Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0626860
Nº Convencional: JTRP00041089
Relator: MARQUES DE CASTILHO
Descritores: TÉCNICO OFICIAL DE CONTAS
SEGURO DE RESPONSABILIDADE CIVIL PROFISSIONAL
CONSULTADORIA
Nº do Documento: RP200802120626860
Data do Acordão: 02/12/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: LIVRO 264. FLS. 16.
Área Temática: .
Sumário: 1. São funções do técnico oficial de contas exercer a consultadoria na área contabilística e fiscal.
2. Celebrado seguro de responsabilidade civil profissional que tem por objecto, além do mais, as indemnizações por danos patrimoniais causados por actos e omissões cometidos no exercício da actividade do TOC, está coberto por esta garantia o dano resultante de omissão de prestação de informação estatutariamente obrigatória no âmbito daquelas funções de consultadoria.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

Relatório

Os Autores,
B…………….……….
C…………………….,
D…………………….,
E…………………….,
F……………………..,
G…………………….,
H…………………….,
I…………….…………,
J………………………,
L……………………….. e
M…………………………,
instauraram acção declarativa de condenação com forma de processo ordinário contra os réus,
N…………………………… e
O……………………………., S.A., com sede no ………, ……, Lisboa, pedindo que sejam condenados a pagar.
- Ao 1° A. a quantia de Euros 3.303,86;

- ao 2° A. a quantia de Euros 1.391,52;
- ao 3° A. a quantia de Euros 1.849,50;
- ao 4° A. a quantia de Euros 1.520,26;
- ao 5°A. a quantia de Euros 2.631,10;
- ao 6° A. a quantia de Euros 5.129,28;
- ao 7° A. a quantia de Euros 1.941,35;
- ao 8° A. a quantia de Euros 4.727,68;
- ao 9° A. a quantia de Euros 1.529,68;
- ao 10° A. a quantia de 1.025,56;
- ao 11° A. a quantia de Euros 2.316,83, num total de Euros 27.366,62, acrescida de juros de mora contados a partir da citação dos R.R., calculados à taxa legal, até efectivo pagamento.
Alegaram, em suma, que:
- O 1.° réu é o contabilista responsável pelas contabilidades fiscais dos aqui autores há mais de dez anos contados por referência a Janeiro de 2005;
- Tal actividade era actualmente prestada por força do contrato de trabalho celebrado a 1 de Março de 2002 entre o 1.º Réu e o P…………….., sendo que já antes da sua celebração aquele prestava serviços idênticos quer ao identificado centro, quer aos associados;
- Todos os autores são associados do P……………….;
- Os autores G…………….. e I………………, mantêm com o 1.° réu, um contrato de avença com o objecto de elaboração da contabilidade fiscal;
- Por tais serviços pagam os referidos autores a mensalidade de Euros 65,00 e Euros 100,00, respectivamente;
- Nesse ano, o 1° réu preencheu a declaração de alterações para a opção de regime de contabilidade organizada relativamente a todos os autores, fazendo-os subscrever tal declaração e apondo a sua vinheta de TOC;
- Em 2003 o 1° réu apresentou as declarações de rendimentos relativas a 2002 de todos os autores, no prazo legal, com os anexos respeitantes a contabilidade organizada;
- Agiu nos termos referidos por estar convicto de que o regime para apuramento de rendimento era, face à declaração referida vigente por três anos;

- Após a apresentação das declarações referidas, foram os autores notificados para substituir o anexo referente à contabilidade organizada, ou seja o anexo C, pelo anexo A, relativo o regime de contabilidade simplificado;
- Tais notificações sucederam uma vez que não tinha sido apresentada declaração de alterações idêntica à referida;
- Tal exigência por parte dos serviços fiscais, foi também devida, concomitantemente, ao facto de os autores não terem atingido a facturação no ano de 2001 de 30 mil contos;
- Por força dos factos aludidos supra, o apuramento do IRS devido pelos autores foi feito segundo métodos indiciários, com base no regime fiscal da contabilidade simplificada e não com base no regime de contabilidade organizada;
- Em consequência dos factos supra descritos os autores tiveram que pagar mais a título de IRS:
- B………………., Euros 3.303,86;
- C……………….: Euros 1.391,52;
- E……………….: Euros 1.520,26;
- F……………….: Euros 2.631,10,
- G………………: Euros 5.129,28;
- H………………: Euros 1.941,35;
- I………………..: Euros 4.427,68;
- J……………….: Euros 1.529,68;
- L………………: Euros 1.025,56;
- M……………...: Euros 2.316,83;
- D………………: Euros 1.849,50.
Após citação a ré O……………. contestou, defendendo-se por excepção, arguindo a ilegitimidade quer do lado activo quer passivo e referindo que o seguro obrigatório a que se refere o n° 4 do artigo 52° do ECTOC não cobre senão os riscos que derivem do exercício das funções dos técnicos oficiais de contas previstas no artigo 6° do mesmo ECTOC, sendo que quaisquer riscos que derivem de uma actividade que não releve das referidas funções estão fora da cobertura do seguro obrigatório, e serão riscos livremente assumidos no quadro de uma relação jurídica alheia ao ECTOC.

Não está abrangida pelas garantias do apontado seguro obrigatório uma actividade contratada entre um contribuinte e um técnico oficial de contas em termos de este se obrigar a entregar à Administração Fiscal as declarações fiscais daquele.
A obrigação de entrega das declarações fiscais não cabe ao técnico oficial de contas, mas sim ao contribuinte, no quadro das relações deste com o Estado pelo que a omissão de entrega de declarações fiscais alegada pelos Autores não releva das funções do técnico oficial de contas protegidas pelo seguro a que se refere o n° 4 do artigo 52° do ECTOC e pelo regime de contabilidade organizada ou regime simplificado compete, pois, “em exclusivo ao contribuinte, sendo essa uma faculdade que ninguém pode exercer em sua substituição.
Termina pugnando pela procedência da excepção, absolvendo-se a contestante da instância ou, pela improcedência da acção, absolvendo-se a contestante do pedido.
Foi apresentada replica no sentido da improcedência da excepção, concluindo como na petição inicial.
Após realização de audiência preliminar foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu da invocada excepção de ilegitimidade passiva tendo-se julgado a mesma improcedente e consequentemente a 2ª Ré parte legítima.
Procedeu-se à selecção dos factos considerados assentes e dos controvertidos, que passaram a integrar a base instrutória tendo sido efectuadas as diligencias instrutórias, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com o formalismo próprio conforme na acta se exara com registo fonográfico da prova na conformidade do estatuído no artigo 522-B do Código Processo Civil como serão todas as outras disposições legais infra citadas de que se não faça menção especial tendo de seguida o Tribunal respondido à matéria da base instrutória em conformidade e com a fundamentação constante do despacho de fls. 565 a 568, o qual não foi objecto de qualquer reclamação e a final prolatada decisão nos seguintes termos:
“Julgo a presente acção procedente e, em consequência condeno:
- O réu N……………… a pagar ao autor B………………, a quantia de 330,38 Euros; ao autor C……………. a quantia de 139,15 Euros; à autora D……………… a quantia de 184,95 Euros; ao autor E……………… a quantia de 152,02 Euros; ao autor F………………. a quantia de 263,11 Euros; ao autor G…………….. a quantia de 512,92 Euros; ao autor H…………….. a quantia de 194,13 Euros; ao autor I……………. a quantia de 472,76 Euros; ao autor J……………. a quantia de 152,96 Euros; ao autor L…………….. a quantia de 102,55 Euros; ao autor M……………… a quantia de 231,68 Euros, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até efectivo e integral pagamento;
- A ré, O………………, S.A. a pagar ao autor B…………….., a quantia de 2.973,48 Euros; ao autor C....................... a quantia de 1.252,37 Euros; à autora D……………… a quantia de 1.664,55 Euros; ao autor E....................... a quantia de 1.368,24 Euros; ao autor F....................... a quantia de 2.367,99 Euros; ao autor G....................... a quantia de 4.616,36 Euros; ao autor H……………. a quantia de 1.747,22 Euros; ao autor I……………. a quantia de 4.254,92 Euros; ao autor J…………….. a quantia de 1.376,72 Euros; ao autor L……………. a quantia de 923,01 Euros; ao autor M……………… a quantia de 2.085,15 Euros, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação até efectivo e integral pagamento.”
Inconformada com o seu teor veio a Ré Seguradora interpor tempestivamente o presente recurso tendo para o efeito nas alegações oportunamente apresentadas aduzido a seguinte matéria conclusiva com a seguinte formulação que passamos a reproduzir apesar da sua prolixidade:
(1) A douta sentença apelada funda-se em matéria dada como provada que (i) ou interpreta erroneamente (ii) ou constitui matéria de facto meramente conclusiva, além de manifestamente insuficiente ou obscura
(2) Na verdade, a matéria de facto dada como provada não permite, de modo algum, concluir pela prova de factos integradores dos pressupostos da responsabilidade civil, nas relações entre os autores e o 1° réu.
(3) Nem pela prova de que o contrato de seguro dos autos tenha por objecto senão a responsabilidade civil profissional dos técnicos oficiais de contas emergente do exercício das funções previstas no artigo 6° do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, como, de resto, na douta sentença apelada se reconhece.
(4) Sendo que, ao contrário do que o tribunal "a quo" afirma, nessas funções não se enquadra qualquer actividade de consultoria em matéria jurídico-fiscal.
(5) Desde logo, aliás, porque a consulta jurídica está reservada aos advogados, constituindo mesmo crime de procuradoria ilícita o exercício dessa actividade por quem não seja licenciado em direito inscrito na Ordem dos Advogados (cf. a Lei nº 49/2004, de 24 de Agosto).
(6) Ficou provado que o 1° réu estava convicto de estar em vigor, nas relações entre os autores e a Administração Fiscal, o regime jurídico-fiscal de contabilidade organizada.

(7) Nada alegaram, nem provaram, os autores, sobre se essa convicção do 1° réu estava certa ou errada.
(8) Tal como nada alegaram, nem provaram, sobre se a Administração Fiscal estava certa ou errada quando procedeu às notificações também referidas no elenco dos factos dados como provados.
(9) De qualquer modo, interpretar normas jurídico-tributárias com vista a saber se um determinado regime fiscal, resultante da opção livre do contribuinte, estaria ou não em vigor na esfera jurídica do contribuinte, é matéria de interpretação da lei, constitui consulta jurídica, actividade própria dos advogados, sendo óbvio que um técnico oficial de contas é incompetente e não está licenciado para sobre essa matéria se pronunciar profissionalmente.
(10) Os autores também não alegaram, nem provaram, sobre se consultaram ou não um advogado para saberem se a convicção jurídico-tributária do 1° réu estava certa ou errada.
(11) O Tribunal "a quo" não distinguiu entre consulta jurídica e a consultoria técnica que é lícito aos técnicos oficiais de contas exercer, mas em matérias técnico-contabilísticas e procedimentais, designadamente, quanto aos formalismos e procedimentos a observar nas declarações fiscais impostas pelo desempenho contabilistico relativo ao exercício da actividade que gera os rendimentos sujeitos às obrigações dos seus clientes.
(12) Não teve o tribunal "a quo" em conta que de modo algum pode incumbir aos técnicos oficiais de contas, no exercício das funções legais previstas no artigo 6° do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, agirem como mandatários dos contribuintes, de modo a exercerem ou a garantirem o exercício de faculdades, legalmente atribuídas aos contribuintes, nas relações destes com a Administração Fiscal.
(13) Não teve o tribunal "a quo" em conta que aos técnicos oficiais de contas apenas cabe - e já é muito - agirem profissionalmente de modo a que os seus clientes cumpram os seus deveres.
(14) E não de modo a que os contribuintes exerçam faculdades.
(15) Também isso revela que a consultoria técnica que é lícita aos técnicos oficiais de contas tem os seus limites na finalidade da observância das obrigações dos seus clientes perante o Estado.
(16) E não pode dar-se um salto mortal, a partir daí, para se entender que aos técnicos oficiais de contas incumbe, ainda, legalmente, prestar consultoria jurídica aos seus clientes em sede, não do cumprimento de deveres, mas do exercício de faculdades dos contribuintes perante a Administração Fiscal.
(17) Não teve o Tribunal "a quo" em conta, além do mais, que os contribuintes são livres de optarem por um regime fiscal ou por outro, se essa faculdade de opção lhes está legalmente concedida.
(18) E tal como os contribuintes são livres de optarem, em dado momento, por um regime fiscal ou por outro, em função, naturalmente, das suas vidas pessoais e profissionais concretas, das suas concretas perspectivas, pessoais e profissionais, dos seus projectos, de curto, médio e longo prazo, nenhuma anomalia pode, mesmo, constituir o exercício de uma faculdade de opção que, em dado momento, seja, por hipótese, susceptível de gerar mais imposto.
(19) Pagar mais imposto ao Estado não é um mal, em si mesmo, que incumba aos técnicos oficiais de contas evitar aos contribuintes.
(20) Os técnicos oficiais de contas não exercem a sua actividade para protegerem os contribuintes das suas obrigações de imposto.
(21) Os técnicos oficiais de contas exercem a sua actividade para garantirem que os contribuintes cumprem as suas obrigações perante o Estado. Tão somente.
(22) Se os contribuintes quiserem conhecer os regimes jurídicos alternativos em que o Estado permite que os mesmos se integrem, segundo a sua opção, se quiserem saber como se interpretam esses regimes jurídicos, como se aplicam esses regimes às suas concretas situações profissionais, aos concretos resultados da sua actividade profissional, e com que consequências, então, não devem recorrer a um técnico oficial de contas, mas sim a um consultor jurídico, e, até, a outros profissionais, por exemplo, a especialistas em matérias de gestão.
(23) Não devem é transformar a figura do técnico oficial de contas numa espécie de pau para toda a obra.
(24) E muito menos devem os contribuintes pretender que um contrato de seguro obrigatório - que apenas abrange a responsabilidade civil profissional, aliás, extra-contratual (como nas Condições Gerais da Apólice se prescreve), emergente do exercício das funções cometidas aos técnicos oficiais de contas pelo artigo 6° do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas -, também pode servir, afinal, para cobrir os impostos que devem pagar à Administração Fiscal, no quadro dos regimes fiscais que se lhes aplicam.

(25) Não devem, obviamente, os contribuintes prevalecer-se do argumento de que podiam ter optado por outro regime fiscal e que o desgraçado do técnico oficial de contas não curou disso.
(26) Não devem os contribuintes raciocinar desse modo, isto é, como se pagar os impostos devidos ao Estado fosse um dano indemnizável mercê da incúria dos técnicos oficiais de contas, que deveriam garantir; com diligência e zelo, uma correcta, interpretação dos normativos jurídico-fiscais aplicáveis aos contribuintes, com vista a que estes paguem sempre o menor imposto ao Estado possível.
(27) Tal maneira de ver, salvo o devido respeito, distorce totalmente as regras do jogo, os objectivos, os valores e os princípios subjacentes ao Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, às leis fiscais, e, até, ao Estado de Direito.
(28) Claro que nada impede um contribuinte de mandatar alguém para exercer por ele as suas faculdades jurídico-fiscais, incumbindo o mandatário de escolher os regimes fiscais que na sua situação concreta lhes proporcionarem o pagamento do menor imposto possível ao Estado.
(29) Mas esse mandato não está coberto pelas garantias do seguro obrigatório de responsabilidade civil profissional imposto pelo Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas.
(30) E está, de resto, mesmo, excluído das garantias do contrato de seguro dos autos, como pode ver-se do seu clausulado, que os autores/recorridos não impugnaram, antes aceitaram, na íntegra, e que foi considerado totalmente provado.
(31) Na verdade, o contrato de seguro constitui um todo, que não pode ser espartilhado, cada uma das suas cláusulas se inserindo no contexto global do contrato e devendo ser interpretada tendo em conta a economia do mesmo contrato, designadamente à luz do disposto no artigo 238° do Código Civil, sobre a interpretação de negócios jurídicos formais.
(32) Decorre das cláusulas 1 e 2 das condições particulares da apólice que o contrato de seguro foi celebrado com a tomadora Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, sendo segurado o Técnico Oficial de Contas, inscrito naquela Câmara, "cuja obrigação de subscrição deste seguro se encontra estabelecida pelo no 4 do artigo 52° do ECTOC".
(33) A obrigação de segurar a que se refere o aludido normativo do estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 452/99, de 5 de Novembro, diz respeito à responsabilidade civil profissional dos técnicos oficiais de contas pelo exercício das funções descritas no artigo 6° do mesmo estatuto.
(34) Só a responsabilidade civil emergente do exercício dessas funções justifica a obrigatoriedade do seguro, pelo facto de as entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento que possuam ou devam possuir contabilidade organizada terem de dispor de técnicos oficiais de contas.
(35) Nos termos do apontado artigo 6°, incumbe aos técnicos oficiais de contas planificarem, organizarem e coordenarem a execução da contabilidade daquelas entidades, segundo os planos de contas oficialmente aplicáveis, respeitando as normas legais e os princípios contabilísticos vigentes, bem como das demais entidades obrigadas, mediante portaria do Ministro das Finanças, a dispor de técnicos oficiais de contas; assumirem a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal das entidades que devam possuir contabilidade organizada; assinarem, conjuntamente com o representante legal das entidades que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada, as respectivas declarações fiscais, as demonstrações financeiras e seus anexos, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos (cf. Nº 1 do citado artigo 6°).
(36) Incumbe, ainda, aos técnicos oficiais de contas o exercício de funções de consultadoria nas áreas da respectiva formação, bem como quaisquer outras funções definidas por lei, adequadas ao exercício das respectivas funções, designadamente as de perito nomeado pelos tribunais ou outras entidades públicas ou privadas (cf. Nº 2 do citado artigo 6°).
(37) Das aludidas funções, não se extrai, de modo algum, que ao técnico oficial de contas incumba exercer, em nome e representação dos contribuintes, a faculdade de opção por um determinado regime fiscal de tributação, em vez de outro regime fiscal.
(38) Nem se vê normativo que imponha aos técnicos oficiais de contas uma tal obrigação.
(39) Não incumbe ao técnico oficial de contas, como dever jurídico, ter a iniciativa de aconselhar o contribuinte a seguir um determinado caminho em detrimento de outro: "o técnico oficial de contas executa ou organiza a execução material da contabilidade do seu cliente, sem prejuízo das responsabilidades ou deveres deste perante o sistema fiscal e os regimes fiscais a que em particular se ache sujeito" (cf. parecer do Dr. Vasco Valdez, junto aos autos).
(40) A opção pelo regime de contabilidade organizada ou regime simplificado compete, pois, "em exclusivo ao contribuinte, sendo essa uma faculdade que ninguém pode exercer em sua substituição ... Sob pena de se admitir que aos TOC seria reconhecida a posse de um verdadeiro direito potestativo, isto é, do poder subjectivo de introduzir uma modificação na esfera jurídica de outrem - criando, modificando ou extinguindo direitos - sem a cooperação destas. Ora, a declaração fiscal de opção não pode deixar de ser assinada pelo contribuinte, parte na relação tributária, pelo que necessariamente contém a manifestação da sua vontade. Que pode até ser diferente da opinião que haja sido expressa pelo TOC" (cf. citado parecer).
(41) Também não incumbe ao técnico oficial de contas, no quadro das funções descritas no artigo 6° do ECTOC, aconselhar o contribuinte a optar por um regime fiscal em detrimento de outro regime fiscal alternativo.
(42) Aliás, como acima se observou já, uma tal actividade do técnico oficial de contas implicaria a interpretação e aplicação de normas jurídicas, sendo certo que os regimes fiscais estão previstos em normas dessa natureza e que a consulta jurídica está reservada aos advogados.
(43) As funções de consultadoria a que se refere a alínea a) do nº 2 do artigo 6° do ECTOC não podem, assim, abranger a consulta jurídica, nomeadamente em matéria de direito fiscal, para a qual os técnicos oficiais de contas não possuem a necessária e adequada formação, nem habilitação profissional, mas apenas as áreas técnicas do conhecimento e da experiência profissional em sede de planificação, organização e coordenação da execução da contabilidade.
(44) Na verdade, insiste-se, aos técnicos oficiais de contas não incumbe o exercício de direitos e faculdades dos contribuintes perante a Administração Fiscal, mas sim agirem, no quadro das funções descritas no artigo 6° do ECTOC, de modo a que os contribuintes cumpram as suas obrigações perante o Estado.
(45) Para que os técnicos oficiais de contas pudessem substituir-se aos contribuintes e ter o dever de em nome e representação deles optar por um regime fiscal em detrimento de outro - isto é, exercer as faculdades dos contribuintes -, seria necessário que os mesmos agissem como mandatários dos contribuintes, com poderes expressos para os substituírem na posição jurídico-pública de sujeitos passivos de imposto, designadamente para os fins específicos do exercício de faculdades de opção por um determinado regime fiscal.
(46) Mas, nesse caso, um tal mandato - carecendo, aliás, de instrumento público - sairia, manifestamente, fora do quadro funcional previsto no artigo 6° do ECTOC, não seria sequer típico da actividade profissional de técnico oficial de contas e poderia ser conferido a qualquer outra pessoa, independentemente da sua profissão. E estaria excluído do contrato de seguro dos autos.
(47) Um mandato dessa natureza não é passível de constituir a razão de ser do seguro obrigatório de responsabilidade civil profissional, a que se refere o nº 4 do artigo 52° do ECTOC, um tal mandatário não seria segurado nos termos do contrato de seguro dos autos, pelo que a responsabilidade contratual decorrente da execução de um mandato de tal natureza não estaria coberta pelo seguro obrigatório de responsabilidade civil titulado pela apólice em causa.
(48) Além de que, na verdade, um tal mandato constituiria um acordo excluído pela alínea l) do nº 1 do artigo 4° das Condições Gerais do contrato de seguro (cf. ainda o artigo 2°, e a alínea i), in fine, do nº 1 do artigo 4°, das mesmas Condições Gerais).
(49) De resto, sem conceder, não estão provados factos susceptíveis de constituírem um qualquer mandato entre os autores e o réu técnico oficial de contas destinado à opção por regimes fiscais.
(50) Nem mesmo estão provados factos susceptíveis de constituir uma obrigação de o mesmo réu entregar quaisquer declarações fiscais para os fins daquela opção, sendo certo, aliás, que também não é uma tal obrigação enquadrável no elenco funcional do artigo 6° do ECTOC.
(51) Acresce, ainda, que os autores não alegaram, nem provaram, factos que permitam aferir se o regime de contabilidade organizada era afinal o adequado ou não à situação dos autores.
(52) Nem há factos provados susceptíveis de evidenciar o resultado fiscal da apresentação, pelos autores, de uma declaração de opção pelo regime fiscal de contabilidade organizada, sendo que só a prova desse resultado permitiria apurar uma eventual diferença de resultados.
(53) Nem a matéria de facto dada como provada permite alcançar aquilo que, precisamente, vem a ser o regime fiscal de contabilidade organizada e por que, em concreto, tal regime seria mais favorável para os autores, em confronto com o regime simplificado, também tendo em conta a concreta situação dos autores.
(54) Com efeito, sempre sem a menor concessão, a matéria de facto dada como provada é manifestamente insuficiente e obscura, não permitindo o preenchimento fáctico dos pressupostos da responsabilidade civil prevenidos no artigo 483°, nº 1, do Código Civil.
(55) Na verdade, a matéria de facto dada como provada não contém factualidade, concreta, que, desde logo, permita concluir, como o tribunal a quo concluiu, pela existência de um imposto mais favorável do que outro imposto; nem pela existência de uma conduta culposa, imputável ao réu técnico oficial de contas, ilicitamente violadora de um direito dos autores ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses; nem pela existência de efectivos prejuízos adequadamente emergentes de uma tal conduta; nem pela existência de um nexo de causalidade entre uma tal conduta e quaisquer prejuízos.
(56) Finalmente, face aos factos provados, em sede de discussão e julgamento da causa, entre os quais se encontra todo o clausulado do contrato de seguro, bem como face à análise e interpretação desse contrato - análise e interpretação que o Tribunal "a quo", no saneador, relegou para a decisão final quando decidiu a excepção de ilegitimidade da seguradora ré, ora apelante, considerando-a parte legítima em função da configuração que os autores deram à causa de pedir -, resulta, como acima se afigura ter-se demonstrado, que, afinal, a ora apelante é parte ilegítima.
(57) Com efeito, ao invés do que se afirma na douta sentença apelada, os autores não provaram deter um direito contra a seguradora ré emergente do contrato de seguro.
(58) Como se vê da matéria de facto provada e do teor do contrato de seguro, os autores não são beneficiários directos do contrato de seguro.
(59) Único beneficiário directo do contrato de seguro seria o 1° réu, o segurado, se este estivesse vinculado a indemnizar os autores em virtude de uma responsabilidade garantida pela apólice.
(60) Nesse caso, o 1° réu poderia exigir da sua seguradora a prestação daquilo que houvesse de pagar aos autores.
(61) E poderia, desde logo, o 1° réu requerer o chamamento da seguradora, nesta acção, atento o contrato de seguro.
(62) Mas o 1° réu, aliás, muito surpreendentemente, nem contestou a acção, optando pela sua revelia.
(63) De qualquer modo, finda a discussão da causa e proferida a douta sentença apelada, pode, finalmente, ver-se, com clareza, que a apelante é parte ilegítima, visto que, afinal, o contrato de seguro não legitima que os autores demandem, como demandaram, directamente, a seguradora ré.
(64) E é também a essa nova luz que pode ver-se, ainda, que a seguradora ré tinha, afinal, razão, quando deduziu a excepção da sua ilegitimidade, com fundamento no disposto no artigo 26° do CPC.

(65) No aludido quadro, pode o Tribunal "ad quem" julgar a questão da ilegitimidade da apelante, como tem preconizado o Supremo Tribunal de Justiça, designadamente, nos seguintes doutos arestos: Acórdão do STJ, de 03/06/2003, doc. nº SJ00303060000672, in www.dgsi.pt; Acórdão do STJ, de 05/09/2002, doc. nº RP200205090230452, in www.dgsi.pt; Acórdão do STJ, de 07/08/2004, doc. nº RP200407080422734, in www.dgsi.pt.
(66) A douta sentença apelada violou, pois, designadamente, todas as disposições legais acima citadas.
Foram apresentadas contra alegações nas quais se pugna pela bondade da decisão.
Mostram-se colhidos os vistos dos Exmºs Juízes adjuntos pelo que importa apreciar e decidir.

THEMA DECIDENDUM
A delimitação objectiva do recurso é feita pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal decidir sobre matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam do conhecimento oficioso, art. 684 nº3 e 690 nº1 e 3.
As questões que estão subjacentes no âmbito de apreciação do presente recurso traduzem-se em síntese no que foi objecto da decisão proferida ou seja da responsabilidade contratual do 1ªRéu e da obrigação indemnização adveniente para a Ré Seguradora como parte legitima para ser demandada por virtude do contrato de seguro celebrado e do seu âmbito de abrangência.

DOS FACTOS E DO DIREITO
Para melhor facilidade expositiva e de compreensão do objecto do presente recurso passamos a reproduzir a factualidade considerada assente e provada sobre a qual se estruturou a decisão proferida:
1. À data dos factos em discussão, e por força de contrato de seguro do ramo da responsabilidade civil, celebrado entre a 2ª ré e a Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas e titulado pela apólice n° 87/42.205, a responsabilidade civil decorrente do exercício das funções profissionais dos TOCs associados àquela Câmara, encontrava-se transferida para a 2ª ré nos termos constantes das condições gerais, particulares e especiais desse contrato que aqui se dão por reproduzidas na integra (cfr. fls. 148 e ss.).

2. O 1.° réu é o contabilista responsável pelas contabilidades fiscais dos aqui autores há mais de dez anos contados por referência a Janeiro de 2005.
3. Tal actividade era actualmente prestada por força do contrato de trabalho celebrado a 1 de Março de 2002 entre o 1° réu e o P………………, sendo que já antes da sua celebração aquele prestava serviços idênticos quer ao identificado centro, quer aos associados.
4. Todos os autores são associados do P………………….
5. Os autores G………………. e I……………, mantêm com o 1° réu, um contrato de avença com o objecto de elaboração da contabilidade fiscal.
6. Por tais serviços pagam os referidos autores a mensalidade de Euros 65,00 e Euros 100,00, respectivamente.
7. Nesse ano, o 1° réu preencheu a declaração de alterações para a opção de regime de contabilidade organizada relativamente a todos os autores, fazendo-os subscrever tal declaração e apondo a sua vinheta de TOC.
8. Em 2003 o 1° réu apresentou as declarações de rendimentos relativas a 2002 de todos os autores, no prazo legal, com os anexos respeitantes à contabilidade organizada.
9. Agiu nos termos referidos imediatamente supra, por estar convicto de que o regime para apuramento de rendimento era, face à declaração referida no quesito 7.° (agora nº 8) vigente por três anos.
10. Após a apresentação das declarações referidas em 8.° (agora nº 9), foram os autores notificados para substituir o anexo referente à contabilidade organizada, ou seja o anexo C, pelo anexo A, relativo ao regime de contabilidade simplificado.
11. Tais notificações sucederam uma vez que não tinha sido apresentada declaração de alterações idêntica a referida no quesito 7° (agora nº 8º).
12. Tal exigência por parte dos serviços fiscais, foi também devida, concomitantemente, ao facto de os autores não terem atingido a facturação no ano de 2001 de 30 mil contos.
13. Por força dos factos aludidos supra, o apuramento do IRS devido pelos autores foi feito segundo métodos indiciários, com base no regime fiscal da contabilidade simplificada e não com base no regime de contabilidade organizada.

14. Em consequência dos factos supra descritos os autores tiveram que pagar mais a título de IRS: - B……………., Euros 3.303,86; - C......................: Euros1.391,52; - E.......................: Euros 1.520,26; -F.......................: Euros 2.631,10, - G.......................: Euros 5.129,28; - H……………: Euros 1.941,35; - I…………….: Euros 4.427,68; - J……………..: Euros 1.529,68; - L……………: Euros 1.025,56; - M……………: Euros 2.316,83; - D………………: Euros 1.849,50.
Esta a factualidade considerada assente e provada sobre a qual se estruturou a decisão e que igualmente foi fundamentadora da mesma.
Tal matéria apesar de no elenco das conclusões recursivas ser de alguma forma colocada em crise o que é facto é que se não impugna com concretização suficiente de molde a permitir que seja a mesma reconsiderada por este Tribunal no âmbito dos poderes de sua competência de alteração, face ao estatuído no artigo 712º limitando-se a dizer que “ …constitui matéria de facto meramente conclusiva, além de manifestamente insuficiente ou obscura na verdade, a matéria de facto dada como provada não permite, de modo algum, concluir pela prova de factos integradores dos pressupostos da responsabilidade civil, nas relações entre os autores e o 1° réu.
E “Nem pela prova de que o contrato de seguro dos autos tenha por objecto senão a responsabilidade civil profissional dos técnicos oficiais de contas emergente do exercício das funções previstas no artigo 6° do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, como, de resto, na douta sentença apelada se reconhece.”
Como bem se analisa na decisão proferida que desde já importa dizer inteira e completamente sufragamos, bem como na respectiva subsunção jurídica, que a matéria em causa impõe, nos sediamos no âmbito da responsabilidade civil contratual e ainda na apreciação do contrato de seguro celebrado e do seu leque de abrangência.
Assim e sem querermos estar em mera repetição retórica dos fundamentos invocados na decisão é manifesto contrariamente ao invocado que resulta não haver quer o 1º Réu, necessariamente porque nem sequer contestou, quer a Ré Seguradora, ilidido a presunção de cumprimento culposo por parte daquele e que permitiria assim a excludência da sua responsabilidade pessoal.
Relativamente ao 1.º R., a atribuição de responsabilidade por banda dos autores situa-se na omissão, na ausência de uma diligência, o cumprimento de um dever e uma obrigação quando não apresentou as declarações subscritas pelos A.A. e com a sua vinheta perante a Entidade Fiscal, para que a tributação incidisse fundamentalmente sobre o seu rendimento real e, portanto, com base na contabilidade organizada, e não como veio a verificar-se, por tal apuramento de tributação em sede de IRS devida pelos A.A., com base no apuramento do lucro para tal efeito, segundo os métodos indiciários ou seja, com base no regime da contabilidade simplificada o que determinou um maior agravamento da situação patrimonial dos AA. em termos fiscais conforme resulta da matéria provada na resposta do ponto da decisão sobre o nº 14º
O 1º réu enquanto contabilista dos autores, não apresentou como se lhe impunha e era sua especial obrigação as referidas declarações subscritas pelos Autores.
No caso em apreço provou-se que a matéria constante dos pontos 2º a 13 inclusive que nos dispensamos de repetir mas que é reveladora inequivocamente do incumprimento ou melhor do cumprimento defeituoso da obrigação a que o Réu se encontrava adstrito e daí a conclusão certeira da decisão para cujos fundamentos se remete que considerou verificados os pressupostos da responsabilidade civil contratual.
Na verdade devendo a culpa ser apreciada em abstracto pela diligencia de um bom pai de família, isto é pelo comportamento normal do homem comum, logo o o segmento final do nº 2 do artigo 487º do Código Civil acrescenta que isso deve ser feito em face das circunstancias de cada caso concreto o que significa que se deve ter em cada caso em atenção a profissão e outros elementos.
O que importa é verificar se um Técnico Oficial de Contas (qualidade em que o 1º Réu foi contratado) normalmente diligente adoptaria a atitude e comportamento que se revela nos autos nas mesmas circunstancias concretas supra evidenciadas e provadas e a resposta a tal matéria é inequívoca e claramente negativa sendo certo tal como aliás se reforça na decisão proferida que não é aos Autores que incumbe provar a culpa tendo em consideração o estatuído no artigo 799º nº 1 do Código Civil sendo incumbência do devedor ( recorrente ) provar que a falta de cumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação não procedeu de culpa sua, ónus que não foi cumprido ou seja não ilidida além do mais a presunção.
Cabe dizer que sendo um TOC e tendo sido contratado nesse âmbito para elaboração da contabilidade devia estar particularmente atento às alterações introduzidas e ter assumido o regime de contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento dos AA. em sede de IRS para o ano aludido no seguimento do que anteriormente havia sido fixado.

Por virtude de tal omissão e não prática do referido acto resultou um prejuízo patrimonial como relação de causa e efeito paras os Autores evidenciada na matéria de facto constante dos artigos 13º e 14º da decisão.
A recorrente não comprovou como lhe competia que actuou sem culpa, mediante uma falsa representação da realidade de molde a se poder obter a sua não culpabilidade.
Apreciemos de seguida a questão inerente à responsabilidade da Ré Seguradora e aqui de novo consideramos não ser de reproduzir igualmente a fundamentação tecida na decisão que inteiramente se acolhe.
A Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (CTOC), na qualidade de tomadora celebrou com a O…………….. SA, um contrato de seguro, tendo por objecto a responsabilidade civil profissional dos Técnicos Oficiais de Contas (TOC) inscritos na referida Câmara.
O problema que se coloca é de alguns dos referidos profissionais como no caso não informaram os seus clientes do ónus de, nos termos da lei ( artigo 53º , nº 7 do CIRC na redacção da Lei nº 109-B/2001 de 27 de Dezembro) comunicarem à Administração Fiscal até 31 de Março de 2002 que pretendiam optar, ou permanecer, no denominado regime geral de determinação do lucro tributável ( determinação directa) e reuniam os pressupostos legais, para o efeito, quer pela Lei tributaria quer pela regulamentação do imposto sobre o rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) tendo de tal omissão resultado diferenças de matéria colectável por aquele imposto, em prejuízo dos Autores no caso, e que teriam ocorrido se porventura estes, informados da obrigação em causa, o tivessem exercido não havendo que suportar o prejuízo que efectivamente foi supra mencioonado.
A CTOC é uma associação pública regulamentada pelo Dec-lei 452/99 de 5/11 que além da representação profissional dos TOC, tem por objecto a superintendência de todos os aspectos relacionados com o exercício das funções daqueles profissionais no âmbito aliás do autorizado pelo art. 267° n°s - 1, 2 e 4, - da Constituição da República Portuguesa, que, em sede de desconcentração administrativa, permite ao Estado, mantendo, pelo menos, os seus poderes de tutela, atribuir a corporações profissionais o exercício de poderes públicos nas condições de admissão, exercício e disciplina dos seus membros como é o caso da CTOC.
De acordo com o artigo 6º do mencionado Decreto-Lei são funções dos TOC:

a. Fiscalizar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades sujeitas aos impostos sobre rendimento que possuam ou devam possuir contabilidade regularmente organizada;
b. Assumir a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilistica e fiscal, das mencionadas entidades;
c. Assinar, conjuntamente com o representante legal das mesmas entidades, as respectivas declarações fiscais, as demonstrações financeiras e seus anexos;
d. Funções de consultadoria nas áreas da respectiva formação;
e. Quaisquer outras funções definidas por lei, adequadas ao exercício das funções: de TOC.
Tal significa que são funções do Técnico Oficial de Contas exercer a consultadoria na área contabilistica e fiscal, que é a área especifica da sua formação entendendo-se esta como conjunto de saberes adquiridos e relacionados com a função de TOC, já que outras áreas de formação necessariamente em nada podiam importar para a qualificação das funções próprias daqueles profissionais.
Registe-se, todavia, que a lei, ao falar de formação, não pretende usar a expressão no sentido restrito, de habilitações, ou de habilitações académicas, como revela a substituição daquela expressão, que constava do anterior regulamento (cf, arts 2° e 9°, do DL n° 265/95, de 17 de Outubro), pela expressão área de formação.
Do que antecede, emergem consequências decisivas a ponderar parecendo inequívoco que enquanto as funções descritas nas alíneas a) a c), supra, são de exercício obrigatório, as constantes das alíneas d) e e) do mesmo número são facultativas.
É apodictico já que se trata de qualificar ou adjectivar, que tal circunstancia de serem facultativas não desqualifica estas últimas como funções legalmente próprias dos TOC.
O seguro de responsabilidade civil profissional dos TOC, pactuado entre a CTOC e a O…………… SA tem por objecto, além do mais, "(...) as indemnizações exigíveis ao segurado em consequência de danos patrimoniais causados a clientes e ou terceiros, desde que resultem de actos ou omissões cometidos durante o exercício da actividade de Técnico Oficial de Contas" –
Assim a omissão de informação dos TOC, aos seus clientes, quanto á supra referida opção de regime, está coberta pela apólice, já que a consultoria fiscal se compreende, nos termos da lei nas funções de Técnico Oficial de Contas e sendo embora facultativas, como se viu supra, mas estão sempre no âmbito das suas funções.
Tal entendimento é reforçado se se tiver em conta a totalidade do regime normativo aplicável aos TOC.
Assim, e desde logo importa considerar que as corporações profissionais, quando assumem, como no caso da CTOC, o figurino de associações públicas, estão sujeitas, como refere VITAL MOREIRA, "(...) ao direito público pelo menos (n)os aspectos que integram a vida institucional da corporação, bem conto (n)os actos que traduzem o exercício de funções públicas. Cabem ai designadamente os seguintes aspectos: o regime de .designação e constituição dos órgãos e o seu funcionamento, o regime de admissão e de exclusão dos sócios, bem como o regime disciplinar, os actos que se traduzem no exercício de funções públicas, nomeadamente a titulação e disciplina profissional, a função certificativa, a função normativa, a fixação de tarifas e honorários”[1]
Na esteira deste ensinamento que tem de ser lido o art. 3° n° 1 alínea o), do referido DL n° 452/99, quando defere à CTOC a faculdade de estabelecer princípios e normas de ética e deontologia profissional, poder normativo que a CTOC exerce enquanto associação pública, figura de desconcentração administrativa, que confere aos regulamentos por ela emitidos, nos termos da lei, a força e o caracter vinculativo dos regulamentos administrativos.,
A CTOC, em cumprimento do referido art. 3° n° 1, alínea o), aprovou o Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas, que no seu art 11 °, sob a epígrafe Deveres de informação, institui como dever do TOC informar as entidades onde exercem funções, a pedido delas, ou por iniciativa própria, "(...) dos condicionalismos de ordem legal susceptíveis de as afectar relacionadas exclusivamente com o exercício da profissão".
Não pode assim oferecer qualquer dúvida, face ao teor do art. 6º n° 2, alínea a), do DL n° 452/99, que as funções de consultoria fiscal se, compreendem nas de TOC, sendo ocioso: demonstrar, por evidente, que o ónus de optar pelo regime geral de determinação do lucro tributável (determinação. directa) integra os condicionalismos de ordem legal susceptíveis de afectar o cliente do TOC, (ut, cit. art° 11 ° do Código Deontológico), e que, por isso, a prestação de informação com aquele âmbito era, estatutariamente, legalmente, obrigatória.
Assim e tal como já supra evidenciamos não oferece contestação que o TOC é civilmente responsável perante o seu cliente por o não ter informado do - ónus de optar, pelo regime determinação do lucro tributável (determinação directa), e que tal obrigação foi, prestada no exercício da actividade de TOC, tal como se encontra definida, no art. 6°, do Estatuto da. Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, completada pelo art. 11º do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas, plasmado ao abrigo do art° 3°, n° 1, alínea o), daquele Estatuto.
A conclusão a nosso ver é inequívoca a responsabilidade civil dos TOC está dentro do âmbito da cobertura do contrato de seguro celebrado entre a CTOC e a Ré O……………. sendo esta como aliás se julgou por força da mencionada apólice parte legitima para ser demandada nos termos em que se mostra configurada a acção pelos Autores
Assim e sem necessidade de outros considerandos não colhe a argumentação conclusiva das alegações recursivas apresentadas pela Apelante pelo que mantendo-se como se mantém sem qualquer alteração a factualidade considerada assente e provada, igualmente no que tange à apreciação das questões supra elencadas, objecto do interposto recurso pela Ré, é entendimento alcançado pela unanimidade dos Juízes que compõem este Tribunal, face à criteriosa e judiciosa apreciação da factualidade descrita, com a correcta valoração das regras inerentes ao ónus probatório que a cada um dos litigantes se impunha, efectuada pelo Tribunal a quo, bem como a sua consequente integração e subsunção jurídica, que a decisão não merece qualquer censura ou reparo, sendo de manter em toda a sua plenitude as considerações e fundamentação aduzidas na apreciação jurisdicional bem como os entendimentos doutrinais e jurisprudenciais que se encontram sedimentados que igual e integralmente se acolhem e sufragam pelo que inteiramente a confirmam, ao abrigo do disposto no art. 713º nº5, nada mais se impondo referir, dado que fazê-lo se traduziria em simples acto de pura e inútil repetição retórica.

DELIBERAÇÃO
Nestes termos em face do que vem de ser exposto perante a improcedência das conclusões elencadas pela Recorrente nega-se a Apelação, confirmando integralmente os Juízes que compõem este Tribunal, por unanimidade, a decisão proferida pelo Tribunal a quo de harmonia com o estatuído no artigo 713º nº 5.
Custas pelos Apelantes.

Porto, 12 de Fevereiro de 2008
Augusto José B. Marques de Castilho
Henrique Luís de Brito Araújo
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
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[1] In, Administração autónoma e associações públicas, Coimbra Editora, 1997, pág. 490