Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1190/09.2TBCHV.P1
Nº Convencional: JTRP00044089
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: INTERPOSIÇÃO DE UM PROCEDIMENTO CAUTELAR
APRESENTAÇÃO DE PEÇAS PROCESSUAIS
TRANSMISSÃO ELECTRÓNICA DE DADOS
CITIUS
INFORMAÇÃO ESPECÍFICA
INDICAÇÃO DE PROVA
Nº do Documento: RP201006141190/09.2TBCHV.P1
Data do Acordão: 06/14/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO.
Área Temática: .
Legislação Nacional: ART.° 6.° N.° 1 DA PORTARIA N.°114/2008, DE 6.02 .
ART.°S 384.° E 303.° N.° 1 DO C.P.CIVIL.
Sumário: I- No caso de interposição de um procedimento cautelar, por força do disposto nos art.°s 384.° n.° 3 e 303.°, ambos do C.P.Civil, deve a parte, logo, no seu requerimento inicial oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova.
II- O objectivo visado pela lei subjacente à obrigação imposta às partes que pretendam apresentar peças processuais por transmissão electrónica de dados do preenchimento de determinados campos existentes no formulário disponibilizado no sistema «CITIUS» para a inserção de informação específica, como no caso em apreço, para indicação de prova testemunhal, cfr. art.° 6.° n.° 1 da Portaria n.°114/2008, de 6.02, a qual podendo constar unicamente desse formulário, não pode constar unicamente de ficheiro anexo, é, além do mais, proporcionar aos oficiais de justiça condições para dedicarem mais tempo ao tratamento dos processos e ao cumprimento dos despachos, libertando-os da necessidade de inserção no sistema dos elementos necessários à ulterior tramitação do processo.
III- È certo que essa informação específica não pode ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos, mas se tal suceder, como a lei não prevê qualquer sanção legal para essa situação, teremos de concluir que estamos perante uma mera irregularidade formal, sem quaisquer consequências processuais ou de outra índole para a parte.
IV- O que releva para a lei processual civil, no caso, para que se julgue cumprido o preceituado pelos art.°s 384.° e 303.° n.° 1 do C.P.Civil, é o que consta de todo o conteúdo formal da peça — requerimento inicial de procedimento cautelar - logo, perante a peça processual em apreço nos autos, de forma alguma se pode considerar que os requerentes nela não indicaram prova (testemunhal) a ser inquirida aos factos que alegaram.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação
Processo nº 1190/09.2 TBCHV.P1
Tribunal Judicial de Chaves – 1.º juízo
Recorrentes – B………. e mulher
Recorrida – C…………. e marido
Relator – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. Sílvia Pires
Desemb. Henrique Antunes

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I – B……….. e mulher D……… intentaram no Tribunal Judicial de Chaves o presente procedimento cautelar para ratificação de embargo de obra nova contra C………. e marido E………, pedindo que os requeridos fossem condenados a demolir e levantar as obras realizadas após o decretamento do embargo extrajudicial, no prazo de três dias, com a cominação de pagarem aos requerentes, a título de sanção compulsória, a quantia de 100,00€ por cada dia de atraso.
Alegaram para tanto que os requeridos, mediante acordo judicialmente homologado, obrigaram-se a construir, ao longo de toda a estrema sua da sua propriedade, um muro em substituição do actual, com determinadas características, também acordadas entre as partes. Os requeridos iniciaram a construção do muro, mas ao colocarem a armação em madeira para enchimento e construção da base do mesmo, ocuparam uma faixa de terreno, em quase toda a extensão, do prédio dos requerentes. Para evitar a continuação da edificação do muro e invasão da sua propriedade, no dia 18.11.2009, pelas 9he 45m, o requerente acompanhado de duas testemunhas, dirigiu-se ao encarregado da obra ali presente e ordenou-lhe que parasse os trabalhos e que não os continuasse e que a obra estava embargada. Não obstante nos dias seguintes, desrespeitando o embargo, os operários continuaram a construção do muro.
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O requerimento inicial foi remetido a tribunal por transmissão electrónica de dados efectuada através do sistema informático “CITIUS” através do formulário disponibilizado para o efeito, preenchido com a identificação das partes e do mandatário dos requerentes, conjuntamente com um ficheiro anexo com o conteúdo material da peça processual, no final da qual se indicavam, como prova - duas testemunhas.
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Ordenada e realizada a citação dos requeridos, vieram estes deduzir oposição pedindo a improcedência do procedimento cautelar, para tanto, negaram, no essencial, os factos invocados pelos requerentes.
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Também o requerimento de oposição foi enviado a tribunal, no dia 8.01.2010, por transmissão electrónica de dados através do sistema “CITIUS”.
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No dia 13.01.2010, por requerimento enviado por correio registado, o mandatário dos requeridos, solicitou a junção aos autos das procurações forenses e dos documentos referidos na parte final do ficheiro anexo que continha o conteúdo material da oposição, onde se incluía o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, alegando que os não enviou juntamente com a peça processual devido à ocorrência de problemas técnicos.
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O documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça atesta que esse pagamento foi efectuado no dia 7.01.2010.
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De seguida decidiu-se indeferir a providência cautelar, consignando-se que tal sucedia: - “por se não encontrarem reunidos os pressupostos legais”, ou seja, como consta da respectiva decisão “(…) Considerando a matéria de facto tida por provada, resulta que apenas se provou o direito de propriedade dos requerentes sobre o prédio rústico no qual está implantada a sua habitação, quer porque o mesmo está registado a seu favor, quer porque se provaram os requisitos da prescrição aquisitiva ou usucapião.
No que respeita aos demais pressupostos (substantivos e formais) essenciais à procedência da providência, não resultaram provados quaisquer factos, pelo que o presente procedimento não pode proceder”.
No concreto, os requerentes não produziram qualquer prova dos factos que alegaram no seu requerimento inicial porque o tribunal entendeu que: - “Considerando o disposto no n.º2 do art. 6.º da Portaria n.º 114/2008.02.06, não foi requerida a produção de qualquer meio de prova, designadamente testemunhal”.
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Os requerentes, ainda não notificados da anterior decisão, vieram aos autos “dar nota” de que dos ficheiros anexos ao formulário pelo qual os requeridos enviaram a sua oposição a tribunal não constava nem as procurações nem o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial.
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Inconformados com a supra referida decisão que julgou improcedente o procedimento cautelar, dela recorrem os requerentes pedindo: - “em primeiro lugar devem ser os requeridos notificados para juntarem aos autos procuração passada ao Ilustre Mandatário subscritor da oposição e para pagarem a aludida taxa de justiça com as devidas penalizações, tudo com as cominações legais que ao caso couberem. Caso as sobreditas omissões não sejam devida e oportunamente supridas deve o presente recurso proceder, de imediato, sendo os requeridos condenados nos pedidos formulados no requerimento da providência cautelar.
Supridas que venham a ser as sobreditas omissões, deve o presente recurso proceder, quanto à questão da prova, sendo julgado que os aqui apelantes requereram a produção da prova testemunhal, revogando-se a douta sentença recorrida, com as demais consequências legais”.
Os apelantes juntaram aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões:
1. Os requeridos não pagaram ou pelo menos não comprovaram o pagamento pela indicada via electrónica da taxa de justiça, devida pelo oferecimento da sua "oposição", nos termos do n.º 3 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais (R.C.P.).
2. Não juntaram também aos autos procuração ao seu Ilustre Mandatário, havendo falta de mandato judicial por parte do mandatário que subscreveu a dita peça processual.
3. A aludida omissão do pagamento da devida taxa de justiça bem como a referida falta de mandato constituem excepções dilatórias, de conhecimento oficioso pelo tribunal, pelo que não foi observado o disposto no artigo 495.º do C.P.Civil.
4. Foi violado o disposto no n.º 3 do artigo 7.º do R.C.P.
5. São invocáveis a todo o tempo e são supríveis.
6. Por sua vez, a indicação das testemunhas nos formulários não era obrigatória, porque a peça processual entregue não se tratava de "requerimento probatório", mas de requerimento de providência cautelar em que as testemunhas foram arroladas de imediato, não sendo a sua junção permitida em momento processual posterior, fazendo o rol das testemunhas oferecido parte integrante da petição da ratificação de embargos e daí incindível do corpo desta peça processual.
7. Mesmo que assim não se entenda, não pode considerar-se como não requerida a produção da prova testemunhal pelos requerentes, porque expressa e inequivocamente a requereram, sob pena de violação do direito dos requerentes à prova.
8. Não podendo uma questão de natureza meramente técnica prevalecer sobre o direito à produção de prova testemunhal manifestado expressamente pelos requerentes na sua petição.
9. O Mm.º Juiz fez incorrecta interpretação do artigo 6.º da mencionada portaria, - não sendo este normativo aplicável ao caso pelas supras apontadas razões -, que ao julgar pela inexistência de prova testemunhal determinou o imediato conhecimento do mérito da causa e a improcedência da acção.
10. Foi violado o direito dos requerentes à prova testemunhal que requereram e violado o disposto no artigo 515.º do C.P.Civil.
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Os apelados juntaram aos autos as suas contra-alegações pugnando pela confirmação da decisão recorrida.

II – Cumpre decidir.
Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual nos dispensamos de os reproduzir aqui.

III - Como é sabido, e constitui hoje entendimento pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos (cfr. art.ºs 684.º n.º3, 685.º-A n.º1 e 685.º-C n.º2, todos do C.P.Civil), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso (art.º n.º 2 “in fine” - do art.º 660.º do C.P.Civil).
Pelo que são questões a apreciar no presente recurso:
- 1.ª – Quais as consequências nestes autos do não envio da procuração forense juntamente com a peça processual apresentada por transmissão electrónica de dados através do sistema “CITIUS”?
- 2.ª – Quais as consequências do não envio do documento comprovativo do pagamento de taxa de justiça inicial devido pela oposição conjuntamente com a peça processual enviada a tribunal nos termos supra referidos?
- 3.ª – Qual a consequência do não preenchimento do campo específico existente no formulário pelo qual se faz a apresentação de peças processuais, por transmissão electrónica de dados, para a indicação de prova testemunhal, não obstante essa prova estar indicada no conteúdo material da peça que seguiu como ficheiro anexo?
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Ao presente recurso é aplicável o regime processual estabelecido pelo DL 303/2007, de 24.08, por respeitar a processo instaurado depois de 1 de Janeiro de 2008, cfr. n.º 1 do artº 11º do citado DL.
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1.ªquestão – falta de procuração forense
A Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro, à data dos factos com as últimas alterações dadas pela Portaria n.º 974/2009, de 1 de Setembro, regula a apresentação das peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados.
Segundo os apelantes o facto de não ter sido remetido a tribunal com a oposição o documento contendo a procuração forense outorgada pelos requeridos ao seu mandatário constitui excepção dilatória típica de conhecimento oficioso do tribunal, nos termos da alínea h) do n.º 494.º do C.P.Civil.
É manifesto que não lhe assiste razão.
Desde logo, sem negar que se está perante a falta de junção de um documento essencial à regularidade da instância, porque se trata de uma omissão dos requeridos nunca pode constituir excepção dilatória, nem consequentemente conduzir à absolvição da instância. Tal situação seria apenas causa de nulidade da oposição e/ou dos actos praticados em seu nome dos requeridos por falta de um pressuposto específico desses actos – falta de procuração a favor do mandatário que pelos requeridos deduziu oposição ou em nome deles interveio no processo.
Na situação dos autos estamos perante um caso de falta de mandato, o que segundo o Prof. Alberto dos Reis, in “Comentário…”, vol. I, pág. 52, ocorre quando um advogado está em juízo a praticar actos em nome da parte, sem que esta o tenha autorizado a praticá-los, nos termos do disposto no art.º 35.º do C.P.Civil, ainda que tal resulte de não ter feito seguir com a peça processual a necessária procuração forense.
O mandato judicial, consoante se prevê no art.º 35.º do C.P.Civil, pode ser conferido por instrumento público ou por documento particular, nos termos do Código do Notariado e da legislação especial ou por declaração verbal da parte no auto de qualquer diligência que se pratique no processo.
No caso dos autos, foi remetida a tribunal, por transmissão electrónica de dados, oposição subscrita por advogado, em nome e em representação dos requeridos, sem que tenha sido enviado conjuntamente a respectiva procuração, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 5.º da Portaria n.º 114/2008, de 6.02, sendo que no final desse oposição se referia a junção da mesma.
O n.º 1 do art.º 262.º do C.Civil define procuração como o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos. Nos termos do art.º 1157.º do mesmo diploma, mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra. Ou seja, distingue a lei, muito claramente, o mandato da procuração. Na verdade, o fundamento da representação voluntária não reside na procuração mas na relação constituída entre representado e representante, da qual advém para este o encargo de gerir os negócios daquele. O mandato que pode ser com representação, cfr. art.º 1178.º do C.Civil, ou sem ela, cfr.art.º1180.º do mesmo Código, sendo, pois, independente e autónomo em relação à procuração respectiva.
Para a situação como a dos autos dispõe o art.º 40.º do C.P.Civil, segundo o qual, a falta de procuração (assim como a sua insuficiência ou irregularidade) podem, em qualquer altura, ser arguidas pela parte contrária e suscitadas oficiosamente pelo tribunal. Devendo o juiz fixar então um prazo dentro do qual deve ser suprida a falta (ou corrigido o vício) e ratificado o processado.
Como resulta dos autos, cinco dias após ter remetido por transmissão electrónica de dados a oposição dos requeridos a tribunal, veio aquele mesmo advogado, em nome e em representação dos requeridos juntar aos autos, além do mais, as procurações forenses que lhe tinham sido outorgadas por aqueles com data anterior ao do supra referido envio electrónico.
Até tal data, nem os requerentes, nem o tribunal, haviam detectado aquela falta de mandato. Pelo que até à junção das procurações verificou-se no processo uma situação de falta de mandato, que ficou absolutamente sanada com a junção dos referidos documentos, o que aliás se verificava à data da decisão que veio a por termo ao processo.
Poder-se-ia colocar a questão da necessidade de ratificação do processado por parte dos requeridos, o que alias não é mencionado pelos apelantes, no entanto, ao que julgamos no caso, a exigência de ratificação do processado pelos requeridos seria um acto inútil, cfr. art.º 137.º do C.P.Civil.
A ratificação é a declaração de vontade pela qual alguém faz seu ou chama a si o acto jurídico realizado por outrem, mas sem poderes e representação confere legitimidade representativa bastante ao mandatário que agiu, em representação do dono do negócio.
Segundo Rui Alarcão, in “A Confirmação dos Negócios Jurídicos”, vol. I, pág. 118, a ratificação caracteriza-se “como o acto pelo qual, na representação sem poderes...a pessoa em nome de quem o negócio é concluído declara aprovar tal negócio, que, de outro modo, seria ineficaz em relação a ela”.
Pois que segundo o disposto no art.º 268.º do C.Civil:
“1 - O negócio que uma pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de outrem é ineficaz em relação a este, se não for por ele ratificado.
2 - A ratificação está sujeita á forma exigida para a procuração e tem eficácia retroactiva, sem prejuízo dos direitos de terceiro”.
A ratificação põe assim termo à indefinição da situação e ao período de pendência em que o negócio não era oponível ao mandante e não era eficaz em relação a terceiro, passando o acto ratificado a valer como se o mandatário sempre tivesse tido poderes para o praticar.
Quer assim a lei prevenir a possibilidade de uma pessoa realizar um negócio ou praticar um acto como representante de outra com falta dos necessários poderes representativos.
Mas, no caso em apreço, não se coloca a questão da ineficácia dos actos praticados pelo advogado subscritor da oposição relativamente aos requeridos, pois que, à data da prática de tais actos – elaboração e remessa da oposição a tribunal – como resulta do confronto entre a data da entrega da peça e as datas das procurações – o advogado subscritor da oposição tinha efectivamente poderes para representar os requeridos nos presentes autos, pelo que a simples junção do documento ao processo sanou a situação de falta de mandato que se verificou.
Improcedem as respectivas conclusões dos apelantes.
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2.ªquestão – não junção de documento comprovativo do pagamento de taxa de justiça inicial.
Os requeridos, em 8.01.2010, por transmissão electrónica de dados através do sistema “CITIUS” enviaram a tribunal a sua oposição à presente providência cautelar, através do preenchimento do respectivo formulário, anexando ao mesmo um ficheiro contendo apenas o conteúdo material dessa oposição. E apenas no dia 13.01.2010, os requeridos fizeram chegar aos autos, por correio registado, entre outros, o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, do qual resulta que tal pagamento havia sido realizado no dia 7.01.2010.
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Dispõe o art.º 150.º-A n.ºs 1 e 4 do C.P.Civil, na redacção conferida pelo D.L. 34/2008, de 26 de Fevereiro, que “quando a prática de um acto processual exija o pagamento de taxa de justiça, nos termos fixados pelo Regulamento das Custas Processuais, deve ser junto o documento comprovativo do seu prévio pagamento ou da concessão do benefício do apoio judiciário, salvo se neste último caso aquele documento já se encontrar junto aos autos”. (n.º1)
“Quando o acto processual seja praticado por transmissão electrónica de dados, o prévio pagamento da taxa de justiça ou a concessão do benefício do apoio judiciário são comprovados nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 138.º-A”. (n.º4)
No que respeita à apresentação da contestação, no caso em apreço, da oposição, o art.º 486.º-A remete para o disposto nos n.ºs 3 e 4 do art.º 467.º, ambos do C.P.Civil, o réu/requerido deve juntar à contestação/oposição o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa do mesmo. (n.º3). E quando a contestação/oposição seja apresentada por transmissão electrónica de dados, o prévio pagamento da taxa de justiça ou a concessão do benefício do apoio judiciário são comprovados nos termos definidos na Portaria prevista no n.º 1 do artigo 138.º-A. (n.º4), isto é, nos termos da Portaria n.º 114/2008, de 6.02.
E segundo o que dispõem os art.ºs 8.º n.º1 e 5.º n.º 1 al. a), da Portaria n.º 114/2008 de 6.02, essa comprovação é feita pela anexação do comprovativo do pagamento da taxa de justiça à peça processual assim enviada.
É assim inquestionável que o comprovativo do pagamento da taxa de justiça relativamente à contestação/oposição apresentada por transmissão electrónica de dados deve ser enviado juntamente com a referida peça processual e pela mesma via, cfr. art.º 150.º n.ºs 1 e 3 do C.P.Civil.
E se o apresentante não fizer acompanhar a peça processual assim transmitida daquele comprovativo?
Essa é exactamente a questão em apreço.
Na verdade, no caso em apreço, os requeridos ao enviarem a sua oposição a tribunal por transmissão electrónica de dados, ou seja, através do sistema “CITIUS” não anexaram o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial devida, importando averiguar quais as consequências dessa omissão, sem esquecer que, dentro dos cinco dias posteriores ao daquela entrega, os requeridos juntaram aos autos, por correio registado, o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial pela dedução de oposição, sendo que esse pagamento foi efectivamente efectuado em data anterior ao da entrega electrónica da referida peça.
De harmonia com o disposto no n.º 3 do art.º 150.º-A do C.P.Civil, a falta de junção do documento do pagamento da taxa de justiça inicial devida pela dedução de contestação/oposição não implica a recusa de recebimento da peça processual pela secretaria judicial, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos art.º 486.º-A do mesmo diploma.
A Portaria n.º 114/2008, de 6.02, não prevê, directamente, a situação de falta de junção daquele comprovativo do pagamento da taxa de justiça quando a apresentação da peça tenha sido feita por transmissão electrónica de dados, uma vez que o n.º3 do seu art.º 8.º prevê tão só a situação do envio desse comprovativo não ser possível por a peça processual, ou o conjunto da peça e dos documentos em ficheiro anexo, excederem a dimensão de 3Mb (cfr. art.º 10.º n.º1), caso em que o documento em causa ser apresentado no prazo de cinco dias e através de um dos restantes meios previstos nas alíneas do n.º 2 do art.º 150.º do C.P.Civil e, só se mesmo assim não for junto ao processo esse comprovativo é que haverá lugar à aplicação das sanções previstas no art.º 486.º-A do C.P.Civil (n.ºs 3 e 4).
Entendemos que também no caso como o dos autos, ou seja, o caso de a falta de junção do documento do pagamento da taxa de justiça inicial devida pela dedução de contestação/oposição, fora da circunstância prevista no n.º 1 do art.º 10.º da Portaria n.º 114/2008, de 6.02 (peça processual ou conjunto desta e ficheiros anexos ultrapasse 3Mb), deve a parte, no prazo de cinco dias a contar da data da entrega electrónica da peça, fazer juntar ao processo, por qualquer outro meio diverso da transmissão electrónica de dados, o documento em falta, integrando-se, dessa forma, a lacuna de previsão da lei.
Ora, no caso em análise constata-se que os requeridos remeteram ao processo, por correio registado, no 5.º dia após a entrega em tribunal por transmissão electrónica de dados da sua oposição, o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial devida, o qual como se verifica foi efectuado tempestivamente. Consequentemente nada mais resta do que considerar absolutamente sanada a falta cometida.
Finalmente, verifica-se que essa junção aconteceu antes de ter sido proferida a decisão ora recorrida e que pôs termo ao processo, razão pela qual nada há a censurar, neste ponto, ao tribunal recorrido.
Improcedem as respectivas conclusões dos apelantes.
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Por fim, a 3.ªquestão - não tendo sido indicada informação relativa às testemunhas, no campo respectivo do formulário facultado no sistema “CITIUS”, para a comunicação electrónica do requerimento inicial da presente providência cautelar, apesar de a mesma informação constar do ficheiro anexo, deve ou não ser considerado no processo a indicação de tais meios de prova.
Como se sabe foi com a Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro, em execução do previsto no art.º 138.º-A do C.P.Civil, que veio regular a forma de apresentação em juízo, por transmissão electrónica de dados, os actos processuais e documentos pelas partes através do sistema informático “CITIUS”. Esta forma de apresentação em juízos dos actos processuais e documentos é uma medida que se insere, como resulta do preâmbulo da referida Portaria no “projecto de «Desmaterialização, eliminação e simplificação de actos e processos na justiça» com o qual se “visou, entre outros aspectos, facilitar o acesso à justiça e simplificar os processos de trabalho de todos os intervenientes no foro, através da utilização intensiva das novas tecnologias”. Consequentemente, das alterações introduzidas à Portaria n.º 114/2008, de 6.02, pela Portaria n.º 1538/2008, de 30 de Dezembro, resultou que a partir de 5 de Janeiro de 2009, Portugal passou a contar com um fluxo processual integralmente electrónico para os processos cíveis, laborais e de família, através das aplicações informáticas do projecto “CITIUS”.
Segundo o n.º 1 do art.º 4.º da Portaria em referência a apresentação de peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados é efectuada através do sistema informático “CITIUS”, no endereço electrónico http://citius.tribunaisnet.mj.pt de acordo com os procedimentos e instruções que aí constam.
Formalmente, a apresentação de peças processuais é efectuada através do preenchimento de formulários que são disponibilizados no referido endereço electrónico, aos quais se anexam os ficheiros com a restante informação legalmente exigida, conteúdo material da peça processual e demais informação que o mandatário considere relevante e que não se enquadre em nenhum campo dos formulários, e os documentos, como determina o n.º 1 do art.º 5.º da Portaria, sendo que, segundo o que preceitua o n.º 2 do mesmo preceito, o formulário e os ficheiros anexos, fazem parte, para todos os efeitos, da peça processual.
No caso dos autos, ou seja, no caso de interposição de um procedimento cautelar, por força do disposto nos art.ºs 384.º n.º 3 e 303.º, ambos do C.P.Civil, deve a parte, logo, no seu requerimento inicial oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova.
Sendo certo que no formulário disponibilizado no sistema “CITIUS” para a entrega de requerimento inicial de procedimento cautelar existe efectivamente um campo específico para ser preenchido com a indicação dos meios de prova, pelo menos, com a indicação de testemunhas e peritos, (únicos meios de prova que o referido formulário admite).
E segundo o art.º 6.º do mesmo diploma regulamentar que “quando existam campos no formulário para a inserção de informação específica, essa informação específica deve ser indicada no campo respectivo, não podendo ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos” (n.º 1); “em caso de desconformidade entre o conteúdo dos formulários e o conteúdo dos ficheiros anexos, prevalece a informação constante dos formulários” (n.º 2).
No em apreço, o requerimento inicial do presente procedimento cautelar foi remetido a tribunal por transmissão electrónica de dados, através do sistema “CITIUS”, tendo sido preenchido, para o efeito, o respectivo formulário apenas com a identificação das partes e do mandatário dos requerentes, ou seja, nele não foi preenchido o campo específico para indicação dos meios probatórios.
Contudo, no ficheiro anexo a esse formulário, seguiu a restante informação legalmente exigida e o conteúdo material da oposição, na parte final da qual foi indicada prova testemunhal dos factos aí alegados.
“Quid iuris”?
Ao que parece o tribunal recorrido entendeu que se estava perante uma desconformidade entre o conteúdo do formulário e o conteúdo do ficheiro anexo, e considerando o disposto no n.º 2 do art.º 6.º da Portaria em apreço, deu prevalência à informação constante do formulário.
Não concordamos com tal entendimento, ou seja, de que estamos perante uma situação de desconformidade de conteúdos.
Segundo entendemos por “conteúdo” deve entender-se “o que está dentro de alguma coisa”, “o que está contido num recipiente”, “o que escrito num texto”, ou seja, algo existente e, não algo que foi omitido.
Ora, no caso em apreço, verificamos que no formulário foi omitida a indicação de quaisquer testemunhas a inquirir, e contrariamente, no ficheiro anexo foram efectivamente indicadas testemunhas a ouvir aos factos alegados nesse requerimento inicial. Estamos assim perante uma inexistência de conteúdo, no que concerne à indicação de prova, no formulário, ao que se contrapõe uma efectiva indicação de prova, ou ante um conteúdo, no que respeita à designação de prova testemunhal, no ficheiro anexo.
A situação a que se reporta a previsão do n.º 2 do art.º 6.º da Portaria n.º 114/2008, de 6.02, é a da efectiva desconformidade entre dois conteúdos, por exemplo, se no formulário se tivessem indicado, como meios de prova, as testemunhas A, B e C, e no ficheiro anexo se indicassem como testemunhas A, C e D, o tribunal perante a desconformidade que se verifica entre esses conteúdos relativos à mesma matéria, teria de considerar como testemunhas arroladas apenas A, B e C.
Ao que julgamos, para a situação em apreço nestes autos preceitua o n.º 1 do citado art.º 6.º, ou seja, a indicação de testemunhas a ouvir devia constar do campo específico existente no formulário através do qual se apresentou o requerimento inicial em tribunal, mais dizendo a lei que essa informação não pode ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos.
Efectivamente, os requerentes desrespeitaram, em toda a linha, o preceituado pelo aludido n.º 1 do art.º 6.º da Portaria n.º 114/2008, de 6.02, não preencheram o campo existente no formulário e carrearam essa informação para os autos unicamente pelo ficheiro anexo.
Será que deve ter por inexistente a indicação daqueles meios de prova?
A resposta é, sem dúvidas, negativa, desde logo, porque se assim fosse, tal sanção não podia deixar de se considerar manifestamente excessiva e desproporcionada à falta cometida, claramente violadora da garantia constitucional do acesso à justiça, cfr. art.º 20.º da C.R.Portuguesa.
Mas vejamos.
Pensamos que o objectivo visado pela lei subjacente à obrigação imposta às partes que pretendam apresentar peças processuais por transmissão electrónica de dados do preenchimento de determinados campos existentes no formulário disponibilizado no sistema “CITIUS” para a inserção de informação específica, como no caso em apreço, para indicação de prova testemunhal, cfr. art.º 6.º n.º 1 da Portaria n.º114/2008, de 6.02, a qual podendo constar unicamente desse formulário, não pode constar unicamente de ficheiro anexo, é, além do mais, proporcionar aos oficiais de justiça condições para dedicarem mais tempo ao tratamento dos processos e ao cumprimento dos despachos, libertando-os da necessidade de inserção no sistema dos elementos necessários à ulterior tramitação do processo.
Tal objectivo resulta expresso no preâmbulo da Portaria n.º 114/2008, de 6.02, onde se afirma que uma das finalidades visadas pela regulamentação que aí se faz da entrega de peças processuais e documentos por transmissão electrónica de dados é “que o trabalho nos tribunais seja mais simples com o auxílio das novas tecnologias, evitando desperdícios de tempo e de esforço em tarefas inúteis e repetitivas, designadamente através da prática de actos pelos magistrados e secretarias através de aplicações informáticas”.
Ora, na prática, o que se pretende evitar é que o oficial de justiça, perante a peça processual, como a que está em apreço nos autos, (composta pelo formulário e pelo ficheiro a ele anexo, cfr. n.º 2 do art.º 5.º) deparando-se com a indicação de testemunhas no conteúdo da peça e com a omissão de preenchimento do respectivo campo no formulário, tenha de inserir essa informação no sistema informático para que, na posterior tramitação do processo, elas sejam assumidas como intervenientes processuais.
Na verdade, o n.º 1 do art.º 6.º da Portaria n.º 114/2008, de 6.02, obriga a que havendo um campo específico do formulário para determinada informação específica, ela deverá constar do formulário, não podendo, ser apresentada, unicamente, no ficheiro anexo, no entanto, nem das demais normas do referido diploma ou nem da lei processual civil resulta a previsão de uma qualquer sanção para a violação daquela imposição.
È certo que essa informação específica não pode ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos, mas se tal suceder, como a lei não prevê qualquer sanção legal para essa situação, teremos de concluir que estamos perante uma mera irregularidade formal, sem quaisquer consequências processuais ou de outra índole para a parte.
Como acima já se deixou consignado e, não podia deixar de ser, resulta expressamente da lei que, da peça processual apresentada por transmissão electrónica de dados fazem parte integrante os formulários e os respectivos ficheiros anexos, cfr. n.º 2 do art.º 5.º da referida Portaria, ou seja, tais elementos constituem o conteúdo formal da peça.
O que releva para a lei processual civil, no caso, para que se julgue cumprido o preceituado pelos art.ºs 384.º e 303.º n.º 1 do C.P.Civil, é o que consta de todo o conteúdo formal da peça – requerimento inicial de procedimento cautelar - logo, perante a peça processual em apreço nos autos, de forma alguma se pode considerar que os requerentes nela não indicaram prova (testemunhal) a ser inquirida aos factos que alegaram.
Pelo que há que revogar a decisão recorrida e ordenar que os autos sigam os seus ulteriores trâmites, designadamente, com a produção da referida prova testemunhal em sede de audiência final.
Procedem as respectivas conclusões dos apelantes.

IV – Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação, parcialmente, procedente, revogando-se a decisão recorrida, ordenando-se que o presente procedimento cautelar siga os seus ulteriores termos, designadamente realização de audiência final para produção da prova testemunhal indicada pelos requerentes.
Custas por apelantes e apelados, na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente.

Porto, 2010.06.14
Anabela Dias da Silva
Sílvia Maria Pereira Pires
Henrique Ataíde Rosa Antunes