Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0623032
Nº Convencional: JTRP00040713
Relator: MARIA EIRÓ
Descritores: TRIBUNAL ARBITRAL
INDEMNIZAÇÃO
LIQUIDAÇÃO
COMPETÊNCIA
Nº do Documento: RP200710230623032
Data do Acordão: 10/23/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 254 - FLS 244.
Área Temática: .
Sumário: I - Tendo sido clausulado que era cometido a tribunal arbitral o litígio sobre a existência, validade e eficácia do contrato onde está inserida a cláusula compromissória, deve concluir-se que a questão respeitante à indemnização por incumprimento também está abrangida por essa cláusula.
II - Tendo sido proferida por tribunal arbitral decisão a condenar uma das partes na quantia que se vier a apurar em incidente de liquidação, não pode o tribunal comum, onde veio a ser requerida a liquidação, declarar-se incompetente, atribuindo a competência ao tribunal arbitral, por tal excepção (preterição do tribunal arbitral) não ser de conhecimento oficioso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto
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B………., Lda apresentou petição inicial à Câmara de Comercio e Industria do Porto, Centro de arbitragem Comercial das Câmaras de Comercio e Industria de Lisboa e do Porto contra C………., pedindo que:
Seja declarado o incumprimento definitivo da obrigação de C………. de compra do capital do capital social da D………., Lda e do crédito da demandante de suprimentos sobre a mesma sociedade, pelo preço total de € 985.843,51;
Seja declarada valida a resolução declarada na carta da demandante, ………, de 04/07/2003;
Condenação do demandado na indemnização devida ao demandante pelos danos emergentes e lucros cessantes resultantes do comportamento do demandado, a determinar de acordo com o disposto na cláusula 11ª do contrato de 23 de Julho de 2001.
O demandado na contestação C………. sustenta que os pedidos sejam declarados improcedentes e em reconvenção pede que o demandante "B………., Lda" seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.500.000 a titulo de responsabilidade contratual de acordo com a clausula 11º do contrato acrescido de juros à taxa legal contados da notificação do presente articulado à contraparte.

Constituído oportunamente o tribunal arbitral, foi proferida decisão nos seguintes termos:
a) Julgar não provada e improcedente o pedido formulado pela demandante B………., Lda, dele absolvendo o demandado, Eng. C……….;
b) Julgar provado e procedente o pedido reconvencional formulado pelo demandado e, em consequência, condenar a demandante reconvinda a pagar àquele a quantia que se vier a apurar, em incidente de liquidação, como correspondente aos danos que sofreu como resultado do descrito comportamento culposo da demandante.
Com vista a liquidar este pedido o requerente C………. instaurou nas Varas Cíveis do Porto processo que denominou de "incidente de liquidação prévio à execução instaurada na sequência do processo declarativo de Arbitragem Ad-Hoc que correu termos pelo Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Industria do Porto sob o n° "……….".
Este tribunal conforme se vê de fls.22 que se tratava de um incidente de liquidação na pendência da acção executiva da competência dos juízos de execução e remeteu o processo a este tribunal.
O tribunal de execução entendeu por seu turno não ser competente, dado que o incidente de liquidação deve correr termos no processo onde foi proferida condenação genérica.
O tribunal de execução indeferiu liminarmente o requerimento inicial.
Desta decisão interpôs recurso de agravo, o recorrente C………., concluindo nas suas alegações:
a) As partes aqui intervenientes acordaram em submeter ao foro arbitral a resolução de questões emergentes do contrato com sinais nos Autos.
b) Ao abrigo da cláusula compromissória, constituiu-se o Tribunal Arbitral "Ad-Hoc", foram produzidos os articulados e realizada a prova,
c) e em resultado da resposta aos quesitos o Tribunal entendeu que se tinha verificado o dano, embora sem possibilidade de proceder à quantificação da indemnização dele emergente.
d) Assim, não tendo sido possível quantificar o dano, a jurisdição estadual retoma a sua competência para fixar o quantum do dano que, por ausência de elementos, o Tribunal Arbitral não conseguiu fixar.
e) Se as partes pretendessem IGUALMENTE a liquidação por via arbitral, tê-lo-iam contratualmente afirmado, aceitando o sistema jurídico esta solução.
f) Ao não elegerem esta solução para dirimir conflitos, os contratantes - aqui litigantes - sujeitaram-se ao regime regra da jurisdição estadual.
g) Entendimento contrário constituiria uma verdadeira denegação da justiça, dado que o Tribunal Arbitral não poderia já intervir nos termos do art. 25° da LAV, e à jurisdição estadual estaria vedada a possibilidade de realizar o Direito emergente de uma sentença que o declarou, sendo este entendimento violador do artigo 20° n.º 1 da CRP.
h) Assim, com a notificação do depósito da decisão extingue-se o poder jurisdicional dos árbitros (art. 25° da LAV), reforçado com o art. 26° do mesmo diploma, por considerá-la transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário (a que as partes renunciaram) e exequível nos mesmos termos que a sentença do Tribunal Judicial de 1º Instância.
i) Por outro lado, os árbitros estão sujeitos a um prazo para a decisão (supletivamente de 6 meses prorrogável até ao dobro da sua duração inicial - art. 19° 113 da LAV),
j) sendo certo que a convenção de arbitragem deixa de produzir efeitos, recuperando o Tribunal Judicial a sua competência normal.
k) salvo quando não tenha decorrido o prazo para a decisão - que já decorreu - ou as partes acordem em atribuir aos árbitros (aos do Tribunal inicial ou a Terceiros) o poder de julgar da liquidação da obrigação (que não atribuíram) cabe ao Tribunal Judicial o exercício de tal competência.
1) O Tribunal competente para proceder à liquidação da indemnização é o Tribunal Judicial.
PARALELAMENTE,
m) O Incidente da Liquidação deve ser preliminar à acção executiva.
n) Ainda que assim não se entendesse, tal pretenso vício não determinaria o erro na forma do processo, mas a falta de um pressuposto processual,
o) sanável pelo recorrente, a convite do Tribunal, mediante a apresentação de acção executiva em falta.
p) Assim, mesmo a admitir tal entendimento, o juízo deveria ter proferido despacho de convite de aperfeiçoamento, nos termos dos artigos 508º n.º 1 a) e 234°-A n.º 1 CPC.
q) A decisão recorrida violou os artigos 20° n.º 1 CRP, 48°, 378°, 380°-A, 805° n.º 5, 564° n.º 2, 565°, 508° n.º 1 a), 234°-A, todos do CPC, e 19° e 25° da Lei de Arbitragem Voluntária.
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Balizado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações a questão a decidir traduz-se no seguinte:
Remetido o processo ao tribunal de execução para liquidação de uma condenação genérica proferida em sentença arbitral, poderá este tribunal estadual conhecer oficiosamente da competência do tribunal arbitral, ou seja da preterição do tribunal arbitral;
Terá o tribunal arbitral competência para proceder à liquidação das suas decisões de condenação genérica?
No caso de condenação genérica em sentença proferida em tribunal arbitral qual o tribunal estadual competente - tribunal comum ou tribunal de execução ­e qual o processo próprio?
O RECURSO.
De acordo com o art. 1 ° da Lei de Arbitragem Voluntária n° 31/86, de 29 de Agosto “desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, qualquer litígio que não respeite a direitos indisponíveis pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros”.
Os tribunais arbitrais voluntários assentam na autonomia, sendo instituições de natureza privada, não se encontrando integrados na estrutura dos tribunais judiciais.
Do preceito supra referido decorre que é essencial a manifestação de vontade actual de constituição de um tribunal arbitral para a decisão de um litígio.
Celebrada a convenção de arbitragem está excluída a jurisdição dos tribunais estaduais.
E, foi o que aconteceu no caso dos autos, como dos mesmos resulta.

Foi celebrado entre E………, SA, C………., B………., Lda e outros, um contrato titulado pelo documento escrito constante do processo arbitral apenso.
Neste contrato (cfr. fls.19 dos autos referidos) as partes clausularam, no art.1 nº1 - LEI APLICAVEL E ARBITRAGEM - que “no caso de litigio ou disputa quanto à existência, validade, eficácia, interpretação, aplicação ou integração do presente contrato, os contraentes diligenciarão, por todos os meios de dialogo e modos de composição de interesses, obter uma solução concertada de interesses”.
E, no n° 2 “Quando não for possível uma solução amigável e negociada, nos termos previstos no número anterior, qualquer um dos contraentes poderá, a todo o momento, recorrer a arbitragem.
Da análise desta cláusula concluímos que as partes celebraram uma convenção de arbitragem na modalidade de cláusula compromissória já que teve por objecto “litígios eventuais emergentes de uma determinada relação jurídica contratual...” - art. 1° nº 2 parte final do diploma em análise -, diferente do compromisso que tem por objecto um litigio actual.
A cláusula compromissória é parte integrante de certo contrato, mas não sofre as vicissitudes deste, ou seja do contrato principal, cfr. art .21°, 2 da LAV.
A convenção de arbitragem consiste em facultar às partes a constituição de um tribunal arbitral competente para o julgamento de litígios nela previstos. Cria um direito potestativo, a que corresponde uma vinculação da outra parte, em constituir o tribunal arbitral (neste sentido, Raul Ventura in ROA, ano 46).
Posteriormente, B………., Lda apresentou petição inicial à Câmara de Comercio e Industria do Porto, Centro de arbitragem Comercial das Câmaras de Comercio e Industria de Lisboa e do Porto contra C………., pedindo que:
Seja declarado o incumprimento definitivo da obrigação de C………. de compra do capital do capital social da D………., Lda e do crédito da demandante de suprimentos sobre a mesma sociedade, pelo preço total de € 985.843,51;
Seja declarada valida a resolução declarada na carta da demandante, ………., de 04/07/2003;
Condenação do demandado na indemnização devida ao demandante pelos danos emergentes e lucros cessantes resultantes do comportamento do demandado, a determinar de acordo com o disposto na cláusula 11ª do contrato de 23 de Julho de 2001.
O demandado na contestação C………. sustenta que os pedidos sejam declarados improcedentes e em reconvenção pede que o demandante "B………., Lda" seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.500.000 a titulo de responsabilidade contratual de acordo com a clausula 11ª do contrato acrescido de juros à taxa legal contados da notificação do presente articulado à contraparte.
Constituído oportunamente o tribunal arbitral, foi proferida decisão nos seguintes termos:
c) Julgar não provada e improcedente o pedido formulado pela demandante B………., Lda, dele absolvendo o demandado, Eng. C……….;
d) Julgar provado e procedente o pedido reconvencional formulado pelo demandado e, em consequência, condenar a demandante reconvinda a pagar àquele a quantia que se vier a apurar, em incidente de liquidação, como correspondente aos danos que sofreu como resultado do descrito comportamento culposo da demandante.

Com vista a liquidar este pedido o requerente C………. instaurou nas Varas Cíveis do Porto processo que denominou de "incidente de liquidação prévio à execução instaurada na sequência do processo declarativo de Arbitragem Ad-Hoc que correu termos pelo Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Industria do Porto sob o nº “……….”.
Convém referir, aliás, como é conhecido, que em caso de condenação genérica, de acordo com os arts. 661°, nº2 do CPC, 565°e 566° nº3 do CPC, resulta que só é possível deixar para liquidação a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora de existência comprovada, não existem elementos indispensáveis para fixar o seu quantitativo, nem sequer recorrendo à equidade. Essencial é que esteja provada a existência de danos.
Os tribunais onde deu entrada esta acção pronunciaram-se em sede de competência - a vara cível declarou-se incompetente atribuiu competência aos juízos de execução remetendo-lhe o processo.
O tribunal de execução considerou competente o tribunal arbitral, dado que a liquidação deveria correr termos na acção que correu neste tribunal (fazendo analogia com as normas do CPC, nesta matéria previstas nos arts 380. e sgts.).
Suscita - se no caso dos autos uma dupla questão: competência do tribunal (estadual ou arbitral) e forma de processo a seguir.
Deverá a liquidação ser efectivada através de acção a intentar no tribunal judicial, que obviamente tem carácter declarativo?
Em processo executivo, como decidiu a vara cível?
Ou na própria processo arbitral, como se entendeu no tribunal de execução renovando-se a instancia arbitral?
A lei não prevê expressamente este caso sendo por isso omissa.
A questão que se coloca é saber quais os meios que as partes devem lançar mão.
Poderá ser competente para o presente litígio, ou seja para a liquidação requerida, o tribunal arbitral?
Creio que deverá analisar-se a convenção de arbitragem para se saber qual a possibilidade legal de a liquidação poder ser submetida ao tribunal arbitral.
Importa que se tenha em consideração a natureza e o fundamento da convenção de arbitragem e dos direitos e vinculações dela resultantes, o seu conteúdo e os seus efeitos, a extinção e/ou o seu efeito para o litigio.
A fonte abstracta dos tribunais arbitrais é a lei, sendo a fonte concreta a convenção das partes.
Esta convenção sugere uma manifestação concordante de vontades, sendo-lhe aplicada as regras gerais do contrato (cfr. Raul Ventura, ROA - ano 46, pág.298).
Visando a convenção providenciar sobre os meios de solucionar os litígios, para saber se o presente litigio foi cometido aos tribunais arbitrais temos que ter presente o texto da própria convenção.
A declaração vale com o sentido que um declarante normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele; sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida-art.236° do CC.
Tendo sido clausulado que era cometido a tribunal arbitral a existência, validade e eficácia do contrato onde está inserida a cláusula compromissória, temos de concluir que o litígio respeitante à indemnização por incumprimento, também está abrangido por esta cláusula.
E neste também está incluído a liquidação da indemnização.
O tribunal arbitral constitui-se para a resolução de um litígio e extingue-­se com o proferimento da decisão final - cfr. art.25° da LAV, esgotamento do poder jurisdicional dos árbitros - corresponde ao art.666° nº 1 do CPC.
Este tribunal arbitral desagregou-se. Será ainda possível recorrer à jurisdição arbitral? Ou ficou sem efeito a cláusula compromissória designadamente pelo decurso do prazo nos termos do art. 4° c) da LAV?
Esgotado o prazo fixado pelas partes ou supletivamente determinado pela lei sem ter sido proferida decisão arbitral o compromisso caduca, se como é o caso a clausula compromissória fica sem efeito (art.4°, nºl c) LAV) podendo os árbitros que injustificadamente tenha obstado à tomada de decisão arbitral dentro do prazo responder pelos danos causados (art.19° nº5 LAV).
Se assim acontecer as partes devem recorrer ao tribunal estadual.
No caso sub júdice estamos perante um litígio novo que não resulta de uma nova relação jurídica, mas apenas uma vicissitude da mesma relação jurídica, por isso abrangida pela convenção de arbitragem.
Trata-se de um outro litigio como vicissitude do 1º.
A convenção de arbitragem celebrada pelas partes, é valida e atribui às partes a constituição de um tribunal arbitral competente para o julgamento de litígios nela previstos no qual se inclui a liquidação.
Confere-se competência exclusiva ao tribunal arbitral para liquidação do pedido em condenação genérica.
Cremos que não se extravasam os limites impostos pela convenção.
Antes os limites da convenção impostos pela convenção estão respeitados.
Vemos que as partes expressamente convencionaram a arbitragem inexistindo fundamento para a ela não recorrer.
Aliás trata-se de competência declarativa própria dos tribunais arbitrais, que são desprovidos de competência executiva incluindo das suas próprias decisões, como se infere do art. 30° da LAV.
Estamos numa hipótese de um processo dirigido ao mérito do litígio proposta no tribunal estadual sem ter sido iniciado o processo arbitral - litígio que não é inarbitrável, art. 1 LAV.
Quid júris?
O meio técnico para garantir a eficácia da convenção é a excepção de preterição do tribunal arbitral que vai neutralizar a jurisdição estadual.
Excepção que, todavia, não é de conhecimento oficioso, art. 494º h) e 495° do CPC.
Se o requerido não a arguir a causa continua no tribunal estadual.
Esta excepção não foi arguida, não podendo por isso ser conhecida.
Não podia, pois, o tribunal de execução declarar-se incompetente, como o fez.
Qual a forma de processo correspondente a este pedido de liquidação? A decisão arbitral é um acto jurisdicional.
A lei 31/86 sujeitou esta matéria ao princípio da equiparação total entre a decisão arbitral e a decisão judicial, conforme resulta do seu art. 26º.
O legislador atribui natureza idêntica aos dois tipos de decisões.
A decisão arbitral transitada em julgado, ou seja, logo que não seja susceptível de recurso ordinário, tem a mesma força executiva que a decisão dos tribunais comuns (art.48º, nº2 do CPC).
Nela poderá fundar-se acção executiva.
Esta acção correrá necessariamente perante os tribunais judiciais, um vez que nos termos do art. 30° do diploma em analise o tribunal arbitral não competência executiva.
As condições de exequibilidade das decisões judiciais encontram-se enunciadas no art. 47° do CPC: as decisões judiciais são exequíveis uma vez transitadas em julgado ou dependentes de recurso com efeito meramente devolutivo.
Tendo havido condenação genérica nos termos do nº2 do art. 661° do CPC, e não dependendo a liquidação de simples cálculo aritmético, a sentença só constitui título executivo após a liquidação no processo declarativo - art.47° nº5 do CPC.
Isto significa que esta decisão não constitui título executivo face ao disposto no art. 47° nº 5 do CPC introduzido pelo DL 38/2003 de 8/3, e por isso com base nela não pode fundar-se execução.
Entendemos que o art.805º nº 4 do CPC na expressão "não sendo o titulo executivo uma sentença" não abrange a sentença do tribunal arbitral, por ser desprovida de exequibilidade, e por isso a liquidação não pode fazer-se no processo executivo.
Se a acção tivesse corrido termos no tribunal judicial com sentença a condenar no que se viesse a liquidar o meio próprio é o incidente de liquidação regulamentado no art.378° n° 2 e 805° do CPC, que corre no próprio processo considerando-se renovada a instancia.
No caso em apreço a acção própria só pode ser a acção comum de declaração, dada a inexistência de forma de processo específica para o caso - cfr. art 462° do CPC.
As varas cíveis onde este processo foi intentado declaram-se incompetentes para o seu conhecimento, e por seu turno, competentes os juízos de execução.
Esta decisão transitou em julgado.
Nos juízos de execução considerou - se que o processo deveria correr no próprio processo arbitral sendo a competência do tribunal arbitral.
Foi desta decisão que foi interposto recurso, não havendo, por isso conflito nos termos do que dispõe o art. 155° do CPC.
Já vimos que com a prolação da decisão ficam esgotados os poderes jurisdicionais dos árbitros, apenas para aquele concreto litigio.
Já vimos que o incidente de liquidação tem carácter declarativo e está abrangido pela convenção de arbitragem e, por tanto da competência do tribunal arbitral.
Sendo um litígio diferente do inicial, a clausula compromissória não ficou sem efeito pelo decurso do prazo, prazo que respeita apenas ao litígio efectivamente dirimido, e cujo tribunal se extinguiu desagregando-se.
Já vimos também que a excepção de tribunal arbitral como sanção pela inobservância da competência arbitral não pode ser conhecida oficiosamente.
Não podia pois o tribunal comum, neste caso de execução, declarar-se incompetente como o fez, atribuindo competência ao tribunal arbitral e indeferindo liminarmente o requerimento inicial.
Acresce que, e de acordo com o princípio consagrado no art. 21º n° 1 LAV, o tribunal arbitral tem competência (e só ele a tem, até à prolação da decisão sobre o fundo da causa, por força do art. 21° nº 4 da LAV) para decidir se é ou não competente - é a designada competência da competência.
Aqui chegados qual a solução que se impõe?
É pelas conclusões do recurso que se limita o seu âmbito de cognição, nos termos dos arts. 690º e 684º n° 2 do CPC, salvo questões de conhecimento oficioso (art. 660º nº2).
Existe decisão transitada em julgado das varas cíveis a declaram-se incompetentes e a considerar a competência dos juízos de execução para a liquidação.
É da decisão do tribunal de execução que versa este recurso.
Assim, não podendo o tribunal de execução conhecer da competência do tribunal arbitral, por não ter sido arguida a excepção de preterição deste tribunal, devem proceder as alegações.
Na procedência das alegações revoga-se a decisão recorrida e declara-se o tribunal de execução competente para apreciar a presente liquidação devendo o processo seguir respectivo os termos dos arts 805°, 810º nº2 do CPC, devendo ser praticados todos os actos para que o processo se aproxime quanto possível da forma estabelecida por lei, de acordo com o que dispõe o art. 199° do CPC.

Porto, 2007.10.23
Maria das Dores Eiró de Araújo
António Luís Caldas Antas de Barros
Anabela Dias da Silva