Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0840948
Nº Convencional: JTRP00041224
Relator: ERNESTO NASCIMENTO
Descritores: CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
ALCOOLÉMIA
ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RP200804160840948
Data do Acordão: 04/16/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL.
Decisão: REENVIADO O PROCESSO.
Indicações Eventuais: LIVRO 308 - FLS. 64.
Área Temática: .
Sumário: Há erro notório na apreciação da prova se na sentença se dá como provado que o arguido apresentou uma taxa de álcool no sangue de 1,35 gramas/litro, que na contraprova apresentou uma taxa de álcool no sangue de 1,24 gramas/litro e, com base numa circular da Direcção-Geral de Viação, que conduzia com uma taxa de álcool no sangue de, pelo menos, 1,14 gramas/litro.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo 948/08-4
Relator - Ernesto Nascimento
Processo sumário ……/07.1GNPRT do …º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso.

Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

I. 1. No processo identificado supra em epígrafe, foi o arguido B………………., submetido a julgamento, pela prática de factos susceptíveis de integrar o tipo legal de crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º/1 e 69º/1 alínea a) C Penal, na sequência do que veio a final a ser absolvido.

I. 2. Inconformado, com o assim decidido recorreu o Digno Magistrado do MP., apresentando as seguintes conclusões:

1. o arguido declarou em audiência pretender confessar os factos que lhe eram imputados e, após o cumprimento do disposto no nº. 1 do artigo 344° do Código de Processo Penal, confessou integralmente e sem reservas tais factos;
2. por isso tendo sido dispensada a produção da prova relativa aos mesmos;
3. face àquela confissão integral e sem reservas por parte do arguido, nos termos e para os efeitos do disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 344° do Código de Processo Penal, dos factos que lhe eram imputados;
4. e não se verificando nenhuma das excepções previstas no nº. 3 do mesmo artigo;
5. estava o Tribunal obrigado a, em cumprimento do disposto na alínea a) do seu nº. 2, e para além e na decorrência da decidida dispensa da demais produção de prova a respeito;
6. dar como provados os - e todos os - factos que ao arguido vinham imputados;
7. ou seja, que nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na acusação conduzia o aludido veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de 1,24 g/litro, de forma livre, deliberada, consciente de infringir a lei, no intuito de conduzir na via pública tal veículo e bem sabendo que havia ingerido antes bebidas alcoólicas;
8. e, consequentemente, julgar procedente por provada a acusação deduzida e proferir decisão condenatória pela prática pelo arguido do crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 69°/1 alínea a) e 292°/1 C Penal, por que vinha acusado;
9. não o fazendo, não dando como provado que o arguido tivesse agido de forma livre, deliberada, consciente de infringir a lei;
10. dando como não provado que o arguido apresentasse "( .. .) uma TAS de 1,24 g/litro”;
11. considerando apenas provados, dos factos imputados, que no dia 29 de Setembro de 2007, pelas 18.14 horas, o arguido conduzia o referido veículo automóvel pela via pública;
12. que "(. . .) foi submetido ao teste de álcool expirado através do aparelho Drager Alcotest 7110 MK III P ( ...)”;
13. e que "(. .. ) sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas (. .. )" e que "( .. .) estava a conduzir um veículo nessas condições o que quis”;
14. e dando como provado que do "teste de álcool" supra referido resultou "(. . .) uma taxa de álcool no sangue de 1, 12 g/I, fruto de bebidas alcoólicas que, prévia e voluntariamente, tinha ingerido”;
15. violou a Meritíssima Juíza de Direito a quo o disposto nos referidos artigos 69°/1 a) e 292°/1 C Penal e 344°/2 a) C P Penal;
16. sendo certo que nos pontos 5 e 6 da Portaria 748/94, de 13/AGO/1994 referida na decisão recorrida, o Ministério da Indústria e Energia aprovou Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros "(. . .) destinados a medir a concentração de álcool por análise do ar alveolar expirado”;
17. estabelecendo que, para efeito das operações de controlo metrológico de tais instrumentos traduzidas na aprovação de modelo e primeira verificação, por um lado, e na verificação periódica, por outro, "(. . .) os erros máximos admissíveis ... são ( ... )", respectivamente e pela ordem indicada, "(, . .) os definidos pela norma NF X 20-701 (. .. )" e "(. .. ) uma vez e meia (. . .)" aqueles;
18. menos certo não é que no caso dos autos não está nem foi posta em causa a regularidade da aprovação ou a verificação do alcoolímetro em questão nem as condições da sua utilização nos procedimentos em análise, indicadas aliás no auto de notícia/acusação - cfr. artigo 389º/3 C P Penal;
19. o intérprete e aplicador da lei tem de presumir que o legislador, ao regular a matéria relativa à condução sob o efeito do álcool, conhecia todos os pressupostos das soluções adoptadas, incluindo os mecanismos de determinação das taxas relevantes para efeitos sancionatórios;
20. não podendo as orientações e determinações respeitantes aos procedimentos relativos à fiscalização do trânsito e à remessa ao Ministério Público, para os efeitos legalmente previstos, quanto a cada situação concreta, dos autos de notícia sobre situações de facto que, em face dos resultados obtidos através dos mecanismos legalmente previstos, sejam enquadráveis nas previsões dos artigos 291º ° e 292° C Penal;
21. prever, "contra legem", quaisquer margens de tolerância ou margens de erro relativamente aos resultados obtidos através dos mecanismos legalmente previstos, devendo a respeito ser recusadas quaisquer orientações ou instruções que não decorram da lei;
22. pelo que bem andou, assim, in casu, a GNR-BT ao, face ao facto de do teste de alcoolemia efectuado ao arguido através dos mecanismos para o efeito legalmente previstos ter resultado apurada a existência de uma TAS de 1,24 g/l;
23. dar cumprimento ao disposto nos artigos 254°/1 a), 255º/1 a), 256°, 381°/1 e 387°/2 C P Penal;
24. tendo sido igualmente correcta a verificada subsequente apresentação do arguido para julgamento em processo sumário, nos termos e para os efeitos das disposições conjugadas dos artigos 69°/1 a) e 292º/1 C Penal e 381°/1, 382°/2, 385° e 389º C P Penal;
25. a douta sentença recorrida deverá assim ser revogada e substituída por outra que, dando por integralmente provada a matéria de facto ao arguido imputada na acusação contra ele deduzida;
26. o condene pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 69°/1 a) e 292°/1 C Penal, por que vinha acusado.


I. 3. O arguido não respondeu.

II. Subidos os autos a este Tribunal o Exm. Sr. Procurador Geral Adjunto, aderindo à argumentação do recorrente, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

No cumprimento do estatuído no artigo 417º/2 C P Penal, nada mais foi acrescentado.

No exame preliminar decidiu-se que nada obstava à apreciação do mérito do recurso.

Foram os autos submetidos à conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

III. Fundamentação

III. 1. Como é por todos consabido, são as conclusões, resumo das razões do pedido, extraídas pelo recorrente, a partir da sua motivação, que define e delimita o objecto do recurso, artigo 412º/1 C P Penal.
No caso presente, na definição, concretização das questões colocadas para apreciação, dir-se-á que, se podem resumir a esta só:

saber se tendo o arguido acusado uma taxa de alcoolemia de 1,35 g/litro e efectuado o exame de contra prova, acusado uma TAS de 1,24 g/litro, pode (deve) o Tribunal fazer operar sobre este valor, qualquer elemento de correcção, designadamente com base numa circular pela D.G.V., que versa sobre as margens de erro legalmente admissíveis nos respectivos aparelhos de análise de quantidade.

III. 2. No processo, de relevante, consta o seguinte:

auto de notícia:
“o condutor quando conduzia o veículo na via pública, foi submetido ao controlo de alcoolemia e acusou a TAS de 1,35 g/l, pelo que requereu o exame de contraprova ao ar expirado, acusando a TAS de 1,24 g/l.
Ambos os testes foram efectuados no aparelho marca DRAGER, modelo Alcotest 7110 MK III P, séria ARPN-0062, aprovado pelo Despacho da DGV 12 594/2007 de 16.3.2007, publicado no DR nº. 118 – II série de 21.6.2007.
O teste inicial foi efectuado às 18.14 e o exame de a contraprova às 18.27 horas”;

Remetido o expediente ao MP, foi ali exarado o seguinte despacho, que consta de fls. 11:
“ 1. valida-se a constituição como arguido de B………………, nos termos do disposto no artigo 58º/3 C P Penal.
2. Remeta a juízo, para julgamento sob a forma de processo sumário do arguido B………………, melhor identificado no auto de notícia,
porquanto se verifica que, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas no auto de notícia, cujo teor se dá aqui por reproduzido, para os efeitos do artigo 389º/2 C P Penal, aquele conduzia, na via pública, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-RP, apresentando uma TAS de 1,24 g/l.
O arguido conhecia o seu estado e sabia que o mesmo não lhe permitia efectuar uma cuidada condução e prudente e lhe diminuía a capacidade de atenção, reacção e destreza, mas ainda assim, quis conduzir o veículo automóvel, o que efectivamente fez.
O arguido agiu livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta é punível por lei.
Constituiu-se, assim, o arguido autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 69º e 292º/1 C Penal.

3. Prova testemunhal:
o autuante, identificado no auto de notícia”.

Acta de audiência de julgamento:


(…)

pela Digna Magistrada do MP foi dito que substituía a apresentação da acusação pela leitura do auto de notícia de fls. 2, com o acrescento de fls. 11, quanto ao dolo e à consciência da ilicitude da conduta do arguido.

(…)

o arguido passou a prestar declarações, no decurso das quais declarou que de sua livre e espontânea vontade e sem qualquer coacção, deseja confessar os factos constantes no auto de notícia.
Perguntou-lhe então a Mma. Juiz se se propunha fazer uma confissão integral e sem reservas, explicando-lhe nos termos do nº. 1 e 2 do artigo 344º C P Penal, as consequências de tal decisão, ao que o arguido respondeu afirmativamente, passando a prestar declarações, confessando na íntegra e sem reservas os factos constantes da participação.
Seguidamente a Mma. Juiz atendendo à confissão integral e sem reservas do arguido, nos termos do artigo 344º/4 C P Penal, dispensou a restante prova testemunhal, dando de imediato apalavra para as alegações, após o que deu a oportunidade ao arguido de acrescentar algo mais em sua defesa, caso assim o entendesse.
Após a Mma. Juiz proferiu a seguinte sentença:

“(…)

FACTOS PROVADOS

1. No dia 29-9-2007, pelas 18.14 horas o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-RP, na A3, em Ervosa, Trofa.
2. O arguido foi submetido ao teste de álcool expirado através do aparelho Drager Alcotest 7110 MK III P tendo resultado uma taxa de álcool no sangue de 1,35 g/I, tendo requerido o exame de contraprova o qual foi realizado através do mesmo aparelho e do qual resultou a TAS de 1,24 g/I.
3. O arguido conduzia o supra referido veículo naquela ocasião e lugar com uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,14 g/I, deduzida já a taxa de erro máximo admissível à TAS de 1,24 g/I que resultou da contraprova, fruto de bebidas alcoólicas que, prévia e voluntariamente, tinha ingerido.
3. O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas, sabia que estava a conduzir um veículo nessas condições o que quis.
4. O arguido não tem antecedentes criminais.

FACTOS NÃO PROVADOS.

Inexistem.

Motivação da matéria de facto provada e não provada:

o arguido admitiu ter ingerido bebidas alcoólicas sabendo que não podia conduzir naquelas circunstâncias.
Manteve uma postura de colaboração com o tribunal.
Todavia, e compulsados os autos, podemos constatar que não foi aplicada, no caso concreto e antes dos mesmos serem distribuídos como processo sumário, a taxa de erro máximo admissível aplicável aos alcoolímetros por força de recomendação da Organização Internacional de Metrologia e na sequência da Portaria 748/94, de 13-8 - cfr. ponto 6, alíneas a) e c) da citada Portaria.
Tal taxa de erro na medição efectuada pelos alcoolímetros consta da Norma NF X 20-701 e fixa a percentagem de erro em 7,5% quando o alcoolímetro apresente uma TAS entre 0,92 g/I e 2,30 g/I.
Deduzindo tal percentagem à TAS apresentada no caso em apreço - 1,24 g/I - temos uma taxa corrigida de 1,14 g/I, a qual fica aquém da TAS exigida para a tipicidade legal penal.
Teve-se, ainda, em conta os doc.s e o crc junto aos autos.

3. O Direito aplicável:
3.1. Enquadramento jurídico-penal:
vem o arguido acusado, por factos susceptíveis de o constituírem como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. p. pelo art. 292°/1, C Penal.
É em face desta disposição legal e da matéria fáctica apurada que importa subsumir jurídico-penalmente a conduta do arguido.
Dispõe o referido art. 292°/1, C Penal que quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igualou superior a 1,2 g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
Ora, dos factos dados como demonstrados resulta como evidente que o arguido conduzia um veículo automóvel ligeiro de passageiros com uma taxa de álcool no sangue de 1,14 g/l.
Assim, podemos claramente concluir que não estão sequer preenchidos os elementos objectivos do tipo legal de crime em apreço por a TAS se mostrar inferior a 1,2 g/l, constituindo antes contra-ordenação.
Pelo exposto, impõe-se desde já, e sem mais delongas, proferir decisão absolutória do arguido.
4. Decisão:
Tudo visto e ponderado, atentas as disposições legais citadas e as considerações expendidas, decide-se julgar improcedente a acusação e, em consequência:
absolver o arguido B…………….. da imputada prática, em autoria material, de um crime de condução em estado de embriaguez p. p. pelo art. 292°/1 C Penal.
Sem custas.
Proceda-se ao depósito - art. 372°/5 C P Penal.
Notifique”.

III. 3. 1. Uma vez que a prova produzida em audiência não foi documentada (não se tendo atentado, porventura, na recente alteração, introduzida pela Lei 48/07 de 29.8, nessa matéria, com o desaparecimento da previsão contida anteriormente no nº. 2 do artigo 389º C P Penal), omissão que acarreta a nulidade do acto, vício, que no caso, no entanto, não é do conhecimento oficioso, cfr. artigos 119º e 120º C P Penal, pelo que há que a considerar sanada, donde, está este tribunal impedido de conhecer da matéria de facto, sem prejuízo, naturalmente, do conhecimento, oficioso, dos vícios que sobre ela se podem repercutir, contidos no artigo 410º/2 C P Penal.

III. 3. 2. A questão da confissão.
!A confissão é uma declaração de ciência (não uma declaração constitutiva, dispositiva ou negocial), pela qual uma pessoa reconhece a realidade de um facto que lhe é desfavorável (contra se pronuntiato). Reconduz-se a um testemunho (no sentido lato de declaração de ciência) qualificado pelo objecto (ser o testemunho contrário ao interesse do autor)”, cfr. Prof. Manuel de Andrade in Noções elementares de processo civil, 240/1.
Nos termos do disposto o artigo 344º/1, 2 alíneas a) e b) e 3 alíneas a), b) e c) C P Penal, a confissão livre, integral e sem reservas, referente a crime punível com pena de prisão até 5 anos, não havendo co-arguidos ou, havendo-os todos confessarem integralmente, se reserva se coerentemente, não suspeitando o tribunal do carácter livre da confissão, implica a renúncia à produção de prova relativamente aos factos imputados na acusação, que se considerarão provados e a consequente passagem, de imediato, às alegações orais e, se o arguido não dever ser absolvido, por outras razões, à determinação da sanção aplicável.
Isto, como corolário da noção de confissão estatuída no artigo 352º C Civil, “reconhecimento ... da realidade de um facto que é desfavorável”.
Esta confissão pode ser espontânea ou provocada.
Neste último caso, a forma de se obter a confissão, processual, é através do depoimento de parte, que, nos termos do artigo 554º/1 C P Civil só pode ter por objecto factos pessoas ou de que o depoente deva ter conhecimento.
Aceite pelo Tribunal aquela confissão, como prova plena e suficiente da matéria da acusação, não se pode depois considerar-se o contrário. Haverá que aplicar o Direito aos factos objecto da confissão, o que não implica necessariamente a condenação do confitente, pois que os factos podem não constituir crime ou existir uma qualquer questão prévia ou falta de um qualquer pressuposto processual, que levam, ou à sua absolvição ou mesmo, a uma mera decisão de forma, que não conheça do mérito.
No caso, cremos bem, não poder proceder a invocação da confissão, como pretende o recorrente, para fundamentar a viabilidade do recurso.
Com efeito, o facto nuclear e essencial, imputado ao arguido - e elemento constitutivo do tipo legal do artigo 292º/1 C Penal - é o de conduzir, na via pública, um veículo automóvel e, (tendo sido interveniente em acidente de viação) ser submetido ao controlo de alcoolemia e acusado uma TAS de 1,35 g/l, tendo requerido exame de contraprova, pelo método do ar expirado, acusando a TAS de 1,24 g/l.
O objecto da confissão no caso, é rigorosamente este - dada a exigência, co-natural e imanente à confissão, da pessoalidade dos factos – o facto de conduzir e ter sido submetido ao teste de pesquisa de álcool no sangue e ter acusado determinada taxa e depois na realização da contra-prova, por si pedida, ter acusado uma outra determinada taxa.
Não se pode, como pressupõe a tese sustentada pelo recorrente, ter como abrangido pela confissão, o facto de o arguido conduzir com determinada taxa, apenas e tão só, que submetido ao teste e depois ao exame de contra-prova, acusou determinadas taxas (esta é de resto a conformação dada aos factos, no auto de notícia).
Naturalmente que não faz parte, do conhecimento pessoal do arguido, nem a taxa de álcool no sangue, que, realmente, apresenta, constitui facto de que deva ter conhecimento (a controvérsia suscitada nos autos, é disso prova evidente).
Esta conclusão exige uma apreciação técnica e científica que se não compadece com a simples interiorização ou verbalização por parte do examinando, nem de outra qualquer pessoa, já agora.
Assim, nesta parte, não pode proceder a pretensão do recorrente, ao pretender que a confissão do arguido abranja, irremediável e irreversivelmente, a taxa de álcool que o mesmo apresente no momento em que estava a conduzir.

III. 3. 3. O artigo 292º/1 C Penal, dispõe que “quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”.
Por sua vez, o artigo 69º/1 C Penal dispõe que “é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido:
a) Por crime previsto nos artigos 291.º ou 292.º; (…)”

Inserido no capítulo do “procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool…”, dispõe o artigo 153º do Código da Estrada, sob a epígrafe “Fiscalização da condução sob influência de álcool”:
1 - O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.
2 - Se o resultado do exame previsto no número anterior for positivo, a autoridade ou o agente de autoridade deve notificar o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais dele decorrentes, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar todas as despesas originadas por esta contraprova no caso de resultado positivo.
3 - A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando:
a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado;
b) Análise de sangue.
4 – No caso de opção pelo novo exame previsto na alínea a) do número anterior, o examinando deve ser, de imediato, a ele sujeito e, se necessário, conduzido a local onde o referido exame possa ser efectuado.
5 – se o examinando preferir a realização de uma análise de sangue, deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a um estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito.
6 – o resultado da contraprova prevalece sobre o resultado do exame inicial.

Nos termos do artigo 158º 1 são fixados em Regulamento,
a) o tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool …
b) os métodos a utilizar para a determinação do doseamento de álcool.

Nos termos do artigo 125º C P Penal, “são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.
A encimar o capítulo “dos meios de obtenção de prova”, prevê o artigo 171º C P Penal, os exames, que no nº. 1, são configurados como meio de inspecção – que pode versar sobre pessoas, lugares e coisas - de vestígios que o criem possa ter deixado.
O exame no caso foi realizado por aparelho mecânico, tido como adequado ao fim em vista.
A prova obtida por meio de exame - na ausência de norma expressa - (como existe, para a prova pericial, artigo 163º, para os documentos autênticos e autenticados, artigo 169º e para a confissão integral e sem reservas do arguido, artigo 344º), é apreciada, nos termos definidos pelo artigo 127º, “segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.

No caso em concreto recorde-se julgou-se provado o seguinte:

1. no dia 29-9-2007, pelas 18.14 horas o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-RP, na A3, em Ervosa, Trofa (facto constante do auto de notícia);
2. foi submetido ao teste de álcool expirado através do aparelho Drager Alcotest 7110 MK III P tendo resultado uma taxa de álcool no sangue de 1,35 g/I, tendo requerido o exame de contraprova o qual foi realizado através do mesmo aparelho e do qual resultou a TAS de 1,24 g/I, (facto constante do auto de notícia) e,
3. conduzia o supra referido veículo naquela ocasião e lugar com uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,14 g/I, deduzida já a taxa de erro máximo admissível à TAS de 1,24 g/I que resultou da contraprova, fruto de bebidas alcoólicas que, prévia e voluntariamente, tinha ingerido (facto não constante do auto de notícia, nem da contestação, que não houve, nem da discussão da causa).

A propósito da fundamentação da formação da convicção e na análise crítica da prova, expendeu-se que:
todavia, e compulsados os autos, podemos constatar que não foi aplicada, no caso concreto e antes dos mesmos serem distribuídos como processo sumário, a taxa de erro máximo admissível aplicável aos alcoolímetros por força de recomendação da Organização Internacional de Metrologia e na sequência da Portaria 748/94, de 13-8 - cfr. ponto 6, alíneas a) e c) da citada Portaria.
Tal taxa de erro na medição efectuada pelos alcoolímetros consta da Norma NF X 20-701 e fixa a percentagem de erro em 7,5% quando o alcoolímetro apresente uma TAS entre 0,92 g/I e 2,30 g/I.
Deduzindo tal percentagem à TAS apresentada no caso em apreço - 1,24 g/I - temos uma taxa corrigida de 1,14 g/I, a qual fica aquém da TAS exigida para a tipicidade legal penal.
O tribunal, depois de declarar provados os valores do teste de alcoolemia, 1,35 g/litro e da contra prova, 1,24 g/litro, veio afirmar, ainda, como provado, que o “arguido conduzia o veículo, na ocasião, com uma TAS de pelo menos 1,14 g/litro, deduzida a taxa de erro máximo admissível a esta última”.

O que aqui está, verdadeiramente em causa é a pertinência da introdução na matéria de facto daquele último parágrafo e, bem assim, apreciar a adequação da motivação da matéria de facto para sustentar a divergência do julgador em relação ao que consta do auto de notícia e dos talões com ele juntos.

Cremos bem que, da simples leitura da decisão - por si só e sem recurso, sequer, às regra das experiência comum - mais concretamente da fundamentação de facto e ainda mais precisamente do elenco dos factos provados, se evidencia a existência de uma (manifesta) contradição entre a fundamentação.
A coexistência daqueles 3 factos na materialidade provada, evidencia, desde logo, a existência de “contradição insanável da fundamentação”, previsto no artigo 410º/2 alínea b) C P Penal.
Com efeito afirma-se e nega-se, ao mesmo tempo, uma coisa; emite-se um juízo com 2 proposições contraditórias, que não podem ser simultaneamente verdadeiras e falsas; pois que tendo o mesmo sujeito e o mesmo atributo, diferem na quantidade, cfr. Ac, STJ de 8.5.96, no processo 327/96, citado por Simas Santos, in Recursos, 6ª edição, 72.
Evidencia-se naquelas proposições uma oposição entre factos, que versando sobre a mesma realidade, mutuamente se excluem.
Nenhum elemento de prova foi produzido, nem na decisão recorrida dele se dá conta, que permitisse afirmar o que se afirma, no segundo segmento dos factos provados
Na decisão recorrida faz-se apelo, na fundamentação da formação da convicção, às declarações do arguido, (curiosamente ou talvez não, não se menciona, sequer, o facto de o mesmo ter confessado os factos de forma integral e sem reservas) e, nos documentos e crc. juntos aos autos.
De nenhum documento junto aos autos consta que a taxa de alcoolemia apresentada pelo arguido era de 1,14 g/litro, como se deu como provado.
O Tribunal na justificação para a realização desta operação de correcção da taxa de alcoolemia, socorreu-se das instruções veiculadas pela DGV., que expressamente invocou.
Cremos que a circular emitida pela DGV não pode consentir, permitir, se tenham extraído as conclusões que se extraíram na decisão recorrida.
Desde logo, por questões digamos, que formais, por não constituir fonte de direito, sendo que no processo penal vigor ao princípio da legalidade.
Os tribunais na administração da justiça e aplicação do Direito, estão sujeitos apenas e tão só, à Lei e às decisões dos tribunais superiores.
A emissão de circulares, directivas e instruções está mais vocacionada, como forma de comunicação entre órgãos da administração pública. De resto, no caso concreto, estamos perante uma recomendação do Director Geral de Viação dirigida ao Comandante da GNR, se bem que divulgada, aos Juízes, pelo CSM, com carácter, seguramente, apenas, informativo.
Depois, se assim não fosse, mais perceptivelmente, por razões de ordem material, ligados ao conteúdo da circular.
Aqui se fala da possibilidade de existência de margens de erro na medição do álcool no sangue, pelo método do ar expirado.
Ora, é pressuposto que se os mesmos aparelhos podem registar valores errados, o erro tanto pode ocorrer, por defeito, como por excesso e, assim sendo, deveriam todos eles, constar do respectivo auto.
Obviamente que estamos a falar de máquinas.
Máquinas de medição, como o radar. Como a balança.
Máquinas que têm que ser rigorosa e periodicamente aferidas e, por entidades idóneas, oficiais, por forma, a que se não obtenham resultados adulterados.
No caso os testes, inicial e a contraprova, foram realizados através do alcoolímetro "DRAGER", modelo "ALCOTESTE 7110 MK III P", série nº. ARPN-0062 aprovado por Despacho da DGV nº. 12 594/2007 de 16.3.2007, publicado no DR- II série, nº. 118 de 21.6.2007.
O quadro regulamentar existente, de acordo com os princípios gerais do controlo metrológico, visa proporcionar a garantia do Estado de os aparelhos funcionam adequadamente para os fins respectivos e as respectivas indicações são suficientemente rigorosas para a determinação dos valores legalmente estabelecidos.
A sua comprovação, para todos os efeitos legais, faz-se pela aposição dos símbolos do controlo metrológico, nomeadamente pelo da Aprovação de Modelo e o da verificação anual válida, em cada aparelho submetido ao controlo metrológico, garantindo a sua inviolabilidade.
Dado estarmos perante máquinas, existe sempre a possibilidade de erro no resultado.
No entanto os apontados valores limite, de erro admissível, para mais e para menos, apenas representam valores convencionais, traduzidos em tabelas gerais e abstractas e não representam valores reais de erro, numa qualquer concreta medição, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra.
Isto é uma coisa e um plano de discussão das coisas, que não pode, nem deve ser olvidado.
Outro, é o de que sem qualquer fundamento sério, sem que a questão seja suscitada, alvitrada, sugerida, sequer, se aplique qualquer coeficiente de correcção a valores apresentados, resultantes das ditas operações de pesquisa de álcool, de controlo de velocidade, ou de pesagem.
A chamada de atenção, feita pela DGV, para a existência desta possibilidade, (presente, desde sempre, como é evidente, na mente de todos, dado a forma mecânica da sua medição) se bem que geradora da confusão a que vimos assistindo, será susceptível de justificar - como se vem assistindo em diversos autos - com a sua consideração no momento da fiscalização e a inclusão do facto, no respectivo auto de notícia.
Mas não nos termos contidos na circular, pois que esta faz referência que o auto de notícia dever conter, a par da TAS registada, aquela que resulta da dedução do erro máximo previsto.
Porquê apenas se deve ponderar a margem de erro máximo?
A margem de erro (reportada a qualquer acto de medição/quantificação) tanto pode oscilar, para mais, como para menos.
A orientação da DGV, para cumprir cabalmente a sua função de alerta, deveria fazer referência, igualmente, à necessidade de indicação da taxa máxima de álcool possível.

No entanto, esta preocupação de rigor, evidenciada pela DGV, está já salvaguardada, pois que o próprio ordenamento jurídico, prevê a possibilidade de o examinando, no caso de resultado positivo, requerer a realização de contraprova, ou através de novo exame ou através de análise de sangue.
No que ao caso interessa, o arguido não concordando, com o resultado inicialmente apresentado, exerceu o seu legítimo direito de ser submetido à contra prova.
Fê-lo, por sua opção, pelo mesmo método, ao fim de 13 minutos, no mesmo aparelho (nada o impede) e o resultado, desceu em 0,11 g/litro, o que é consentâneo, com o consabido gradual decréscimo, por processo de metabolização levado a cabo pelo organismo, daquele valor, com o decurso do tempo, após determinado período depois da ingestão do álcool.
No caso concreto, o resultado inicial de 1,35 g/litro, converteu-se no resultado de 1,24 g/litro dado pela contra prova, valor que prevalece, como vimos já sobre o resultado inicial.
Que mais garantia de fiabilidade se pode exigir?
O examinando podia, como forma de controlar a fiabilidade do método de controlo e medição do álcool no sangue, assim obtendo dados mais convincentes, requerer a realização de contraprova, por 1 de 2 métodos. Foi o que fez, optando pelo mesmo método, através do qual se realizou o exame inicial.
Nada permite concluir que o examinando se não tenha conformado com o resultado da contraprova, que a lei diz que deve prevalecer sobre o do resultado inicial.
Não tem qualquer justificação fazer-se operar agora, ainda sobre este resultado, uma qualquer margem máxima de erro, por forma, a, se fazer degradar, ainda mais o resultado.
Não pode depois da realização da contraprova, sem que se tenha suscitado a existência de qualquer irregularidade na realização dos exames, nem dúvida sobre os seus resultados, fazer-se operar, de forma automática qualquer operação de correcção.
Qualquer discussão dos factos – atinente ao resultado concreto da contraprova, no caso – só pode ser feita, agora, em sede de julgamento, onde o arguido, tem a oportunidade de questionar este último resultado, invocando, porventura, a possibilidade de existência de erro, tal como defende a DGV, disso se valendo para, eventualmente, criar um sentimento de dúvida no espírito do julgador.
Não o fazendo também aqui, aceitando, até por confissão, como se verificou no caso dos autos – ainda que, como dissemos já em relação ao resultado do exame, não tanto em relação à realidade da TAS que tinha, mas que, fundada e razoavelmente, se pode converter aquela nesta, se nada houver que coloque em causa a fiabilidade do resultado da contraprova - os factos que lhe foram imputados, o tribunal não pode deixar de decidir de acordo com a prova que foi produzida, condenando o arguido pela prática do respectivo crime.
Ao não decidir dessa forma, o tribunal estará sempre a fazer relevar factos que não foram discutidos em julgamento, e, consequentemente, que não poderão ser considerados provados.
O arguido requereu a contraprova, por, naturalmente discordar, do valor apresentado pelo exame inicial.
Com base neste valor foi submetido a julgamento, sem que aparentemente, tenha reincidido na discordância.
Perante esta situação de facto, era imposto que tivesse sido condenado, com base no resultado da contra prova.
Se o arguido na audiência tivesse persistido na discordância, naturalmente com viabilidade e fundamento, vg. alegando, no limite, que nenhuma bebida alcoólica tinha ingerido e que por isso teria havido erro, por manipulação ou por deficiente funcionamento do aparelho, o tribunal teria que decidir, colocado perante esta situação, porventura limite, recorrendo a todo um leque de prova suplementar, que se lhe apresentasse como necessária.
Isto equivale por dizer que o examinado não está indefeso, perante a máquina.
Não está condenado à partida.
Não tem é que ser absolvido e tratado com favor, como assumidamente fala a dita circular, quando a situação o não justifica, de todo.

Em resumo, a circular apenas pode ser entendida, como uma chamada de atenção, julgada necessária, porventura pela prática e experiências, diárias na matéria.
Qualquer exame, efectuado por máquinas ou, mesmo por meios humanos, comporta uma margem de erro, em valor tido como razoavelmente admissível.
Porventura seria mais correcto, mais preciso e mais rigoroso, enquadrar na apresentação do resultado, essa mesma realidade, com a indicação do intervalo – tão reduzido quanto possível - de segurança, para mais e para menos, tanto mais importante, quanto menos elevados forem os valores absolutos em confronto.
A questão da determinação concreta do valor, elemento essencial, maxime, nos casos fronteira, seria remetida para o momento do julgamento, aquele onde, afinal, se decide a matéria de facto, campo, por excelência para fazer operar - quando, verificados os respectivos pressupostos - o princípio in dubio pro reo.

Agora o que não assume qualquer justificação, em ordem à prossecução e defesa de qualquer interesse legítimo, é no caso de realização de contraprova, ainda assim, se entender, para mais sem que alguém o colocasse em causa, que este resultado não merece credibilidade, entendimento, que foi sufragado no caso concreto.
As regras da experiência o não consentem.

Uma vez que na decisão recorrida se faz apelo na fundamentação, à circular da DGV, com base na qual se considerou provado o último segmento da matéria de facto, que já consideramos absolutamente incompatível com os restantes, cremos que da mesma forma se pode considerar estarmos, no caso, perante uma situação de erro notório na apreciação da prova, previsto, na alínea c) do nº. 2 do artigo 410º C P Penal.
O erro notório na apreciação da prova é a falha grosseira e ostensiva na análise da prova, perceptível pelo cidadão comum, denunciadora de que se deram provados factos inconciliáveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, seja, que foram provados factos incompatíveis entre si ou as conclusões são ilógicas ou inaceitáveis ou que se retirou de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável.
O erro é notório quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada – que no caso não ocorre - ou das leges artis.
Afirmar-se, com efeito, que o arguido apresentou uma TAS de 1, 35 g/litro e que na contra prova apresentou uma TAS de 1.24 g/litro e que conduzia com um TAS de pelo menos 1,14 g/litro, bem evidencia estarmos perante uma situação de erro notório na apreciação da prova, estruturada na aplicação, leitura e interpretação que se fez da apontada circular da DGV, elemento de prova, porventura não analisado em audiência e que por força do disposto no artigo 355º/1 C P Penal não podia ser valorado, isto porque cremos que ninguém irá tão longe no sentido de conceder a tal circular o estatuto ou a qualificação de matéria de direito do conhecimento oficioso do Tribunal.
A questão da circular e, no que ao caso mais interessa da matéria sobre a qual versa foi introduzida nos autos, apenas na sentença, pois que até esse momento nada, nem ninguém, colocou em causa a fiabilidade do resultado da contraprova.
Com efeito, cremos que se a divergência não fundamentada da convicção do julgador relativamente ao juízo contido no parecer dos peritos, artigo 163º/2 C P Penal, consubstancia um erro notório na apreciação da prova, cfr. Ac. STJ de 18.11.98, no proc. 615/98, não pode deixar de se entender que a discordância do valor apresentado no exame de contraprova ao teste de pesquisa de álcool no sangue, apenas e tão só com base na ponderação da margem admissível de erro do aparelho, que a DGV recordou, poder existir, sem que ninguém no decurso do processo, até à sentença, a tenha suscitado, não pode, deixar, da mesma forma de configurar caso de erro notório na apreciação da prova.

Assim, está condenado a proceder, ainda que parcialmente, o recurso, na sequência da verificação dos 2 apontados vícios previstos nas alíneas a) e c) do nº. 2 do artigo 410º C P Penal, pelo que, não sendo possível decidir da causa, se ordena o reenvio do processo para novo julgamento, relativamente à totalidade do objecto do processo, nos termos do artigo 426º/1 e 426º-A 1 e 2 C P Penal.

IV. Dispositivo

Nestes termos e com os fundamentos mencionados, na procedência parcial do recurso apresentado pelo MP, acorda-se em ordenar o reenvio do processo para novo julgamento.

Sem tributação.

Elaborado em computador. Revisto pelo Relator, o 1º signatário.

Porto, 16 de Abril de 2008
Ernesto de Jesus de Deus Nascimento
Olga Maria dos Santos Maurício