissão parcial ou com reservas, o tribunal mantém intacta a sua liberdade de apreciação e consequentemente pode admitir ou não a confissão. II- E, assim, a confissão do arguido, mesmo no caso de ser admitida, não impede necessariamente a produção de prova em audiência, mormente no que concerne à prova da defesa para o efeito da escolha e da medida da reacção criminal a aplicar. “Ac. STJ 9/10/91 BMJ 410, 591, e, “A circunstância de um arguido confessar em audiência de julgamento os factos constantes da acusação não implica necessariamente a condenação pela prática do crime imputado. Basta, por exemplo que, não se perfilhando a qualificação jurídica dos factos, se conclua pela inexistência de ilícito penal, ou que esclarecimentos complementares recolhidos na audiência levem a concluir pela não verificação do crime” Ac. R. C de 30/6/93 BMJ 428, 705.

De todo o modo e sempre que se verifique uma declaração de confissão, o juiz é que decide em sua livre convicção se deve e em que medida ter lugar a produção de prova quanto àqueles factos (Ac. R.P. de 27/1/93 www.dgsi.pt/jtrp nº conv. JTRP00007195”.

Aplicando a situação ao caso dos autos temos que o arguido confessou os factos, mas constando da participação/ acusação a taxa de alcoolemia de 1,40 g/l, o tribunal apenas considerou provada a taxa de, pelo menos, 1,30g/l.

“E tal resultou de não ter considerado a confissão do arguido ou de outro factor?

Como se extrai da fundamentação da sentença tal resultou, para além da confissão “ no talão de fls. 5 (deduzido o valor de erro máximo admissível dos equipamentos de fiscalização, de acordo com a Portaria nº 748/94, de 13/08, por remissão para a norma NF X 20-701)”

Ou seja a concreta taxa de alcoolemia de que o arguido vinha acusado resultou não de um concreto e preciso conhecimento do arguido, mas de um exame feito por uma máquina, cujo resultado era o descrito, donde a confissão do arguido apenas podia abranger o resultado do exame, (isto é que o aparelho acusara aquela taxa) e não que essa era a taxa de alcoolemia com que conduzia (não percepcionável directa e pessoalmente, em termos quantitativos pelo arguido, que apenas sabe do estado ou da ingestão de bebida alcoólicas).

Como daqui resulta que a decisão do Juiz, conhecedor da existência de uma norma técnica (emergente dos conhecimentos técnico científicos actuais) - (publicada e inserida num diploma legislativo – logo de conhecimento geral e como norma legal), emerge do facto de “em sua convicção” suspeitar que o resultado do exame, não traduz a “realidade do acontecido” ou seja “da veracidade dos factos confessados” pois só através do exame eles podem ser determinados, ou seja que o resultado do exame efectuado ( exame seja ele qual for) tem uma margem de erro;

Essa suspeita / certeza é fundada e de conhecimento geral e de que por isso dela deve fazer uso, quer como facto notório - que são os factos do conhecimento geral ou conhecimento público (e não se diga que algo publicado no D.R. não é de conhecimento publico) - 514º 1 CPC ex vi artº 4º CPP e por isso não estando sujeito a alegação e a prova, quer como facto de que tem conhecimento em virtude das suas funções (sendo dispensável no caso a junção de tais normas ao processo por serem de âmbito publico porque inserido em diploma legislativo para que se remete na decisão) - artº 514º2 CPC ex vi artº 4º CPP.

Ora in casu a confissão do arguido não pode abranger a concreta taxa porque é determinável por exame do aparelho (alcoolímetro), facto do conhecimento do juiz (e de qualquer pessoa como facto notório, e único meio de controle), pelo que considerar abrangida pela confissão uma concreta taxa de alcoolemia que apenas o aparelho pode medir é no mínimo ilógico.

Ou será que confessando o arguido uma taxa de Y e o aparelho (sem problemas) uma taxa de Z, o Tribunal aceitaria a taxa confessada em vez da apurada pelo exame efectuado pelo aparelho?

Assim ao não considerar provada a concreta taxa de alcoolemia expressa na acusação, não infringiu o comando do artº 344º CPP.
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Mas fazendo uso da Recomendação da O.I.M e da Norma Técnica e constante da Portaria nº 748/94 de 13/8, e corrigindo, face às margens de erro da máquina de medição/alcoolímetros, os resultados obtidos, errou?

Em 1ª linha a resposta é negativa, pois que se sabe (e disso pode conhecer) que o resultado do exame não corresponde á realidade, é seu dever corrigir e repor a verdade. Mas a questão não se coloca ao nível desse procedimento/actuação.

Já se referiu que a única maneira de calcular a taxa de alcoolemia é o exame (quantitativo ou qualitativo), que é feito por um aparelho – alcoolímetro - que é o instrumento destinado a medir a concentração de etanol através da análise do ar profundo dos pulmões, e que pode ser utilizado para fins de prova judicial, na definição da Recomendação OIML R 126 (1998) da Organização Internacional de Metrologia Legal.
Para fazer as medições (nesse aparelho ou em qualquer outro) necessário é que o mesmo esteja calibrado (ou seja faça sempre a mesma medição), para o que é necessário permanente ou periódico controlo metrológico.

É na sequência dessa necessidade (de que uma medida seja sempre igual onde quer que seja - de natureza mundial) que surgiram as normas técnicas reguladoras desse controle, porque não existem instrumentos de medição perfeitos (porque sujeitos a diversas variáveis), e por isso não há medições isentas de erro (que é a diferença entre o valor indicado pelo instrumento de medição utilizado e o valor verdadeiro do que se pretende medir).

“Ignorando os grosseiros (de todo imponderáveis e que só a definição de protocolos de medição adequados, e a sua estrita aplicação na prática, poderá, em princípio, evitar), há erros há que, sendo sistemáticos, podem ser conhecidos e, consequentemente, cujos efeitos podem ser controlados” AC. R.P. de 1/12/07 ww.dgsi.pt/jtrp proc. nº 0744023;

Ora foi para regular essa calibragem, fazer esse controlo, tentar evitar esses erros que surgiram as normas de controlo metrológico, que mesmo assim não são eficazes (no sentido do resultado // realidade), mas através das quais se sabe que a margem de erro se situa entre X e Y, e verificando-se que esse aparelho não ultrapassa a margem de erro prevista / normalizada, se considera calibrado.

Foi no sentido de dar conhecimento e eficácia a tais normas técnicas que foram inseridas na Portaria nº 748/94, de 13/8; tais normas como conhecimento técnico científico têm a sua validade independentemente de a portaria estar ou não em vigor - (pelo menos já não está - ver adiante, e cfr. sobre a “historia” da Portaria, o Ac. RP de 19/12/07 www.dgsi.pt/jtrp proc nº 0746058) - dado que não é aquela que determina a eficácia técnica das normas de controlo metrológico (mas a realidade técnico-científica conhecida que lhe está subjacente).

E tanto assim é que a adopção de tais normas foi de novo legislativamente assumida com a publicação da Portaria nº 1556/2007 de 10/12 (emitida ao abrigo do disposto no nº1 do artº1º e 15º do DL 291/90 de 0/9 e nº 1.2 do Regulamento Geral do Controlo Metrológico anexo á Portaria nº 96/90 de 9/10) e que também revoga expressamente no artº 2º a Portaria nº 748/94 de 3/10 citada.

Assim os aparelhos para serem usados terão de respeitar tais normas técnicas de aprovação e controle (sob pena de o meio de prova ser inadmissível), ou seja têm de ser calibrados (de modo a que todos os aparelhos façam a mesma medição), pois que calibrar significa “ Verificar as indicações de um instrumento, de acordo com um padrão, a fim de lhe corrigir erro de graduação” ou “Afinar ou equilibrar uma peça de um mecanismo de modo a obter uma total homogeneidade de funcionamento das suas partes, com vista ao fim para que foi criada, rectificando eventuais desajustes ou irregularidades.” In Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia de Ciências de Lisboa, Verbo, I vol. pág. 638.

Ora cabendo ao IPQ a certificação, normalização e metrologia dos aparelhos em causa, este afere ou calibra os aparelhos e cada um deles desde que, e face á norma técnica aprovada, o mesmo não tenha uma margem de erro superior á permitida, do que decorre que qualquer aparelho certificado o-é e pode ser usado com uma margem de erro, sendo esta a margem de erro que a lei permite.

Mas o seu resultado deve ser aceite sem mais?
Ora se existe um juízo técnico científico que nos diz que aquele aparelho, mesmo sobre controlo, tem, está em funcionamento e é usado, com um erro (tem sempre uma margem de erro - ou seja que o que ele traduz é não a realidade mas esta resulta de dois factores: a medida indicada e uma variável que nos permite aceder e estar o mais próximo possível da realidade) cremos que nos devemos aproximar da realidade.

Ora se sabemos que o erro existe e qual é (mas entre duas margens: mínimo e máximo), cremos que o que há a fazer é só corrigi-lo usando (porque em direito sancionatório) a certeza do erro mínimo (porque cientificamente não é possível eliminá-lo).

Ao contrário do Ac. R.P. de 12/12/07 cit., cremos que o não uso do juízo científico do conhecimento público ínsito na Norma “NF X20701 da AFNOR” adoptada ao controlo metrológico, traduzir-se-ia em erro notório na apreciação da prova, face exactamente ao conhecimento do tribunal das margens de erro de medição que aqueles aparelhos permanentemente comportam (pois como emerge da portaria os aparelhos são aprovados tendo essa margem de erro – artº 4º e 10º), e independentemente de considerar como o faz o Ac. R.P. 19/12/07 www.dgsi.pt/jtrp Proc. 0746058 que “O tribunal não está vinculado, na apreciação da prova, ao resultado dos exames para detecção de álcool no sangue, não constituindo tais exames prova pericial.”

Por isso se nos afigura correcto, como o faz o Ac. R.G de 26/2/07 www.dgsi.pt/jtrp proc.2602/06-2 considerar que o Tribunal deve fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição (EMA: erro máximo admissível), por tal lhe permitir reduzir ao máximo o erro entre ao resultado do exame e a realidade, não constituindo em função do exposto óbice a existência ou não de norma legal (como se refere no Ac. R.P. de 14/3/07 www.dgsi.pt/jtrp proc. nº 0617247), posto que o juízo científico tenha subjacente o mesmo nível de conhecimento, que constitui a garantia da existência do erro.

Tal situação é neste momento igual á que ocorre com os aparelhos de controlo de velocidade (radar) em que a velocidade é calculada de acordo com o erro de medição do mesmo aparelho, resultado de idêntico juízo técnico-científico de controlo metrológico.

É que na verdade o crime (rectius infracção) resulta não do elemento (taxa) que o aparelho (meio ou instrumento) acusa (lê), (como se expressa a acusação), mas de o arguido conduzir um veículo com uma determinada taxa de álcool no sangue.

Assim se um juízo técnico científico, do conhecimento público, nos indica que determinado aparelho de medição tem uma margem de erro (que define) na análise do resultado do mesmo deve ser tido em conta esse erro, sob pena de erro notório na apreciação da prova”.

Ora tendo o Tribunal, ponderado a margem de erro do aparelho em resultado do juízo técnico de carácter público e por isso notório (não carecendo de alegação nem prova), e fixado que o arguido conduzia o veículo com uma taxa de alcoolemia de pelo menos 1,30 g/l, no sangue, não infringiu qualquer norma legal, passível de ver censurada a sua decisão.
III
Decisão

Acordam os Juízes nesta Relação em negar provimento ao recurso mantendo em consequência a decisão recorrida.
Sem tributação.

Porto, 07.05.08
Luís Dias André da Silva
Francisco Marcolino de Jesus
Ângelo Augusto Brandão Morais