Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
763/09.8TTBRG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO JOSÉ RAMOS
Descritores: DESPEDIMENTO
DECLARAÇÃO RECEPTÍCIA
ARREPENDIMENTO
SEGURO DE SAÚDE
Nº do Documento: RP20110314763/09.8TTBRG.P1
Data do Acordão: 03/14/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Representando o despedimento uma declaração negocial receptícia que se torna eficaz logo que chegue ao poder ou seja conhecida pelo seu destinatário (art. 224º n.º 1 do Cod. Civil), não pode a mesma ser retirada sem a aquiescência deste, atendendo ao princípio da irrevogabilidade da declaração negocial expresso no art. 230º n.º 1 do Cod. Civil, situação esta que, impede que a entidade patronal, uma vez comunicada aquela decisão possa voltar com a palavra atrás e tudo se passa como nada tivesse acontecido. Mesmo nos casos de um despedimento verbal, não pode, a entidade patronal, depois, por sua exclusiva iniciativa (porque tenha eventualmente dado conta de que apenas o poderia fazer mediante verificação de justa causa apreciada em processo disciplinar), como que retirar aquela decisão para, de seguida, lançar contra este um procedimento disciplinar com o propósito de alcançar o mesmo objectivo.
II – Prevendo a lei o chamado direito de arrependimento ou retracção para o caso de denúncia do contrato pelo trabalhador, e não a prevendo para os casos de despedimento levados a cabo pelo empregador, estaríamos a agir contra legem permitindo que este de forma não regulamentada, por sua livre iniciativa, o pudesse fazer quando lhe aprouvesse.
III – Decidida e comunicada ao trabalhador a cessação do vínculo laboral, por extinção do posto de trabalho, não é possível a entidade patronal suspender o prazo prévio em curso, mesmo que a finalidade seja para o processamento de procedimento disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa.
IV – O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito sempre que o empregador, (a) não tiver respeitado os requisitos do n.º 1 do artigo 403.º, (b) tiver violado o critério de determinação de postos de trabalho a extinguir, enunciado no n.º 2 do artigo 403.º, (c) não tiver feito as comunicações previstas no artigo 423.º, (d) não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401.º e, bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.”
V – O seguro de saúde que a entidade empregadora concedeu ao trabalhador sendo uma prestação regular e periódica tem um inegável valor patrimonial para quem dela usufrui que é, desde logo, poder beneficiar da protecção do seguro sem suportar os inerentes custos.
VI – Estamos, assim, perante uma prestação em espécie que deve ser qualificada como retribuição, caso a entidade empregadora não elida a presunção estabelecida no nº 3º do art 249º do CT.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de Apelação: nº 763/09.8TTBRG.P1 Reg. Nº 57
Relator: António José Ascensão Ramos
1º Adjunto: Des. Eduardo Petersen Silva
2º Adjunto: Des. José Carlos Machado da Silva
Recorrente: B…, S.A.
Recorrido: C…

Acordam os juízes que compõem a Secção Social deste Tribunal da Relação do Porto:

1. D…, técnico de contas, residente na Rua …, nº .. – .° Dtº., em Braga, deduziu contra B…, S.A., com sede na Rua …, … – .° Piso, em Lisboa, a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, tendo formulado os seguintes pedidos:
I – Ser julgado e declarado abusivo o despedimento e cessação unilateral do contrato de trabalho dos autos por alegada extinção do posto de trabalho de que é titular o Autor.
II – Sem prescindir, se assim não for decidido, ser o mesmo despedimento julgado e declarado ilícito, por violação massiva dos requisitos aludidos no art. 432º do Código do Trabalho, porquanto se não verifica nenhum deles.
III – Sem prescindir, se for julgado válido e subsistente o dito despedimento, ser a Ré condenada a pagar ao Autor uma indemnização nos termos das disposições combinadas dos artºs 404º e 401º do Código do Trabalho, a fixar pelo Tribunal, ou no montante mínimo de 74 400,00 € (3752,96€ X 14/12 X 17) – sem prejuízo do pedido em XII infra.
IV – Sem prescindir, ser julgado e declarado abusivo o despedimento por alegada verificação de factos imputáveis ao Autor consubstanciadores de justa causa.
V – Se assim não for decidido, ser o mesmo despedimento julgado e declarado ilícito, por inexistência ou total improcedência dos motivos invocados pela Ré; e porque está ferido de invalidade, por causa da violação do contraditório.
VI – Ser julgado que, de qualquer modo, ocorreu caducidade do direito de aplicar a sanção de despedimento, por terem decorrido mais de 30 dias entre a recepção da resposta à nota de culpa, pela Ré, e a recepção da comunicação do despedimento, pelo Autor, sem que tenha sido realizado qualquer acto no processo, designadamente de instrução – por consequência sendo inválido o processo e ilícita a sanção aplicada.
VII – Por consequência, condenar-se a Ré a reintegrar o Autor no seu posto de trabalho ou em lugar compatível com as suas qualificações profissionais, em todo o caso com a retribuição que lhes corresponder e nunca inferior à que por último percebia, se outra superior não for fixada pelo Tribunal – sem prejuízo do pedido infra formulado no nº XIV.
VIII – Em alternativa, sendo declarado abusivo qualquer dos despedimentos, ser a Ré condenada a pagar-lhe, se no prazo legal o Autor por isso optar, uma indemnização calculada nos termos das disposições combinadas dos artºs 375º/2 e 439º/4 do CTrab, entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade – sem prejuízo do pedido em XII infra.
IX – Atendendo ao valor da retribuição, sem alterações desde 2001; ao elevado grau de ilicitude dos comportamentos da Ré para com o Autor; a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão a proferir, deve a base de cálculo ser fixada no máximo legal de 60 dias de retribuição, em montante não inferior a 146 828,13 € (3752,96€ X 14 / 365 X 60 X 17) – sem prejuízo do pedido em XII infra.
X – Em alternativa ainda, em substituição da reintegração, mas se for julgado ilícito o despedimento com invocada justa causa, ser a Ré condenada a pagar ao Autor, nos termos do disposto no artº 439º do CTrab., uma indemnização calculada entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade.
XI – Atendendo aos elementos referidos sub IX, deve a base de cálculo ser fixada no máximo legal de 45 dias de retribuição, em montante não inferior a 110 121,10 € (3752,96€ X 14 / 365 X 45 X 17) – sem prejuízo do pedido em XII infra.
XII – Seja fixado, segundo prudente arbítrio do Tribunal, ao abrigo do disposto no artº 265º/1 do Código do Trabalho, o valor da retribuição do Autor para os efeitos da presente acção, designadamente para o cálculo das retribuições peticionadas ao abrigo do disposto no artº 437º/1 e 4 do CTrab [ut sub XIII/d)] e, bem assim, dos montantes dos pedidos indemnizatórios formulados.
XIII – Ser a Ré condenada a pagar ao Autor as seguintes importâncias, acrescidas de juros à taxa legal a contar da citação e até integral pagamento:
a)- 19 876,67 €, valor de IRS pago a mais por este pelos motivos referidos nos artºs 53º ss supra;
b)- 3 139,50 €, valor de créditos relativos a formação obrigatória, e respectivos juros à taxa legal, líquidos nesta data (31-05-2009) em 280,95 €, como se explicita nos artºs 65º e ss supra;
c)- 5.760,00 €, valor relativo a prémios de seguro de saúde retirado pela Ré (cfr artºs 70º e ss supra);
d)- O valor das retribuições que o Autor deixou de auferir desde a data do despedimento vencidas e vincendas até ao trânsito em julgado da decisão a proferir, deduzido o montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 07-05-2009, o 30º dia antes da data da propositura da presente acção, líquida neste momento no mínimo de 3.752,96 € – sem prejuízo do pedido em XII supra.
XIV – Ser a Ré condenada a cumprir as obrigações a que está adstrito para com o Autor, devendo entregar ao Autor os bens e equipamentos que se obrigou a proporcionar-lhe, inclusive para seu uso pessoal, a título permanente, nomeadamente uma viatura automóvel da marca Volkswagen, modelo … (ou da mesma gama e nível de preço), um telemóvel e um computador portátil (… ou similar), bem como a suportar as respectivas despesas, incluindo combustível e portagens, com as adaptações que forem entendidas adequadas à circunstância de terem decorrido mais de seis anos sobre os últimos de uso e fruição de tais bens.

Para tanto, alegou ter entrado ao serviço da R. no dia 01-01-2003 para, sob a direcção, orientação e fiscalização da respectiva Administração, exercer as funções de “…”, mantendo no entanto ao serviço desta Ré a antiguidade reportada a 11-09-1991, por ter trabalhado sucessivamente para sociedades pertencentes – tal como a R. – ao chamado “E…”.
Em 31 de Dezembro de 2002 o A. auferia o salário mensal base de € 3.752,96, acrescido de subsídio de alimentação de € 4,26 diários, beneficiando ainda de uso permanente de uma viatura automóvel (uso pessoal e profissional, sendo as respectivas despesas custeadas pela Ré, incluindo combustível e portagens), de um telemóvel (também com pagamento das suas despesas) e de um PC portátil.
Alegou, ainda, que no dia 01-04-2003 o director de recursos humanos da R. lhe comunicou que estava suspenso, na sequência de um processo disciplinar que lhe havia sido instaurado e que culminou com o seu despedimento, o qual no entanto veio a ser declarado ilícito por sentença transitada em julgado em 14-01-2008 e a R. condenada a readmitir o A. ao seu serviço.
Porém, poucos dias depois, através de carta datada de 01-02-2008, a Ré comunicou ao Autor a necessidade de proceder à extinção do posto de trabalho que este último ocupara, o que veio a suceder com efeitos a partir de 16-06-2008. Não obstante, defende que os motivos invocados são falsos e o despedimento abusivo, tratando-se antes de uma verdadeira sanção disciplinar com vista evitar o cumprimento da decisão judicial anterior.
Impugnou, subsidiariamente, o despedimento com alegação de justa causa levado a efeito pela R. em 08-08-2008, que também considerou abusivo, invocando a inexistência de factos susceptíveis de configurar justa causa de despedimento, a caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar em causa e, ainda, a invalidade do procedimento disciplinar por violação do direito do contraditório.
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2. Frustrada a audiência de partes a Ré apresentou contestação, pugnando pela improcedência da acção, defendendo a veracidade dos motivos invocados para a extinção do posto de trabalho, situação que determinou uma impossibilidade involuntária de dar cabal cumprimento à decisão judicial anterior a que o A. alude na petição inicial. No entanto, invoca ter pago as remunerações devidas ao A. e que apenas o dispensou da prestação efectiva de trabalho, por ausência de possibilidades de ocupação alternativa.
Por outro lado, invoca que os efeitos da decisão de extinção do posto de trabalho ficaram suspensos com a comunicação ao A. da instauração de um processo disciplinar e respectiva nota de culpa, comunicação essa que diz ter produzido os seus efeitos no dia 12-06-2008, antes da declaração de despedimento por extinção de posto de trabalho.
Relativamente ao despedimento com invocação de justa causa, contraria que o mesmo tenha sido abusivo, nega a existência de caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar e, ainda, a invalidade do procedimento disciplinar, pugnando pela verificação de justa causa nos termos constantes do aludido procedimento.
Impugnou, ainda, a generalidade dos créditos peticionados.
Terminou, pedindo absolvição da instância quanto ao pedido formulado pelo A. em XIV e a improcedência da acção quanto ao restante, com a sua consequente absolvição do pedido.
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3. Foi realizada audiência preliminar, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador e foi seleccionada a matéria de facto assente e a base instrutória.
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4. Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova pessoal, tendo o autor no decurso do mesmo optado pela indemnização, em detrimento da reintegração da empresa, nos termos do art. 439º do Código do Trabalho. Após o Tribunal respondeu à matéria de facto, não tendo havido reclamações.
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5. Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo:
“IV – Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:
I - julgar e declarar ilícito o despedimento e cessação unilateral do contrato de trabalho dos autos por alegada extinção do posto de trabalho;
II – condenar a Ré a pagar ao Autor uma indemnização correspondente a 40 dias (€ 5.003,95) de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade, contando-se para o efeito todo o tempo decorrido até à data do trânsito em julgado da decisão judicial, indemnização esta que neste momento se cifra no montante de € 95.074,99;
III – condenar a Ré a pagar ao Autor as seguintes importâncias, acrescidas de juros à taxa de 4% a contar da citação e até integral pagamento, sobre o capital em dívida:
a) € 19.876,67, a título de IRS pago a mais pelo Autor;
b) € 1.948,50, a título de valor de créditos relativos a formação obrigatória, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde o vencimento de cada uma das quantias parcelares supra indicadas até 31-05-2009;
c) € 5.760,00, valor relativo a prémios de seguro de saúde retirado pela Ré;
d) a importância correspondente ao valor das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da presente decisão, no montante mensal de € 3.752,96, acrescido de férias e subsídios de férias e de Natal em igual montante, contabilizando até ao momento € 56.294,40 (€ 3.752,96 x 13 meses x 2 meses);
IV – absolver a Ré do restante pedido.
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Custas por A. e Ré, na proporção do respectivo decaimento (art. 446º nºs 1 e 2 do C.P.C.).
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Registe e notifique, sendo ambas a Ré com a expressa advertência constante do art. 76º do C.P.T. (na redacção vigente à data da propositura da acção).”
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6. Inconformada com o assim decidido, veio a Ré interpor recurso.
6.1. Tendo no requerimento de interposição invocado as seguintes nulidades da sentença:
1. Entendeu o Tribunal que, e conforme se pode ler na sentença, “é inquestionável que o contrato de trabalho que vigorou entre Recorrido e Recorrente cessou por despedimento promovido por esta última por extinção de posto de trabalho, com efeitos a partir de 17.06.2008. Face a esta circunstância, tendo a decisão final do procedimento disciplinar sido proferida e comunicada ao Recorrido em momento posterior à cessação do contrato de trabalho (...), não se irão conhecer dos pedidos formulados, nomeadamente, sob os pontos IV, V e VI pelo Recorrido, respeitantes à questão da ilicitude do despedimento disciplinar com invocação de justa causa, dado que se tratam de pedidos naturalmente subsidiários (...)”.
2. Sem prejuízo do que adiante se dirá acerca do modo de cessação do contrato do Recorrido, nada haveria a apontar a tal decisão, não fora o facto de o Tribunal ter julgado ilícito aquele despedimento por extinção de posto de trabalho, condenando a Recorrente, consequentemente, a indemnizar o Recorrido (uma vez que este optou pela indemnização em substituição da reintegração) e a pagar-lhe as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão final.
3. Com efeito, tendo sido declarada a invalidade do despedimento, e em virtude da eficácia retroactiva dessa declaração – art. 289.º do Código Civil – tudo se passa, no plano jurídico, como se o despedimento jamais tivesse sido declarado.
4. Assim, e como ensina Pedro Furtado Martins, “como o despedimento não produziu a extinção do contrato de trabalho, este manteve-se na plenitude dos seus efeitos: os direitos e deveres das partes permanecem inalterados, devendo ser prestado aquilo que indevidamente o não foi, na medida em que isso for materialmente possível” (Despedimento ilícito, reintegração na empresa e dever de ocupação efectiva, “Direito e Justiça” – Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, 1992, pág. 102).
5. Em suma: a declaração da invalidade do despedimento tem como consequência a manutenção do vínculo jurídico entre o empregador e o trabalhador, o que implica que o contrato de trabalho se mantenha na plenitude dos seus efeitos, até que sobrevenha alguma das causas de cessação.
6. Significa isto que, tendo o Tribunal declarado ilícito o despedimento do Recorrido (por extinção do posto de trabalho), então o contrato de trabalho não terminou no dia 17-06-2008, tendo, pelo contrário, continuado plenamente em vigor após essa data.
7. Estando, como tal, em vigor, quando o Recorrido recebeu a comunicação da instauração do processo disciplinar e respectiva nota de culpa (ponto 31 dos factos provados).
8. Assim como estava em vigor quando, em 08-08-2008, a Recorrente comunicou ao Recorrido a aplicação da sanção de despedimento com justa causa (ponto 35 dos factos provados).
9. Conforme refere Pedro Furtado Martins (Obra citada, pág. 139), “Continuando o contrato, isso significa que se poderão verificar alguns dos factos extintivos que integram as referidas causas de cessação, mesmo que ocorram no período que antecede a sentença. É certo que durante este espaço de tempo os deveres principais de prestação a cargo de cada uma das partes não são efectivamente cumpridos, mas, como já foi repetidamente afirmado, tal não impede a sobrevivência do vínculo jurídico que as une e, consequentemente, a possibilidade dele se extinguir”.
10. Pense-se, por exemplo, na hipótese de o trabalhador se reformar antes da declaração judicial da invalidade, caso em que, uma vez que a reforma do trabalhador determina a caducidade do contrato de trabalho, este cessa na data da reforma.
11. Como tal, estando o contrato de trabalho em vigor, não poderia o Mmo. Juiz ter deixado de se pronunciar sobre o despedimento disciplinar de que o Recorrido foi alvo, concretamente, sobre a licitude ou ilicitude do mesmo.
12. Com efeito, e contrariamente ao que entendeu o Tribunal, o conhecimento de tal matéria não ficou prejudicado pela declaração de ilicitude do despedimento por extinção, devendo essa matéria ser conhecida precisamente porque o despedimento por extinção do posto de trabalho foi declarado ilícito e o contrato de trabalho se manteve, como tal, em vigor.
13. Nos termos do disposto na alínea d), do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C. (aplicável ex vi artigo 49.º n.º 2 do C.P.T.), é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
14. Do exposto resulta claro que o juiz não se pronunciou sobre uma questão que deveria ter conhecido, o que, nos termos do citado artigo 668.º do C.P.C., gera a nulidade da sentença
15. A sentença proferida padece, assim, de nulidade por omissão de pronúncia, que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos.
16. A sentença proferida sofre ainda de nulidade, nos termos da alínea d), do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C., por se ter pronunciado sobre questão de que não podia tomar conhecimento.
17. Com efeito, a propósito da apreciação da validade do despedimento por extinção do posto de trabalho do Recorrido, pode ler-se na sentença o seguinte: “Acresce que não resulta do processo junto com a contestação da Ré que tenham sido observados os critérios previstos no n.º 2 do aludido art. 403.º, quanto à preferência dada à extinção do posto de trabalho do Autor e não do outro gerente da loja de Braga”.
18. Assim, o Tribunal considerou a inobservância de tais critérios, não só para fundamentar a sua declaração de ilicitude do despedimento do Recorrido mas também para fundamentar a sua decisão acerca do grau de ilicitude de tal despedimento.
19. Ora, a observância ou inobservância por parte da Ré ora Recorrente dos critérios a que faz referência o art. 403.º, n.º 2 do C.T. não foi, em momento algum, alegada pelo Autor.
20. Nos termos do art. 264.º, n.º 1 do CPC, “Às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”, dispondo o n.º 2 daquele preceito que “O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa”.
21. Não se verifica, in casu, nenhuma das situações a que aludem os referidos artigos 514.º e 665.º do CPC, assim como, os factos em causa, isto é, os factos que integram os requisitos do citado art. 403.º, n.º 2 do CT, não só não são “factos instrumentais” (muito pelo contrário são factos essenciais à apreciação da licitude do despedimento por extinção do posto) como não resultaram da instrução e discussão da causa.
22. Prevê ainda o n.º 3 do citado art. 264.º que “Serão ainda considerados os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório.”
23. Ora, conforme se disse, tais factos não resultaram, de todo, da instrução e discussão da causa, a que acresce que, ainda que assim tivesse sido, a parte interessada (o Autor) não manifestou qualquer vontade de deles se aproveitar, nem à Ré ora Recorrente foi facultado o exercício do contraditório.
24. Com efeito, a consideração de que a Ré não observou os critérios previstos no art. 403.º, n.º 2 do CT, não tendo a Ré, em momento algum, tido a oportunidade de se pronunciar sobre a observância de tais critérios, sempre consubstanciaria uma flagrante violação do princípio do contraditório, plasmado no art. 3.º do CPC.
25. Como tal, ao pronunciar-se sobre a inobservância, por parte da Recorrente, daqueles critérios, a sentença recorrida violou os artigos. 3.º, 264.º e 660.º, n.º 2, todos do CPC, sendo, como tal, nula nos termos do art. 668.º, n.º 1 al. d) desse mesmo código, nulidade que aqui se invoca para os devidos efeitos.

6.2. E formulado as seguintes conclusões.
a) Considerou o Tribunal que, na data em que a Recorrente comunicou ao Recorrido a decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho, a 16.04.2008, tal declaração de despedimento tornou-se irrevogável desde esse momento, nos termos do art. 230.º, n.º 1 do Código Civil.
b) Ora, desde logo, o citado art. 230.º do C.C. não pode aplicar-se ao foro laboral, uma vez que é por demais evidente que da sua não aplicação resulta maior benefício para o trabalhador.
c) Com efeito, trata-se aqui de revogar uma declaração de despedimento, revogação essa que tem, como consequência natural, a manutenção do vínculo laboral, situação evidentemente mais favorável ao trabalhador do que a cessação desse vínculo.
d) Mesmo que não se considere procedente este argumento e, em consequência, se decida aplicar à declaração extintiva a regra que o art. 230.º do Código Civil estabelece para a “Proposta de Contrato”, outras razões há que justificam a não aplicação dessa solução no caso concreto.
e) Desde logo, estamos perante uma declaração que ainda não produziu os seus efeitos no momento em que chega ao conhecimento do declaratário, uma vez que a sua eficácia estava sujeita a um termo inicial ou suspensivo.
f) Ora, a regra do art. 230.º, válida para as propostas contratuais, pressupõe que estas produzem efeitos quando chegam ao poder do destinatário ou dele são conhecidas (cfr. art. 224.º do C.C.).
g) Sucede que, in casu, não estamos perante uma proposta contratual nem perante uma declaração eficaz.
h) Com efeito, a declaração de despedimento, sendo embora uma declaração de vontade negocial, não configura qualquer proposta contratual, o que por si só já afasta a aplicação do referido art. 230.º.
i) Por outro lado, trata-se, como se viu, de uma declaração cuja eficácia só ocorre depois de decorrido o período de aviso prévio legalmente exigido.
j) Pelo que, antes de se completar tal período, o contrato permanece plenamente em vigor, como aliás assegura a própria lei – art. 398.º, n.º 2 do Código do Trabalho, aplicável ao despedimento por extinção do posto de trabalho por força do art. 404.º do Código do Trabalho.
k) Este é, aliás, o entendimento maioritário da jurisprudência (cfr., por exemplo, Ac. RC de 17/02/87, in CJ, 1987, I, pp.87-88; Ac. RP de 09/02/87, in CJ, 1987, I, pp. 279 a 281; e Ac. RL de 14/02/83, in CJ, 1983, I, 189 a 193) e da doutrina.
l) Acresce que, a irrevogabilidade da decisão de despedimento, propugnada pelo Mmo. Juiz a quo, é de todo incompatível com os efeitos da vigência do contrato de trabalho durante o prazo de aviso prévio, pois não obstante estar a decorrer um prazo de aviso prévio findo o qual o contrato de trabalho cessará, até que tal cessação ocorra efectivamente, aquele contrato mantém-se plenamente em vigor, mantendo-se, como tal, todos os direitos e deveres das partes, nomeadamente o poder disciplinar do empregador.
m) Efectivamente, pode suceder que, no decurso daquele prazo de aviso prévio o trabalhador pratique infracções disciplinares, infracções essas que poderão até ser susceptíveis de dar origem a uma situação de justa causa de despedimento.
n) Ora, a aceitar-se o entendimento do Tribunal a quo, o empregador nada poderá fazer em tal situação ou, pelo menos, a verificar-se uma situação de justa causa de despedimento, o empregador não poderá reagir disciplinarmente contra o trabalhador, maxime aplicando-lhe a sanção de despedimento com justa causa, uma vez que se encontra irremediavelmente vinculado a uma anterior decisão de despedimento por extinção de posto de trabalho.
o) Assim, por tudo o que se deixou exposto, e contrariamente ao que entendeu o Mmo. Juiz a quo, a decisão de despedimento por ocorrência de justa causa não pode deixar de se considerar eficaz, tendo, como tal, o contrato de trabalho do Recorrido cessado através deste despedimento (com justa causa ou não, caberia ao Tribunal ter apreciado, o que não fez).
p) No que respeita ao entendimento da sentença recorrida de que, quando a comunicação de instauração de um processo disciplinar foi recebida pelo Recorrido, o prazo de aviso prévio já havia decorrido na íntegra, e só assim não seria se se demonstrasse que aquela declaração não havia sido oportunamente recebida pelo Recorrido por culpa sua, o que não teria sucedido, não pode igualmente este entendimento proceder.
q) De facto, o Recorrido não se recusou a receber a carta, nem se ausentou para parte incerta. A questão está, na verdade, no tempo decorrido entre a data em que foi tentada a entrega (12.06.2008) e a data em que o Recorrido levantou a carta nos correios (18.06.2008).
r) Com efeito, no dia imediatamente a seguir, o correio tentou a entrega do documento no domicílio do Recorrido, não o tendo conseguido por o destinatário se encontrar ausente, pelo que, nesse dia 12.06.2008, pelas 12:30, ficou na caixa do correio do Recorrido o correspondente aviso, indicando que a carta registada devia ser levantada na estação de correios.
s) Todavia, só no dia 18.06.2008 é que o Recorrido, por sua única e exclusiva decisão, levantou a correspondência na estação dos correios, sendo certo que o podia ter feito logo no dia 12.06.2008 ou, admitindo que só viu o aviso depois de a estação estar encerrada, pelo menos desde o dia 13.06.2008.
t) A propósito do citado art. 224.º ensina a doutrina autorizada que a declaração se tem por “chegada ao poder do destinatário” quando “foi levada à proximidade do destinatário de tal modo que, em circunstâncias normais, este possa conhecê-la, em conformidade com os seus usos pessoais ou os usos do tráfico (v. g. apartado, local de negócios, casa)” – MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 4. ª ed. (PINTO MONTEIRO E PAULO MOTA PINTO), Coimbra, 2005, p. 440.
u) Esclarece-se ainda que “uma enfermidade, uma ausência transitória de casa ou do estabelecimento são riscos dos destinatários”, devendo portanto, também nessas ocasiões, ter-se a declaração por recebida quando foi deixada no endereço postal do destinatário ou quando aí se deixou o respectivo aviso da sua existência; já será risco do declarante, o atraso dos correios ou do meio por ele escolhido para fazer chegar a declaração ao poder do destinatário.
v) Assim, ao empregador não é exigível que assegure que, além de chegar ao poder do destinatário, a declaração seja por ele efectiva e materialmente recebida no prazo em causa. Depois de colocada na disposição ou “proximidade do destinatário”, o risco do efectivo recebimento passa a correr por conta deste.
w) Como tal, tendo o correio deixado no endereço do Recorrido, no dia 12.06.2008, o aviso da existência de correspondência registada que ao mesmo cabia levantar, deve entender-se que foi essa a data em que a declaração de intenção de despedimento e a Nota de Culpa chegaram ao poder do destinatário.
x) Quanto muito, poderia admitir-se que só se consideraria como tal o dia 13.06.2008, data em que o Recorrido seguramente já tinha obrigação de saber da existência do aviso que lhe foi deixado pelo serviço postal.
y) Como tal, essa comunicação produziu plenamente os seus efeitos, suspendendo o prazo de aviso prévio que se encontrava em curso e dando início ao procedimento disciplinar que veio a culminar com o despedimento do Recorrido.
z) Sem prejuízo do que atrás se deixou dito e, como tal, sem conceder e por mera cautela de patrocínio, a entender-se que o contrato de trabalho do Recorrido cessou mediante despedimento por extinção do posto de trabalho, contrariamente ao que entendeu o Tribunal a quo, esse despedimento é plenamente válido, não se verificando, desde logo, a invalidade que lhe aponta a sentença, por falta de pagamento ao Autor da compensação prevista nos arts. 401.º, 403.º, nº 1, al. e) e 432.º d), todos do CT.
aa) Com efeito, não pode deixar de se considerar que a Ré, ora Recorrente, pautou toda a sua actuação considerando que procedeu ao despedimento do Autor por verificação de justa causa de despedimento e não por extinção do posto de trabalho.
bb) Como é natural, a Recorrente não colocou à disposição do Recorrido a compensação prevista no art. 401.º do CT, pois, de acordo com o entendimento que propugna, não foi esse o modo de cessação do contrato do Recorrido.
cc) Trata-se de situação equiparável à dos créditos laborais litigiosos, cujo não pagamento não pode, igualmente, afectar a validade do despedimento (por extinção do posto ou despedimento colectivo), conforme ensina Bernardo Xavier.
dd) Como tal, no caso aqui em apreço, o não pagamento ao Recorrido da compensação prevista no art. 401.º do CT, não invalida o despedimento, como entendeu a sentença recorrida, pois se naqueles casos estamos perante créditos litigiosos, no caso em apreço é o próprio modo de cessação do contrato (despedimento por extinção de posto ou por justa causa) que se encontra em litígio.
ee) No que respeita ao outro fundamento em que se baseia a sentença recorrida para considerar a ilicitude do despedimento do Autor, isto é, a não observância, por parte da Ré, dos critérios previstos no n.º 2 do art. 403.º do CT, a observância ou inobservância de tais critérios não poderia ter sido conhecida pelo Tribunal a quo.
ff) Com efeito, a observância ou inobservância por parte da Ré ora Recorrente dos critérios a que faz referência o art. 403.º, n.º 2 do C.T. não foi, em momento algum, alegada pelo Autor.
gg) Nos termos do art. 264.º, n.º 1 do CPC, “Às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”, dispondo o n.º 2 daquele preceito que “O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa”.
hh) Não se verifica, in casu, nenhuma das situações a que aludem os referidos artigos 514.º e 665.º do CPC, assim como, os factos em causa, isto é, os factos que integram os requisitos do citado art. 403.º, n.º 2 do CT, não só não são “factos instrumentais” (muito pelo contrário são factos essenciais à apreciação da licitude do despedimento por extinção do posto) como não resultaram da instrução e discussão da causa.
ii) Acresce que, ainda que assim tivesse sido, a parte interessada (o Autor) não manifestou qualquer vontade de deles se aproveitar, nem à Ré ora Recorrente foi facultado o exercício do contraditório.
jj) Com efeito, a consideração de que a Ré não observou os critérios previstos no art. 403.º, n.º 2 do CT, não tendo a Ré, em momento algum, tido a oportunidade de se pronunciar sobre a observância de tais critérios, sempre consubstanciaria uma flagrante violação do princípio do contraditório, plasmado no art. 3.º do CPC.
kk) Em suma, a entender-se que o contrato de trabalho do Autor cessou mediante despedimento por extinção de posto de trabalho, não podem considerar-se procedentes os fundamentos invocados pela sentença para declarar a ilicitude de tal despedimento, tendo, como tal, a sentença violado o disposto nos artigos 401.º e 403.º do CT.
ll) No que respeita aos créditos reclamados pelo Recorrido, e quanto à indemnização, considerou o Tribunal a quo a ilicitude do despedimento como especialmente grave, não só porque a Recorrente decidiu extinguir o posto de trabalho do Recorrido em detrimento de outro, sem critério, como, para além disso, que a Recorrente não atribuiu ao Recorrido quaisquer funções efectivas após o trânsito em julgado da anterior sentença, tendo o Autor ficado quase cinco anos sem poder exercer a sua profissão.
mm) No que respeita ao primeiro aspecto, conforme se deixou dito, não poderia o Tribunal a quo ter considerado que a Recorrente não observou os critérios a que se refere o art. 403.º, n.º 2 do CT, pelo que não pode o Tribunal basear-se em tal facto para apreciar a gravidade da ilicitude do despedimento do Recorrido.
nn) Para além disso, no que respeita à atribuição de funções ao Recorrido, importa esclarecer que o trânsito em julgado da sentença a que se refere o Tribunal a quo apenas ocorreu a 14.01.2008 (cfr. ponto 19 dos factos provados), sendo certo que no dia 01.02.2008 a Recorrente deu início ao processo de extinção do posto de trabalho do Autor (cfr. ponto 24 dos factos provados).
oo) Quanto aos “cinco anos sem exercer a profissão mesmo após ter sido ordenada judicialmente a sua reintegração”, a que se refere a sentença, note-se que a providência cautelar a que aqui se faz referência (que não foi, note-se, de suspensão do despedimento, pois este não havia ainda ocorrido) embora tenha ordenado a reintegração do Recorrido a 23.05.2003, somente transitou em julgado a 19.02.2004, sendo certo que no dia 20.06.2003 foi aplicada ao Autor a sanção disciplinar de despedimento com justa causa.
pp) Por seu lado, entre o trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento do Autor e a comunicação do início do processo de extinção do seu posto de trabalho mediaram cerca de 15 dias.
qq) Durante os quais, como se explica na comunicação inicial do processo de extinção do posto de trabalho (ponto 24 dos factos provados), já não existiam funções para atribuir ao Autor, uma vez que a extinção do seu posto se reportava a Janeiro de 2004.
rr) É pois absolutamente falaciosa a fundamentação da sentença recorrida, ao referir que o Autor esteve cinco anos sem exercer a sua profissão, para daí concluir pelo elevado grau de ilicitude do despedimento, pois todo o período em que o Autor esteve “sem exercer a sua profissão” está, como se viu, plenamente justificado nos autos.
ss) Foi ainda a Recorrente condenada a pagar o montante de € 19.876,67, a título de IRS pago a mais pelo Recorrido.
tt) Este alegado prejuízo sofrido pelo Recorrido teria resultado, directamente, segundo o Tribunal a quo, da circunstância de este ter recebido, de uma só vez e no mesmo ano (2008), todas as remunerações vencidas no período compreendido entre 2003 e 2008, na sequência do trânsito em julgado de uma anterior sentença que apreciou um outro despedimento a que este foi sujeito.
uu) Ora, a questão fiscal é totalmente alheia ao empregador, na medida em que compete apenas e só ao legislador estabelecer as regras necessárias à tributação dos rendimentos, de forma a que o trabalhador não seja prejudicado pelo facto de receber, de uma só vez, as retribuições referentes a vários anos.
vv) Repare-se, a este propósito, que o artigo 74.º do CIRS representa, de algum modo, uma tentativa de reduzir eventuais prejuízos decorrentes do facto de serem pagos ou colocados à disposição do sujeito passivo, num determinado ano, rendimentos produzidos em anos anteriores.
ww) Todavia, o mecanismo previsto no artigo 74.º do CIRS poderá não excluir totalmente a possibilidade de um contribuinte que deva imputar, no ano a que respeita a declaração, os rendimentos produzidos em anos anteriores, vir a ser, de algum modo, penalizado, através da aplicação de uma taxa superior àquela que seria devida se a imputação fosse feita por referência ao ano em que tais rendimentos foram efectivamente produzidos.
xx) No entanto, a Recorrente, enquanto entidade empregadora, terá de ser considerada totalmente alheia a esse facto, pois a responsabilidade não pode depender da solução – mais ou menos favorável para o contribuinte/trabalhador – que o legislador vá consagrando ao longo do tempo.
yy) Considerou a sentença serem devidos ao Recorrido créditos de horas de formação vencidos no dia 01.01.2005, o que não pode aceitar-se.
zz) Com efeito, deve entender-se que o limite que o art. 125.º, n.º 5, do CT coloca à acumulação das horas anuais de formação funciona também como um prazo de caducidade para o exercício do direito anual à formação. Esgotado esse período, se o trabalhador não fizer uso do crédito de horas de que disponha através da sua utilização em acções de formação escolhidas por si, tal crédito caduca.
aaa) Significa isto que “os créditos do quarto e demais anos anteriores ao da cessação do contrato não devem ser tidos em conta por virtude de caducidade pelo seu não uso” (J. Soares Ribeiro, “Formação Contínua dos Trabalhadores”, Minerva, Revista de Estudos Laborais, Universidades Lusíada, Ano VI, n.º 10, 2007, p. 47).
bbb) Como tal, decidiu mal a sentença ao condenar a Ré a pagar ao Autor o crédito de horas referente à formação vencida no dia 01.01.2005, violando assim o artigo 125.º do Código do Trabalho e art.161.º da RCT.
ccc) Condenou ainda a sentença recorrida a Ré ora Recorrente a pagar ao Autor o montante de € 5.760,00 relativo a prémios de um seguro de saúde que a Ré retirou ao Recorrido, por entender que a atribuição de tal seguro de saúde ao Recorrido integra a remuneração do mesmo, traduzindo-se tal benefício no valor do prémio de seguro que era suportado pela Recorrida, no valor de € 80,00 mensais.
ddd) Não pode, todavia, aceitar-se tal decisão, pois aquele seguro de saúde foi disponibilizado pela Recorrente a alguns dos seus trabalhadores a título de mera liberalidade, não integrando como tal a retribuição dos mesmos, nomeadamente a do Recorrido, pelo que não está a Ré de modo algum vinculada à sua atribuição.
eee) De todo o modo, ainda que se considerasse que aquele seguro de saúde integrava a remuneração do Recorrido, tal remuneração traduzir-se-ia necessariamente nas vantagens que o Recorrido poderia retirar daquele seguro, e nunca no valor do prémio.
fff) De facto, a componente remuneratória daquele seguro – a conceber-se tal hipótese - não pode deixar de ser a vantagem que o Recorrido pode retirar, ou não, do mesmo, beneficiando, por exemplo, de consultas médicas e exames médicos a preços reduzidos.
ggg) O Recorrido teria pois que ter alegado e provado, o que não sucedeu, que, por lhe ter sido retirado aquele seguro de saúde, despendeu determinadas quantias, por exemplo, em consultas e exames, que não teria despendido caso tivesse beneficiado do mesmo.
hhh) Não pode é ser a Recorrente condenada a pagar ao Recorrido o montante de € 80,00 por mês, quando se trata de quantia que nunca a Recorrente atribuiu ao Recorrido.

Nestes termos e nos melhores de Direito e com o douto suprimento que se invoca deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida na parte de que ora se recorre e substituindo-se por outra onde se acolha a pretensão da Recorrente.
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7. O Autor apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma:
“QUANTO ÀS ARGUIDAS NULIDADES DA SENTENÇA

Para além do que mais ao diante será referido, cabe dizer que:
a)- Tendo o Tribunal a quo julgado procedente o respectivo pedido e declarado a ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho, nada mais podia fazer senão abster-se de prosseguir na apreciação do pedido respeitante à ilicitude do despedimento disciplinar formulado subsidiariamente pelo Autor, não existindo portanto qualquer causa de nulidade por omissão de pronúncia;
b)- Tendo o Tribunal declarado não provada pelo empregador a observância dos requisitos legais do despedimento por extinção do posto de trabalho, não há de qualquer modo fundamento de nulidade por excesso de pronúncia, pois lhe incumbe exactamente a ele, empregador, provar em juízo a exactidão dos factos justificativos do despedimento e que se consideram susceptíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho.

QUANTO AOS FUNDAMENTO DA ALEGAÇÃO

Quanto às conclusões a) a y) das doutas alegações da Recorrente

a) Transmitida ao trabalhador a decisão final de despedimento por extinção do seu posto de trabalho, a declaração da suspensão do prazo de 60 dias previsto na lei não pode ter lugar em momento posterior à recepção da declaração. Para ainda poder aniquilar os efeitos daquela, terá pois que ser anterior ou contemporânea da mesma: como é próprio da declaração unilateral receptícia, ela é eficaz, irreversível e irrevogável nos termos do artº 224º/1 do CCiv.
b) O dito prazo de aviso prévio não tem por finalidade permitir a reponderação dos fundamentos do despedimento por parte da entidade empregadora ou qualquer outro motivo que pudesse fazê-la voltar atrás na sua pretensão, antes se destina, sobretudo, a possibilitar ao trabalhador a obtenção de outro emprego (cfr ANTÓNIO MONTEIRO FERNANDES, Direito do Trabalho, 10ª ed., p 527).

a)- Não é admissível a decretação da sanção de despedimento na pendência do prazo de aviso prévio posterior à declaração de despedimento por extinção do posto de trabalho. Não se pode, a pretexto de ainda decorrer esse prazo, pretender que o contrato de trabalho e o poder disciplinar subsistem e se prolongam no decurso dele para o efeito de ser instaurado processo disciplinar com a intenção de ser aplicada a sanção de despedimento com justa causa.
b)- É absurdo defender que, já decretado o fim do contrato precisamente por despedimento – conquanto ancorado na extinção do posto de trabalho –, a entidade patronal possa decretá-lo de novo, porém agora como sanção e com fundamento na culpa. Se os factos em causa deverem ser valorados, isso não será em acção disciplinar com vista ao despedimento, por tal exceder manifestamente as finalidades que o direito quer atingir com a sanção, isto é, disciplinares. Ao empregador eventualmente lesado estão reservados os meios judiciais comuns de defesa de bens e interesses, nos termos gerais de direito.
c)- Este entendimento é ademais congruente com a previsão legal de que, recebida pelo trabalhador a comunicação da decisão final de extinção e despedimento, o trabalhador fica com o direito de denunciar o contrato (artº 400º, ex vi do artº 404º do CTrab). Nascido tal direito potestativo do trabalhador, não é viável a coexistência, com ele, doutro da entidade patronal de se “arrepender” ou retractar quanto à declaração de extinção, por serem real e logicamente incompatíveis, não podendo pretender-se que a lei permita que a invocação deste direito bloqueie o exercício daquele ou o anule.
d)- E outrossim é congruente com o facto de que, do exercício ilícito da faculdade de despedir por extinção do posto de trabalho, nasce também de imediato o direito potestativo do trabalhador de optar pela compensação prevista na lei, opção que não pode ser frustrada pela consagração de um direito contraditório.

a)- A simples ausência do destinatário da sua residência no momento em que foi tentada a entrega e uma carta registada não pode, por si só, integrar-se no conceito de culpa para os fins previstos no art. 224º/2 do CCiv: tutelando-se neste normativo a posição do declarante, em razão do princípio da boa fé, pretendendo-se evitar fraudes e evasivas por parte do declaratário, é imprescindível averiguar se, em concreto, este adoptou um comportamento pautado pela lealdade, probidade e correcção (cfr. Almeida Costa, “Obrigações”, 3ª. Edição, pág. 715) ou se, pelo contrário, actuou com má fé, comportando-se com o objectivo de dificultar, evitar ou impedir a recepção da declaração (em tempo oportuno).
b)- A ausência da residência de qualquer destinatário postal constitui, hoje em dia, uma situação normal, frequente e, mesmo, previsível. Por esse motivo, as cartas enviadas sob registo não são, desde logo, devolvidas ao remetente, devendo ser levantadas na estação de correios, mediante a entrega do aviso depositado na caixa de correio da residência do destinatário, dentro do prazo estabelecido no regulamento dos correios. E foi o que sucedeu no caso dos autos: tentada a entrega no dia 12-06-2008 (uma Quinta-feira), a carta veio a ser levantada na Quarta-feira seguinte (dia 18), ou seja no 4º dia útil seguinte e dentro do prazo previsto no referido regulamento. Pelo que o Autor não adoptou qualquer comportamento desleal ou incorrecto: não recusou a recepção da carta, não se negou a ir levantá-la aos correios, nem se ausentou da sua residência para parte incerta.
c)- Assim e para os efeitos previstos no art. 224º Cód. Civil (de eficácia da declaração negocial), não tendo o Autor agido com má fé, o conhecimento da comunicação em causa apenas pode considerar-se eficaz a partir do momento em que a mesma chegou ao seu poder, ou seja, na data da sua efectiva entrega ao destinatário.

Por consequência, a conclusão é a seguinte: a comunicação da pretendida suspensão do prazo de aviso prévio supra referido só chegou ao conhecimento do Autor, sem culpa sua, depois do decurso integral do mesmo prazo, pelo que nunca poderia ter o efeito pretendido.

Quanto às conclusões z) a dd) das doutas alegações da Recorrente

Resulta dos autos que a Ré não procedeu ao pagamento ao Autor da compensação prevista no art. 401º do Cód. do Trabalho. Visto que tal compensação constitui uma verdadeira condição de validade do despedimento (neste sentido, ANTÓNIO MONTEIRO FERNANDES, op. cit., p 528), como se afere do disposto na al. e) do nº 1 do art. 403º do mesmo código. Por isso, o despedimento por extinção do posto de trabalho, aqui em causa, verificou-se efectivamente; mas é ilícito, com os devidos e legais efeitos.

Quanto às conclusões ee) a kk) das doutas alegações da Recorrente

a)- Uma vez que o despedimento é considerado ilícito designadamente quando “forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento”, nos termos do artigo 429º/1 do CTrab, incumbe ao empregador provar em juízo a exactidão dos factos justificativos do despedimento e que se consideram susceptíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho (ou seja, demonstrar a existência dos fundamentos invocados, a observância dos requisitos impostos pelo art. 403º e o necessário nexo causal ou de adequação entre os aludidos fundamentos e a decisão tomada de extinção do posto de trabalho do autor). Ao autor cumpre apenas alegar e provar o despedimento (artºs 342º/1 e 2 CCiv e artº 435º/3 do CTrab; bem como, entre outros, o Ac. do STJ de 16-01-2008, in www.dgsi.pt, processo 07S4105).
b)- O fundamento da necessidade de extinguir o posto de trabalho tem que ser consubstanciado com a alegação pelo empregador de motivos concretos e claros, não bastando a invocação da necessidade de diminuir os custos (sic Ac. STJ de 04-07-2002 processo 2389/01, 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt documento SJ200207040023894).
c)- Revertendo ao caso concreto, no que respeita a esta questão, a factualidade adquirida pelo processo é insuficiente para que possa considerar-se demonstrada a verificação de todos os pressupostos legalmente exigíveis para a licitude do despedimento por extinção de posto de trabalho. Desde logo, a Ré não procedeu ao pagamento ao Autor da compensação prevista no art. 401º do CTrab; nem resulta do processo junto com a contestação da Ré que tenham sido observados os critérios previstos no nº 2 do aludido art. 403º, quanto à preferência dada à extinção do posto de trabalho do Autor e não do outro gerente da loja de Braga (cujas funções não poderiam deixar de ser equivalentes e as categorias profissionais de ambos equiparadas).
d)- Assim, a inobservância dos requisitos acima apontados determina a invalidade do despedimento e, consequentemente, a respectiva ilicitude.

Quanto às conclusões ll) a rr) das doutas alegações da Recorrente

Para apreciar a gravidade da ilicitude do despedimento do Recorrido, é em especial relevante ter em conta o facto de que, efectivamente, a Ré se recusou sempre a cumprir uma decisão judicial proferida em 23-05-2003, uma providência cautelar para ser cumprida de imediato, sem qualquer efeito suspensivo; de que, por via disso, o A. esteve pelo menos “cinco anos sem exercer a profissão mesmo após ter sido ordenada judicialmente a sua reintegração”; que o “despedimento” de 20-06-2003 a que se refere a conclusão oo) é uma inexistência jurídica, porquanto decretado por sociedade que não era a entidade patronal do Autor, apesar disso a Ré o tendo acatado como se dela fosse a decisão; que o posto de trabalho do A. na ora Recorrente não foi extinto, antes vagou porque a Ré não o reintegrou de facto.

Quanto às conclusões ss) a xx) das doutas alegações da Recorrente

Tendo em conta o que consta da sentença acerca da decisão sobre a matéria de facto julgada provada, que a Recorrente não impugnou, está demonstrado que “devido ao pagamento deste montante, de uma só vez e apenas na referida data, o Autor pagou a quantia de € 71.132,04 a título de IRS (ponto 22º dos factos provados)”; e “provou-se, ainda (ponto 23º), que caso a Ré lhe tivesse pago as remunerações, mensal e periodicamente, desde Junho de 2003, ao longo daqueles anos, o A. teria pago de IRS um total de apenas € 53.255,37”. Por conseguinte, ficou claramente estabelecido o nexo de causalidade entre o pagamento tardio e o dano causado ao Autor (montante de 19 876,67 € pago a mais a título de IRS), o que constitui matéria de facto que não pode ser alterada e que o Recorrente nem sequer atacou.

Quanto às conclusões yy) a hhh) das doutas alegações da Recorrente
10ª
a) No respeitante ao valor de créditos relativos a formação obrigatória não proporcionada, deve considerar-se que o prazo de 3 anos previsto no nº 5 do artº 125º não é de caducidade. Seria necessário, para tanto, em conformidade com o estipulado no artº 298º/2 do CCiv, estar previsto que o direito à formação tem de ser exercido dentro desse prazo, o que não acontece. Por outro lado, é certo que o direito à formação não pode ser directamente exercitado pelo trabalhador, antes a sua organização é da responsabilidade do empregador. Bem assim, o Regulamento do CT estipula, no citado preceito, que é “cessando o contrato de trabalho” que o trabalhador tem o direito de os valores dos créditos em causa.
b) Quanto ao valor de € 5.760,00 relativo a prémios de um seguro de saúde retirado ao Autor pela Ré desde 20-06-2003, motivo pelo qual deixou de usufruir dele desde então, a verdade é que está provado que a Ré atribuiu o seguro ao A. até aquela data (cfr. ponto 15º); e considerando a prestação tem carácter regular e periódico (apenas interrompido na data em que o Autor foi despedido pela primeira vez), não pode oferecer quaisquer dúvidas sobre que esta prestação tem natureza remuneratória; e não poderá deixar de ser equivalente ao valor do prémio de seguro que era suportado, de 80,00 € mensais.
11ª
Deve ser negado provimento à apelação e confirmada a douta sentença recorrida.”
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8. O Ex.º Procurador-Geral Adjunto deu o seu parecer no sentido da não verificação das invocadas nulidades da sentença e que o recurso interposto não merece provimento.
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9. Admitido o recurso, foram colhidos os vistos legais.
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II – Questões a Decidir
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, temos que as questões a decidir são as seguintes:
1. Nulidade da sentença: omissão de pronúncia e excesso de pronúncia.
2. Saber se decidida e comunicada ao trabalhador a cessação do vínculo laboral, por extinção do posto de trabalho, é possível a entidade patronal suspender o prazo prévio em curso;
3. Nomeadamente, para o processamento de procedimento disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa.
4. Saber quando é que a notificação do processo disciplinar, com a nota de culpa, e a declaração de suspensão do prazo de aviso prévio, chegou ao conhecimento do trabalhador/autor.
3. Aderindo-se à tese defendida na sentença recorrida de que a Ré não pôs à disposição do trabalhador, até ao termo do aviso prévio, a compensação a que alude o artigo 401º do CT, e bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, quais as consequências daí decorrentes, a nível:
3.1. do valor da retribuição reconhecida;
3.2. dos créditos laborais arbitrados: quantum da indemnização em substituição da reintegração; condenação atinente ao IRS que o autor pagou a mais; horas de formação de que não beneficiou e o montante correspondente ao seguro de saúde.
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III – FUNDAMENTOS
1-Fundamentos de facto resultantes da decisão da matéria de facto proferida pela primeira instância que este tribunal mantém, porque a matéria de facto não foi impugnada e porque os elementos do processo não impõem decisão diversa, nem foi admitido documento superveniente com virtualidade para infirmar aquela decisão (artigo 712º, nº 1 do CPC):
1. Por força de contratos de trabalho subordinado, o A. trabalhou sucessivamente para as sociedades "F…, S.A." entre 01-09-1991 e 31-07-1998 e, a partir de 01-04-1998, para a sociedade G…, SA, sociedades estas que, tal como a Ré, pertencem ao chamado "E…" [A) dos factos assentes].
2. No dia 1 de Janeiro de 2003, o A. iniciou o desempenho, ao serviço da ora Ré e no estabelecimento desta, sito no …, freguesia de …, concelho e comarca de Braga, das funções de gestão integral da loja, nomeadamente, de pessoal, de stocks, de vendas e outras, competindo-lhe dirigir e superintender as actividades de todos os trabalhadores do estabelecimento de venda por grosso de produtos alimentares, próprias duma grande superfície de cash and carry [B) dos factos assentes].
3. O A., que possuía e possui a especialização de "técnico oficial de contas", vinha exercendo no estabelecimento da B… funções de enquadramento das actividades de outros trabalhadores, de coordenação das mesmas e de definição de orientações [C) dos factos assentes].
4. O referido em 2º ocorreu na sequência de um contrato verbal celebrado entre o A. e a R., mediante o qual o A. passaria, a partir de 01-01-2003, a desempenhar as funções aí referidas, correspondentes às de "…", sob a direcção, orientação e fiscalização da administração da dita R. [D) dos factos assentes].
5. Ficou também acordado entre as administrações de ambas as sociedades interessadas – a B… e a G… – e o A. que, em 31-12-2002, cessaria a relação laboral do mesmo com esta última e que o A. mantinha, ao serviço da ora R., a antiguidade reportada a 11-09-1991, assim contando todo o tempo de serviço referido em 1º até então [E) dos factos assentes].
6. A Ré obrigou-se, ainda, a proporcionar ao A. e a pagar as respectivas despesas, incluindo de combustível e portagens, para uso permanente – pessoal e profissional – devido ao cargo de chefia que ocupava, uma viatura automóvel, então (em Janeiro de 2003) um Volkswagen …, bem como um PC portátil (…) e um telemóvel, incluindo o pagamento das suas despesas [F) dos factos assentes].
7. Entre o A. e as duas sociedades mencionadas não foi celebrado qualquer acordo escrito, mediante o qual tenha sido acordada a cedência ocasional do A. à Ré [G) dos factos assentes].
8. Ao serviço da Ré, o A. auferia em Janeiro de 2003 o salário mensal base de € 3.752,96, acrescido de subsídio de alimentação de € 4,26 diários [H) dos factos assentes].
9. Desde 11-09-1991, o A. foi sendo remunerado mensalmente da seguinte forma: € 972,66 (1991); € 1097,36 (1992); € 1446,51 (1993); € 1496,39 (1994); € 1596,15 (1995); € 1646,03 (1996); € 2314,42 (1997); € 2543,86 (1998); € 2668,57 (1999); € 2858,11 (2000); € 3752,96 (2001, 2002 e 2003) e teve as seguintes categorias profissionais: contabilista, em 1991/1992; chefe de sector entre 1993 e 1997; chefe de departamento entre 1998 e 2002; Director de Loja 2 em 2003 [I) dos factos assentes].
10. Os trabalhadores ao serviço da R. que têm categoria igual ou equivalente à detida pelo A. e qualificações profissionais do mesmo nível (quadro superior) foram beneficiando de progressões salariais posteriormente a 2003 e até 2008 (resposta ao facto 3º da base instrutória);
11. Porém, a trabalhadora da Ré, Sra. D. H…, Gerente, tal como o Autor, desde 2003 e até 2008, auferiu sempre a retribuição de € 3.826,00, não tendo sofrido qualquer evolução salarial no referido período (resposta ao facto 10º da base instrutória);
12. Na Ré não se verificam actualizações salariais para os seus trabalhadores todos os anos, nem actualizações salariais gerais, abrangendo todos os trabalhadores indiscriminadamente, dependendo os aumentos salariais, nomeadamente, do resultado da avaliação de mérito do trabalhador (resposta aos factos 7º e 8º da base instrutória);
13. Anteriormente, aquando da sua transferência do F… para a G…, esta assegurou-lhe "todas as condições contratuais que regulavam a relação juslaboral" com o F… e, bem assim, "todos os direitos e garantias entretanto adquiridos" [J) dos factos assentes].
14. Um desses direitos ou benefícios era dispor de um seguro de saúde da …, abrangendo todo o agregado familiar [K) dos factos assentes].
15. A Ré atribuiu ao Autor este benefício referente ao seguro de saúde, cujo prémio mensal ascendia ao valor de € 80,00, mas o mesmo deixou de poder dele usufruir desde 20-06-2003 até 2008, inclusive [L) dos factos assentes].
16. No dia 20-06-2003, na sequência de um processo disciplinar que lhe havia sido movido e que havia determinado a sua suspensão preventiva do trabalho, o A. recebeu uma comunicação da G…, no sentido de que o Presidente do seu Conselho de Administração, I…, decidiu aplicar-lhe "a sanção de despedimento, com efeitos a partir da data da comunicação desta decisão ao trabalhador" [M) dos factos assentes].
17. Com vista a que a R. de imediato permitisse o seu regresso ao exercício de suas funções e lhe entregasse o que lhe tinha retirado ilegitimamente, no dia 15-04-2003 o A. intentou procedimento cautelar comum, o qual correu termos pelo 2º Juízo sob o nº 528/03.0TTBRG, no âmbito do qual foi determinado em 23-05-2003 à Ré que readmitisse o A. ao seu serviço, no mesmo lugar, dando sem efeito a decretada suspensão do trabalho, decisão que transitou em julgado em 19-02-2004 [N) dos factos assentes].
18. Porém, a R. não permitiu o regresso do A. ao seu local de trabalho na sequência do decretado nessa providência [O) dos factos assentes].
19. O Autor impugnou judicialmente aquele despedimento através da acção que, com o nº 820/03.4TTBRG, correu termos por este Tribunal e 1º Juízo, que culminou com a decisão, que transitou em julgado em 14-01-2008, de condenação da Ré:
- a reconhecer que ela e o Autor se encontravam vinculados por contrato verbal de trabalho subordinado desde 01-01-2003 e válido por tempo indeterminado, porém com antiguidade reportada a 01-09-1991, competindo ao mesmo Autor as funções correspondentes à classificação profissional de "…" (CCT ANACPA / FETESE, BTE 8-2000, BTE 10-2001);
- a reintegrar definitiva e imediatamente o Autor ao seu serviço, para exercer as suas funções no seu estabelecimento sito na freguesia de Nogueira, concelho de Braga, onde as vinha desempenhando, dando sem efeito a sua suspensão;
- a pagar ao Autor a importância correspondente a todas as retribuições que este deixou de auferir desde a data da suspensão […] até à sua efectiva reintegração;
- a entregar ao Autor os bens e equipamentos que se obrigou a proporcionar-lhe, como inerentes ao seu cargo de chefia e para seu uso tanto pessoal como profissional, a título permanente, nomeadamente uma viatura automóvel da marca Volkswagen, modelo … (ou da mesma gama e nível de preço), um telemóvel e um computador portátil (… ou similar), bem como a suportar as respectivas despesas, incluindo combustível e portagens [P) dos factos assentes].
20. A Ré não chegou a atribuir ao Autor quaisquer funções efectivas e deixou de lhe pagar as respectivas remunerações a partir de Junho de 2003 [Q) dos factos assentes].
21. Por transferência bancária efectuada em 01-02-2008, a Ré pagou-lhe o montante de € 147.230,54, a título de remunerações referentes aos anos de 2003 a 2008 [R) dos factos assentes].
22. Devido ao pagamento do montante referido em 18º, de uma só vez e apenas na data aí indicada, o Autor pagou a quantia de € 71.132,04 a título de IRS (resposta ao facto 1º da base instrutória).
23. Caso a Ré lhe tivesse pago as remunerações, mensal e periodicamente, desde Junho de 2003, ao longo daqueles anos, o A. teria pago de IRS um total de € 53.255,37 (resposta ao facto 2º da base instrutória).
24. Com data de 01-02-2008, a Ré endereçou ao A. uma carta, sob o assunto “Extinção de posto de trabalho” e com o seguinte teor:
“[…] a B…, S.A., introduziu, a partir de 2001, uma alteração ao modelo de gestão da sua loja de Braga, com a criação de mais um posto de responsável de loja, passando esta a ter uma gestão bipartida, posto este atribuído a V. Exa. a partir de Janeiro de 2003.
Infelizmente, este modelo mostrou-se inoperante […] o que, associado aos elevados custos com a sua manutenção, forçou a B…, S.A. em Janeiro de 2004, a regressar ao modelo de gestão única, com a consequente extinção do posto de trabalho de … ocupado por V. Exa..
[…]
Assim, nos termos e para os efeitos do artigo 423.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, vimos por este meio comunicar a necessidade de proceder à extinção do posto de trabalho de …, ocupado por V. Exa., em virtude duma necessária e imperiosa reestruturação e reorganização ocorrida na empresa, e a consequente cessação do correspondente contrato de trabalho.
[…]
A extinção do posto de trabalho ocupado por V. Exa. implicará a cessação do contrato de trabalho existente com a B…, S.A.. Contudo, a cessação do vínculo laboral apenas se concretizará no termo do processo agora iniciado, ou seja, com a comunicação da decisão final, que oportunamente lhe será enviada e da qual constará, entre outros elementos exigidos por lei, a data prevista para a cessação do contrato de trabalho.
Lembramos ainda que, nos termos legais, a cessação do contrato lhe será formalmente comunicada com uma antecedência não inferior a 60 dias relativamente à data prevista para a mesma e que, em qualquer caso lhe será sempre garantido o pagamento da retribuição correspondente a esse período. […]”[S) dos factos assentes].
25. Por correspondência datada de 16-04-2008 e recebida no dia seguinte, a R. comunicou ao A. a decisão final proferida no processo, isto é, a “extinção do posto de trabalho” do A. e a cessação do contrato, uma vez decorridos 60 dias consecutivos da data da recepção daquela decisão final [T) dos factos assentes].
26. Esta decisão fundou-se, designadamente, na “… ocorrência de motivos estruturais justificativos da extinção do posto de trabalho (…), nos termos dos artigos 402.º e 397.°, n.º 2, do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto) …” [U) dos factos assentes].
27. Devido a alterações ocorridas a partir do final de 2004 no modelo de gestão da loja de Braga da Ré, esta havia deixado de contar, desde então, com uma gestão bicéfala, tendo regressado ao modelo de gestão única (resposta ao facto 4º da base instrutória);
28. Na loja de Braga, passou a existir apenas um cargo de director de loja já preenchido por outro funcionário da Ré, tendo deixado de existir naquele estabelecimento outra função ou cargo compatível com a categoria do Autor (resposta ao facto 5º da base instrutória);
29. Deixou, também, de existir a possibilidade de ocupação alternativa para o Autor, no âmbito de uma função ou cargo compatível com a categoria do Autor (resposta ao facto 6º da base instrutória);
30. O Autor remeteu ao Presidente do E…, J…, a carta cujo teor consta da cópia junta a fls. 121, datada de 15 de Maio de 2008 [V) dos factos assentes].
31. No dia 11-06-2008, através de carta registada com A/R, a Ré enviou ao Autor uma comunicação, recebida por este no dia 18 do mesmo mês, notificando da instauração de um processo disciplinar com a intenção de o sancionar com o despedimento e com suspensão preventiva da prestação do trabalho (sem perda de retribuição), bem como da respectiva “nota de culpa” constante de fls. 136 e 137, na qual foi determinada a suspensão do prazo de aviso prévio inerente à decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho (cfr. aditamento de fls. 280) [W) dos factos assentes].
32. No dia imediatamente a seguir ao envio, o correio tentou a entrega desta comunicação no domicílio do Autor, mas não o conseguiu por o destinatário se encontrar ausente, pelo que ficou na caixa do correio do Autor o correspondente aviso, indicando que a carta registada devia ser levantada na estação de correios [X) dos factos assentes].
33. Em 02-07-2008 o A. respondeu à nota de culpa, juntando documentos e requerendo que os Ex.mos Instrutores do processo disciplinar promovessem a junção aos autos aos dos comprovativos das vendas do ano de 2002 respeitantes aos seguintes clientes: K…, Lda; L…; M…, SA; N…; O…, Lda; P…; Q…; S…, Lda; T…; U…; bem como o valor reportado pela B… à DGCI referente a estes clientes (mapas recapitulativos de clientes) [Y) dos factos assentes].
34. A ré recebeu esta resposta no dia 03-07-2008, não tendo efectuado qualquer diligência probatória requerida pelo A., com fundamento na sua falta de pertinência e efeito meramente dilatório, nos termos do respectivo despacho proferido no dia 18-07-2008 no processo disciplinar, cuja cópia se encontra a fls. 179 e 180, do qual o Autor não foi notificado [Z) dos factos assentes].
35. Em 08-08-2008 esta comunicou por escrito à A. a aplicação da sanção de despedimento com justa causa, sem qualquer indemnização de antiguidade, nos termos e pelos fundamentos constantes do relatório final de instrução e da decisão final de fls. 162 a 177 [AA) dos factos assentes].
36. Os elementos contabilísticos a que o Autor se reporta na carta referida em V) constituem documentos internos da Ré, com informações reservadas e confidenciais, às quais os trabalhadores apenas têm acesso para o exercício das suas funções (resposta aos factos 12º e 13º da base instrutória).
37. Nos anos de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 a R. não proporcionou ao A. formação nem crédito de horas [BB) dos factos assentes].

2. De Direito.
Feita esta enumeração, e delimitado como está o objecto do recurso pelas conclusões das alegações dos recorrentes, passaremos a apreciar as questões a decidir.
1.Nulidades da sentença
1.a. Omissão de pronuncia
Começou a Ré por invocar a nulidade da sentença prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPC, por, no seu entendimento, o Tribunal a quo não ter tomado conhecimento do despedimento de que o autor foi receptor, ou seja, impunha-se ao Tribunal dizer se ocorreu ou não justa causa para tal. Estamos perante a chamada omissão de pronúncia.

De acordo com o expresso no artigo 668º, nº 1 do CPC,
“É nula a sentença:
a) Quando não contenha a assinatura do juiz;
b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão;
d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.”

A nulidade prevista na alínea d), nº 1, do artigo 668º do C.P.C., está directamente relacionada com o comando que se contém no n.º 2, do artigo 660.º, servindo de cominação ao seu desrespeito: o Juiz deve resolver na sentença todas as questões[1] (não resolvidas antes) que as partes tenham suscitado, com excepção daquelas que estejam prejudicadas (tornadas inúteis) pela solução já adoptada quanto a outras.
Todavia, não incorrerá em nulidade por omissão de pronúncia prevista no artº 668º, nº 1, alínea d), primeira parte, do CPC, a decisão judicial que considerou a questão que lhe era posta e entendeu que a mesma não era de apreciar, aduzindo nesse sentido razões justificativas; em tal caso, só poderá haver erro de julgamento.

Ora, foi precisamente esta hipótese que se verificou. Na verdade, a decisão judicial – apreciando o principal pedido – considerou que o autor foi alvo de um despedimento por extinção do posto de trabalho ilícito, pelo que entendeu que, face a essa conclusão jurídica, todas as questões relacionadas com o eventual despedimento subjectivo – por justa causa – ficaram prejudicadas, na medida em que a relação laboral cessou, não com este despedimento, mas com o primeiro.
Saber se esta solução juridicamente está correcta ou não é coisa que se decidirá mais à frente e que apenas tem a ver com um eventual erro de julgamento.

Sendo assim, inexiste qualquer omissão de pronúncia, não se verificando a aludida nulidade da sentença.

1.b. Excesso de pronúncia
Mas a ré não se quedou por esta nulidade, alegando, ainda, que a sentença proferida é nula, nos termos da alínea d), do n.º 1 do artigo 668.º do C.P.C., por se ter pronunciado sobre questão de que não podia tomar conhecimento.
Com efeito, diz ela, a propósito da apreciação da validade do despedimento por extinção do posto de trabalho do Recorrido, pode ler-se na sentença o seguinte: “Acresce que não resulta do processo junto com a contestação da Ré que tenham sido observados os critérios previstos no n.º 2 do aludido art. 403.º, quanto à preferência dada à extinção do posto de trabalho do Autor e não do outro gerente da loja de Braga”.
Assim, o Tribunal considerou a inobservância de tais critérios, não só para fundamentar a sua declaração de ilicitude do despedimento do Recorrido mas também para fundamentar a sua decisão acerca do grau de ilicitude de tal despedimento.
Ora, a observância ou inobservância por parte da Ré ora Recorrente dos critérios a que faz referência o art. 403.º, n.º 2 do C.T. não foi, em momento algum, alegada pelo Autor.

É o chamado excesso de pronúncia.
Verifica-se excesso de pronúncia quando o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, estamos no campo do excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido[2]. Isto sem esquecer que o juiz sempre poderá e deverá conhecer das questões, mesmo que não trazidas ou suscitadas pelas partes, que a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso.

Vejamos:
A disciplina legal do despedimento por extinção do posto de trabalho está prevista nos arts 402º a 404º, 423º a 425º, 429º c) e 432ºdo Código do Trabalho, aprovado pela L 99/2003, de 27.08, aplicável in casu, por ser o vigente à data em que o autor foi despedido[3].
Dispõe, o artigo 402º do CT que “[a[ extinção do posto de trabalho determina o despedimento justificado por motivos económicos, tanto de mercado, como estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa, nos termos para o despedimento colectivo.”
A explicitação destes motivos é operada pelo
- Artigo 397º/2, considerando nomeadamente:
«a) Motivos de mercado: redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado;
b) Motivos estruturais: desequilíbrio económico-financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes;
c) Motivos tecnológicos - alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização dos instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.»
Todavia, nos termos do artigo 403º, nº 1 do CT «[o] despedimento por extinção do posto de trabalho só pode ter lugar desde que, cumulativamente, se verifiquem os seguintes requisitos:
a) Os motivos indicados não sejam devidos a uma actuação culposa do empregador ou do trabalhador;
b) Seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho;
c) Não se verifique a existência de contratos a termo para as tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto;
d) Não se aplique o regime previsto para o despedimento colectivo;
e) Seja posta à disposição do trabalhador a compensação devida.
2 – Havendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, o empregador, na concretização de postos de trabalho a extinguir, deve observar, por referência aos respectivos titulares, os critérios a seguir indicados, pela ordem estabelecida:
1.º Menor antiguidade no posto de trabalho;
2.º Menor antiguidade na categoria profissional;
3.º Categoria profissional de classe inferior;
4.º Menor antiguidade na empresa.
3 – A subsistência da relação de trabalho torna-se praticamente impossível desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador.
4 – O trabalhador que, nos três meses anteriores à data do início do procedimento para extinção do posto de trabalho, tenha sido transferido para determinado posto de trabalho que vier a ser extinto, tem direito a reocupar o posto de trabalho anterior, com garantia da mesma retribuição base, salvo se este também tiver sido extinto.»

Já sobre os direitos do trabalhador cujo contrato cesse por extinção do posto de trabalho remete-se para as regras do despedimento colectivo, dispondo o

Artigo 404º (Direitos do trabalhadores)
«Ao trabalhador cujo contrato cesse nos termos da presente divisão aplica-se disposto nos artigos 398º a 401º.»

Nestes normativos prevê-se, designadamente, e no que ora releva, que o trabalhador tem direito:
- à observância de um aviso prévio de 60 dias relativamente à data da cessão do contrato (art. 398º); e
- à compensação fixada no art. 401º que deve ser posta à disposição do trabalhador até ao termo do prazo de aviso prévio [arts 403º/1- e) e 432º- d)].
Para além disso, o despedimento por extinção do posto de trabalho está ainda sujeito a um determinado procedimento, processo de despedimento regulado nos arts 423º a 425º que, no dizer de Monteiro Fernandes[4], se traduz “numa série de diligências preparatórias de uma decisão unilateral que pertence ao empregador.”

Tal procedimento começa, em casos como o sub iudice, com uma comunicação escrita do empregador à estrutura representativa dos trabalhadores, havendo-a, e ao trabalhador visado da «necessidade de extinguir o posto de trabalho e o consequente despedimento do trabalhador que o ocupe»; e, em caso de oposição ao despedimento, qualquer deles pode emitir parecer fundamentado no prazo de 10 dias do qual constem as respectivas razões e solicitar a intervenção dos serviços competentes do ministério responsável pela área laboral, nos termos do nºs 3 e 4 do art. 424º.
Decorridos cinco dias sobre o termo do prazo fixado nos nºs 1 e 2 do art. 424º, em caso de cessação do contrato de trabalho, o empregador profere, por escrito decisão fundamentada, de que constem os elementos referidos nas alíneas do nº 1 do artigo 425º, e designadamente: «a) o motivo de extinção do posto de trabalho, b) a confirmação dos requisitos previstos nas als a) a d) do art.403º, com justificação da inexistência de alternativas à cessação do contrato do ocupante do posto de trabalho extinto ou menção da recusa de aceitação das alternativas propostas, d) o montante da compensação, assim como a forma e o lugar do seu pagamento e e) a data da cessação do contrato», devendo a decisão ser comunicada «por cópia ou transcrição, à entidade referida no nº1 do art. 423º e, sendo o caso, à mencionada no nº2 do mesmo artigo e, bem assim, aos serviços do ministério responsável pela área laboral» (art. 425º/2).

Relativamente à ilicitude do despedimento, o art. 429º prevê como “princípio geral” que qualquer tipo de despedimento é ilícito; a) se não tiver sido precedido do respectivo procedimento; b) se se fundar em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso; c) se forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento.
Mas o art. 432º estipula que o despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito, sempre que o empregador: a) não tiver respeitado os requisitos do n.º 1 do artigo 403.º; b) tiver violado o critério de determinação de postos de trabalho a extinguir, enunciado no n.º 2 do artigo 403.º; c) não tiver feito as comunicações previstas no artigo 423.º; d) não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401.º e, bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.

A este respeito importa outrossim realçar, tal como se consigna no acórdão do STJ de 7.07.2009[5], que “a ilicitude do despedimento só pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo trabalhador e que na acção de impugnação do despedimento, «o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador» (art. 435, nºs 1 e 3).
Este ónus de prova tem pressuposta a ideia de que existe uma relação laboral entre as partes e que o empregador, assumindo a existência desse vínculo, emite uma declaração negocial com vista à extinção do contrato de trabalho.
O despedimento é considerado ilícito, mormente quando «forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento», pelo que o ónus probatório que incumbe ao empregador é precisamente para demonstrar em juízo a exactidão dos factos justificativos do despedimento e que se consideram susceptíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho.
Por outro lado, conforme estipula o art. 342º do Código Civil, «[à]quele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado» (nº 1), competindo a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado «àquele contra quem a invocação é feita» (nº 2), e,«em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito» (nº 3).

Assim, na acção de impugnação de despedimento, cabe ao trabalhador alegar e provar a existência de um contrato de trabalho e a sua cessação ilícita por iniciativa do empregador (art. 342º, nº 1, citado)

Ora, no caso em apreço provou-se a existência de um contrato de trabalho entre as partes [pontos 1 a 8 dos factos provados], bem como se provou que em 17 de Abril de 2008, o Autor recebeu da Ré a decisão de despedimento, com fundamento em extinção do posto de trabalho, anunciando-lhe que tal decisão produziria efeitos decorridos 60 dias após a data daquela recepção, ou seja, a partir de 16 de Junho de 2008 [ponto 25 dos factos provados].

Daqui decorre que o autor provou, como lhe competia a existência de um contrato de trabalho e a sua cessação levada a efeito pela ré através de despedimento por extinção do posto de trabalho (art. 342º/1 do CCivil).

Invocou ainda o autor no artigo 38º da petição inicial que “é absolutamente fantasiosa a alegada “ocorrência de motivos estruturais justificativos da extinção do posto de trabalho”; inexiste qualquer fundamento para a cessação do contrato de trabalho” e termina pedindo que seja o “mesmo despedimento julgado e declarado ilícito, por violação massiva dos requisitos aludidos no artº 432º do Código do Trabalho, porquanto se não verifica nenhum deles.”

Ora, como competia à Ré fazer a prova de todos os requisitos de que dependia a validade do despedimento por extinção do posto de trabalho e, não o tendo feito, poderia sempre o Tribunal, face ao alegado e ao pedido pelo autor, pronunciar-se sobre a questão na sentença.

Sendo assim, inexiste qualquer excesso de pronúncia, tendo o Tribunal a quo conhecido o que deveria ter conhecido, não se verificando a aludida nulidade da sentença.
******
2. Comecemos, agora, por analisar a questão de saber se decidida e comunicada ao trabalhador a cessação do vínculo laboral, por extinção do posto de trabalho, é possível a entidade patronal suspender o prazo prévio em curso.

Como já se deixou exarado ficou provado que em 17 de Abril de 2008, o Autor recebeu da Ré a decisão de despedimento, com fundamento em extinção do posto de trabalho, anunciando-lhe que tal decisão produziria efeitos decorridos 60 dias após a data daquela recepção, ou seja, a partir de 16 de Junho de 2008 [ponto 25 dos factos provados].
A extinção do posto de trabalho constituí uma das modalidades de despedimento que tem como finalidade a cessação do contrato de trabalho (artigo 384º, c) e 402º, ambos do CT).

E, como é sabido, o despedimento, seja qual for o motivo que lhe esteja subjacente (facto imputável ao trabalhador, despedimento colectivo, extinção do posto de trabalho ou inadaptação superveniente do trabalhador ao posto de trabalho) caracteriza-se por ser uma decisão unilateral do empregador, que assenta numa resolução também unilateral, que, sendo embora vinculada, aquele é livre de tomar ou de deixar de tomar, por se tratar de decisão da sua exclusiva iniciativa[6]
E representando o despedimento uma declaração negocial receptícia que se torna eficaz logo que chegue ao poder ou seja conhecida pelo seu destinatário (art. 224º n.º 1 do Cod. Civil), não pode a mesma ser retirada sem a aquiescência deste, atendendo ao princípio da irrevogabilidade da declaração negocial expresso no art. 230º n.º 1 do Cod. Civil, situação esta que, portanto, impede que a entidade patronal, uma vez comunicada aquela decisão possa voltar com a palavra atrás e tudo se passa como nada tivesse acontecido. Mesmo nos casos de um despedimento verbal, não pode, a entidade patronal, depois, por sua exclusiva iniciativa (porque tenha eventualmente dado conta de que apenas o poderia fazer mediante verificação de justa causa apreciada em processo disciplinar), como que retirar aquela decisão para, de seguida, lançar contra este um procedimento disciplinar com o propósito de alcançar o mesmo objectivo[7].

Portanto, a declaração de despedimento não pode ser revogada pela entidade empregadora depois de ter chegado ao conhecimento do trabalhador, não sendo lícito ao declarante (empregador), como que retirar aquela decisão para, de seguida, lançar contra o trabalhador um procedimento disciplinar com o propósito de alcançar o mesmo objectivo.
E não se venha com o argumento que como se trata de um despedimento por extinção do posto de trabalho e decorrendo da lei a concessão pela entidade patronal ao trabalhador em causa, de um aviso prévio, o mesmo só produz efeitos no fim desse mesmo prazo, sendo assim possível a revogação.
É verdade que o caso em apreço reveste alguns contornos especiais, uma vez que tratando-se de um despedimento por extinção do posto de trabalho e decorrendo da lei a concessão pela entidade patronal ao trabalhador em causa, um aviso prévio, o mesmo só produz efeitos no fim desse mesmo prazo.
Com efeito a declaração de despedimento, necessariamente[8] sujeita a aviso prévio, tem natureza receptícia, e significa que é eficaz logo que é conhecida do destinatário, ainda que a efectivação dos seus efeitos seja diferida no tempo. Uma coisa é a eficácia da declaração e, realidade distinta, o momento em que se produzem os efeitos próprios do conteúdo da declaração[9]. Ou seja, o diferimento, para momento posterior, da consumação dos seus efeitos, não impede a eficácia da declaração.
Podemos dizer que existem algumas similitudes com o regime da denúncia do contrato de trabalho pelo trabalhador, a que se reportam os arts. 447 º 449º do CT/2003. Aí o trabalhador pode, a todo o tempo, denunciar o contrato de trabalho, devendo, porém, fazê-lo mediante comunicação ao empregador com a antecedência mínima (aviso prévio) prevista na lei. E, por sua vez, o art. 449º, consagrando o designado direito ao arrependimento, permite que o trabalhador possa revogar essa denúncia "até ao 7º dia seguinte à data em que chega ao poder do empregador." (nº 1).
Ou seja, a denúncia do contrato de trabalho pelo trabalhador, tal como a declaração da comunicação do despedimento por extinção do posto de trabalho pelo empregador, consubstanciam ambas um negócio jurídico unilateral (que não depende da aceitação da parte contrária), de natureza receptícia, e que estão sujeitas a aviso prévio. E, consagrando o art. 449º a possibilidade de revogação dessa denúncia no limitado prazo nele previsto, significa isso que a regra é a de que a declaração de denúncia, não obstante o diferimento da produção dos seus efeitos (para o termo do prazo do aviso prévio), é eficaz logo que chega ao conhecimento do destinatário. Se essa revogação, por se tratar de negócio jurídico unilateral, fosse possível a todo o tempo até ao termo do aviso prévio, mal se compreenderia, então, o art. 449º, nº 1, sendo certo que este preceito, pela sua ratio, foi introduzido não como uma limitação à possibilidade de revogação da denúncia, mas como um direito do trabalhador a essa revogação. Por isso é que tal possibilidade é habitualmente designada de "direito ao arrependimento".
Defendendo que a declaração negocial de despedimento por extinção do posto de trabalho poderia ser unilateralmente revogada pelo empregador enquanto não se verificassem os efeitos dessa declaração –, então ter-se-ia que concluir que também o trabalhador, até ao termo do aviso prévio, poderia revogar livremente a comunicação de denúncia do contrato de trabalho, o que não é o caso, face ao apertado limite temporal dessa denúncia prevista no art. 449º, nº 1.
E, além do mais, não faria sentido algum, indo até contra a unidade do sistema jurídico, limitar de alguma forma a possibilidade de revogação da declaração de denúncia por parte do trabalhador e libertar de qualquer limitação ou constrangimento a declaração de despedimento por parte do empregador.
E, prevendo a lei o chamado direito de arrependimento ou retracção para o caso de denúncia do contrato pelo trabalhador, e não a prevendo para os casos de despedimento levados a cabo pelo empregador, estaríamos a agir contra legem permitindo que este de forma não regulamentada, por sua livre iniciativa, o pudesse fazer quando lhe aprouvesse.
Além do mais, se o prazo de aviso prévio previsto no artigo 447º, nº 1 do CPC, é uma forma de proteger o empregador contra saídas inesperadas dos trabalhadores, de forma a permitir-lhe que durante esse prazo arranje outra pessoa para substituir o trabalhador denunciante, já o prazo de aviso prévio previsto no artigo 398º, nº 1 do CT, tem como finalidade a protecção do trabalhador dando-lhe tempo para ele prepara a saída da empresa e procurar novo emprego[10]. Daí que a respectiva violação tenha consequência no primeiro o pagamento de uma indemnização pelo trabalhador ao empregador e no segundo o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta pelo empregador ao trabalhador (cfr. artigos 448º e 398º, nº 2, ambos do CT).
Por isso, com diferimento no tempo da produção dos efeitos da cessação do contrato e, ambas, consubstanciando negócio jurídico unilateral, esse diferimento não obsta à eficácia da declaração negocial. Ou seja, em ambas as situações a declaração negocial, chegada que seja ao conhecimento do destinatário, é eficaz, ainda que a consumação da cessação do contrato apenas venha a correr posteriormente, não podendo essa declaração ser unilateralmente revogada (com excepção da limitada revogação no caso da denúncia do contrato pelo trabalhador prevista ano art. 449º, que foi introduzida, como excepção à regra geral da irrevogabilidade da declaração, tendo em conta o interesse do trabalhador e propósito ou ratio subjacente a essa excepção).
Não desconhecemos a jurisprudência mencionada pela Recorrente nas suas alegações de recurso. Contudo, esses arestos foram proferidos no domínio da anterior lei de despedimentos aprovada pelo Dec-Lei n.º 372-A/75 de 16-07, em que a inexistência de prévio processo disciplinar, tinha como consequência a nulidade do despedimento que tivesse sido declarado pela entidade patronal (cfr. o respectivo art. 12º n.º 1), possibilitando desse modo que se extraísse a conclusão de que tal nulidade determinava a subsistência da relação de trabalho, com a consequente manutenção do poder disciplinar pelo empregador e, portanto, a instauração de processo disciplinar que convalidasse aquele despedimento, desde que instaurado dentro do prazo de caducidade do mesmo.
Porém, segundo o regime do contrato de trabalho aprovado pelo Código do Trabalho de 2003 e que aqui deve ser levado em consideração atendendo à data em que se verificou o despedimento do Autor/Recorrido, a inobservância de determinados critérios ou requisitos em relação ao despedimento por extinção do posto de trabalho tem como consequência não a nulidade mas a ilicitude deste [artigos 429º e 432º, ambos do CT], ilicitude que apenas pode ser declarada pelo Tribunal em acção instaurada para o efeito [artigo 435º, nº 1 do CT].
Também não podemos deixar de defender que está vedado à entidade empregadora a possibilidade ou a faculdade de poder suspender por sua iniciativa o decurso do prazo prévio.
Na verdade, aplicando aqui os ensinamentos referidos, em nenhum normativo está prevista essa possibilidade. Por outro lado, decorrendo o prazo de aviso prévio da lei, e sendo normas de interesse público, onde estão em causa direitos fundamentais dos trabalhadores, não pode a entidade patronal por sua livre iniciativa suspendê-lo ou interrompê-lo, como se fosse dona e senhora das regras básicas procedimentais das várias modalidades de despedimento.
Essa possibilidade de suspensão do decurso do prazo de aviso prévio está vedado ao empregador, conforme decorre do disposto do artigo 383º do CT, revestindo, quanto a esse aspecto, a continuidade do prazo, natureza imperativa.
Compreende-se a atitude da recorrente em suspender o aludido prazo de aviso prévio. No seu pleno interesse suspendeu tal prazo para ter a possibilidade de levar a cabo um procedimento disciplinar contra o recorrido e, assim, em tempo útil, ou seja, enquanto o contrato de trabalho mantinha a sua vigência, por virtude dessa mesma suspensão, poder-lhe aplicar uma medida disciplinar, nomeadamente, o despedimento com justa causa.
Se é verdade que durante o decurso do prazo de aviso prévio, o contrato de trabalho mantém-se em vigor, com os atinentes deveres e direitos de ambas as partes, continuando, como é óbvio, o trabalhador sob a alçada disciplinador do empregador. E, se durante esse período o trabalhador praticar alguns factos que possam levar à instauração de um processo disciplinar e à aplicação de uma sanção, não vislumbramos razões para que o empregador não possa levar a cabo essa instauração disciplinar e eventualmente aplicação de uma sanção. Contudo, terá de concluir o processo antes de terminar o prazo de aviso prévio, pois se o fizer depois o contrato já se extinguiu e o empregador deixou de ter poder disciplinar sobre o trabalhador.
Compreendemos que face ao relativo curto prazo de aviso prévio, a aplicação de qualquer sanção disciplinar ao trabalhador prevaricador, pode ser praticamente impossível, sendo, assim, o processo disciplinar inócuo. É uma verdade! Mas, esse argumento não pode obstaculizar à produção de efeitos legais que a lei determina a determinadas consequências. E, nestes caso, sentindo-se o empregador lesado poderá eventualmente lançar mão de outros mecanismos jurídicos por forma a ser ressarcido desse comportamento do trabalhador. Agora, não pode, é o empregador, de forma a contornar esta dificuldade, suspender por sua iniciativa o decurso do prazo de aviso prévio, pois isso está-lhe legalmente vedado.
Podemos concluir, assim, que decidida e comunicada ao trabalhador a cessação do vínculo laboral, por extinção do posto de trabalho, não é possível à entidade patronal suspender o prazo prévio em curso, mesmo que a finalidade seja para o processamento de procedimento disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa.

A decisão da questão anterior prejudica o efeito útil da questão de saber quando é que a notificação do processo disciplinar, com a nota de culpa, chegou ao conhecimento do trabalhador/autor. De qualquer forma não deixaremos de sobre o assunto deixarmos aqui vincada a nossa posição.
Relacionado com esta questão ficou provado que no dia 11-06-2008, através de carta registada com A/R, a Ré enviou ao Autor uma comunicação, recebida por este no dia 18 do mesmo mês, notificando da instauração de um processo disciplinar com a intenção de o sancionar com o despedimento e com suspensão preventiva da prestação do trabalho (sem perda de retribuição), bem como da respectiva “nota de culpa” constante de fls. 136 e 137, na qual foi determinada a suspensão do prazo de aviso prévio inerente à decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho.
No dia imediatamente a seguir ao envio, ou seja no dia 12/06/2008, o correio tentou a entrega desta comunicação no domicílio do Autor, mas não o conseguiu por o destinatário se encontrar ausente, pelo que ficou na caixa do correio do Autor o correspondente aviso, indicando que a carta registada devia ser levantada na estação de correios, o que aquele fez em 18 de Junho de 2008.

Dispõe o artigo 224º. do Código Civil:
1- A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2- É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.
3- A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é ineficaz.

As declarações recipiendas pressupõem, a existência de um declaratário, por quem devem ser recebidas, ou seja, a cuja esfera de conhecimento devem ser levadas (cfr. Rui Alarcão, in Confirmação dos Negócios Anuláveis, pág. 179).
Não é essencial, como se refere na mesma obra, o efectivo conhecimento da declaração recebida pelo destinatário, bastando a sua cognoscibilidade, traduzida na circunstância de ser possível ao mesmo destinatário apreender o conteúdo da declaração, por haver ela chegado à sua esfera de conhecimento ou de controle.
Conforme refere o Prof. Pires de Lima, in anotação a este artigo do C. Civ.:
«O legislador consagra aqui uma teoria mista, ou seja, o declaratário ficará vinculado logo que conheça o conteúdo da declaração ainda que o texto ou o documento que lhe foi dirigido não lhe tenha sido entregue, mas, ficará igualmente vinculado – nos termos da teoria da recepção – logo que a declaração chegue ao seu poder, à sua esfera pessoal, ainda que não tome conhecimento dela.
O que importa é que a declaração seja colocada ao alcance do destinatário, que esse seja posto em condições de só com a sua actividade, conhecer o seu conteúdo».
No caso vertente, a eficácia da declaração de suspensão do prazo de aviso prévio depende da sua recepção pelo respectivo destinatário, tornando-se eficaz logo que chega ao poder dele ou é dele conhecida.

Portanto, a declaração negocial para ser eficaz tem de chegar ao poder do seu destinatário, ou então, tem de ser dele conhecida, mesmo que o seja por qualquer meio ao seu dispor.
A teoria da recepção consagrada no artigo 224.º, do Cód. Civil faz com que a declaração recipienda se torne ineficaz quando não foi recebida sem culpa do destinatário, salientando-se que o que importa é que a declaração seja colocada ao alcance do destinatário, que este seja posto em condições de, só com a sua actividade, conhecer o seu conteúdo.
A produção de efeitos prestada por uma declaração negocial receptícia, nos termos do estatuído no art.º 224º, n.º 1 do Cód.Civil, fica dependente da sua chegada ao poder do seu destinatário ou de ser dele conhecida, sendo também legalmente eficiente se só por culpa do destinatário não foi recebida e não o sendo se, mesmo recebida pelo destinatário, o é em condições de, sem culpa deste, não poder ser conhecida – nº 2 e 3 do mesmo normativo.

No caso, no dia 12/06/2008, o correio tentou a entrega da carta – onde constava a declaração de suspensão do aviso prévio – no domicílio do Autor, mas não o conseguiu por o destinatário se encontrar ausente, pelo que ficou na caixa do correio do Autor o correspondente aviso, indicando que a carta registada devia ser levantada na estação de correios, o que aquele fez em 18 de Junho de 2008.
Sufragamos quanto a esta questão a posição assumida na decisão recorrida, quando refere que “a simples ausência do Autor da sua residência no momento em que foi tentada a entrega da carta não pode, por si só, integrar-se no conceito de culpa para os fins previstos no art. 224º nº 2 do Cód. Civil.
Na verdade, tutela-se neste normativo a posição do declarante, em razão do princípio da boa fé, pretendendo-se como já vimos evitar fraudes e evasivas por parte do declaratário. É por isso imprescindível averiguar se, em concreto, este último adoptou um comportamento pautado pela lealdade, probidade e correcção (cfr. Almeida Costa, “Obrigações”, 3ª. Edição, pág. 715) ou se, pelo contrário, actuou com má fé, comportando-se com o objectivo de dificultar, evitar ou impedir a recepção da declaração.
No caso em apreço, da factualidade provada não pode, efectivamente, concluir-se que à conduta do Autor não tenham presidido os ditames da boa fé, de forma a imputar-lhe um comportamento culposo com o intuito de não recepcionar a declaração em tempo oportuno.
Com efeito, a ausência da residência de qualquer destinatário postal constitui, hoje em dia, uma situação normal, frequente e, mesmo, previsível. Por esse motivo, as cartas enviadas sob registo não são, desde logo, devolvidas ao remetente, devendo ser levantadas na estação de correios, mediante a entrega do aviso depositado na caixa de correio da residência do destinatário, dentro do prazo estabelecido no regulamento dos correios.
E foi o que sucedeu no caso dos autos.
Tentada a entrega no dia 12-06-2008 (uma Quinta-feira), a carta veio a ser levantada na Quarta-feira seguinte (dia 18), ou seja no 4º dia útil seguinte e dentro do prazo previsto no referido regulamento.
O Autor não adoptou, assim, qualquer comportamento desleal ou incorrecto: não recusou a recepção da carta, não se negou a ir levantá-la aos correios, nem se ausentou da sua residência para parte incerta.
Assim e para os efeitos previstos no art. 224º Cód. Civil (de eficácia da declaração negocial), não tendo o Autor agido com má fé, o conhecimento da comunicação em causa apenas pode considerar-se eficaz a partir do momento em que a mesma chegou ao seu poder, ou seja, na data da sua efectiva entrega ao destinatário.”

Podemos, pois, assentar, quanto a esta questão que a notificação do processo disciplinar, com a nota de culpa e a declaração de suspensão do prazo de aviso prévio, chegou ao conhecimento do trabalhador/autor não dia 18 de Junho de 2008, altura em que procedeu ao levantamento da carta nos correios.

Perante este circunstancialismo, podemos assentar nos seguintes pontos:
i) É ineficaz e sem qualquer valor jurídico a comunicação feita pela recorrente ao autor da suspensão do prazo de aviso prévio em curso relativo à comunicação do despedimento por extinção do posto de trabalho entretanto efectuada.
ii) Mesmo que tivesse relevância jurídica tal comunicação de suspensão quando chegou ao conhecimento do seu destinatário já a anterior declaração de despedimento por extinção do posto de trabalho tinha produzido efeitos.
iii) Também a notificação da nota de culpa e a intenção de despedimento com justa causa[11] chegou ao conhecimento do trabalhador após o contrato de trabalho já se encontrar extinto.
iv) É assim irrelevante, inócua, e sem eficácia jurídica a comunicação da recorrente ao recorrido em 08/08/2008 da aplicação da sanção de despedimento com justa causa, sem qualquer indemnização de antiguidade, uma vez quer o contrato já se encontrava extinto e o recorrido já havia adquirido na sua esfera jurídica os direitos adveniente dessa declaração de despedimento e extinção do contrato.
v) o contrato de trabalho cessou pelo despedimento do autor pela extinção do seu posto de trabalho.
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3. Chegado à conclusão que o contrato de trabalho do recorrido se cessou mediante despedimento por extinção do posto de trabalho, cabe, agora, indagar, se esse despedimento foi lícito ou ilícito.

A decisão recorrida entendeu estarmos perante um despedimento ilícito, tendo-se socorrido da seguinte fundamentação:
“… no que respeita a esta questão ficou provado o seguinte:
- devido a alterações ocorridas a partir do final de 2004 no modelo de gestão da loja de Braga da Ré, esta havia deixado de contar, desde então, com uma gestão bicéfala, tendo regressado ao modelo de gestão única;
- na loja de Braga, passou a existir apenas um cargo de director de loja já preenchido por outro funcionário da Ré, tendo deixado de existir naquele estabelecimento outra função ou cargo compatível com a categoria do Autor;
- deixou, também, de existir a possibilidade de ocupação alternativa para o Autor, no âmbito de uma função ou cargo compatível com a categoria do Autor.
Esta factualidade, porém, afigura-se-nos altamente insuficiente para que possa considerar-se demonstrada a verificação de todos os pressupostos legalmente exigíveis para a licitude do despedimento por extinção de posto de trabalho.
Na verdade e sem necessidade de outros considerandos, desde logo ressalta dos autos que a Ré não procedeu ao pagamento ao Autor da compensação prevista no art. 401º do Cód. do Trabalho, que constitui uma verdadeira condição de validade do despedimento (neste sentido, cfr. António Monteiro Fernandes, ob. ct., pág. 528), como se afere do disposto na al. e) do nº 1 do art. 403º do mesmo código.
Acresce que não resulta do processo junto com a contestação da Ré que tenham sido observados os critérios previstos no nº 2 do aludido art. 403º, quanto à preferência dada à extinção do posto de trabalho do Autor e não do outro gerente da loja de Braga (cujas funções não poderiam deixar de ser equivalentes e as categorias profissionais de ambos equiparadas).
Assim, independentemente da verificação em concreto dos motivos estruturais invocados na decisão final, a inobservância dos requisitos acima apontados determina a invalidade do despedimento e, consequentemente, a respectiva ilicitude.
O art. 429º do Cód. do Trabalho prevê que qualquer tipo de despedimento é ilícito (a) se não tiver sido precedido do respectivo procedimento, (b) se se fundar em motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso, (c) se forem declarados improcedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento.
O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito sempre que o empregador, (a) não tiver respeitado os requisitos do n.º 1 do artigo 403.º, (b) tiver violado o critério de determinação de postos de trabalho a extinguir, enunciado no n.º 2 do artigo 403.º, (c) não tiver feito as comunicações previstas no artigo 423.º, (d) não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401.º e, bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.”

Ora, porque próprias e adequadas, aderimos na totalidade às doutas considerações do Mº Juiz a quo.
A recorrente vem invocar que não pôs à disposição do recorrido a compensação pois, de acordo, com o seu entendimento, não foi esse o modo de cessação do contrato, pelo que tal situação é equiparável à dos créditos laborais litigiosos, cujo não pagamento não pode afectar a validade do despedimento.
Acontece, que, salvo melhor opinião, esta questão não tem razão de ser. Isto porque foi a ré que comunicou ao autor o despedimento com extinção do posto de trabalho. Em segundo lugar aproveitou-se do decurso de um prazo, que foi pensado para salvaguarda do trabalhador, para em seu proveito, através de um mecanismo sem cobertura legal – suspensão desse mesmo prazo – levar a cabo um processo disciplinar para, assim, em última análise, se eximir ao pagamento de uma compensação que por lei estava obrigada. E, por último, foi por sua livre iniciativa e risco que levou a cabo a iniciativa de suspender o prazo de aviso prévio, sem primeiro cuidar das consequências legais daí advenientes.
Podemos, assim, concluir, que a recorrente actuou de forma negligente, ou pelo menos, objectivamente assumiu um risco, ao levar à prática determinados actos, com as consequências que acabamos de descrever.
Dizer-se que estamos perante uma situação equiparável a créditos laborais litigiosos, é manifestamente desvirtuar o conceito jurídico dos mesmos. Se se admite como possível a existência de divergências quanto ao montante a liquidar, uma vez que as partes podem entender que a compensação possa ou não englobar determinadas quantias, já o mesmo não acontece quando pura e simplesmente ao empregador por sua livre iniciativa entende não proceder ao pagamento da compensação devida, sem base legal, e fazer cessar o contrato de trabalho por uma outra forma que o exclua de proceder ao pagamento de qualquer indemnização pela respectiva sanção. Aqui é o risco inerente à sua atitude que o empregador tem de correr. Não pode é mais tarde vir com argumentos desculpabilizantes, que ele próprio criou, para o não pagamento atempado.

No que se refere ao argumento de que o Tribunal a quo considerou, para basear a ilicitude do despedimento a inobservância, por parte da recorrente, os critérios a que faz referência o art. 403.º, n.º 2 do C.T., e que em momento algum, tais elementos foram alegados pelo autor, pelo que, não teve a recorrente oportunidade de se pronunciar sobre os mesmos, violando-se, assim, o principio do contraditório, também não tem qualquer fundamento.

Podemos, pois, assentar que o despedimento por extinção do posto de trabalho de que o autor foi vitima é ilícito.
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5. Decidida a ilicitude do despedimento compete apreciar agora as respectivas consequências jurídicas, nomeadamente, o quantum indemnizatório.

A declaração de ilicitude do despedimento tem como consequência:
i) Que a entidade empregadora seja condenada a indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados [artigo 436º, nº 1, alínea a) do CT];
ii) Que a entidade empregadora seja condenada a reintegrar o trabalhador no seu posto de trabalho sem prejuízo do seu posto de trabalho e antiguidade[artigo 436º, nº 1, alínea b) do CT]; ou, em substituição da reintegração, no pagamento de uma indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do despedimento, não podendo ser inferior a três meses, contando-se para o efeito todo o tempo decorrido até à data do trânsito em julgado da decisão judicial [artigo 439º, nº 1 e 2 do CT];
iii) no pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão final (deduzida do montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data de propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento, bem como dos montantes que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e, ainda, do montante do subsídio de desemprego eventualmente auferido pelo trabalhador) [artigo 437º do CT].

No caso o Autor declarou optar de forma pela indemnização em substituição da reintegração (cfr. declaração constante da acta de audiência de julgamento de fls. 280).

Sobre esta questão a decisão recorrida percorreu o seguinte caminho:
“Como consequência da ilicitude do seu despedimento, ao A. assiste o direito à indemnização prevista no citado art. 439º nº 1 do Cód. do Trabalho, em substituição da reintegração (pela qual o mesmo optou em devido tempo).
Há a considerar, para efeitos de fixação da indemnização, que a antiguidade do Autor é reportada a 11-09-1991, conforme ficou a constar do acordo aludido no ponto 5º dos factos provados e que o salário base mensal auferido ascendia a € 3.752,96 (pontos 8º dos factos provados).
Quanto ao grau de ilicitude do despedimento, realce-se o facto da Ré ter optado por extinguir o posto de trabalho do Autor em detrimento de outro (já que a gestão da sua loja de Braga passou, a partir de determinada altura, a ser efectuada por um único director de loja) sem critério, tendo apenas como pressuposto o facto do Autor se encontrar afastado do exercício de funções na sequência de um despedimento anterior.
Este, porém, foi entretanto julgado ilícito por sentença transitada em julgado, o que significa que esse afastamento nunca poderia ser imputável ao Autor, nem poderia motivar qualquer escolha do posto de trabalho a extinguir.
Acresce, ainda, que após o trânsito em julgado da anterior sentença, a Ré não chegou a atribuir ao Autor quaisquer funções efectivas (ponto 20º dos factos provados), tendo o mesmo ficado quase cinco anos sem poder exercer a sua profissão, mesmo após ter sido ordenada judicialmente a sua reintegração na Ré.
Entendemos, pois, que estas circunstâncias agravam relevantemente a ilicitude do despedimento, não obstante da factualidade assente não poder concluir-se (como alegou o Autor) que os fundamentos invocados para a extinção do posto de trabalho eram absolutamente fantasiosos e que o despedimento havia sido motivado por uma atitude revanchista por parte da Ré.
Assim, entendemos proporcional e adequado fixar o montante da indemnização em causa em 40 dias de retribuição de base (€ 3.752,96) por cada ano completo ou fracção de antiguidade.
Como tal, o Autor tem direito, a este título e até ao momento (sendo certo que, como já se referiu, o momento a atender, como limite temporal final, é a data do trânsito em julgado da decisão final), à importância de € 95.074,99 (€ 3.752,96: 30 x 40 x 19).”

Diga-se desde já que concordamos em pleno com a fundamentação aludida. Os argumentos da apelante não são convincentes, sendo certo que os fundamentos explanados na decisão recorrida encontram assento nos factos dados como provados [pontos 16 a 20]. Por outro lado, seria uma gritante injustiça e um benefício sem limites e injustificado ao infractor, no caso à recorrente, que se fixasse o quantum indemnizatório, num caso de despedimento por extinção do posto de trabalho ilícito, nos mesmos patamares do despedimento por extinção do posto de trabalho lícito em que a compensação corresponde a um mês de retribuição base e diuturnidade por cada na o completo e de antiguidade [cfr. nº 1 do artigo 401º, ex vi do artigo 404º.ambos do CT].
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6. Passemos agora a apreciar a questão dos créditos laborais trazidos à colação.
6.1. IRS pago a mais pelo recorrido.

Insurge-se a recorrente contra a condenação de que foi alvo relacionado com o pagamento do montante de € 19 876,67, a título de IRS pago a mais pelo recorrido.

Na verdade, a decisão recorrida condenou a recorrente a pagar ao recorrido a quantia € 19.876,67, a título de IRS pago a mais pelo Autor.
E para chegar a essa conclusão entendeu-se na decisão recorrida que resultou provado que na sequência do trânsito em julgado da anterior sentença, a Ré pagou ao Autor o montante de € 147.230,54, a título de remunerações referentes aos anos de 2003 a 2008, por transferência bancária efectuada em 01-02-2008.
Devido ao pagamento deste montante, de uma só vez e apenas na referida data, o Autor pagou a quantia de € 71.132,04 a título de IRS (ponto 22º dos factos provados).
Provou-se, ainda (ponto 23º), que caso a Ré lhe tivesse pago as remunerações, mensal e periodicamente, desde Junho de 2003, ao longo daqueles anos, o A. teria pago de IRS um total de apenas € 53.255,37.
Como tal, devido ao incumprimento pontual da Ré não restam dúvidas de que o Autor sofreu um prejuízo correspondente à diferença entre os valores indicados, no valor de € 19.876,67, tendo por isso direito a ser indemnizado nesse montante.

Contudo, a recorrente entende que esse diferencial não lhe pode ser assacado, argumentando que a questão fiscal é totalmente alheia ao empregador, na medida em que compete apenas e só ao legislador estabelecer as regras necessárias à tributação dos rendimentos, de forma a que o trabalhador não seja prejudicado pelo facto de receber, de uma só vez, as retribuições referentes a vários anos.
Repare-se, a este propósito, que o artigo 74.º do CIRS representa, de algum modo, uma tentativa de reduzir eventuais prejuízos decorrentes do facto de serem pagos ou colocados à disposição do sujeito passivo, num determinado ano, rendimentos produzidos em anos anteriores.
Todavia, o mecanismo previsto no artigo 74.º do CIRS poderá não excluir totalmente a possibilidade de um contribuinte que deva imputar, no ano a que respeita a declaração, os rendimentos produzidos em anos anteriores, vir a ser, de algum modo, penalizado, através da aplicação de uma taxa superior àquela que seria devida se a imputação fosse feita por referência ao ano em que tais rendimentos foram efectivamente produzidos.
No entanto, a Recorrente, enquanto entidade empregadora, terá de ser considerada totalmente alheia a esse facto, pois a responsabilidade não pode depender da solução – mais ou menos favorável para o contribuinte/trabalhador – que o legislador vá consagrando ao longo do tempo.

Já o recorrido, quanto a esta questão, refere que Apelante abstrai por completo da matéria de facto julgada provada, o que não impugnou. Como se regista na sentença, provou-se que “devido ao pagamento deste montante, de uma só vez e apenas na referida data, o Autor pagou a quantia de € 71.132,04 a título de IRS (ponto 22º dos factos provados)”. E “provou-se, ainda (ponto 23º), que caso a Ré lhe tivesse pago as remunerações, mensal e periodicamente, desde Junho de 2003, ao longo daqueles anos, o A. teria pago de IRS um total de apenas € 53.255,37”.
Está claramente estabelecido o nexo de causalidade entre o pagamento tardio e o dano causado ao A., o que constitui matéria de facto que não pode ser alterada e que o Recorrente nem sequer atacou.

Mais uma vez concordamos com a decisão recorrida.
Na verdade, resulta que face ao comportamento ilícito da recorrente o património do autor sofreu um prejuízo. E esse prejuízo é fruto da recorrente não ter procedido ao pagamento das retribuições quando o deveria ter feito. É que a mora do devedor, além de o não libertar do cumprimento da obrigação, obriga-o a reparar os prejuízos causados ao credor, resultantes da prestação não ser realizada a tempo (artigo 804º, nº 1 e 2[12] do CC). E não deve ser o credor, que nenhuma culpa teve em que o devedor não cumprisse atempadamente a obrigação a que estava adstrito, a arcar com as consequências nefastas das modificações fiscais/contributivas. Quem deve arcar com essas consequências é o devedor. Seria um encargo injusto e insuportável para o credor que além de não ver atempadamente satisfeita a sua prestação, ainda é penalizado por a receber tardiamente.
Deverá, assim, a recorrente ser condenada no prejuízo causado com o pagamento tardio das respectivas retribuições (artigos 563º e 564º do CC).
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6.2. Passemos agora à questão das horas de formação de que o autor não beneficiou

O autor requereu que a recorrente fosse condenada a pagar-lhe 3 139,50 €, valor de créditos relativos a formação obrigatória, e respectivos juros à taxa legal, líquidos nesta data (31-05-2009), isto, por nos anos de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 a R. não proporcionou ao A. formação nem crédito de horas.
A sentença recorrida condenou a recorrente a pagar ao recorrido € 1.948,50, a título de valor de créditos relativos a formação obrigatória.
Baseou-se a decisão recorrida nos seguintes argumentos:
“Nos termos do disposto no art. 125º do Cód. do Trabalho, compete ao empregador promover e organizar a formação na empresa, e, designadamente, “garantir um número mínimo de horas de formação anuais a cada trabalhador, seja em acções a desenvolver na empresa, seja através da concessão de tempo para o desenvolvimento da formação por iniciativa do trabalhador”; e “ao trabalhador deve ser assegurada, no âmbito da formação contínua, um número mínimo de vinte horas anuais de formação certificada”, sendo “o número mínimo de horas anuais de formação certificada […] de trinta e cinco horas a partir de 2006”; e “as horas de formação certificada […] que não foram organizadas sob a responsabilidade do empregador por motivo que lhe seja imputável são transformadas em créditos acumuláveis ao longo de três anos, no máximo.”.
Por seu lado, o art. 169º do Reg. do Cód. do Trabalho (Lei nº 35/2004) estipula que “cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao crédito de horas para formação que não lhe tenha sido proporcionado”.
Ao contrário do que defende a Ré na sua contestação, entendemos que o prazo de três anos previsto no nº 5 do citado art. 125º não constitui um prazo de caducidade.
Na verdade, este normativo não prevê que o direito à formação tenha que ser exercido dentro desse prazo, única situação que permitiria qualificar esse prazo como de caducidade (cfr. art. 298º nº 2 do Cód. Civil).
Efectivamente, para além deste direito à formação não poder ser directamente exercido pelo trabalhador (uma vez que a sua organização é da responsabilidade do empregador), da disposição legal em questão retira-se apenas que os créditos em que se convertam as horas de formação não organizadas têm um limite que não pode exceder os três anos.
O objectivo desta limitação temporal prende-se, apenas, com a necessidade de forçar as entidades empregadoras a organizarem formação dentro desse período, sob pena de incorrerem na prática da contra-ordenação prevista no art. 654º do Cód. do Trabalho.
Não estão subjacentes, pois, à estipulação deste prazo quaisquer razões de segurança e certeza jurídicas típicas dos prazos de caducidade.
Assim, considerando que o Regulamento do Cód. do Trabalho apenas entrou em vigor no dia 28-08-2004, que o direito individual à formação se vence no dia 1 de Janeiro de cada ano civil (art. 161º nº 2 do RCT), que a retribuição horária do A. ascendia a € 21,65 e, ainda, que a Ré não proporcionou ao Autor formação nem crédito de horas de 2004 a 2008 (ponto 37º dos factos provados), o mesmo tem direito – art. 169º do RCT - a este título à importância global de € 1.948,50:
- 2005 (20 horas anuais): € 433,00;
- 2006 e 2007 (35 horas anuais): € 757,75 + € 757,75.
A esta quantia acrescem juros de mora à taxa de 4%, desde o respectivo vencimento até 31-05-2009, como pedido.”

A recorrente está em desacordado com o decidido invocando que deve entender-se que o limite que o art. 125.º, n.º 5, do CT coloca à acumulação das horas anuais de formação funciona também como um prazo de caducidade para o exercício do direito anual à formação.
Esgotado esse período, se o trabalhador não fizer uso do crédito de horas de que disponha através da sua utilização em acções de formação escolhidas por si, tal crédito caduca.
Significa isto que “os créditos do quarto e demais anos anteriores ao da cessação do contrato não devem ser tidos em conta por virtude de caducidade pelo seu não uso” (J. Soares Ribeiro, “Formação Contínua dos Trabalhadores”, Minerva, Revista de Estudos Laborais, Universidades Lusíada, Ano VI, n.º 10, 2007, p. 47).
Como tal, decidiu mal a sentença ao condenar a Ré a pagar ao Autor o crédito de horas referente à formação vencida no dia 01.01.2005, violando assim o artigo 125.º do Código do Trabalho e art.161.º da RCT.

Sobre esta questão devemos ter em conta os seguintes normativos
Do Código do Trabalho
ARTIGO 125.º
FORMAÇÃO CONTÍNUA
1 - No âmbito do sistema de formação profissional, compete ao empregador:
a) Promover, com vista ao incremento da produtividade e da competitividade da empresa, o desenvolvimento das qualificações dos respectivos trabalhadores, nomeadamente através do acesso à formação profissional;
b) Organizar a formação na empresa, estruturando planos de formação e aumentando o investimento em capital humano, de modo a garantir a permanente adequação das qualificações dos seus trabalhadores;
c) Assegurar o direito à informação e consulta dos trabalhadores e dos seus representantes, relativamente aos planos de formação anuais e plurianuais executados pelo empregador;
d) Garantir um número mínimo de horas de formação anuais a cada trabalhador, seja em acções a desenvolver na empresa, seja através da concessão de tempo para o desenvolvimento da formação por iniciativa do trabalhador;
e) Reconhecer e valorizar as qualificações adquiridas pelos trabalhadores, através da introdução de créditos à formação ou outros benefícios, de modo a estimular a sua participação na formação.
2 - A formação contínua de activos deve abranger, em cada ano, pelo menos 10% dos trabalhadores com contrato sem termo de cada empresa.
3 - Ao trabalhador deve ser assegurada, no âmbito da formação contínua, um número mínimo de vinte horas anuais de formação certificada. x
4 - O número mínimo de horas anuais de formação certificada a que se refere o número anterior é de trinta e cinco horas a partir de 2006.
5 - As horas de formação certificada a que se referem os nºs 3 e 4 que não foram organizadas sob a responsabilidade do empregador por motivo que lhe seja imputável são transformadas em créditos acumuláveis ao longo de três anos, no máximo.
6 - A formação prevista no n.º 1 deve ser complementada por outras acções previstas em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
7 - A formação a que se refere o n.º 1 impende igualmente sobre a empresa utilizadora de mão-de-obra relativamente ao trabalhador que, ao abrigo de um contrato celebrado com o respectivo empregador, nela desempenhe a sua actividade por um período, ininterrupto, superior a 18 meses.
8 - O disposto no presente artigo não prejudica o cumprimento das obrigações específicas em matéria de formação profissional a proporcionar ao trabalhador contratado a termo.

Da Regulamentação ao Código do Trabalho – Lei nº 35/2004, de 29 de Julho

Artigo 162º
Direito individual à formação
1 — O direito individual à formação vence-se no dia 1 de Janeiro de cada ano civil, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 — No ano da contratação, o trabalhador tem direito à formação, após seis meses de duração do contrato, devendo o número de horas ser proporcional àquela duração.
3 — O direito individual à formação do trabalhador concretiza-se, na parte a que o empregador está adstrito, através da formação contínua.

Artigo 168º
Crédito de horas para formação contínua
1 — O trabalhador pode utilizar o crédito de horas correspondente ao número mínimo de horas de formação contínua anuais, se esta não for assegurada pelo empregador ao longo de três anos por motivo que lhe seja imputável, para a frequência de acções de formação por sua iniciativa, mediante comunicação ao empregador com a antecedência mínima de 10 dias.
2 — Sempre que haja interesse para a empresa e para o trabalhador pode ocorrer a antecipação, até ao máximo de três anos, do número de horas anuais de formação.
3 — Nas situações de acumulação de créditos, a imputação da formação realizada inicia-se pelas horas dos anos mais distantes, sendo o excesso imputado às horas correspondentes ao ano em curso.
4 — O conteúdo da formação referida no nº 1 é escolhido pelo trabalhador, devendo ter correspondência com a actividade prestada ou respeitar a qualificações básicas em tecnologias de informação e comunicação, segurança, higiene e saúde no trabalho ou numa língua estrangeira.
5 — O crédito de horas para formação é referido ao período normal de trabalho, confere direito a retribuição e conta como tempo de serviço efectivo.

Artigo 169º
Cessação da relação de trabalho
Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao crédito de horas para formação que não lhe tenha sido proporcionado.

Entendemos que aqui também não assiste razão à recorrente.
Da leitura que fazemos do quadro normativo que regula esta questão, resulta que em caso de omissão da formação profissional obrigatória por parte da entidade patronal, nasce um crédito de horas para o trabalhador que pode ir acumulando num máximo até três anos. Passados esses três anos, mesmo que a entidade patronal continue a não dar a formação profissional obrigatória, não pode haver mais acumulação. Podendo o trabalhador utilizar esse crédito de horas correspondente ao número mínimo de horas de formação contínua anuais, se esta não for assegurada pelo empregador ao longo desses três anos, da forma descrita no artigo 168º do RCT, isto independentemente, de já terem decorrido mais de 3 anos sem essa mesma formação, ou seja, o montante máximo de horas que o trabalhador pode acumular como créditos não pode ser superior a 3 anos.
Cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao crédito de horas para formação que não lhe tenha sido proporcionado e que não tenha utilizado, conforme o atrás referido. Sendo assim, tendo-se fixado na sentença recorrida uma retribuição correspondente ao crédito de horas para formação correspondentes a 3 anos de não formação que a ré deveria ter dado e não deu, a solução encontrada esta correcta.
Improcede, assim, também esta questão.
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6.3. Montante correspondente ao seguro de saúde.
A sentença recorrida condenou a recorrente a pagar ao recorrido a o montante de € 5.760,00 relativo a prémios de um seguro de saúde que a Ré retirou ao Recorrido.
Fundamentou tal condenação no seguinte:
“Invoca o Autor que a Ré lhe cortou este benefício desde 20-06-2003, motivo pelo qual deixou de usufruir do seguro de saúde desde então.
Neste particular, provou-se que, aquando da transferência do Autor do F… para a G…, esta última lhe assegurou "todas as condições contratuais que regulavam a relação juslaboral" com o F… e, bem assim, "todos os direitos e garantias entretanto adquiridos", onde se incluía um seguro de saúde da …, abrangendo todo o agregado familiar (pontos 13º e 14º dos factos provados).
Porém, a partir de 1 de Janeiro de 2003, na sequência de um contrato verbal, o Autor passou a desempenhar funções para a aqui Ré.
No âmbito deste novo contrato e relativamente às relações de trabalho anteriores, ficou acordado que o Autor manteria a antiguidade reportada a 01-09-1991.
Não obstante nada se referir nesse acordo quanto à manutenção daquele benefício, o certo é que está provado que a própria Ré o atribuiu ao Autor até 20-06-2003 (cfr. ponto 15º).
Considera-se retribuição a prestação a que o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho, compreendendo a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie (art. 249º nºs 1 e 2 do Cód. do Trabalho).
Além disso, o nº 3 do mesmo artigo estabelece a presunção de que qualquer prestação do empregador ao trabalhador constitui retribuição.
Atento o seu carácter regular e periódico (apenas interrompido na data em que o Autor foi despedido pela primeira vez), não se nos oferecem quaisquer dúvidas sobre a natureza remuneratória desta prestação.
Trata-se de um notório benefício patrimonial concedido pela Ré ao Autor, o qual não poderá deixar de ser equivalente ao valor do prémio de seguro que era suportado por aquela, no valor de € 80,00 mensais.”

A recorrente discorda desta argumentação. Alega que:
- a Recorrente atribuiu ao Recorrido tal seguro de saúde, como o fez em relação a outros trabalhadores, porque assim entendeu, isto é, a título de mera liberalidade, não estando de modo algum vinculada à sua atribuição, não podendo, assim, considerar-se retribuição.
- se aquele seguro de saúde integrasse a retribuição, estariam melhor retribuídos os trabalhadores que utilizassem frequentemente os serviços médicos cobertos pelo mesmo, em confronto com os trabalhadores saudáveis!
- a Recorrente não poderia ser condenada a pagar ao Recorrido o “valor mensal do prémio de seguro”, no valor de € 80,00, pois tal valor nunca lhe foi, de facto, pago, e ainda que se considerasse que aquele seguro de saúde integrava a remuneração do Recorrido, tal remuneração traduzir-se-ia necessariamente nas vantagens que o Recorrido poderia retirar daquele seguro, e nunca no valor do prémio.
- De facto, a componente remuneratória daquele seguro – a conceber-se tal hipótese - não pode deixar de ser a vantagem que o Recorrido pode retirar, ou não, do mesmo, beneficiando, por exemplo, de consultas médicas e exames médicos a preços reduzidos.
- O Recorrido teria pois que ter alegado e provado, o que não sucedeu, que, por lhe ter sido retirado aquele seguro de saúde, despendeu determinadas quantias, por exemplo, em consultas e exames, que não teria despendido caso tivesse beneficiado do mesmo.

Deram-se. Relacionados com esta questão, como provados os seguintes factos:
Por força de contratos de trabalho subordinado, o A. trabalhou sucessivamente para as sociedades "F…, S.A." entre 01-09-1991 e 31-07-1998 e, a partir de 01-04-1998, para a sociedade G…, SA, sociedades estas que, tal como a Ré, pertencem ao chamado "E…" [A) dos factos assentes].
No dia 1 de Janeiro de 2003, o A. iniciou o desempenho, ao serviço da ora Ré
O referido em 2º ocorreu na sequência de um contrato verbal celebrado entre o A. e a R., mediante o qual o A. passaria, a partir de 01-01-2003, a desempenhar as funções aí referidas, correspondentes às de "…", sob a direcção, orientação e fiscalização da administração da dita R. [D) dos factos assentes].
Ficou também acordado entre as administrações de ambas as sociedades interessadas – a B… e a G… – e o A. que, em 31-12-2002, cessaria a relação laboral do mesmo com esta última e que o A. mantinha, ao serviço da ora R., a antiguidade reportada a 11-09-1991, assim contando todo o tempo de serviço referido em 1º até então [E) dos factos assentes].
A Ré obrigou-se, ainda, a proporcionar ao A. e a pagar as respectivas despesas, incluindo de combustível e portagens, para uso permanente – pessoal e profissional – devido ao cargo de chefia que ocupava, uma viatura automóvel, então (em Janeiro de 2003) um Volkswagen …, bem como um PC portátil (…) e um telemóvel, incluindo o pagamento das suas despesas [F) dos factos assentes].
Anteriormente, aquando da sua transferência do F… para a G…, esta assegurou-lhe "todas as condições contratuais que regulavam a relação juslaboral" com o F… e, bem assim, "todos os direitos e garantias entretanto adquiridos" [J) dos factos assentes].
Um desses direitos ou benefícios era dispor de um seguro de saúde da …, abrangendo todo o agregado familiar [K) dos factos assentes].
A Ré atribuiu ao Autor este benefício referente ao seguro de saúde, cujo prémio mensal ascendia ao valor de € 80,00, mas o mesmo deixou de poder dele usufruir desde 20-06-2003 até 2008, inclusive [L) dos factos assentes].

O artigo 82º da LCT, que vigorou até 1 de Dezembro de 2003 (vide art 3º nº 1º da Lei nº 99/2003,de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho), estabelecia que:
"1 - Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador".

O artigo 83º do mesmo diploma regulava:
"A retribuição pode ser certa, variável ou mista, isto é, constituída por uma parte certa e outra variável".

Por sua vez, o art 84º do aludido diploma estatuía:
"1 - É certa a retribuição calculada em função do tempo de trabalho.
2 - Para determinar o valor da retribuição variável tomar-se-á como tal a média dos valores que o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses ou no tempo da execução do contrato, se este tiver durado menos tempo.
3 - Se não for praticável o processo estabelecido no número anterior, o cálculo da retribuição variável far-se-á segundo o disposto nas convenções colectivas ou nas portarias de regulamentação de trabalho e na sua falta, segundo o prudente arbítrio do julgador".

O art 85º da LCT regulava sobre a retribuição mista.

Segundo o art 86º “não se considera retribuição a remuneração por trabalho extraordinário, salvo quando se deva entender que integra a retribuição do trabalhador”.

O art 87º da LCT estatuia:
“Não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações ou novas instalações, feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações frequentes, essas importâncias, na parte que excedam as respectivas despesas normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador”.

O art 88º daquele diploma regulava:
“1 - Não se consideram retribuição as gratificações extraordinárias concedidas pela entidade patronal como recompensa ou prémio dos bons serviços do trabalhador.
2 - O disposto no número anterior não se aplica às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àquelas que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele”.

Nos termos do art 89º não se considera retribuição a participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho.

O art 90º preceituava que:
"1 - Compete ao julgador fixar a retribuição quando as partes o não fizeram e ela não resulte das normas aplicáveis ao contrato.
2 - Compete ainda ao julgador resolver as dúvidas que se suscitarem na qualificação como retribuição das prestações recebidas da entidade patronal pelo trabalhador".

Resultava, pois, destas normas que desde que o trabalhador prove a existência de determinada atribuição patrimonial passa a caber ao empregador demonstrar que não se verificam os elementos definidores da retribuição.

A definição contida no art 82º da LCT "pode ser decomposta, para efeitos analíticos, em quatro elementos: uma prestação patrimonial, regular e periódica, devida pela entidade empregadora ao seu trabalhador, como contrapartida da actividade prestada por este"[13].

De acordo com o STJ "segundo o conceito civilista de retribuição esta deveria ter como contrapartida e como base a actividade do trabalhador, mas tal conceito, com a moderna elaboração do direito do trabalho, foi ultrapassado e hoje integram-se no domínio da retribuição todos os benefícios outorgados pela entidade patronal e que se destinam a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe a justa expectativa do seu recebimento, dada a sua regularidade e continuidade periódicas[14] ".

O Código do Trabalho que passou a vigorar a partir de 1 de Dezembro de 2003 veio estabelecer no seu artigo 249º:
“1 - Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
2 - Na contrapartida do trabalho inclui-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente em dinheiro ou em espécie.
3 - Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - A qualificação de certa prestação como retribuição, nos termos dos nºs 1º e 2º,determina a aplicação dos regimes de garantia e tutela dos créditos retributivos previstos neste Código”.

Segundo o art 250º do mesmo diploma:
“1 - Quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, entende-se por:
a ) retribuição base – aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido;
b) Diuturnidade – a prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva do trabalho, com fundamento na antiguidade”.

O art 251º regula:
“A retribuição pode ser certa, variável ou mista, isto é constituída por uma parte certa e outra variável”.

Segundo o art 252º:
“1 - É certa a retribuição calculada em função do tempo de trabalho.
2 - Para determinar o valor da retribuição variável toma-se como tal a média dos valores que o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos 12 meses ou no tempo de execução do contrato se este tiver durado menos tempo.
3 - Se não for praticável o processo estabelecido no número anterior,o cálculo da retribuição variável faz-se segundo o disposto nos instrumentos de regulamentação colectiva e, na sua falta, segundo o prudente arbítrio do julgador.
4 - O trabalhador não pode, em cada mês de trabalho, receber montante inferior ao da retribuição mínima garantida”.

O art 253º regula sobre a retribuição mista.

Nos termos do art 254º o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano.

Por sua vez, o art 255º veio estabelecer:
“1 - A retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo.
2 - Além da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho.
3-...
4-...”.

O art 260º regula:
“1 - Não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos parte integrante da retribuição do trabalhador.
2 - O disposto no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, ao abono para falhas e ao subsídio de refeição”.

O art 261º estatui:
“1 - Não se consideram retribuição:
a) As gratificações ou prestações extraordinárias concedidas pelo empregador como recompensa ou prémio dos bons resultados obtidos pela empresa;
b) As prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos não esteja antecipadamente garantido.
2 - O disposto no número anterior não se aplica às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àquelas que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele.
3 - O disposto no nº 1º não se aplica, igualmente, às prestações relacionadas com os resultados obtidos pela empresa quando, quer no respectivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente, revistam carácter estável, independentemente da variabilidade do seu montante”.

Nos termos do art 262º “[n]ão se considera retribuição a participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho”.

Mas será que se deve considerar o seguro em causa como fazendo parte da retribuição do Autor?
Afigura-se evidente que o seguro em questão configura um benefício que a Ré se viu obrigar a conceder ou a continuar a garantir ao Autor em virtude da transferência deste da F… para a G…, onde lhe foi assegurado "todas as condições contratuais que regulavam a relação juslaboral" com o F… e, bem assim, "todos os direitos e garantias entretanto adquiridos", sendo um desses direitos ou benefícios era dispor de um seguro de saúde da …, abrangendo todo o agregado familiar. Seguro esse que a Ré atribuiu ao Autor referente ao seguro de saúde, cujo prémio mensal ascendia ao valor de € 80,00, mas o mesmo deixou de poder dele usufruir desde 20-06-2003 até 2008.
Apesar de alguma opacidade na forma como este seguro foi concedido, não nos parece que estejamos perante uma mera liberalidade.
Ao defender-se que a concessão deste tipos de seguro pela entidade empregadora aos seus trabalhadores não têm a natureza de retribuição, mas antes a de mera liberalidade, ou seja, de valores atribuídos com “animus donandi”, sem prévia vinculação da entidade patronal[15] seria ónus de prova que recairia sobre a recorrente, que o não logrou fazer[16].

Assim, entendemos que a prestação em apreço deve ser qualificada como uma modalidade de retribuição em espécie, como uma regalia que a recorrente concedeu ao trabalhador conferindo-lhes uma legítima expectativa de dela beneficiar.
O seguro em apreço acaba por constituir uma prestação regular e periódica com inegável valor patrimonial para quem dela usufrui que é, desde logo, poder beneficiar da protecção do seguro sem suportar os inerentes custos.
Assim, afigura-se que estamos perante prestação em espécie que deve ser qualificada como retribuição, tanto mais que a Ré não ilidiu a presunção estabelecida no nº 3º do art 249º do CT.
E nem se venha argumentar que não estamos perante qualquer atribuição patrimonial directa, mas perante meras expectativas (susceptíveis de concretização ou não) de recebimentos monetários ou de prestações futuras nas situações (de doença) em que o seguro em apreço lograria aplicabilidade.
É que o cariz retributivo da prestação em apreço não advém do valor ou protecção a receber, mas do facto do trabalhador da recorrente – sem ter de pagar a inerente contrapartida monetária - usufruir da protecção conferida pelo seguro (que constitui contrato a favor de terceiro).

E, tendo a recorrente deixado de pagar o aludido seguro, e tendo o mesmo a componente de retribuição, a única forma de que o trabalhador tinha para poder usufruir da protecção conferida pelo seguro, era ele próprio constituir um outro seguro com as mesmas características.
Deixou, pois, de receber uma componente retributiva que o seguro lhe assegurava e, como tal, tem direito a que a recorrente lhe pague a quantia correspondente ao prémio que lhe assegurava a manutenção do aludido seguro, com as vantagens daí adveniente.
E, sendo uma componente retributiva, o seguro, o mesmo assiste e deve ser mantido, independentemente de o autor ou a sua família tê-lo ou não usado. O que é importante é que em qualquer momento de necessidade o mesmo posa usufruir das suas vantagens.

E nenhum sentido faz o argumento de que se aquele seguro de saúde integrasse a retribuição, estariam melhor retribuídos os trabalhadores que utilizassem frequentemente os serviços médicos cobertos pelo mesmo, em confronto com os trabalhadores saudáveis! Este é um argumento absurdo, pois se os trabalhadores não estivessem doentes, ou não fossem susceptíveis de adoecer, não precisavam do seguro de saúde.

Entendemos, mais uma vez, que o recurso improcede, mantendo-se a sentença recorrida.

7. As custas do recurso ficam a cargo da Ré/recorrente (artigo 446º do CPC).

III. Decisão.
Em face do exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento à apelação, assim mantendo a sentença impugnada.

Condenam a Ré/recorrente no pagamento das respectivas custas.

Porto, 14 de Março de 2011
António José da Ascensão Ramos
Eduardo Petersen Silva
José Carlos Dinis Machado da Silva
___________________
[1] Essenciais para a dirimência da lide e não de mera argumentação aduzida pelas partes em defesa das teses por si expendidas, não devendo, todavia, confundir-se com qualquer erro de julgamento dirigido ao mérito ou fundo da causa
[2] Cfr. o prof. Alb. dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 49 e ss”; o prof. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil, págs. 672/673”; o prof. Anselmo de Castro, in “Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, pág. 143”; o prof. Lebre de Freitas, in “Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, pág. 670”), e Ac. do STJ de 06/02/1992, in “BMJ, 414 – 415
[3] Uma vez que o Código do Trabalho aprovado pela L. 7/2009, de 12.02 só entrou em igor em 17.02.2009 (cfr arts 5º do CC e L 74/98, de 11.11 republicada pela L. 42/07, de 24.08).
[4] Em Direito do Trabalho, 13ª edição, Almedina, 2006, pag. 592.
[5] Processnº 27/07.1TT.FIG.C1.S1, datado de 07.07.2009, disponível in www.dgsi,pt
[6] Neste sentido, o acórdão do STJ de 3 de Junho de 2009, Processo n.º 622/09, da 4.ª Secção, www.dgsi.pt; Ac STJ de 28/04/2010, processo 413/08.0TTCBR.C1.S1, www.dgsi.pt
[7] Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 18-5-2005, processo 1607/2005-4, www.dgsi.
[8] Cuja inobservância não determina a imediata cessação do vínculo e implica para o empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta, nos termos do nº 2 do artigo 398º do CT.
[9] Como refere Bernardo da Gama Lobo Xavier, in Curso do Trabalho, Verbo, 1992, pág. 520, o aviso prévio [C]onstituindo tecnicamente um termo suspensivo aposto à declaração de denúncia (o despedimento só terá eficácia passados n dias)…”
[10] Nesse sentido Bernardo da Gama Lobo Xavier, obr. cit. pág. 520, e Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 12ª edição, pág. 589.
[11] Sanção que é de difícil compreensão. Na verdade para que se verifique a justa causa, não é suficiente um qualquer incumprimento dos deveres contratuais, por parte do trabalhador. É necessário, ainda, que se trate de um comportamento que, pela sua gravidade e consequências, leve a concluir que a subsistência da relação de trabalho se tornou imediata e praticamente impossível.
No entanto, a impossibilidade em questão não é uma impossibilidade de ordem material, correspondendo, antes, a uma situação de inexigibilidade reportada a um padrão essencialmente psicológico, qual seja o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, implicando mais ou menos frequentes e intensos contactos entre os sujeitos, e que, na apreciação dessa inexigibilidade, há que atender, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes (art.º 396.º, n.º 2, do CT), tudo à luz dos critérios de um bonus paterfamilias, ou seja, de um empregador normal, e não à luz da sensibilidade do real empregador.
O conceito de justa causa é assim um conceito indeterminado, pois não facultando uma ideia precisa quanto ao seu conteúdo, aponta para modelos de decisão a elaborar em concreto e, constituindo a mais grave das sanções disciplinares, visa o sancionamento da conduta do trabalhador que, pela sua gravidade objectiva e pela imputação subjectiva, torna impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe.
A inexigibilidade há-de, pois, ser aferida através de um juízo de probabilidade, de prognose, sobre a viabilidade da relação de trabalho, sendo de concluir pela existência de justa causa quando, sopesando os interesses em presença, se verifique que a continuidade da vinculação representaria, objectivamente, uma insuportável e injusta imposição ao empregador, isto é, quando, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações (pessoais e patrimoniais) que ele supõe seriam de molde a ferir de modo desmesurado e violento a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do empregador.
Ora, perguntamos nós, como é que, no caso se pode defender a justa causa, quando a recorrente instaurou ao recorrido uma nota de culpa, faltando apenas 6 dias para que o contrato de trabalho cessasse? É que neste caso a continuidade da vinculação não representaria, objectivamente, uma insuportável e injusta imposição ao empregador, pelo simples facto de que a relação laboral apenas duraria mais 6 dias.
[12] Não nos podemos esquecer que apesar de o pagamento da retribuição corresponder a dever contratual, o pagamento em causa resulta da prática de um acto ilícito – o despedimento.
[13] Comentário às Leis do Trabalho, Mário Pinto, Pedro Martins e António Carvalho, vol I, pág 247
[14] vide ac. de 8-5-96,CJ/STJ, Ano IV, Tomo II, pág 251.
[15] Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 362, Lobo Xavier, “Introdução ao Estudo da Retribuição no Direito do Trabalho Português”, RDES, ano I, 2ª Série, nº 1, pág. 83
[16] Sobre um caso relacionado com seguro de vida podemos ver o acórdão da Relação de Lisboa de 12-07-2007, processo nº 4178/2007-4 in www.dgsi.pt, www.dgsi.pt.
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Sumário
I – A nulidade prevista na alínea d), nº 1, do artigo 668º do C.P.C., está directamente relacionada com o comando que se contém no n.º 2, do artigo 660.º, servindo de cominação ao seu desrespeito: o Juiz deve resolver na sentença todas as questões[1] (não resolvidas antes) que as partes tenham suscitado, com excepção daquelas que estejam prejudicadas (tornadas inúteis) pela solução já adoptada quanto a outras.
II – Não incorrerá em nulidade por omissão de pronúncia prevista no artº 668º, nº 1, alínea d), primeira parte, do CPC, a decisão judicial que considerou a questão que lhe era posta e entendeu que a mesma não era de apreciar, aduzindo nesse sentido razões justificativas; em tal caso, só poderá haver erro de julgamento.
III – Verifica-se excesso de pronúncia quando o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes, ou seja, estamos no campo do excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido[2]. Isto sem esquecer que o juiz sempre poderá e deverá conhecer das questões, mesmo que não trazidas ou suscitadas pelas partes, que a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso.
IV – O despedimento, seja qual for o motivo que lhe esteja subjacente (facto imputável ao trabalhador, despedimento colectivo, extinção do posto de trabalho ou inadaptação superveniente do trabalhador ao posto de trabalho) caracteriza-se por ser uma decisão unilateral do empregador, que assenta numa resolução também unilateral, que, sendo embora vinculada, aquele é livre de tomar ou de deixar de tomar, por se tratar de decisão da sua exclusiva iniciativa.
V – Representando o despedimento uma declaração negocial receptícia que se torna eficaz logo que chegue ao poder ou seja conhecida pelo seu destinatário (art. 224º n.º 1 do Cod. Civil), não pode a mesma ser retirada sem a aquiescência deste, atendendo ao princípio da irrevogabilidade da declaração negocial expresso no art. 230º n.º 1 do Cod. Civil, situação esta que, portanto, impede que a entidade patronal, uma vez comunicada aquela decisão possa voltar com a palavra atrás e tudo se passa como nada tivesse acontecido. Mesmo nos casos de um despedimento verbal, não pode, a entidade patronal, depois, por sua exclusiva iniciativa (porque tenha eventualmente dado conta de que apenas o poderia fazer mediante verificação de justa causa apreciada em processo disciplinar), como que retirar aquela decisão para, de seguida, lançar contra este um procedimento disciplinar com o propósito de alcançar o mesmo objectivo.
VI – Portanto, a declaração de despedimento não pode ser revogada pela entidade empregadora depois de ter chegado ao conhecimento do trabalhador, não sendo lícito ao declarante (empregador), como que retirar aquela decisão para, de seguida, lançar contra o trabalhador um procedimento disciplinar com o propósito de alcançar o mesmo objectivo.
VII – A declaração de despedimento, necessariamente sujeita a aviso prévio, tem natureza receptícia, e significa que é eficaz logo que é conhecida do destinatário, ainda que a efectivação dos seus efeitos seja diferida no tempo. Uma coisa é a eficácia da declaração e, realidade distinta, o momento em que se produzem os efeitos próprios do conteúdo da declaração, ou seja, o diferimento, para momento posterior, da consumação dos seus efeitos, não impede a eficácia da declaração.
VIII – Prevendo a lei o chamado direito de arrependimento ou retracção para o caso de denúncia do contrato pelo trabalhador, e não a prevendo para os casos de despedimento levados a cabo pelo empregador, estaríamos a agir contra legem permitindo que este de forma não regulamentada, por sua livre iniciativa, o pudesse fazer quando lhe aprouvesse.
IX – Igualmente está vedado à entidade empregadora a possibilidade ou a faculdade de poder suspender por sua iniciativa o decurso do prazo prévio, conforme decorre do disposto do artigo 383º do CT, revestindo, quanto a esse aspecto, a continuidade do prazo, natureza imperativa.
X – Decidida e comunicada ao trabalhador a cessação do vínculo laboral, por extinção do posto de trabalho, não é possível a entidade patronal suspender o prazo prévio em curso, mesmo que a finalidade seja para o processamento de procedimento disciplinar com vista ao seu despedimento com justa causa.
XI – O despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito sempre que o empregador, (a) não tiver respeitado os requisitos do n.º 1 do artigo 403.º, (b) tiver violado o critério de determinação de postos de trabalho a extinguir, enunciado no n.º 2 do artigo 403.º, (c) não tiver feito as comunicações previstas no artigo 423.º, (d) não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401.º e, bem assim, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho.”
XII – O seguro de saúdo que a entidade empregadora concedeu ao trabalhador sendo uma prestação regular e periódica tem um inegável valor patrimonial para quem dela usufrui que é, desde logo, poder beneficiar da protecção do seguro sem suportar os inerentes custos.
XIII – Estamos, assim, perante uma prestação em espécie que deve ser qualificada como retribuição, caso a entidade empregadora não elida a presunção estabelecida no nº 3º do art 249º do CT.
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[1] Essenciais para a dirimência da lide e não de mera argumentação aduzida pelas partes em defesa das teses por si expendidas, não devendo, todavia, confundir-se com qualquer erro de julgamento dirigido ao mérito ou fundo da causa
[2] Cfr. o prof. Alb. dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 49 e ss”; o prof. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil, págs. 672/673”; o prof. Anselmo de Castro, in “Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, pág. 143”; o prof. Lebre de Freitas, in “Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, pág. 670”), e Ac. do STJ de 06/02/1992, in “BMJ, 414 – 415

António José da Ascensão Ramos