Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0523469
Nº Convencional: JTRP00038269
Relator: CÂNDIDO DE LEMOS
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
CADUCIDADE
Nº do Documento: RP200507070523469
Data do Acordão: 07/07/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA A DECISÃO.
Área Temática: .
Sumário: I - O tribunal comum é o competente para conhecer da caducidade da declaração de utilidade pública da expropriação.
II - À gestão desta caducidade é aplicável a lei nova e não a lei da DUP.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

Para o -.º Juízo do Tribunal Judicial de..... foram remetidos os presentes autos de expropriação urgente litigiosa em que é expropriante E. P.- Estradas de Portugal, E. P. E. e expropriados B..... e outros, com os sinais dos autos, relativo à parcela n.º7, atinente à execução da obra dos acessos de..... ao IP4 - Variante à EN.. e à EN.. (1.ª fase), a destacar de um prédio rústico de maiores dimensões, sito no lugar de....., freguesia de...., ....., inscrito na matriz predial respectiva sob o n.º 593 e descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 00169/030889.
A DUP (Declaração e Utilidade Pública) foi publicada no DR, II série de 5 de Maio de 1998.
Por ofício de 9 de Março de 1999 foram pedidos os Árbitros ao Presidente desta Relação, os quais foram comunicados por carta recebida pelo expropriante a 16 de Março de 1999.
Os expropriados foram notificados da designação dos árbitros no dia 2 de Janeiro de 2001.
Procedeu-se à vistoria ad perpetuam rei memoriam e arbitragem, tendo o Tribunal proferido despacho de adjudicação da parcela à expropriante e do depósito de dinheiro aos expropriados.
Do Acórdão Arbitral recorrem expropriante e expropriados.
Estes, nas suas alegações suscitam a excepção de caducidade da declaração de utilidade pública.
Os autos prosseguiram os seus trâmites legais, com as diligências obrigatórias e inquirição de testemunhas, tendo as partes produzido as suas alegações.
Conclusos os autos para sentença final, é proferida decisão em que, para além do mais, julga procedente por provada a arguida excepção de caducidade, declarando caduca a declaração de utilidade pública de expropriação da parcela em causa.

Inconformada a expropriante apresenta este recurso de apelação e nas suas alegações formula as seguintes conclusões:
1.ª- Estamos perante matéria para a qual não são competentes os tribunais comuns, tendo o julgador excedido os seus limites de competência.
2.ª- A DUP assume a natureza de acto administrativo, acto materialmente administrativo diga-se, impugnável contenciosamente ex vi o n.º 4 do art. 268.º da CRP, criando-se com a sua declaração uma relação jurídica administrativa com os expropriados, enquanto sujeitos do processo expropriativo.
3.ª- Traduzida em verdadeiro acto administrativo que é, visa a produção de determinados efeitos jurídicos, sendo que, por efeito desta, o proprietário do bem expropriado fica vinculado ao dever de o transferir mediante indemnização, para a entidade expropriante, a favor de quem a declaração é feita; e, portanto, cessou, para ele, o direito de livre disposição que é característico do proprietário.
4.ª- Porque na base da constituição desta relação jurídica está um acto administrativo, susceptível de recurso sob a alegação dos vícios dos actos definitivos e executórios da Administração, não compete aos tribunais comuns conhecer nem apreciar da validade/nulidade nem caducidade da DUP, mas sim aos tribunais administrativos e fiscais (cfr. Ac STJ de 17.06.66 in BMJ n.º 158; Ac STA de 13.01.56 in O Direito n.º 89 e Ac RL de 18.02.88 in CJ Ano XIII, tomo 1).
5.ª- Assim sendo, e na esteira do Ac RL de 18.10.94, in CJ Ano IX, Tomo IV, os tribunais comuns não têm competência em razão da matéria para apreciar a própria DUP, sendo como tal, incompetentes para conhecer da questão da sua eventual caducidade.
6.ª- Aos tribunais comuns assiste em exclusivo a competência material para, após adjudicada a propriedade – o que foi feito nos presentes autos sem que tivesse sido aposta nenhuma reserva pelo julgador, nem contestação pelos expropriados, sendo que é o despacho de adjudicação que informa da legalidade sobre a transferência de propriedade que pelo mesmo se opera – decidir sobre a indemnização.
7.ª- De onde que, e em primeiro lugar, a resolução dos litígios resultantes das relações jurídicas administrativas e fiscais integra hoje uma reserva constitucional de competência material criada a favor dos tribunais administrativos e fiscais (cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, Coimbra, 1993, p. 815) -- desde já se invocando a inconstitucionalidade de qualquer decisão que venha a ser proferida e contrarie tal dispositivo legal -- e, em segundo lugar, o julgamento de um litígio emergente de uma relação jurídica administrativa ou fiscal não pode ser feito por qualquer outro tribunal, senão pelos tribunais administrativos/fiscais, sob pena de estarmos perante um vício de incompetência absoluta do tribunal e inconstitucionalidade da própria decisão judicial.
8.ª- Aos tribunais comuns está reservada por decreto-lei (art. 51.º do anterior Código das Expropriações) – a própria redacção do n.º 3 do art. 214.º da CRP não exclui a possibilidade casual e devidamente ponderada de manter nos tribunais judiciais a possibilidade casual e devidamente ponderada de manter nos tribunais judiciais a competência para julgar questões de direito administrativo --, a resolução do conflito entre os interesses dos sujeitos envolvidos na fixação do valor global da indemnização.
9.ª- Lê-se no Ac TC 96/746/2 de 29.05.96, publicado no DR II, 205 de 04.09.96 que “Tendo o processo de expropriação litigiosa por objecto a dirimição de um conflito entre expropriante e expropriado acerca da indemnização devida, sendo a justa indemnização a conversão ou sucedâneo do direito de propriedade extinto em consequência da expropriação, e estando vedada à jurisdição administrativa a dirimição dos litígios relativos a direitos reais, de natureza privada, bem se compreende que a lei retire à jurisdição administrativa competência para o arbitramento de tal indemnização, confiando-a aos tribunais judiciais”.
10.ª- De onde que, quando estamos perante uma relação jurídica administrativa, atenta a reserva material de jurisdição dos tribunais administrativos, apenas poderão os tribunais judiciais conhecer dos conflitos para os quais exista uma atribuição expressa de competência.
11.ª- Por conseguinte, e ainda porque se aplica ao presente processo a lei vigente à data da publicação da DUP, ao tribunal judicial estava reservado o conhecimento do conflito sobre o valor indemnizatório.
12.ª- Resultando, como tal, também por esta razão, a incompetência material deste tribunal para conhecer da questão da caducidade ou não da DUP, devendo o tribunal comum abster-se de conhecer da matéria.
13.ª- A segunda questão que pretende o recorrente ver reapreciada por esse Vem. Tribunal respeita à sucessão no tempo de dois regimes diferentes relativos à caducidade da presente DUP -- art. 10.º do CE/91 e art. 13.º do CE/99 --.
14.ª- A data da publicação da DUP releva para determinar quais os normativos aplicáveis sobre os critérios de avaliação dos terrenos expropriados: nessa medida, mesmo que se houvesse por materialmente competente o tribunal comum, o n.º 3 do Art.º 10.º do CE/91 não teria aplicabilidade no presente caso.
15.ª- Pela própria razão de ser do instituto da caducidade, este só tem cabimento nas situações em que não se procedeu à construção da obra imbuída de interesse público e portanto, só quando não se constrói o aludido empreendimento é que haverá que sancionar os atrasos da entidade expropriante, nomeadamente com a caducidade do acto declarativo de utilidade pública, a qual, pelos vistos, deixou de existir, ou pelo menos, perdeu actualidade e fundamento.
16.ª- Já quando o empreendimento é construído, resulta pública e notória a utilidade pública que foi declarada, perdendo virtualidade a caducidade da mesma, esvaziando-se, como tal, de conteúdo.
17.ª- Este entendimento que já vinha sendo defendido pela doutrina, foi devidamente aclarado no novo CE, o qual no n.º 7 do art. 13.º refere que, tratando-se de obra contínua, a caducidade não pode ser invocada depois daquela ter sido iniciada em qualquer local do respectivo traçado, apenas deixando esta excepção de operar se os trabalhos forem suspensos ou estiverem interrompidos por prazo não superior a três anos, caso em que a caducidade volta a poder ser invocada.
18.ª- Só quando a obra não se constrói é que a utilidade pública pode caducar, sendo a sua declaração um acto executório da mesma, razão pela qual só faz sentido falar de caducidade de DUP relativa a obras que não se realizaram.
19.ª- Este não é seguramente o caso dos autos, já que do conhecimento público que não só a obra se construiu como se encontra em devido funcionamento.
20.ª- Além disso, a caducidade é matéria que deve ser analisada à luz da lei nova, e como tal, construído que está o empreendimento em causa, não pode ser declarada a sua caducidade.
21.ª- Além disso, e ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, mesmo que se houvesse por caducada a DUP, entende o recorrente que, de acordo com o regime aplicável, após nova declaração de utilidade pública, se aproveita todo o processado já praticado respeitante à determinação da indemnização, sem prejuízo do disposto no art. 23.º, sendo que a caducidade terá como efeito imediato e exclusivo uma actualização da indemnização nos termos do art. 23.º.
22.ª- Interposto que foi recurso de arbitragem por parte dos expropriados, sempre teria aplicabilidade o aludido art. 23.º, pelo que uma eventual declaração de caducidade da DUP não teria qualquer efeito útil material nem procedimental.
23.ª- A reposição da legalidade que se possa pretender alcançar com uma nova DUP, é meramente aparente, podendo conduzir a resultados verdadeiramente horripilantes como sejam os de permitir que seja declarada a utilidade pública de um bocado de estrada para a construção dessa mesma estrada de que já é proprietário o beneficiário da expropriação, como seria o caso dos autos: construído que foi o empreendimento, não é possível declarar a utilidade pública dos terrenos necessários à sua construção.
24.ª- Foi neste sentido que evoluiu o pensamento do legislador na esteira daquele que vinha já sendo o entendimento da nossa melhor doutrina, e é esse que se pugna seja o entendimento desse Ven. Tribunal ad quem.
25.ª- Além disso, veja-se que o julgador apenas conheceu da caducidade em sede se sentença final: proferiu despacho de adjudicação de propriedade, permitiu que o processo seguisse os seus termos para efeitos de determinação do valor indemnizatório, e apenas conheceu da caducidade em sede de sentença.
26.ª- O despacho de adjudicação de propriedade transitou em julgado, tratando-se de decisão que constituiu caso julgado formal no processo, pelo que não é em sede de sentença final que se possa atender à excepção de caducidade.
27.ª- O recurso de arbitragem é um recurso da decisão arbitral sobre os valores indemnizatórios, não é a sede própria para invocar irregularidades do processo administrativo: a caducidade da declaração de utilidade pública deveria ter sido invocada antes do trânsito em julgado do despacho de adjudicação de propriedade, e não em sede de recurso de arbitragem conforme foi feito pelos expropriados.
28.ª- “Se o bem expropriado já foi adjudicado à expropriante já não pode ter lugar a caducidade e apenas poderá haver lugar à reversão se se verificarem os pressupostos” Ac TRP com o n.º de processo 9650386 in www.dgsi.pt.
29ª- Além disso, mesmo que assim se não entendesse e se houvesse por atempadamente arguida a caducidade da DUP, o que se não concede e se admite por mero efeito de raciocínio, impunha-se ao julgador que de imediato, tratando-se como se trata de questão incidental, suspendesse a instância e conhecesse da arguição que foi feita, não permitindo que o processo prosseguisse os seus termos, nomeadamente com a produção de actos por um lado inúteis – realização da avaliação – e por outro lado, altamente dispendiosos – custo da peritagem – “Suscitada pelo expropriado a questão da caducidade é justificado o despacho que ordena a suspensão da instância”, in www.dgsi.pt
30.ª- Pelo que, também por esta razão se entende que não pode ser conhecida em sede de sentença para fixação do valor da indemnização a caducidade de uma DUP arguida em sede de recurso de arbitragem.
31.ª- Mesmo na esteira do raciocínio do tribunal a quo, nunca a DUP poderia ter-se por caducada pelo decurso do tempo.
32.ª- Entendeu aquele Tribunal que (sic) “Caducou, efectivamente, a declaração de utilidade pública pela não constituição da arbitragem no prazo de um ano como invocaram os expropriados”.
33.ª- São os seguintes os dados cronológicos que interessam para a apreciação da causa:
    • Publicação da DUP – 05 de Maio de 1998
    • Pedido de árbitros os TRP – 09 de Março de 1999
    • Data da recepção no expropriante da designação dos árbitros pelo TRP – 16 de Março de 1999, informação constante da relação dos árbitros designados junta aos autos com o processo expropriativo administrativo
34.ª- De onde que, a promoção da arbitragem iniciou-se 9 meses após a publicação da DUP, não tendo a DUP caducado pelo motivo invocado na decisão recorrida: a caducidade da declaração de utilidade pública prevista na 1.ª parte do n.º 3 do art. 10.º respeita à promoção da constituição da arbitragem, ou seja, respeita à não constituição do colégio arbitral e não à falta de notificação aos expropriados dessa constituição, no aludido prazo de um ano (cfr. Ac RP de 20.10.88, in CJ Ano XIII, Tomo V, p.194, pelo que não se verificam os pressupostos da caducidade invocada.
Pugna pela procedência do recurso devendo, em consequência, anular-se a decisão proferida que decidiu julgar caducada a declaração de utilidade pública da parcela expropriada objecto dos presentes autos.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Os factos com interesse para a decisão são os que resultam do antecedente relatório, sendo que não vem postos em causa.
Para melhor compreensão, aqui se deixa o seu resumo:
-a) A 5 de Maio de 1998 é publicada a DUP em causa nos autos.
-b) A 9 de Março de 1999 é pedida ao Tribunal da Relação a nomeação de peritos.
-c) A 16 de Março de 1999 recebe a expropriante essa comunicação.
-d) A 2 de Janeiro de 2001 a expropriante notifica os expropriados da designação dos árbitros.
-e) É decidia a procedência da caducidade por se entender que “nessa data há muito que havia decorrido o prazo de um ano estabelecido no art. 10.º n.º3 do CExp/91”.
-f) A obra (acessos de Baião ao IP4) encontra-se concluída e em uso público.
Cumpre agora conhecer do objecto do recurso, delimitado como está pelas conclusões das respectivas alegações (arts. 684.º n.º3 e 690.º n.º1 do CPC).
São-nos colocadas duas questões:
- Competência material do Tribunal; e
- Aplicação da lei nova (bem como a existência da caducidade à face da lei antiga.
*
Entende a apelante que só o Tribunal Administrativo tem competência para conhecer da caducidade da declaração de utilidade pública, limitando-se a competência do tribunal comum a conhecer do valor da indemnização.
Pese embora o facto da existência de decisões nesse sentido, sobretudo na Relação de Lisboa, não é esse o entendimento maioritário desta Relação e dos signatários desta decisão. (Ac. da RP de 24/10/2000 Processo 1057/2000-2ª Secção).
A declaração de utilidade pública é o facto constitutivo da relação de expropriação, ou seja, o acto constitutivo da expropriação reside no acto declarativo de utilidade pública (cfr. Marcelo Caetano, Estudos de Direito Administrativo, pág. 182, e Fernando Alves Correia, As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, págs. 110 e 178).
As expropriações têm lugar através de um acto administrativo – o acto declarativo de utilidade pública sendo permitido ao expropriado impugnar a sua legalidade por via contenciosa – pois está sujeito ao recurso contencioso da anulação, como acto administrativo que é.
E, para tal efeito, é inequívoco que só os tribunais administrativos são os competentes.
Mas o que aqui está em causa é apenas o conhecimento da caducidade da declaração de utilidade pública.
Não estará este, porém, incluído na jurisdição dos tribunais administrativos, cabendo aos tribunais comuns. Como escreve Osvaldo Gomes [Expropriações por Utilidade Pública, pág. 355] “ao conhecer da caducidade do acto declarativo o tribunal comum não está a apreciar a validade intrínseca ou a eficácia inicial ou deferida de um acto administrativo, mas a declarar as consequências da verificação de um factor externo e posterior – o decurso do prazo previsto no artigo 10º n.º3 do C.E. de 91.
Deste modo (...) ao fazê-lo não conhecem da validade intrínseca, nem da eficácia inicial ou deferida da declaração de utilidade pública, limitando-se a reconhecer uma causa extintiva dos seus efeitos.”
Esta posição tem sido seguida, de modo maioritário, pela nossa jurisprudência [cfr., para além dos acórdãos citados, por Osvaldo Gomes, obra citada, págs. 354 e 355, os da RL de 9.5.91, no BMJ 407, 612, da RC de 20.9.94, no BMJ, 439, 661 e da RL de 12.6.96, CJ, tomo III, 112 e mais recentemente nos acórdãos desta secção proferidos nos agravos n.ºs 803/ 2000, de 8.6. 2000, n.º 807/2000 de 21.6.2000 n.º 872/2000, de 8.6.2000].
De notar que o actual Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18.9, expressamente dispõe, no seu artigo 13º n.º 4, que “a declaração de caducidade pode ser requerida pelo expropriado ou por qualquer outro interessado no tribunal competente para conhecer do recurso da decisão arbitral (...).
Ora, apesar de este diploma não ser, em princípio, aplicável, atenta a data de declaração de utilidade pública, é defensável que estamos perante norma interpretativa e, por isso, sujeita ao regime do artigo 13º n.º1 do Código Civil.
É, pois, de concluir que o tribunal comum é competente em razão da matéria para declarar a caducidade de uma declaração de utilidade pública.
Não está em apreço, pois, o conteúdo da relação jurídico-administrativa (incluindo qualquer litígio emergente da mesma).
Há apenas uma constatação judicial (comprovação) em acção comum do facto jurídico strictu sensu – o decurso do tempo –. O juiz não declara a caducidade do acto, limita-se a constatá-lo – cfr. Aníbal de Castro, in “A Caducidade”, pág. 218. O acto declarativo extingue-se, por decorrido o tempo previsto para a produção dos seus efeitos (cfr. Marcelo Caetano, Manual do Direito Administrativo, 1, 9 ed., pág. 506).
O tribunal não julga da legalidade do acto. É um caso normal de extinção do acto. Assim, não estando em caso a apreciação da ilegalidade do acto declarativo de expropriação por utilidade pública os tribunais comuns são competentes para conhecer da caducidade do mesmo.
Improcede esta primeira questão.
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DA CADUCIDADE.
Conclusos os autos para ser proferida sentença fixando a indemnização (art. 64.º n.º1 do C. Exp/91), surge o conhecimento das excepções que haviam sido alegadas aquando das alegações dos recursos da decisão arbitral, declarando-se a caducidade da declaração de utilidade pública por se ter entendido que a notificação aos expropriados pela expropriante da designação dos árbitros [art. 45.º, a)], efectuada a 2 de Janeiro de 2001, o foi para além do prazo fixado no art. 10.º n.º3 (não tiver promovido a constituição de arbitragem no prazo de um ano a contar da DUP).
Insurge-se a expropriante contra o assim decidido, pugnando pela improcedência da excepção invocada.
Com inteira razão, a nosso ver e por várias razões.
Em primeiro lugar quanto à lei aplicável.
Porque a DUP é de 5 de Maio de 1998, entendeu-se ser aqui aplicável o Código das Expropriações aprovado pelo D L n.º 438/91 de 9 de Novembro.
Consta do sumário do Ac. RP de 6/5/96 Proc. 386/96- 5ª Secção na base de dados da DGSI:
“I - O regime legal aplicável à expropriação por utilidade pública é o vigente à data da respectiva declaração.
II - A questão da caducidade, sendo de natureza substantiva deve, no entanto, ser regulada pela lei nova porque não está relacionada com a concreta expropriação que teve lugar, mas reporta-se ao conteúdo da relação de caducidade quando o expropriado se dispunha a invocá-la.
III - Na expropriação, a caducidade reporta-se ao processo expropriativo na fase que antecede a transferência, quer suscitando a questão perante o tribunal, quer face à administração e como sanção para a morosidade do processo expropriativo.
IV - Se o bem expropriado já foi adjudicado à expropriante já não pode ter lugar a caducidade e apenas poderá haver lugar à reversão se se verificarem os pressupostos.”
O princípio da caducidade aplica-se às anteriores declarações de utilidade pública de expropriações pendentes, porque: a) O prazo de caducidade justifica-se pela necessidade de limitar os efeitos negativos provocados ao titular dos bens expropriados pelo protelamento do início de tais actos. b) A necessidade de os limitar verifica-se tanto em relação às expropriações futuras como às passadas. c) A regra que estabelece a caducidade regula directamente o conteúdo da situação do expropriado, abstraindo dos factos que lhe deram origem.
É doutrina aceite que as leis que alteram prazos são de aplicação imediata – cfr. Rodrigues Bastos, Notas ao C.P.Civil, Vol. II, pág. 59).
A Lei nº 168/99, de 18.9, entrou em vigor em 17.11.99 (art. 4º do Dec. Preambular), é a aqui aplicável, quanto às questões processuais e à questão dos autos, designadamente o seu art. 13.º n.º3.
Em segundo lugar, a lei fala de “promover a constituição da arbitragem”. Esta compete efectivamente à expropriante (art.42.º), podendo em determinadas condições passar para o juiz de direito.
A primeira coisa que aquela terá de fazer será a solicitação ao Presidente do Tribunal da Relação da designação de três árbitros.
Recebida a nomeação, no prazo de dez dias deverá a expropriante proceder à notificação da designação dos árbitros aos interessados.
Temos que a expropriante promoveu a constituição da arbitragem dentro do prazo de um ano, a contar da data da publicação da DUP. Nove meses depois.
O que não foi cumprido foi o prazo para a notificação aos expropriados, mas tal não se confunde com a não constituição do colégio arbitral (Ac. RP de 20/10/1988,CJ Ano XIII, T4, 194).
Em terceiro lugar, face ao disposto nos arts. 5.º n.º3 e 13.º n.º7 da Lei 168/99 e à conclusão da obra, já posta à disposição do público, não se falando em suspensão ou interrupção da mesma, não haverá lugar à caducidade.
Tratando-se de uma via pública, não fazia qualquer sentido voltar ao domínio privado um pequeno troço da mesma ou voltar a parcela a ter a utilidade anterior. Pela própria razão de ser da caducidade, como afirma a expropriante.
Temos, pois, como certa a improcedência da excepção de caducidade suscitada pelos expropriados.

DECISÃO:
Nestes termos se decide julgar totalmente procedente a presente apelação, revogando-se a decisão sobre a caducidade da DUP, declarando-se improcedente a excepção em causa e prosseguindo os autos para fixação da indemnização a pagar aos expropriados.
Custas pelos apelados/expropriados.
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PORTO,07 de Julho de 2005
Cândido Pelágio Castro de Lemos
Armindo Costa
Alberto de Jesus Sobrinho