Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00038060 | ||
| Relator: | FERREIRA DA COSTA | ||
| Descritores: | PROCESSO LABORAL EXECUÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP200505090447047 | ||
| Data do Acordão: | 05/09/2005 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | PROVIDO. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O regime processual previsto no Código de Processo do Trabalho (artigos 89º e 90º) é exaustivo, não contendo qualquer lacuna a preencher pelo regime previsto nos artigos 810º e 811º do Cód. Proc. Civil. II - Não pode manter-se, por isso, o despacho que indeferiu liminarmente um requerimento executivo, com o fundamento de não ter sido dado cumprimento ao disposto no artigo 810, n.º 2 e 3 do C.P.C., isto é, não ter sido apresentado o modelo aprovado pelo Dec. Lei 200/2003, de 10 de Setembro. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B.........., por apenso à acção com processo comum em que é A. e R. C.........., veio deduzir execução de sentença, ao abrigo do disposto no Art.º 89.º do Cód. Proc. do Trabalho, apresentado o respectivo requerimento, por já ter decorrido o prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da sentença e pedindo a final a penhora de todos os móveis. Pelo douto despacho de fls. 6, o Sr. Juiz a quo recusou liminarmente a petição de execução, atento o disposto na alínea a) do n.º 1 do Art.º 811.º do Cód. Proc. Civil. Inconformada com o assim decidido, veio a exequente interpor recurso de apelação (sic), tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1. O presente recurso foi interposto do douto despacho de 11/10/2004, que indeferiu liminarmente a petição de execução. 2. Apesar de não ter sido notificada pela secretaria judicial para o efeito, a ora recorrente, com vista a evitar mais delongas, em 28 de Setembro de 2004, deu entrada de requerimento executivo inicial, nomeando à penhora o recheio das instalações da sociedade Executada. 3. O requerimento inicial executivo foi indeferido por não ter sido dado cumprimento ao disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 810.º do C.P.C., ou seja, por não ter sido apresentado no modelo aprovado no Decreto-Lei n.º 200/2003, de 10 de Setembro. 4. Ora, salvo o devido respeito, o normativo legal invocado no douto despacho aqui em crise não se aplica ao processo de trabalho, pois que o Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, não procede a qualquer alteração das regras do processo executivo, no âmbito do processo de trabalho. 5. Com efeito, pode ler-se nos n.ºs 1 e 2 do artigo 89.º do C.P.T., o seguinte: Nº 1 - "...a secretaria, sem precedência de despacho, notifica o credor para nomear à penhora bens do devedor necessários para solver a dívida e as custas...". Nº 2 - "A execução inicia-se com a nomeação de bens à penhora ou com o requerimento previsto no n.º 2 do artigo seguinte.". 6. Por outro lado, prescreve ainda o n.º 2 do artigo 90.º (que também não sofreu qualquer alteração com a reforma da acção executiva - que apenas alterou os seus n.ºs 4 e 5) que "Sempre que o exequente justificadamente alegue dificuldade na identificação ou localização de bens suficientes para pagamento do crédito e das custas, mas esteja convencido da sua existência, pode, dentro do prazo fixado no número anterior, requerer ao tribunal que proceda à realização das diligências adequadas.". 7. É inequívoco que a execução em processo de trabalho pode iniciar-se com um mero requerimento de nomeação de bens à penhora ou de solicitação de diligências adequadas à identificação e localização de bens penhoráveis (cfr. Carlos Alegre, C.P.T. Anotado, 6º Edição, 2004, pág. 244). 8. Por força do disposto no artigo 1.º do Cód. Proc. do Trabalho, apenas nos casos omissos se aplicará ao processo de trabalho a legislação processual comum, sendo que as normas subsidiárias apenas se aplicarão quando não incompatíveis com a índole do processo regulado nesse Código. 9. Acresce ainda que diversas individualidades com reconhecida intervenção e responsabilidade na elaboração do projecto de reforma da acção executiva, como sendo o Ilustre Prof. Lebre de Freitas e o Exmº Senhor Deputado António Montalvão Machado, se têm pronunciado publicamente no sentido de que, na ausência de alterações ao processo de trabalho, nomeadamente no tocante aos artigos supra citados, outra conclusão não se pode retirar que não a da inaplicabilidade deste novo regime às execuções de sentenças proferidas em processos de trabalho. 10. Finalmente, importará referir que a generalidade dos Juízos do próprio Tribunal a quo e, bem assim, do resto do país, têm seguido igual posição, aceitando, sem reservas, os requerimentos de execução, nos moldes previstos nos artigos 89.º, n.ºs 1 e 2 e 90.º, n.º 2, ambos do Cód. Proc. do Trabalho. 11. O douto despacho recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação, entre outros, o disposto nos artigos 1.º, 89.º, n.ºs 1 e 2 e 90.º, n.º 2, todos do Cód. Proc. do Trabalho. O Tribunal a quo recebeu o recurso como agravo. A Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que o recurso merece provimento. Recebido o recurso como agravo, foram colhidos os vistos legais. Cumpre decidir. Estão provados os factos acima referidos em relatório. O Direito. Sendo pelas conclusões do recorrente que se delimita o âmbito do recurso [Cfr. Abílio Neto, in Código de Processo Civil Anotado, 2003, pág. 972 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 359, págs. 522 a 531], atento o disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 1.º, n.º 2, alínea a) do Cód. Proc. do Trabalho, a única questão a decidir neste agravo consiste em saber se, com a reforma do processo executivo comum, se mantém, no foro laboral, a execução oficiosa. Vejamos. Como acima se referiu, pelo douto despacho de fls. 6, o Sr. Juiz a quo recusou liminarmente a petição de execução, atento o disposto na alínea a) do n.º 1 do Art.º 811.º do Cód. Proc. Civil. Tal normativo estabelece que a secretaria recusa receber o requerimento quando não conste do modelo ou omita algum dos requisitos impostos pelo n.º 3 do artigo 810.º, sendo certo que o n.º 2 deste artigo dispõe que o requerimento executivo consta de modelo aprovado por decreto-lei. Por seu turno, estatuem os n.ºs 1 e 2 do Art.º 89.º do Cód. Proc. do Trabalho, nomeadamente: 1 - "Decorridos 10 dias sobre o trânsito em julgado da sentença de condenação em quantia certa ou o prazo que, por motivo justificado, for fixado pelo juiz na sentença, a secretaria, sem precedência de despacho, notifica o credor para nomear à penhora bens do devedor necessários para solver a dívida e as custas... 2 - A execução inicia-se com a nomeação de bens à penhora ou com o requerimento previsto no n.º 2 do artigo seguinte. Por outro lado, prescrevem os n.ºs 2 e 4 do artigo 90.º do mesmo diploma: 2 - Sempre que o exequente justificadamente alegue séria dificuldade na identificação ou localização de bens suficientes para pagamento do crédito e das custas, mas esteja convencido da sua existência, pode, dentro do prazo fixado no número anterior, requerer ao tribunal que proceda à realização das diligências adequadas. 4 - Tratando-se de direitos irrenunciáveis, se o autor não fizer a nomeação de bens no prazo fixado, o tribunal, oficiosamente, observará o disposto no n.º 2. Estas normas, salvo questão de pormenor [Dada a introdução das novas tecnologias nos tribunais, foi acrescentada apenas a seguinte expressão nos n.ºs 4 e 5 do Art.º 90.º do Cód. Proc. do Trabalho: … e é ordenada a menção desse facto no registo informático de execuções previsto no Código de Processo Civil … tendente a registar o facto de não serem encontrados bens no caso de se tratar de direitos irrenunciáveis ou o facto de o exequente não ter nomeado bens à penhora ou não ter requerido que o tribunal procedesse a averiguações, tendentes à sua descoberta, no caso de direitos renunciáveis], irrelevante para a questão em debate, não sofreram qualquer alteração com a reforma da acção executiva. Tal significa que no foro laboral se mantém a execução oficiosa, a qual se inicia com a notificação do exequente, efectuada oficiosamente pela secretaria, para nomear bens à penhora, sendo certo que ele pode requerer ao tribunal que proceda a diligências com vista à descoberta de bens penhoráveis e, tratando-se de direitos irrenunciáveis, e se o credor nenhuns indicar, o tribunal oficiosamente procede a diligências tendentes à descoberta de bens do devedor. Tal disciplina, avessa ao princípio do dispositivo, traduz uma das mais profundas e ousadas alterações consagradas pelo Cód. Proc. do Trabalho de 1963 [Cfr. Alberto Leite Ferreira, in CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO ANOTADO, 1989, pág. 387], em cujo preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45.497, de 1963-12-30, que o aprovou, se pode ler: 8. Execuçãa oficiosa - Outra alteração importante do código é a que se refere à execução oficiosa a que se procede, independentemente de despacho do juiz, se, passado um mês sobre o trânsito em julgado da sentença, esta não tiver sido cumprida. Justifica-se tal providência porque normalmente as sentenças condenatórias dos tribunais do trabalha dizem respeito a salários ou indemnizações devidas a trabalhadores, aqueles e estas quase sempre com uma natureza que muito os aproxima dos alimentos. Pretende-se, por esse modo, que o trabalhador, que tem tantas vezes dificuldades em vir ao tribunal do trabalho, veja executada a sentença sem os prejuízos de tempo que até aqui se verificavam, tempo que, para ele, significa normalmente salário. Considera-se ainda que essa execução oficiosa e quase automática da sentença contribui para a paz social, pondo fim ao conflito em breve prazo e não agravando a posição do trabalhador perante a entidade patronal, com a instauração, por ele trabalhador, de um processo executivo em si mesmo odioso. Ora, sendo a execução laboral dominada pelos princípios do inquisitório e da oficiosidade, está dispensado o obrigatório impulso processual do credor, pois a secretaria é quem tem de formular o convite para que aquele nomeie bens à penhora ou, desconhecendo-os, requeira a realização de diligências com vista à sua descoberta; mais, se se tratar de direitos indisponíveis e se o credor ficar inactivo apesar do convite, age o próprio tribunal, oficiosamente, fazendo averiguações tendentes à descoberta de bens do devedor. Mas, sendo assim, não se aplica à execução laboral as normas constantes dos Art.ºs 810.º e 811.º, ambos do Cód. Proc. Civil, pois não há caso omisso - cfr. o disposto no Art.º 1.º, n.º 2, corpo, do Cód. Proc. do Trabalho. Na verdade, os Art.ºs 89.º e segs., deste diploma, disciplinam toda a matéria deste tipo de execução - execução baseada em sentença de condenação em quantia certa - pelo que, sendo a regulamentação completa, não tem casos omissos para serem preenchidos pelo processo comum. [Cfr., na doutrina, Isabel Alexandre, in A execução laboral à luz da reforma da acção executiva, Revista do Ministério Público, Ano 25, n.º 100, págs. 71 a 102, Paula Costa e Silva, in A Reforma da Acção Executiva, 3.ª edição, 2003, págs. 43 e segs., Albino Mendes Baptista, in CÓDIGO DO PROCESSO DO TRABALHO ANOTADO, 2000, págs. 180 a 183, Carlos Alegre, in CÓDIGO DO PROCESSO DO TRABALHO ANOTADO, 2.ª edição, 1987, págs. 128 a 132, António José Moreira, in CÓDIGO DO PROCESSO DO TRABALHO ANOTADO, 1987, págs. 113 a 115 e Carlos Francisco de Oliveira Lopes do Rego, in Comentários ao Código de Processo Civil, Volume II, 2.ª edição, 2004, págs. 23 a 28. Cfr., na jurisprudência, os Acórdãos da Relação de Lisboa de 1986-05-28 e de 1993-02-18, in Colectânea de Jurisprudência, respectivamente, Ano XI-1986, Tomo III, págs. 179 e 180 e Ano XVIII-1993, Tomo I, págs. 191 a 193]. Daí que o despacho impugnado não possa subsistir, pois recorreu à disciplina do processo comum, como se o processo do trabalho contivesse qualquer lacuna para preencher nesta sede - execução baseada em sentença de condenação em quantia certa - quando tal, pelas razões expostas, não ocorre. Decisão. Termos em que, no provimento do agravo, se acorda em revogar o douto despacho recorrido que se substitui por outro em que se ordena que o Tribunal a quo receba o requerimento executivo e proceda à penhora dos bens aí nomeados, seguindo-se os ulteriores termos. Custas pela executada. Porto, 9 de Maio de 2005 Manuel Joaquim Ferreira da Costa Domingos José de Morais António José Fernandes Isidoro |