Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
260/07.6TTVRL.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE
Nº do Documento: RP20130909260/07.6TTVRL.P1
Data do Acordão: 09/09/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – Deve expurgar-se da matéria de facto a referência conclusiva à caracterização das funções exercidas por remissão para o descritivo de uma categoria profissional institucionalizada, se está em causa a classificação profissional do trabalhador e este formula um pedido de diferenças salariais por entender que auferiu uma retribuição inferior à estabelecida no instrumento de regulamentação colectiva para aquela categoria.
II - Recai sobre o trabalhador que pretende ver reconhecida a existência de um contrato de trabalho, o ónus de alegar e provar os factos necessários ao preenchimento dos elementos constitutivos de tal figura contratual.
III – Caso não funcione a presunção de laboralidade prevista na lei, por não preenchimento de algum dos requisitos cumulativos enunciados em 2003, pode o trabalhador provar que estão preenchidos os elementos constitutivos do contrato de trabalho tal como o mesmo se mostra definido no preceito que o define, caso demonstre factos que os integrem ou que constituam índice relevante da sua verificação.
IV – Não se provando uma forma de direcção e definição concreta do conteúdo da actividade prestada pelo A., nem que a R. exercesse sobre o mesmo um poder de disciplina e conformação da actividade, sequer fixando os limites temporais do seu exercício, e sendo a remuneração fixada exclusivamente em função das vendas e apurada e paga pelo próprio A., interessando à R., apenas, um resultado – a laboração do seu posto de abastecimento de combustíveis no respectivo horário de funcionamento, independentemente da circunstância de o A. ali se encontrar concretamente a exercer funções, pois que podia fazer-se substituir por outrem –, não se divisam os contornos da subordinação jurídica inerente à vinculação laboral, apesar de o A. desenvolver as suas funções exclusivamente para a R. no período em causa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 260/07.6TTVRL.P1
4.ª Secção

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
II
1. Relatório
1.1. B… intentou em 21 de Maio de 2007 a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra C…, peticionando se declare como contrato de trabalho o celebrado entre A. e R. e que vigorou entre Setembro de 2001 e Fevereiro de 2007, se declare a existência de justa causa para a resolução contratual operada pelo A. e seja R. condenada a pagar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, bem como pelos créditos laborais vencidos e não liquidados, no montante de € 139.173,56.
Em fundamento da sua pretensão alegou, em síntese: que foi admitido ao serviço da Ré em Setembro de 2001 para exercer as funções correspondentes à categoria profissional de abastecedor de combustíveis no posto de abastecimento da R. sito na …; que a R não inscreveu o A. na Segurança Social e informou o A. que deveria inscrever-se nas Finanças como comissionista, passando a emitir recibos verdes, ao que o A. acedeu por necessitar deste emprego; que durante os primeiros 6 meses de execução do contrato o A. exerceu o horário, consecutivo, das 13h00 às 20h00 horas, sem dias de descanso semanal, nem feriados; que em Março de 2002 o A. passou, por imposição da R., a trabalhar alternadamente de 2ª feira a domingo das 07h0 às 13h00 horas e de 2º feira a domingo das 13h00 às 20h00/21h00 horas, sem dia de descanso ou feriado; que o A. auferia um vencimento variável correspondente a Esc. 1$50/litro de combustível vendido e cumpria as ordens que lhe eram dadas pelo seu superior hierárquico, pelo que caracteriza o seu contrato como sendo de trabalho e por tempo indeterminado, apesar de emitir os recibos verdes; que nunca gozou férias, nem nunca lhe foram pagos subsídios de férias e de Natal; que no final de 2006 e por inspecção levada a cabo pelos serviços sociais competentes, a R. viu-se obrigada a regularizar a situação do A. e a do seu colega de trabalho, tendo decidido que lhes iria liquidar a quantia de € 403,00/mês, equivalente ao salário mínimo nacional; que o A. não aceitou esta proposta da R. e em 15 de Fevereiro de 2007 remeteu comunicação à mesma fazendo cessar o seu contrato de trabalho com invocação de justa causa; que tem direito ao pagamento dos montantes que peticiona a título de indemnização, diferenças salariais, subsídio de alimentação, férias vencidas e não gozadas e respectivos subsídios, compensação por violação de direito a férias, subsídios de Natal não pagos, trabalho suplementar prestado em dia de descanso semanal complementar e obrigatório e feriados e não gozo de dias de descanso complementar, retribuição pelo trabalho prestado em Fevereiro de 2007 e indemnização por danos não patrimoniais.
Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação foi ordenada a notificação da R. para contestar, vindo a mesma a apresentar contestação em que invoca, essencialmente: que a R. é uma associação sem fins lucrativos e o A. passou a integrar a Mesa da Assembleia-Geral da R, como Secretário em 13 de Abril de 2002; que em meados de 2001 estava reformado por invalidez e pediu à R. para ir ocupar a vaga que iria ser deixada por uma das pessoas que se encontrava a prestar serviços no posto de abastecimentos de combustíveis que a R. obteve licença para instalar em …, o que a R. aceitou, informando o A. que receberia a quantia de 3$00 por litro de combustível vendido e que o horário seria a combinar com a outra pessoa que explorava o posto, dentro do horário de funcionamento deste; que o A. recebia subsídio de invalidez pela Segurança Social; que o A. aceitou e quis prestar serviço como trabalhador independente e pretendeu inscrever-se nas Finanças como trabalhador independente, já que as contribuições aos serviços sociais como trabalhador dependente determinariam a cessação do pagamento da sua pensão de reforma; que o A. resolveu que passaria a receber 1$50 por cada litro vendido, recebendo o seu colega igual quantia, sendo eles que no final do mês retiravam as quantias referentes ao combustível vendido e as faziam suas, o que a R. nunca pôs em causa; que eram eles quem decidia a quem vender a crédito, qual o horário em que prestavam serviço e os dias; que o A. arranjava alguém da sua confiança que o substituísse quando por qualquer motivo não prestava serviço num ou vários dias, sendo ele quem dava instruções a essa pessoa e pagava a respectiva remuneração, sem prévia autorização da R.; que a R. não controlava nem determinava o horário do A.; que o A. e o colega alteraram o preço do gasóleo agrícola sem pedirem previamente autorização à R. e que foi só quando a R. pretendeu fazer cessar o contrato de prestação de serviços que se encontrava em vigor com o A. e celebrar um contrato de trabalho, como horário determinado, retribuição e categoria, que este se recusou a tal e fez cessar o seu contrato com a R.; que, a haver contrato de trabalho, o A. o resolveu em momento em que já havia caducado o seu direito de resolver o contrato com justa causa. Conclui defendendo a improcedência da acção, por não provada, condenando-se o A. por litigância de má-fé.
O A. respondeu à contestação nos termos de fls. 162 e ss., aí alegando, em síntese: que não corresponde à verdade a factualidade alegada pela R.; que a reforma por invalidez não o impede de exercer uma actividade profissional remunerada; que não se verifica a caducidade do direito do A. e que quem litiga de má fé é a R. e não o A. No mais, reiterou os pedidos formulados no petitório.
Foi proferido despacho saneador e fixada a matéria de facto assente, bem como organizada a base instrutória (fls. 185 e ss.), sendo estas peças objecto de reclamação por parte do A. (fls. 204 e ss.), a qual foi parcialmente atendida (fls. 212-213).
Após a audiência de discussão e julgamento veio a ser proferida sentença, que foi anulada na 1.ª instância por despacho proferido a fls. 330 que, sob requerimento da R., afirmou o vício decorrente da deficiente gravação dos depoimentos na prestados na audiência e declarou a nulidade dos actos ali praticados no que respeita à inquirição de testemunhas, bem como dos actos processuais posteriores dependentes do julgamento de facto, determinando a repetição da audiência de julgamento.
Realizada nova audiência e concluído o julgamento, foi proferido despacho a decidir a matéria de facto em litígio, que não foi objecto de reclamação (fls. 358 e ss.).
A Mma. Julgadora a quo proferiu em 18 de Outubro de 2012 sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
“Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência declara-se que o “contrato de prestação de serviços” celebrado entre as partes se traduziu num verdadeiro contrato de trabalho por tempo indeterminado; que este contrato de trabalho cessou por iniciativa do A. com justa causa e por esta via, condena-se a R. no pagamento ao A. da quantia de € 68.113,18 (sessenta e oito mil cento e treze euros e dezoito cêntimos), a título de indemnização e de créditos laborais vencidos e não liquidados, acrescida do montante relativos às remunerações que o mesmo deixou de auferir, desde a indicada data, até ao trânsito em julgado da presente decisão.
[…]”
1.2. O A., inconformado, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
“1- Vem o presente recurso interposto da decisão do Mmo. Juiz do Tribunal “à quo” que considerou inaplicável ao contrato de trabalho celebrado entre autora e ré o CCT publicado no BTE nº 37 de 08/10/1978, com as alterações que lhe foram introduzidas, nomeadamente, pelas alterações publicadas no BTE nº 24 de 29-06-1997 e BTE, nº 29, de 8-08-1997, pela alteração salarial e outras publicada no BTE nº 34, de 15-09-2000, pela PE publicada no BTE nº 04, de 29-01-2001, pelas alterações publicadas no BTE nº 41 de 08-11-2001, pela PE publicada no BTE nº 6 de 15-02-2002, pelas alterações publicadas no BTE nº 8 de 28-02-2003, pela PE publicada no BTE nº 17 de 8-05-2003, pelas alterações publicadas no BTE nº 2 de 15-01-2006, pela PE publicada no BTE nº 27 de 22-07-2006, pelas alterações publicadas no BTE nº 46 de 15-12-2006 e Portaria nº 496/2007 de 26 de Abril, e em consequência considerou como improcedentes os pedidos relativos ao pagamento quer de diferenças salariais, quer dos montantes referentes ao subsídio de alimentação, quer ainda as quantias peticionadas a título de trabalho suplementar correspondente a uma hora de trabalho prestado em intervalo de descanso diário, nos anos de 2002 a 2007, como melhor explicitado nos artigos 70º a 83º da PI, e de acordo com o disposto na clausula 17ª, nº 1 al. a), do CCT aplicável ao sector.
2- Mal andou, com o enorme respeito que nos merece, o Mm. Juiz “a quo” ao entender que, vigorando, no nosso ordenamento jurídico, “o chamado princípio da dupla filiação, estabelecido nos artigos 552º e 553º ambas do indicado diploma legal” (Código do Trabalho) e não tendo o autor sequer alegado “que seja filiado em qualquer sindicato que tenha subscrito aquele CCT e que a Ré seja membro de associação que também o tenha assinado,… o mesmo não tem aplicação ao contrato de trabalho aqui em análise
3- Nos termos do disposto no artigo 573º do Código do Trabalho “o âmbito de aplicação definido nas convenções colectivas ou decisões arbitrais pode ser estendido, após a sua entrada em vigor, por regulamentos de extensão.”
4- O Contrato Colectivo de Trabalho para o Sector das Garagens, Estações de Serviço, Postos de Abastecimento, Postos de Assistência a Pneus e Revenda e Distribuição de Gás (doravante designado por CCT), publicado no BTE nº 37 de 08-10-1978, com as sucessivas actualizações, foi sendo por, também sucessivas, Portarias de Extensão, estendido no território do continente às relações de trabalho entre entidades patronais não filiadas na associação patronal outorgante que exerçam a actividade económica a actividade económica abrangida pela convenção e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nele previstas, como melhor explicitado no corpo das alegações de recurso,
5- Está provado nos autos – Alínea B) dos factos assentes – “Que ao sector de actividade da ré era aplicado o CCT que nos autos é identificado.”
6- Pelo que deverá ser este CCT declarado aplicável ao contrato de trabalho celebrado entre autor e Ré, o CCT para o Sector das Garagens, Estações de Serviço, Postos de Abastecimento, Postos de Assistência a Pneus e Revenda e Distribuição de Gás, publicado no BTE nº 37 de 08-10-1978, com as sucessivas actualizações, nomeadamente, as publicadas no BTE nº 34 de 15-09-2000 e estendidas pela PE publicada no BTE nº 4 de 29-01-2001, as alterações publicadas no BTE nº 41 de 08-11-2001 e estendidas pela PE publicada no BTE nº 6 de 15-02-2002, as alterações publicadas no BTE nº 8 de 28-02- 2003 e estendidas pela PE publicada no BTE nº 17 de 8-05-2003, as alterações publicadas no BTE nº 2 de 15-01-2006 e estendidas pela PE publicada no BTE nº 27 de 22-07-2006 e as alterações publicadas no BTE nº 46 de 15-12-2006 e estendidas pela Portaria nº 496/2007 de 26 de Abril.
7- Revogando-se a douta Sentença em crise na parte em que não procede à aplicação do CCT e, em consequência, declarando-se procedentes os pedidos formulados na PI de condenação da Ré a pagar ao autor, a quantia de € 375,48, devida a título de diferenças salariais, como descrito nos artigos 42º a 45º da P.I. e aí peticionado, a quantia de € 6.922,68, devida a título de subsídio de alimentação não liquidado, referente aos anos de 2002 a 2007, nos termos descritos nos artigos 65º a 69º da P.I. e aí peticionado e a quantia de € 53.824,01 devida a título de trabalho suplementar correspondente a uma hora de trabalho prestado em intervalo de descanso diário, nos anos de 2002 a 2007, como melhor explicitado nos artigos 70º a 83º da PI e no corpo das alegações, acrescida da quantia de € 50.293,92 em que já foi condenada pela douta Sentença em crise.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá se impõe a alteração parcial da Sentença recorrida, revogando-a nos termos melhor descritos no corpo das alegações de recurso, e em consequência alterando-se a decisão recorrida, condenando-se a Ré a pagar ao autor a quantia de € 375,48, devida a título de diferenças salariais, a quantia de € 6.922,68, devida a título de subsídio de alimentação não liquidado, referente aos anos de 2002 a 2007 e a quantia de € 53.824,01 devida a título de trabalho suplementar correspondente a uma hora de trabalho prestado em intervalo de descanso diário, nos anos de 2002 a 2007, acrescida da quantia de € 50.293,92 em que já foi condenada pela douta Sentença em crise.”.
1.3. A R. interpôs igualmente recurso da sentença, vindo a concluir a sua peça processual do seguinte modo:
"1. A sentença recorrida apresenta uma fundamentação insuficiente, contraditória em diversos pontos, o que revela a inexistência de uma apreciação crítica das provas, como é legalmente exigível crítica das provas, como é legalmente exigível (art. 205.º/1 da Constituição da República Portuguesa, art.158.º/1 e art.653.º/2 do Código de Processo civil).
2. Tal determina a nulidade da sentença, nos termos do art.668.º/1 do Código de Processo Civil.
3. A prova testemunhal produzida em audiência de julgamento _concretamente, o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas D..., E..., F..., G... e H..._ impunha que houvesse sido dado uma resposta negativa aos factos questionados sob 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 8.º, 9.º, 10.º, 14.º, 15.º, 17.º, 18.º, 19.º, 26.º, 34.º, 35.º, 37.º, 38.º e 39.º da douta base instrutória e, paralelamente, resposta positiva às questões enunciadas nos pontos 11.º, 12.º, 13.º, 23.º, 24.º, 25.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º e 33.º da base instrutória.
4. Pelo que resultam erradamente julgados os pontos 2., 4., 5., 6., 7., 8., 9., 13., 15., 16., 22., 23., 25., 26. e 27. da matéria de facto considerada assente pela 1.ª Instância, impondo-se a sua revogação e reformulação em conformidade com a prova produzida.
5. Há manifesta e inconciliável contradição entre os pontos 6. e 19., e entre os pontos 21., 26. e 27. da decisão sobre a matéria de facto, impondo-se a respectiva sanação.
6. Ao qualificar o contrato em apreço como um contrato de trabalho, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação das normas constantes dos artigos 1152.º, 1154.º, 1157.º, 1158.º, n.º 2, 1161.º e 1167.º do Código Civil e dos artigos 11.º e 12.º do Código do Trabalho, que resultam violadas no aresto recorrido, impondo-se a sua revogação.
7. Ao não reconhecer nos vários factos vindos de enunciar aspectos e características típicas de um contrato de prestação de serviços, e ao não qualificar o objecto e relação acordados entre autor e ré em Setembro de 2011 como um mandato oneroso, o Tribunal do Trabalho de Vila Real violou o disposto nos artigos 1154.º, 1157.º, 1158.º, n.º 2, 1159.º, 1161.º, 1162.º, 1165.º, 1167.º, 1178.º e 1182.º do Código Civil, e o artigo 3.º, n.º b) do CIRS.
8. Ao qualificar a comunicação, datada de 17 de Fevereiro de 2007, dirigida pelo autor à ré e instruída como doc. da PI, como uma denúncia de contrato de trabalho com justa causa, e não, como soía, como uma revogação do mandato pelo mandatário, o Tribunal a quo violou as disposições do artigo 441.º, n.ºs 1 e 2,b) do Código do Trabalho e do artigo 1170.º, n.º 1, do Código Civil, impondo-se também aqui, e nesta parte, a revogação da sentença.
Nos termos e razões expostos, e nos melhores de direito que V. Ex.as. doutamente suprirão, deverá o presente recurso proceder, por fundado, e, em consequência, serem reconhecidos os apontados erros na apreciação e decisão sobre a matéria de facto e de direito, revogando-se a sentença proferida e, em seu lugar, proferida decisão consentânea com os factos revelados pela prova produzida, que determinam a qualificação do contrato celebrado entre autor e ré em Setembro de 2001 e executado pelas partes ao longo de cinco anos e meio como um contrato de mandato oneroso; declarando a improcedência das pretensões formuladas pelo autor e delas absolvendo a ré, em preito a sã Justiça.”
1.4. A R. apresentou contra-alegações ao recurso do A., defendendo a improcedência deste.
1.5. Também o A. contra alegou ao recurso interposto pela R. e concluiu que se mostram preenchidos todos os elementos constitutivos do contrato de trabalho, muito bem andou o Tribunal “a quo” ao decidir que entre recorrente e recorrido vigorou entre 2001 e 2007 um verdadeiro contrato de trabalho, devendo manter-se a sentença.
1.4. Foi prolatado despacho de admissão dos recursos e fixado `causa o valor de € 139.173,56 (fls. 519-520).
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de que se deve anular a sentença para que se fixem os concretos factos que correspondem aos n.ºs 4, 11, 13, 14 e 15 da sentença.
Notificadas as partes, apenas a R. se pronunciou nos termos de fls. 534 e ss.
Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.
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2. Objecto do recurso
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Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões dos recorrentes – artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A do Código de Processo Civil aplicáveis “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – artigos 660.º e 713.º do Código de Processo Civil – este tribunal debruçar-se-á sobre as questões suscitadas nos recursos interpostos por A. e R. e dará, ainda, resposta à questão prévia suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto.
Tais questões, pela ordem lógica da sua apreciação, são as seguintes:
1.ª – da arguida nulidade da sentença recorrida por inexistência de apreciação crítica das provas [conclusão 1.º e 2.ª do recurso da R.];
2.ª – da necessidade de se decretar a anulação da sentença nos termos prescritos no n.º 4 do artigo 712.º do Código de Processo Civil por ser a decisão de facto insuficiente e para que em nova sentença se fixem os concretos factos a que correspondem os n.ºs 4, 11, 13, 14 e 15 da sentença [questão prévia suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto];
3.ª – da impugnação da decisão de facto no que diz respeito aos pontos 2., 4., 5., 6., 7., 8., 9., 13., 15., 16., 22., 23., 25., 26. e 27. da matéria considerada assente pela 1.ª instância, e, ainda, à apontada contradição entre os pontos 6. e 19., e entre os pontos 21., 26. e 27. da mesma matéria [conclusões 3.ª a 5.ª do recurso da R.];
4.ª – da qualificação do vínculo contratual estabelecido entre as partes como um contrato de trabalho [conclusões 5.ª a 8.ª do recurso da R.];
5.ª – em caso de resposta afirmativa à questão anterior, da aplicabilidade do Contrato Colectivo de Trabalho publicado no BTE n.º 37 de 08 de Outubro de 1978 [conclusões 1.ª a 17.ª do recurso do A.].
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3. Da nulidade da sentença
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Afirma a R. recorrente que a sentença apresenta uma fundamentação insuficiente, contraditória em diversos pontos, revelando a inexistência de uma apreciação crítica das provas, como é legalmente exigível (art. 205.º/1 da Constituição da República Portuguesa, art.158.º/1 e art.653.º/2 do Código de Processo civil), o que determina a nulidade da sentença, nos termos do art. 668.º/1 do Código de Processo Civil.
Mas no requerimento de interposição de recurso (fls. 401) não faz qualquer alusão à nulidade da sentença.
Ora, por força do estatuído no art. 77.º do Código de Processo de Trabalho, a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso. Este normativo pressupõe que o anúncio da arguição e a corresponde motivação das nulidades (a substanciação das razões por que se verificam) devem constar do requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao órgão judicial “a quo”, permitindo ao juiz recorrido aperceber-se, de forma mais rápida e clara, da censura produzida e possibilitando-lhe o eventual suprimento das nulidades invocadas.
Em consonância com esta especialidade estabelecida pela lei processual laboral, a jurisprudência tem considerado pacificamente que não deve ser conhecida pelo tribunal ad quem a nulidade da sentença em processo laboral que não foi arguida no requerimento de interposição de recurso.
É certo que se tem admitido que aquela exigência se mostrará cumprida, no caso de o requerimento e a alegação constituírem uma peça única, com a indicação no requerimento de interposição de recurso a que se apresenta a arguição de nulidades da sentença e a exposição dos motivos determinantes das nulidades feita na alegação, imediatamente a seguir ao requerimento stricto sensu, de forma perfeitamente clara e autónoma – vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.10.31, Recurso n.º 1442/07, de 2008.03.12, Recurso n.º 3527/07, sumariados in www.stj.pt, em consonância com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 304/05, de 8 de Junho de 2005, in Diário da República, II Série, n.º 150, de 5 de Agosto de 2005 (também em www.tribunalconstitucional.pt), que julgou inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade a norma constante do art. 77.º do CPT/99 “na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição de recurso com referência a que se apresenta a arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço do tribunal superior”.
Mas tem sido igualmente jurisprudência constante do Tribunal Constitucional a de não ser inconstitucional o entendimento de que o tribunal “ad quem” está impedido de apreciar as nulidades da sentença, em processo laboral, sempre que as mesmas não tenham sido expressamente arguidas no requerimento de interposição do recurso (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 403/2000, in D.R., II Série, de 2000.12.13, reportado ao artigo 72º n.º 1 do CPT/81 e n.º 439/2003, in www.tribunalconstitucional.pt, reportado ao artigo 77º n.º 1 do CPT/99).
No fundo, apenas se admite ser desproporcionado que, relativamente aos recursos interpostos das decisões proferidas em 1.ª instância - em que existe uma unidade formal do requerimento de interposição do recurso e das alegações -, o tribunal ad quem decline o seu conhecimento quando o recorrente referencia genericamente a existência do vício decisório no dito requerimento, mas vem a efectivar a sua substanciação no corpo alegatório de forma clara e autónoma. Embora este comportamento não observe inteiramente o prescrito no art. 77.º do Código de Processo do Trabalho, admite-se que nestas situações o tribunal superior aprecie a questão da nulidade desde que a motivação desta, no corpo da alegação, se mostre explanada de forma expressa e de molde a facilitar ao juiz a percepção, imediata e sem necessidade de maiores indagações, de que está colocada a questão da nulidade da sentença.
No caso sub judice, a recorrente não chega sequer a arguir a nulidade no requerimento de interposição de recurso dirigido ao tribunal, aí não lhe fazendo qualquer referência, pelo que não pode apreciar-se a sua argumentação no sentido de saber se verifica a nulidade da sentença nos termos do preceituado no artigo 668.º do Código de Processo Civil.
Além disso, as razões que invoca para sustentar esta nulidade e o preceito processual civil que, além dos que prescrevem o dever de fundamentação das decisões judiciais (artigos 205.º da Constituição da República Portuguesa e 158.º do CPC), indica como violado – artigo 653.º, n.º 2[1] – nada tem a ver com as nulidades da sentença prescritas no artigo 668.º do CPC.
Com efeito, no âmbito do regime processual civil aplicável ao caso vertente – o emergente do Código de Processo Civil, antes das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 303/2007 de 24 de Agosto – a falta de fundamentação da decisão de facto é causa de reclamação, nos termos do artigo 653º, nº 4 e, na fase do recurso, motivo para retorno ao tribunal de primeira instância com vista à sua correcção[2], como estabelece o artigo 712º, nº 5 do Código de Processo Civil, segundo o qual pode a Relação, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de 1ª instância fundamente a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa se a mesma não estiver devidamente fundamentada.
E não se confunde com o dever de fundamentação da sentença final, cujo incumprimento, esse sim, determina a nulidade da sentença nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil[3].
O incumprimento do dever de motivação das respostas à base instrutória previsto no art. 653.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, que pode, no circunstancialismo descrito no art. 712.º, n.º 5, determinar a baixa do processo à primeira instância para que o julgador sane a deficiência (concretização dos meios probatórios decisivos para a sua convicção), não acarreta a nulidade da sentença, e há mesmo situações em que a lei admite que se não colmate a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, não estabelecendo qualquer sanção para tal, como ressalta do último segmento do nº 5 do artigo 712º, ao dizer que se for “impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova”, o juiz da causa se limitará a “justificar a razão da impossibilidade”[4].
Acresce que, mesmo para que se ordene a baixa ao tribunal da 1.ª instância que fundamente a decisão de facto, mostra-se necessário que a parte requeira tal retorno[5], o que o recorrente não fez, limitando-se a invocar a falta de fundamentação.
Assim, não pode este Tribunal da Relação conhecer da apontada nulidade da decisão da primeira instância, nenhumas consequências lhe sendo lícito retirar da invocada inexistência de suficiente apreciação crítica das provas.
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4. Da anulação do julgamento para ampliação da matéria de facto
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Haverá ainda que dar resposta à questão prévia suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto de saber se deve decretar-se a anulação da sentença nos termos prescritos no n.º 4 do artigo 712.º do Código de Processo Civil por ser a decisão de facto insuficiente e para que em nova sentença se fixem os concretos factos a que correspondem os n.ºs 4, 11, 13, 14 e 15 da sentença.
É o seguinte o teor de tais factos:
«4. Cumprindo o horário de trabalho melhor expresso nos artigos 9º e 11º da p.i., cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
(…)
11. Quantia inferior à auferida pelo A. – cfr. documentos de fls. 34 a 58, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
(…)
13. Como esta não corrigisse a situação, viu-se o A. compelido a fazer cessar o contrato de trabalho – cfr. doc. de fls. 30 a 31 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
14. O A. exercia as funções inerentes à categoria de operador de posto de abastecimento, fazendo ainda a caixa do dia e tarefas similares melhor descritas no art. 37º da p.i., cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
15. Durante o tempo em que esteve ao serviço da R. e porque foi obrigado a prestar para a mesma um horário que o privava do descanso semanal e feriados, viu-se o A. impedido de conviver com a família e os amigos.»
Explicita o Exmo. Procurador-Geral Adjunto que tais factos se reportam ao horário de trabalho, remuneração auferida até à intervenção da Inspecção do Trabalho, circunstancialismo que sustentou a justa causa invocada e funções concretamente exercidas.
Ora, quanto ao item n.º 15. da matéria de facto, entendemos que o mesmo encerra ainda um conteúdo factual, com a afirmação da obrigação imposta pela R. do cumprimento de um horário que contemplava dias de descanso semanal e feriados, o não convívio do A. com a família e amigos e o nexo de causalidade entre um e outro destes factos. Assim, sem prejuízo da apreciação do alegado erro de julgamento suscitado no recurso da R, quando a este facto n.º 15., não constitui a sua inclusão na matéria de facto fundamento para anulação do julgamento.
Mas já deve reconhecer-se razão ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto na crítica que dirige aos demais factos que enuncia.
Com efeito, nas descrições que ficaram a constar dos n.ºs 4., 11., 13. e 14. “dos factos” que se consideraram “provados”, o tribunal, ao arrepio do disciplinado nos artigos 653.º e 659.º, nos seus n.ºs 2 – que impõe ao tribunal o dever de discriminar os factos que julga provados, na decisão de facto e na sentença –, apenas decidiu remetendo para a petição inicial, ou para documentos, enquanto suportes de materialidade que veio a ponderar na decisão de direito, ou proferiu afirmações conclusivas, vg. qualificando a categoria profissional sem que cuidasse de descrever as funções exercidas.
Ora, e quanto à remissão para documentos (factos 11. e 13.), como vem repetidamente sendo afirmado, os documentos enquanto objectos elaborados pelo homem “com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa, ou facto” (artigo 362.º do Código Civil), não são factos, mas meios de prova que “têm por função a demonstração da realidade dos factos” (artigos 341.º do Código Civil e 523º, nº1 do Código de Processo Civil). Pelo que constitui prática incorrecta, na decisão sobre a matéria de facto, remeter para o teor de documentos, o que é bem diferente de dizer qual, ou quais, os factos que, deles constando, o tribunal considera provados.
Quanto à remissão para descrição do articulado (facto 4.), também não observou o tribunal a quo o dever de discriminação, no acto decisório, dos factos que se encontram provados (n.º 2 do artigo 653.º e 659.º do CPC).
Quanto à afirmação de que o A. desempenhava funções inerentes a determinada categoria profissional (facto 14.), reveste-se a mesma de um evidente carácter conclusivo, uma vez que na presente acção é formulado, além do mais, um pedido de diferenças salariais que tem como pressuposto a classificação categorial do A. à face do instrumento de regulamentação colectiva que o mesmo entende aplicável [artigos 34.º a 45.º da petição inicial], pelo que constitui “thema decidendum” da presente acção, além do mais, a caracterização das funções exercidas pelo A. no decurso do vínculo contratual estabelecido com a R. Tendo em atenção que só os factos podem ser objecto de prova, tal afirmação não deveria constar dos factos elencados na sentença, sendo de reputar como não escrita à face do que estabelece o n.º 4 do artigo 646.º do Código de Processo Civil cujo campo de aplicação se estende às asserções de natureza conclusiva, «[n]ão porque tal preceito, expressamente, contemple a situação de sancionar como não escrito um facto conclusivo, mas, como tem sido sustentado pela jurisprudência, porque, analogicamente, aquela disposição é de aplicar a situações em que em causa esteja um facto conclusivo, as quais, em rectas contas, se reconduzem à formulação de um juízo de valor que se deve extrair de factos concretos objecto de alegação e prova, e desde que a matéria se integre no thema decidendum» - vide o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Setembro de 2009, Processo n.º 238/06.7TTBGR.S1, da 4.ª Secção, in www.dgsi.pt.
Cremos contudo que, no caso vertente, são ultrapassáveis por este Tribunal da Relação as deficiências resultantes do facto de o tribunal a quo não ter procedido em estrita conformidade com o que estabelece o artigo 653.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, por nos itens 4., 11. e 13. da matéria de facto em causa não ter enunciado claramente os factos que considerava provados, limitando-se a remeter para os textos dos articulados ou de documentos apresentados em que os mesmos estavam relatados.
Com efeito, uma vez que foi interposto recurso também da decisão proferida em termos de facto, haverá que reponderar a prova produzida, incluindo os documentos referenciados nos aludidos pontos da matéria de facto. Além disso, constam efectivamente dos autos todos os elementos probatórios necessários para alicerçar a decisão quanto a estes pontos da matéria de facto, sendo certo que, nos exactos termos previstos no invocado n.º 4 do artigo 712.º do Código de Processo Civil, apenas «[s]e não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do nº 1 permitam a reapreciação da matéria de facto, pode a Relação anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na 1ª instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão».
Pode pois ser colmatado nesta instância o modo remissivo (quer para documentos, quer para a petição inicial) como ficaram redigidos os factos referidos pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto.
E, no que diz respeito ao facto n.º 14., de natureza conclusiva – afirmação de que o A. exercia funções inerentes a uma categoria profissional –, cabe lembrar que as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do acervo factual a considerar, cabendo ao Tribunal da Relação, no julgamento de facto, cuidar, oficiosamente, da observância do estipulado no n.º 4 do artigo 646.º citado, tendo tal matéria por não escrita [artigo 712.º, n.º 1, alínea b) do CPC].
Cremos pois que, no caso vertente, em que constam dos autos todos os elementos probatórios necessários, não se justifica lançar mão do disposto no artigo 712.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, com as delongas processuais que daí resultariam (o que é absolutamente desaconselhado nos presentes autos que pendem já desde o ano de 2007), podendo nesta instância ser colmatadas as faltas constatadas e outras de que caiba oficiosamente conhecer.
Em suma, apesar das apontadas deficiências, entende-se não se justificar a anulação da sentença nos termos do artigo 712.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, colmatando-se as faltas constatadas após reapreciada a prova produzida.
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5. Fundamentação de facto
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5.1. Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos:
«[...]
1. O A. foi admitido ao serviço das R. em Setembro de 2001 através de contrato verbal, não o tendo [a R.] inscrito na Segurança Social.
2. Para trabalhar sob as suas ordens, direcção e fiscalização, dos legais representantes da R.
3. E exercendo funções inerentes à categoria de abastecedor de combustíveis em exclusividade para a R. e utilizando instrumentos propriedade desta.
4. Cumprindo o horário de trabalho melhor expresso nos artigos 9º e 11º da p.i., cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
5. Tendo que justificar as faltas que desse ao serviço.
6. Como contrapartida do seu trabalho auferia o A. a retribuição mensal variável de Esc. 1$50/litro.
7. O A. acabou por colectar-se como trabalhador independente pois caso não o fizesse a R. despedi-lo-ia.
8. Sendo por isso o A. compelido a passar recibos verdes.
9. Durante a execução do contrato em apreço foi o A. impedido pela R. de gozar férias.
10. Após visita inspectiva da IGT no final de 2006, a R. passou a pagar ao A. o vencimento mensal de € 403,00.
11. Quantia inferior à auferida pelo A. – cfr. documentos de fls. 34 a 58, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
12. Do que este discordou perante a R.
13. Como esta não corrigisse a situação, viu-se o A. compelido a fazer cessar o contrato de trabalho – cfr. doc. de fls. 30 a 31 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
14. O A. exercia as funções inerentes à categoria de operador de posto de abastecimento, fazendo ainda a caixa do dia e tarefas similares melhor descritas no art. 37º da p.i., cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
15. Durante o tempo em que esteve ao serviço da R. e porque foi obrigado a prestar para a mesma um horário que o privava do descanso semanal e feriados, viu-se o A. impedido de conviver com a família e os amigos.
16. Sempre foi o A. enquanto ao serviço da R. um trabalhador zeloso e diligente.
17. O A. pelo menos em meados de 2001 estava reformado por invalidez.
18. Passando a receber da Segurança Social a respectiva pensão.
19. E quando o A. foi admitido pela R. o que sucedeu, atendendo à situação pessoal deste e a seu pedido, ficou acordado que o mesmo iria ser remunerado com a contrapartida de Esc. 3$00/litro de combustível que a R. vendesse.
20. Pagando-se o A. no final do mês pela quantidade de combustível vendido.
21. Chegando o A. quando necessitava a chamar outras pessoas para o substituir.
22. Ao serviço da R. cumpria o A. as ordens que lhe eram transmitidas directamente pelo seu superior hierárquico directo, presidente da direcção da R.
23. O A. estava na dependência económica da R. que mensalmente lhe liquidava uma determinada quantia devida pela sua força de trabalho.
24. E sempre prestou a sua colaboração no posto de abastecimento propriedade da demandada.
25. Sendo todos os instrumentos de trabalho fornecidos pela R. a quem o A. obedecia, cumprindo o horário de trabalho que esta lhe estipulava.
26. E estava o A. impedido de faltar ao serviço.
27. Sendo informado que caso faltasse, a R. seria obrigada a dispensar os seus serviços e a contratar outro trabalhador para ocupar o seu lugar.
[...]».
O tribunal a quo exarou, para expor a fundamentação desta decisão de facto, o seguinte:
O Tribunal baseou a sua convicção em toda a prova documental junta aos autos, nomeadamente, nos documentos juntos a fls. 30 a 58, 126, 127, 142 a 146 e 182.
No mais, atendeu-se ainda ao depoimento das seguintes testemunhas:
- D…, disse ter sido vogal da R. durante 8 anos, tendo cessado estas funções há cerca de 2 anos e afirmou que o A. acatava as ordens dadas pela direcção da aqui demandada e que tinha por funções vender os combustíveis e os produtos relacionados com os mesmos (óleos), bem como fazia a entrega dos mesmos ao domicílio e processava a facturação e entregava os documentos na contabilidade, encomendava os produtos ali vendidos e trabalhava das 07h00 às 20h00 e no Verão até às 21h00 horas, alternando o horários entre os dois trabalhadores que ali se encontravam; acrescentou que o A. não gozava nenhum dia de descanso, nem nunca gozou férias, por imposição da R. que queria manter o posto sempre aberto e se tivesse de faltar tinha de arranjar alguém que o substituísse, comunicando o facto à R.; disse ainda que o A. auferia Esc. 1$50 por cada litro de combustível que vendesse, tal como o seu colega, o que se traduzia em cerca de e 500,00/mês; apesar do A. ter pedido para ser inscrito na Segurança Social, para a R. era economicamente mais vantajoso se aquele emitisse recibos verdes, pelo que impôs que assim fosse, posteriormente, houve uma inspecção dos serviços sociais que determinaram que acabassem com esses recibos e que passassem a fazer as contribuições sociais devidas e o A. passou a auferir apenas € 400,00; confirmou também que a R. nunca pagou ao A. qualquer subsídio de férias, nem de Natal e que face à proposta de redução de vencimento que lhe foi apresentada o A. deixou o seu posto de trabalho;
- E…, disse ser primo do aqui A. e afirmou que o A. trabalhava nas bombas de gasolina da R. e não exercia qualquer outra actividade remunerada, sendo as suas funções as de abastecer os veículos, distribuir o gasóleo, tirar fotocópias e vender óleo para os veículos; cuidava ainda dos equipamentos e fazia o fecho do caixa diariamente, bem como os pagamentos e entrega de documentos na contabilidade da R.; acrescentou também que o A. e o outro seu colega que ali trabalhava, faziam dois horários, um das 07h00 até meio da tarde e outro desde essa hora até às 20h00 horas, alternando este horário entre os dois à semana; confirmou que o posto de combustível em apreço estava aberto todos os dias da semana, só encerrando no dia de Natal e no dia da festa local, sendo que o A. não gozava férias, nem tinha qualquer dia de descanso, daqui decorrendo os problemas familiares que o A. teve por estar sempre a trabalhar; confirmou também que o A. auferia uma pequena pensão de invalidez e que foi por isso que aceitou este trabalho, bem como que o mesmo se faltasse ao trabalho perdia o emprego, já que o posto tinha de estar sempre aberto;
- F…, disse ser solicitador e conhecer o A. desde a infância; afirmou que o A. exercia as suas funções no posto de abastecimento da R. na …, como abastecedor de combustível e que trabalhava todos os dias da semana, fazendo encomendas de combustível, a caixa e depósitos, bem como distribuição de combustível; limpava os depósitos e emitia as vendas a dinheiro; o horário que ele cumpria era das 07h00 às 14h00 ou das 14h00 às 20h00, conforme as semanas, repartido com o outro colega que ali trabalhava; acrescentou ainda que o A. nunca foi de férias e que quando necessitava de faltar tinha de arranjar alguém que o substituísse; depois houve uma inspecção da Segurança Social que impôs à R. que terminassem com os recibos verdes e que os inscrevessem nesses serviços sociais, tendo-se o horário mantido na prática, mas a R. quis diminuir-lhe o vencimento e ele não aceitou e saiu; confirmou ainda que o A. teve problemas conjugais por via do horário de trabalho que cumpria, sem dias de descanso e nunca auferiu qualquer subsídio de Natal, nem de férias; mais afirmou que o então presidente da direcção da R. morava perto do posto de combustíveis em questão e que lá passava diariamente, constatando que o mesmo estava aberto todo os dias, dando ordens ao A. a que este obedecia;
- G…, disse ser funcionário da R., enquanto abastecedor de combustíveis, tendo sido colega do A.; afirmou que desde o início recebiam ordens da Direcção da R. e confirmou o horário repartido entre ambos, das 07h00 às 20h00 ou às 21h00 horas, todos os dias da semana e sem qualquer período de férias; disse ainda que auferiam Esc. 3$00/litro de combustível e que no final do mês eram verificados os apuros e o resultado era dividido em igual proporção entre ambos; a R. através do seu contabilista impôs-lhes que emitissem recibos verdes, mas com a inspecção da Segurança Social, passaram a fazer as contribuições devidas, e colocaram mais 1 funcionário para repartir o horário de funcionamento do posto, mas reduziram-lhes os vencimentos e o A. como não aceitou, saiu; confirmou ainda as funções desempenhadas pelo A. tal como descritas pelas testemunhas anteriores;
- H…, disse ter feito parte da Direcção da R. desde 1990 até 2002, tendo sido presidente da assembleia geral até 2010; declarou que a demandada dava o posto à exploração a quem estivesse interessado a troco de comissão sobre o valor dos combustíveis vendidos e que quando o A. lá começou a trabalhar o posto passou a dar prejuízo dado que o mesmo fiava o combustível, tendo ficado um montante elevado por liquidar. Esta testemunha revelou acentuada animosidade contra o aqui demandante, a quem se referiu como “incompetente” e não merecedor de confiança, pelo que a credibilidade do seu testemunho ficou diminuída face à falta de isenção claramente revelada.
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5.2. A recorrente dedica grande parte das suas alegações à impugnação da decisão de facto fixada na 1.ª instância, expressando a sua discordância no que diz respeito a um grande número de factos submetidos à instrução.
Sustenta a recorrente que a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento - concretamente, o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas D…, E…, F…, G… e H… - impunha que houvesse sido dado uma resposta negativa aos factos questionados sob 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 8.º, 9.º, 10.º, 14.º, 15.º, 17.º, 18.º, 19.º, 26.º, 34.º, 35.º, 37.º, 38.º e 39.º da douta base instrutória. E, paralelamente, resposta positiva às questões enunciadas nos pontos 11.º, 12.º, 13.º, 23.º, 24.º, 25.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º e 33.º da base instrutória.
Na reapreciação da decisão de facto pelo Tribunal da Relação, no âmbito dos poderes conferidos pelo artigo 712.º do Código de Processo Civil, o que é proposto ao tribunal de segunda instância não é que proceda a um novo julgamento – desprezando o juízo formulado na primeira instância sobre as provas produzidas e a expressão do processo lógico que conduziu à pronúncia sobre a demonstração (ou não) dos factos ajuizados –, mas que, no uso dos poderes próprios de tribunal de recurso, averigúe – examinando a decisão da primeira instância e respectivos fundamentos, analisando as provas gravadas e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos – se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido quanto aos concretos pontos impugnados assentou num erro de apreciação.
Deve dizer-se que a jurisprudência mais recente, quer do Supremo Tribunal de Justiça, quer das Relações, tem vindo a acentuar que a reapreciação deve ultrapassar o mero controlo formal da motivação da decisão da 1.ª instância em matéria de facto e não se contenta com o objectivo de apenas debelar erros grosseiros na valoração da prova, assente numa hipervalorização do princípio da livre apreciação (artigo 655.º do CPC) e da imediação por parte do juiz a quo. Pelo contrário, tem-se entendido que o pleno exercício dos poderes de reapreciação da matéria de facto da Relação, exige a formação de uma convicção própria, obtida activa e criticamente em face dos elementos probatórios indicados pelas partes ou mesmo adquiridos oficiosamente[6].
Assim, tendo em consideração que constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os referidos pontos da matéria de facto, por terem sido gravados os meios de prova oralmente produzidos perante o tribunal a quo [cfr. o artigo 712.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil], conhecer-se-á do recurso interposto apreciando-se a argumentação da recorrente no sentido de ser alterada a decisão que ficou a constar dos assinalados pontos da matéria de facto.
Para o que procedemos à audição integral dos depoimentos das testemunhas indicadas (todas as que prestaram depoimento em audiência de julgamento), bem como à análise de todos os documentos constantes dos autos.
Não perdendo de vista que, em caso de dúvida quanto à verificação dos factos que são susceptíveis de consubstanciar os elementos constitutivos de contrato de trabalho, deve a mesma ser resolvida em desfavor daquele que o invoca – o autor – e sobre quem impende o ónus da prova dos elementos caracterizadores da existência da relação laboral (cfr. os artigos 342.º, n.º 1 e 346.º do Código Civil e 516.º do Código de Processo Civil).
Vejamos, pois.
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5.3. Os factos a atender para a decisão jurídica do pleito
Porque a impugnação da matéria de facto se revestiu de alguma extensão – e por inerência, a consequente decisão –, elencam-se os factos a atender para a decisão jurídica do pleito, após a intervenção deste Tribunal da Relação, que são os seguintes:
«[...]
1. O A. foi admitido ao serviço das R. em Setembro de 2001 através de contrato verbal, não o tendo [a R.] inscrito na Segurança Social.
2. (eliminado)
3. O A. procedia ao abastecimento dos veículos que se dirigiam ao posto de abastecimento da R. para esse efeito e à entrega de combustível de aquecimento nas residências dos clientes que o solicitavam, recebia os pagamentos, emitia recibos e facturas, procedia à leitura dos totais registados nos contadores das bombas, fazia o fecho do “caixa” ao fim do dia, procedia à encomenda de combustíveis à I… consoante as litragens que havia nos depósitos, providenciava pela reparação dos equipamentos das bombas através de contacto com as empresas responsáveis, quando necessário, contabilizava os litros de combustível vendido, retirando o valor equivalente a 3$00 por litro de combustível vendido (valor que apurava e dividia com a testemunha G…), procedia aos depósitos bancários do produto destas operações e entregava periodicamente os documentos comprovativos das mesmas e “as contas” ao contabilista que efectuava a contabilidade da R., o que fazia em exclusividade para a R. e utilizando instrumentos propriedade desta.
4. No início do contrato, e por tempo não apurado, o autor exerceu as suas funções consecutivamente de segunda-feira a domingo das 13h às 20h, passando depois a exercer tais funções de segunda-feira a domingo das 07h às 13h e de segunda-feira a domingo das 13h às 20h ou às 21h em horário de verão, de modo a assegurar o funcionamento do posto de abastecimento no horário compreendido entre as 07 e as 20 horas (ou 21 horas no horário de Verão), com excepção dos dias 25 de Dezembro, dos dias em que se comemoravam as festas … e dos dias, em número não apurado, em que se fez substituir por outra pessoa.
5. (eliminado)
6. Como contrapartida da sua actividade, o A. auferia o valor mensal equivalente a de Esc. 1$50 por cada litro de combustível vendido no posto de abastecimento de combustíveis da R.
7. O A. colectou-se como trabalhador independente.
8. E passava recibos “verdes” pela remuneração auferida.
9. (eliminado)
10. Após visita inspectiva da IGT no final de 2006, a R. passou a pagar ao A. o vencimento mensal de € 403,00.
11. Quantia inferior à auferida pelo A.
12. Do que este discordou perante a R.
13. O A. remeteu à R. e esta recebeu a carta documentada a fls. 30-31 dos autos, datada de 15 de Fevereiro de 2007 e por si subscrita, da qual fez constar o seguinte:
“ASSUNTO: Resolução de contrato de trabalho
Exmos, Senhores.
Venho pelo presente meio comunicar a V. Exas. que, nos termos do disposto no artigo 441º e 442º do Código do Trabalho, rescindo com justa causa o contrato de trabalho convosco celebrado em Setembro de 2001, pelos seguintes factos e fundamentos:
Por contrato celebrado em Setembro de 2001, foi contratado para, sob as ordens, direcção e fiscalização de V. Exas. exercer as funções de gasolineiro, no Posto de Combustível de V/propriedade.
Durante os primeiros seis meses de execução do contrato pratiquei o seguinte horário de trabalho:
- De segunda-feira a domingo das 13h00 às 20h00
Posteriormente passei, em regime de turno a praticar o seguinte horário de trabalho, alternadamente dia à dia:
- De segunda-feira a domingo das 7h00 às 13h00
- De segunda-feira a domingo das 13h00 às 20h00 ou às 21 h00 em horário de verão.
Desta forma trabalhei desde Setembro de 2001 sete dias por semana, sem qualquer dia de descanso semanal, apesar de diversas vezes solicitado.
Também não me foi permitido gozar qualquer dia de férias, desde o início da execução do contrato celebrado com V. Exas., numa clara violação dos meus mais precários direitos.
Por outro lado, logo após o início do contrato fui informado por V. Exas. que seria obrigado a colectar-me como comissionista e a emitir recibos verdes sobre as quantias que V. Exas. me liquidavam mensalmente, situação que acabei por aceitar em virtude da necessidade que tinha de trabalhar.
No entanto, nunca fui um trabalhador independente, pois que sempre fui obrigado por V. Exas. a praticar um horário de trabalho que me foi imposto, a cumprir todas as ordens que me eram directamente transmitidas por V. Exas., não podendo faltar ao serviço em qualquer situação, caso em que corria o sério risco de ser despedido.
Assim a minha relação com V. Exas. sempre configurou um verdadeiro contrato de trabalho, apesar de V. Exas. nunca terem cumprido a obrigação legal de me inscreverem na Segurança Social, realizarem os descontos que a Lei impõe ao empregador e conceder-me os direitos que por Lei me estavam garantidos.
Porque sempre me impus contra a conduta de V. Exas. em clara violação dos meus mais elementares Direitos e porque exigi sempre de V. Exas. a regularização da minha situação, fui agora confrontado com a indicação que a minha retribuição mensal iria ser diminuída, situação com a qual não posso de forma nenhuma aceitar.
A conduta assumida por V. Exas. ao longo dos seis anos de duração do meu contrato de trabalho, claramente violadora dos meus Direitos, nomeadamente do disposto no artigo 441º, n''s 1 e 2. als. b), e) e f) do Código do Trabalho, torna imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral e fundamenta a rescisão com justa causa do contrato de trabalho que me liga a V. Exas.
Com base nos factos e fundamentos supra descritos, de forma directa ou indirecta, declaro e comunicou que faço cessar com justa causa e com efeitos imediatos o meu contrato de trabalho.
Como consequência reclamo de V. Exas. o pagamento de todos os créditos salariais que me são devidos, incluindo a indemnização prevista no artigo 443º do Código do Trabalho.»
14. (eliminado)
15. Durante o tempo em que exerceu as suas funções em benefício da R. nos termos relatados no ponto 4., viu-se o A. impedido de conviver com a família e os amigos.
16. Sempre foi o A. enquanto ao serviço da R. um trabalhador zeloso e diligente.
17. O A. pelo menos em meados de 2001 estava reformado por invalidez.
18. Passando a receber da Segurança Social a respectiva pensão.
19. E quando o A. foi admitido pela R. o que sucedeu, atendendo à situação pessoal deste e a seu pedido, ficou acordado que o mesmo iria ser remunerado com a contrapartida de Esc. 3$00/litro de combustível que a R. vendesse.
19-A. O A. veio a receber 1$50 por cada litro de combustível vendido, porque assim o concertou com a testemunha G…, que no referido posto de abastecimento exercia actividade idêntica ao A. (resposta ao quesito 26.º dada pelo Tribunal da Relação)
20. Pagando-se o A. no final do mês pela quantidade de combustível vendido.
20-A. Nunca o A. pôs em causa as quantias que, assim, fazia suas, perante a R.
21. Chegando o A. quando necessitava a chamar outras pessoas para o substituir.
21- A. R. não controlava nem determinava a R o horário em que o A. exercia as suas funções.
22. (eliminado)
23. A R. liquidava mensalmente ao A. uma determinada quantia, nos termos referidos nos pontos 6. e 19-A.
24. O A. sempre prestou a sua colaboração no posto de abastecimento propriedade da demandada.
25. Sendo todos os instrumentos de trabalho fornecidos pela R., que estipulava o horário de funcionamento do posto de abastecimento em que o A. exercia a sua actividade.
26. (eliminado)
27. (eliminado)
[...]»
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6. Fundamentação de direito
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6.1. A questão fundamental a analisar nos presentes autos consiste em saber se se estabeleceu entre as partes uma relação contratual de natureza laboral como decidiu a sentença de 1.ª instância ou se, como entende a recorrente, tal não se verificou.
No período de tempo em análise (entre Setembro de 2001 e Fevereiro de 2007), estiveram em vigor regimes laborais sucessivos, pelo que se chamará à colação o regime que estiver em vigor em cada momento a que se reporta a apreciação a efectuar.
De todo o modo, importa dizer que a noção de contrato de trabalho se manteve incólume na lei civil ao longo deste tempo – artigo 1152º do Código Civil – e não sofreu igualmente alterações, no que diz respeito à sua essência, nas definições constantes, sucessivamente, do artigo 1.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.° 49.408 de 24 de Novembro de 1969 (LCT), do artigo 10.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto, que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003 (artigo 3.º, n.º 1 desta lei) e do artigo 11.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que entrou em vigor em 17 de Fevereiro de 2009 e por isso não logra aplicação ao caso sub judice.
Os elementos constitutivos da noção de contrato de trabalho, em qualquer destes textos normativos, são: a prestação de actividade, a retribuição e a subordinação jurídica.
Como decorre do disposto no artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil, e já se salientou, recai sobre o trabalhador que pretende ver reconhecida a existência de um contrato de trabalho, o ónus de alegar e provar os factos necessários ao preenchimento dos elementos constitutivos de tal figura contratual[7].
Perante as dificuldades muitas vezes inerentes ao cabal cumprimento deste ónus, a jurisprudência que se firmou no âmbito da LCT passou a recorrer ao denominado “método indiciário”, lançando mão de vários índices – cuja verificação tinha igualmente de ser demonstrada por quem estava onerado com o ónus da prova do contrato – sobre os quais formulava um juízo global sobre a qualificação contratual, extraindo a conclusão pela autonomia na prestação do trabalho ou pela subordinação jurídica, a partir de factos índice essencialmente emergentes da fase de execução do contrato, como o local de trabalho, o horário de trabalho, a modalidade da remuneração, a titularidade dos instrumentos de trabalho, a eventual situação de exclusividade do prestador de serviços, o nomen juris escolhido, o enquadramento fiscal e de Segurança Social, etc.
A partir de 2003, e com o mesmo objectivo de obviar às dificuldades de prova dos elementos que preenchem a noção de contrato de trabalho, bem como de facilitar a operação qualificativa nas denominadas “zonas cinzentas” entre o trabalho autónomo e o trabalho subordinado, nesta matéria, o artigo 12º do Código do Trabalho de 2003, na sua redacção inicial, estabeleceu uma “presunção” de que as partes celebraram um contrato de trabalho assente no preenchimento cumulativo dos requisitos nela enunciados.
Este preceito foi alterado pela Lei n.º 9/2006 – que lhe conferiu uma nova redacção, entrada em vigor em 25 de Março de 2006 –, passando a dispor que “[p]resume-se que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido na estrutura organizativa do beneficiário da actividade e realize a sua prestação sob as ordens, direcção e fiscalização deste, mediante retribuição”. Se a primeira redacção do preceito veio a revelar-se de uma extrema exigência e trouxe pouca utilidade à presunção de laboralidade ali estabelecida, também esta redacção se não furtou a críticas da doutrina, já que, afinal, os factos base da presunção coincidiam integralmente com os factos cuja conclusão se pretendia alcançar com a prova dos primeiros e ainda acrescentava mais alguns (a dependência do beneficiário da actividade e a inserção na estrutura organizativa deste)[8].
Actualmente, o Código do Trabalho de 2009 regressou a uma norma presuntiva com uma estrutura semelhante à redacção originária de 2003, mas aligeirando o esforço do trabalhador que não terá que provar cumulativamente os vários factos-base, mas apenas alguns, para que se possa aferir a existência dos elementos caracterizadores do contrato de trabalho.
Caso não funcione a presunção de laboralidade prevista na lei, por não preenchimento de algum dos requisitos cumulativos enunciados em 2003, pode o trabalhador provar que estão preenchidos os elementos constitutivos do contrato de trabalho tal como o mesmo se mostra definido no preceito que o define, caso demonstre factos que os integrem ou que constituam índice relevante da sua verificação[9].
Tendo presente este quadro normativo, vejamos se pode concluir-se que se estabeleceu entre as partes um contrato de trabalho, tal como foi decidido na 1.ª instância, ou se os factos não permitem tal conclusão, como defende a recorrente, tendo em consideração o que provado ficou nestes autos.
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6.2. O contrato individual de trabalho vem definido no art. 1º da LCT e no art. 1152º do C.Civil, como o contrato pelo qual uma “pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta”.
No Código do Trabalho de 2003 o contrato de trabalho é definido no seu art. 10º como “aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direcção destas” [10].
O contrato de prestação de serviço, por seu turno, é descrito no art. 1154º do Código Civil como “aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição”.
Das definições legais de contrato de trabalho e de contrato de prestação de serviço resulta que os elementos que essencialmente os distinguem são: o objecto do contrato (prestação de actividade ou obtenção de um resultado) e o relacionamento entre as partes (subordinação ou autonomia).
O contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e como elemento típico e distintivo a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador conformar através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou. Diferentemente, no contrato de prestação de serviço, o prestador obriga-se à obtenção de um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte.
Através do critério do objecto do contrato, nem sempre constitui tarefa fácil a de distinguir o contrato de trabalho do contrato de prestação de serviço previsto no art. 1154º do Código Civil, na medida em que muitas vezes não se pode verdadeiramente saber se se promete o trabalho ou o seu resultado, pois que todo o trabalho conduz a um resultado e este não existe sem aquele[11].
Em última análise, o relacionamento entre as partes - a subordinação ou autonomia - é que permite caracterizar a “locatio operarum”, ou contrato de trabalho, e a “locatio operis”, ou contrato de prestação de serviço[12]. Esta característica fundamental do vínculo laboral implica uma posição de supremacia do credor da prestação de trabalho e a correlativa posição de subordinação do trabalhador cuja conduta pessoal na execução do contrato está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador dentro dos limites do contrato e das normas que o regem.
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6.3. Como resulta do inicialmente dito, existem muitas vezes dificuldades no juízo qualificativo, vg. em situações que contêm elementos enquadráveis em diferentes figuras contratuais por se situarem em zonas de fronteira entre o contrato de trabalho e outras espécies de contratos para cuja execução é necessária a prestação da actividade intelectual ou manual de alguém.
Contudo, tendo em consideração que o contrato de trabalho é um negócio meramente consensual (artigos 6.º da LCT e 102.º do Código do Trabalho de 2003), o que igualmente sucede com o contrato de prestação de serviço (art. 219º do CC), é possível alcançar a determinação da sua existência e dos seus contornos pelo comportamento das partes, pela análise da situação de facto[13], sendo comummente invocado nesta matéria o denominado “princípio da primazia da realidade”, segundo o qual “os contratos são o que são e não o que as partes dizem que são”[14].
Assim, para proceder ao juízo qualificativo a formular perante a situação concreta e alcançar, eventualmente, a identificação da relação laboral, haverá que interpretar o comportamento declarativo expresso nas estipulações contratuais (averiguando qual a vontade revelada pelas partes, quer quando procederam à qualificação do contrato, quer quando definiram as condições em que se exerceria actividade, ou seja, quando definiram a estrutura da relação jurídica em causa) e, depois, analisar a conduta dos contraentes na execução do contrato, recolhendo do circunstancialismo que envolveu a execução do negócio indícios que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado ou do modelo da prestação de serviço.
Nesta análise, e perante a dificuldade da prova de elementos fácticos nítidos de onde resultem os elementos caracterizadores do contrato de trabalho, a jurisprudência tem lançado mão do método indiciário a que já nos referimos, procedendo à identificação da relação laboral (vg. para a distinguir de outras formas de negociar) através de indícios que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado, por modo a poder-se concluir pela coexistência no caso concreto dos elementos definidores do contrato de trabalho.
Como indícios negociais internos a captar apontam-se, geralmente, a vinculação a horário de trabalho, a prestação da actividade em local definido pelo empregador, a utilização de bens ou utensílios fornecidos pelo mesmo, a retribuição em função do tempo, a obediência a ordens, a sujeição à disciplina da empresa, o pagamento das férias, subsídios de férias e de Natal e a inserção na organização produtiva.
Como indícios externos do contrato, aponta-se a exclusividade do empregador, a inscrição, ou não, na Repartição de Finanças como trabalhador dependente, o tipo de recibos emitidos, o tipo de declaração de IRS, o registo na Segurança Social, com os respectivos descontos, no fundo a observância dos regimes fiscal e de segurança social, próprios dos trabalhadores por conta de outrem[15].
O juízo a efectuar não é configurável como um juízo subsuntivo ou de correspondência biunívoca, mas como um mero juízo de aproximação entre dois "modos de ser" analiticamente considerados: o da situação concreta e o do modelo típico da subordinação.
Os indícios a ponderar têm pois um valor relativo se individualmente considerados[16] e têm sempre que reconduzir-se ao único critério incontroversamente diferenciador e verdadeiramente típico do contrato de trabalho, ou seja, a subordinação jurídica pressuposta na norma laboral definidora desta figura contratual.
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6.4. O artigo 12.º do Código do Trabalho de 2003 veio consagrar a já referenciada presunção de laboralidade com vista a facilitar a prova do contrato de trabalho por parte do trabalhador sobre quem recai o ónus da prova dos elementos constitutivos do contrato.
Na sua redacção inicial, o artigo 12º do Código do Trabalho de 2003 dispunha o seguinte:
«Presume-se que as partes celebraram um contrato de trabalho sempre que, cumulativamente:
a) O prestador de trabalho esteja inserido na estrutura organizativa do beneficiário da actividade e realize a sua prestação sob as orientações deste;
b) O trabalho seja realizado na empresa beneficiária da actividade ou em local por esta controlado, respeitando um horário previamente definido;
c) O prestador de trabalho seja retribuído em função do tempo despendido na execução da actividade ou se encontre numa situação de dependência económica face ao beneficiário da actividade;
d) Os instrumentos de trabalho sejam essencialmente fornecidos pelo beneficiário da actividade;
e) A prestação de trabalho tenha sido executada por um período, ininterrupto, superior a 90 dias.»
Este preceito foi alvo de múltiplas críticas por parte da doutrina em face da extensão da base da presunção, com a exigência de verificação cumulativa de diversos factos indiciários, considerando-se que a presunção, tal como estava formulada, não só não correspondia ao objectivo de facilitar a prova de um contrato de trabalho, como se arriscava a dificultar a operação de qualificação[17].
Como refere João Leal Amado[18], “a disposição em apreço limitou-se a compendiar os elementos indiciários habitualmente utilizados pela jurisprudência, exigindo que todos eles apontassem para a existência de trabalho subordinado – então, e apenas então, funcionaria a presunção legal o que, em bom rigor, de pouco ou nada serviria, visto que, em tais situações, a qualificação laboral do contrato não suscitaria qualquer espécie de controvérsia, mesmo na ausência da referida presunção legal”.
A evolução legislativa que ulteriormente se verificou (com a alteração do artigo 12.º introduzida pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março e com o próprio Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro), demonstra as dificuldades do legislador nesta matéria.
Seja como for, e revertendo ao caso sub judice, entendemos que a matéria de facto apurada nestes autos não é efectivamente suficiente para se concluir que se encontram preenchidos, cumulativamente, os vários factos base da denominada presunção de laboralidade, tal como a mesma se mostra estabelecida no Código do Trabalho de 2003, na sua versão original, desde logo por não resultar da factualidade provada que o A. realize a sua prestação sob as orientações da R. [alínea a)] e, também, por não demonstrado que o prestador de trabalho fosse retribuído em função do tempo despendido na execução da actividade, pois ficou provado que era retribuído em função da litragem de combustível vendido no posto de abastecimento de combustíveis (factos 3., 6., 19., 19-A. e 23.), não havendo factos suficientes para se afirmar que se caracterizava uma situação de dependência económica perante a R., tanto mais que o A. auferia concomitantemente uma pensão de invalidez (factos 17. e 18.) [alínea c)].
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6.5. Cabe pois aferir se os factos provados permitem concluir que se firmou um vínculo de natureza laboral entre as partes com o trabalho prestado pelo recorrido à recorrente a partor de Setembro de 2001.
Sendo as prestações recíprocas que as partes executaram ao longo do tempo – exercer as actividades inerentes ao funcionamento de um posto de abastecimento de combustíveis referenciadas no ponto 3. da matéria de facto mediante uma contrapartida pecuniária –, em abstracto, compatíveis com a existência de um contrato de trabalho ou de um contrato de prestação de serviço, torna-se imprescindível recorrer ao método indiciário para responder a esta questão fundamental.
Como o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a defender, repetidamente, os indícios de subordinação jurídica não podem ser avaliados de uma forma atomística, antes deve ser efectuado um juízo global, em ordem a convencer ou não da existência, no caso, da subordinação jurídica do prestador do trabalho em relação à entidade a quem o presta[19].
Ou seja, não basta o preenchimento, em abstracto, de um ou mais indícios apontados como susceptíveis, em princípio, de revelar a subordinação jurídica para se poder concluir, desde logo, que se está perante um contrato de trabalho, nem basta que o número de indícios nesse sentido seja maior que o dos indícios que apontam em sentido diverso, havendo sempre que avaliar, em concreto, o valor sintomático dos respectivos factos. Nesta avaliação, cada um dos indícios tem naturalmente um valor muito relativo e, por isso, o juízo a fazer é sempre um juízo de globalidade, formulado com base na totalidade dos elementos de informação disponíveis, a partir de uma maior ou menor correspondência com o conceito-tipo.
Analisando para o efeito a factualidade apurada no âmbito do presente processo, podemos adiantar que o juízo de globalidade a que se procede não permite a afirmação de que o recorrido prestava trabalho de modo juridicamente subordinado quando desenvolvia a sua actividade em benefício da recorrente.
No sentido da eventual existência de contrato de trabalho poderiam apontar os factos de a actividade ser prestada em instalações da recorrente e com instrumentos de sua propriedade. Mas estes factos não são concludentes. Com efeito, a prestação da actividade no estabelecimento da R. não é incompatível com a prestação da actividade em regime de prestação de serviço, maxime se é nesse local que se encontram os equipamentos necessários ao exercício de tal actividade. E o mesmo se diga quanto a estes equipamentos que, no caso de um posto de abastecimento de combustíveis, se incorporam na sua maioria no próprio terreno em que o mesmo está implantado e pertencem geralmente ao proprietário do posto, seja, ou não, ele quem o explora.
Ou seja, por natureza, as actividades necessárias ao funcionamento de um posto de abastecimento de combustíveis, apenas podem ser desenvolvidas nos locais onde o posto se mostra implantado e com os pesados e dispendiosos equipamentos que dele fazem parte e o compõem.
Quanto ao modo de exercício da actividade, o facto de o recorrido executar as tarefas necessárias à gestão e funcionamento do posto sem que se demonstrasse a existência de qualquer interferência da R. no modo como ele e a testemunha G… exerciam tal actividade, e se encarregavam das múltiplas tarefas inerentes à exploração e funcionamento do posto – aí se incluindo a organização do seu tempo e horário de trabalho, a definição do modo de repartição do valor de 3$00/litro vendido acordado com a R. com a pessoa que, em termos idênticos aos seus, exercia actividade no posto de abastecimento, a designação de pessoas para o substituírem no posto de abastecimento, a determinação mensal do valor da contrapartida pecuniária e o pagamento a si mesmo a que procedia – não se coaduna com a existência das ordens e instruções que necessariamente caracterizam a subordinação jurídica (embora com maior ou menor intensidade, consoante o tipo de actividade desenvolvida).
É certo que nada obsta a que no contrato de prestação de serviço possa haver ordens ou instruções, as quais se dirigirão, contudo, mais ao resultado a alcançar, do que à forma de o atingir. Como tem sido jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, a existência de um contrato de prestação de serviços não é incompatível com a possibilidade de a parte que beneficia do serviço emitir directivas, instruções e orientações genéricas e exercer algum controle sobre o modo como o serviço é prestado[20]. Mas, embora a prestação de serviço seja compatível, também, com directrizes que sejam emitidas no âmbito da indicação e definição dos concretos serviços que o contratante pretende que sejam realizados ou prestados, o certo é que, mesmo quanto a estas, nada consta dos factos provados, o mesmo se dizendo quanto a eventuais factos caracterizadores da existência de fiscalização da actividade do recorrido por parte da recorrente.
Por outro lado, também nada se provou quanto à vinculação do recorrido ao cumprimento de um horário de trabalho e às eventuais consequências de um incumprimento do mesmo. O facto de o estabelecimento da R. ter um horário das 7 às 20 horas (ou 21 horas no horário de Verão) e de ser a R. quem estipulava tal horário de funcionamento (vide os factos 4. e 25.), em si, nada adianta, pois que não pode confundir-se o horário de funcionamento de um estabelecimento com a pré-determinação de um horário em que o recorrido deva exercer a sua actividade e que este, apesar de ter alegado nestes autos ter-lhe sido imposto pela recorrente, não logrou demonstrar (vide as respostas aos quesitos 4.º, 17.º e 37.º).
Bem como nada se provou quanto à eventual sujeição do recorrido ao poder disciplinar que é próprio de uma relação de trabalho subordinado, não tendo o mesmo provado sequer, apesar de o alegar, que tinha que justificar as faltas que desse ao serviço (vide a resposta ao quesito 5.º).
Ora este aspecto é da maior relevância na medida em que no contrato de trabalho o conhecimento pelo empregador da razão de ser das faltas é, antes de mais, imprescindível para saber se deve ou não retribuir o tempo de trabalho respectivo, uma vez que as faltas justificadas não implicam perda de remuneração – cfr. os artigos 26.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.° 874/76, de 28 de Dezembro e 230.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2003. Além disso, e numa outra perspectiva, esta desnecessidade de “dar contas” da razão de ser das ausências ao serviço (em princípio necessária no contrato individual de trabalho), é um índice forte da autonomia do A. na sua vida, autonomia esta que o regime das faltas no âmbito da legislação laboral comum de certo modo condiciona e que é pouco compatível com a subordinação jurídica pressuposta no contrato de trabalho. Finalmente, é de notar que, no âmbito do contrato individual de trabalho, tem evidentes reflexos disciplinares a circunstância de as faltas serem ou não justificadas, podendo as injustificadas fundamentar, inclusivamente, a cessação do contrato com justa causa por iniciativa do empregador, o que também denota o relevo da necessidade de justificação de faltas (em termos indiciários positivos, quando exista, e negativos, quando não exista).
No caso sub judice, não se provou que o A. tivesse que justificar as faltas que desse e, ao invés, ficou provado que, quando necessitava, o A. chamava outras pessoas para o substituir (facto 21.).
Esta circunstância denota uma autonomia no relacionamento profissional com a ré, e na organização dos próprios tempos de actividade, muito pouco compatível com a heterodisponibilidade que caracteriza o contrato de trabalho.
Além disso, se no decurso da execução das relações contratuais estabelecidas entre as partes o A. chamava outras pessoas que bem entendesse para o substituir quando precisava de se ausentar, tal denota que o interesse da R. era o de que o posto se mantivesse em funcionamento no período por si assinalado, confiando às pessoas que contratou a responsabilidade de assegurar a continuidade da exploração da organização produtiva, podendo o A. fazê-lo por si, ou por quem se fizesse substituir.
Daqui se retira que, por um lado, à R. interessava, apenas, a produção de um determinado resultado (a manutenção do estabelecimento em funcionamento) e não a actividade do autor, como é próprio do contrato de prestação de serviço. E, por outro, que as relações contratuais se mantinham e eram cumpridas ainda que, para o efeito, o A. não prestasse a sua actividade intelectual ou manual em benefício da R., como é característico do contrato de trabalho[21].
Quanto à remuneração do A., fixada em função dos litros de combustível vendido (factos 6., 19., 19-A., 20., 20-A e 23.), pode ser acordada quer no âmbito de um contrato individual de trabalho, quer no de um típico contrato de prestação de serviços, mas no âmbito do contrato de trabalho é mais comum remunerar-se a disponibilidade abstracta para a sua prestação, convencionando-se um salário determinado em função do tempo de disponibilidade para o trabalho, independentemente do número de horas de trabalho efectivamente realizado e dos resultados obtidos. A remuneração convencionada entre as partes no caso sub judice, exclusivamente ligada aos resultados obtidos e sem qualquer componente fixa, mostra-se geralmente associada ao trabalho autónomo, sendo aqui de sublinhar que no amplo leque de tarefas inerentes ao funcionamento do estabelecimento que o A. tinha a seu cargo e desempenhava com assinalável autonomia, se incluía a realização das contas, e o próprio apuramento da percentagem que lhe cabia de acordo com as vendas de combustível mensalmente efectuadas, pagando-se a si mesmo no final do mês. Ou seja, e como refere a recorrente, “o autor auferia uma remuneração sempre variável e a priori indefinida, dependente da quantidade de combustível vendido no posto de abastecimento em cada mês, e pelas partes indexada a 3$00 [três escudos] por litro _consubstanciando uma verdadeira comissão. Sendo teoricamente possível não haver qualquer remuneração, na hipótese de não se vender nenhum combustível”.
Neste contexto em que não existia uma forma de direcção e definição concreta do conteúdo da actividade prestada pelo A., em que não se demonstrou que a R. exercesse sobre este um poder de disciplina e conformação da actividade, nem sequer fixando os limites temporais do seu exercício, em que a remuneração era fixada em função das vendas e apurada e paga pelo próprio A., interessando à R., apenas, um resultado – a laboração do posto de abastecimento da R. no respectivo horário de funcionamento, independentemente da circunstância de o A. ali se encontrar concretamente a exercer funções –, torna-se muito difícil divisar no contrato sub judice os contornos da subordinação jurídica inerente à vinculação laboral, apesar de o A. desenvolver as suas funções exclusivamente para a R. no período em causa.
São, por seu turno, consonantes com a vinculação em termos de contrato de prestação de serviço outros factos apurados que, embora sem relevo decisivo, surgem como coadjuvantes para se aferir do tipo de vínculo estabelecido entre as partes.
É o que sucede com os factos de a R. não ter inscrito o A. na Segurança Social (facto 1.), de o A. se ter colectado como trabalhador independente e de emitir os denominados recibos verdes (factos 7. e 8.).
Em suma, em face da já referenciada natureza consensual dos tipos contratuais em presença, procedendo a uma ponderação global dos factos que se provaram relativos ao modo de execução do contrato e a um juízo de valoração face ao tipo enunciado nos arts. 1.º da LCT e 10º do Código do Trabalho de 2003, entendemos que não estão presentes nas relações contratuais estabelecidas entre a recorrente e o recorrido a partir de Setembro de 2001 indícios de subordinação jurídica que apontem para a existência de uma relação de trabalho subordinado, devendo recordar-se que era sobre o recorrido que impendia o ónus da prova dos elementos caracterizadores da existência da relação laboral por tempo indeterminado que pretende ver reconhecida através da presente acção.
Porque este vínculo constituía pressuposto necessário da procedência dos pedidos formulados pelo A. na presente acção, devem julgar-se procedentes as conclusões da apelação relacionadas com a qualificação contratual e deverá revogar-se a decisão condenatória contida na sentença recorrida.
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6.6. Por força desta decisão fica prejudicada a apreciação da questão da aplicabilidade do Contrato Colectivo de Trabalho publicado no BTE n.º 37 de 08 de Outubro de 1978 colocada no recurso interposto pelo A. e que a este Tribunal da Relação caberia agora conhecer, caso considerasse que as partes estiveram vinculados através de um contrato individual de trabalho durante o período que decorreu entre Setembro de 2001 e Fevereiro de 2007, o que não sucedeu.
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6.7. Porque ficou vencido no recurso interposto pela R., incumbe ao recorrido o pagamento das custas respectivas, o mesmo sucedendo quanto ao recurso que interpôs, na medida em que o respectivo conhecimento ficou prejudicado em consequência do provimento do recurso da R. (artigo 446.º do Código de Processo Civil). Deverá, contudo, atender-se a que beneficia de apoio judiciário (fls. 458).
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7. Decisão
Em face do exposto, decide-se julgar procedente a apelação interposta pela R. e revogar a sentença recorrida, absolvendo a R. de todos os pedidos formulados na acção.
E não se conhece, por prejudicada, da apelação interposta pelo A.
Custas pelo recorrido, atendendo-se a que beneficia de apoio judiciário.
Nos termos do artigo 713.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, anexa-se o sumário do presente acórdão.

Porto, 9 de Setembro de 2013
Maria José Pais de Sousa da Costa Pinto
António José da Ascensão Ramos
Eduardo Petersen Silva
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[1] Regime distinto se mostra traçado no Código de Processo Penal, no âmbito do qual é nula a sentença, nos termos do respectivo artigo 379, nº1, al.a), por violação do disposto no artigo 374, nº2, do mesmo diploma, quando da mesma não consta o exame critico dos elementos de prova que serviram para fundamentar a convicção do tribunal.
[2] Vide Luís Filipe Lameiras, in “Notas práticas ao regime dos recursos em processo civil”, 2ª edição, pp. 57 a 60 e Augusto Lopes Cardoso, in “Motivação nas respostas à matéria de facto e consequências da falta de fundamentação”, ROA, ano 43, Janeiro–Abril de 1983, pp. 151 a 152, defendendo este autor que em casos mais graves pode, porventura, levar à anulação do julgamento. Vide ainda o Acórdão da Relação de Lisboa de 2011.1.1, Processo: 152/09.4TBPDL.L1-7, in www.dgsi.pt.
[3] Vide os Acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 2008.02.12, Recurso n.º 07A4317 e de 2007.05.15, Recurso n.º 07A924, in www.dgsi.pt.
[4] No regime constante do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, embora a análise crítica das provas que fundamenta a decisão de facto passe a ter assento na sentença final, deixando de haver um despacho autónomo, prévio à sentença, que decide a matéria de facto em litígio – cfr. o novo artigo 607.º, n.º 4 e 5 –, a falta de fundamentação da decisão sobre algum facto segue na sua essencialidade o regime processual traçado no Código de Processo Civil ainda em vigor – cfr. o novo artigo 662.º, n.º 2, alínea d) e n.º 3, alínea d).
[5] Havendo ainda quem entenda que constitui pressuposto para a invocação em sede recursória de um tal vício (que, na letra do artigo 712º, nº 5, depende sempre do requerimento da parte) haver a parte, antecipadamente, reclamado com o mesmo fundamento, a coberto do artigo 653º, nº 4. Quando a parte o não faça – como também o não fez no caso sub judice (vide a acta de fls. 363) – terá deixado consolidar a decisão e não pode no tribunal superior invocar o vício que, na primeira instância, deixou passar em claro - vide Luís Filipe Lameiras, in ob. citada, pp. 57-58.
[6] Vide, entre outros, os Acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 2010.12.16, Proc. n.º 2401/06.1TBLLE.E1.S1, de 2011.03.02, Proc. n.º 1675/06.2TBPRD.P1.S1, de 2011.05.24, Proc. n.º 376/2002.E1.S1; de 2012.05.24, Proc. 850/07.7TVLSB.L1.S2, de 2012.11.22, Processo n.º 196/1998.E.1.S1, todos in www.dgsi.pt.
[7] Entre muitos outros, afirmou que incumbe ao trabalhador, nos termos do artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil, a alegação e prova dos factos reveladores da existência de uma relação de natureza jurídico-laboral, porque são constitutivos do direito que pretende ver reconhecido, os Acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 2012.05.30, Recurso n.º 270/10.6TTOAZ.P1.S1- 4.ª Secção, de 2012.01.31, Recurso n.º 121/04.0TTSNT.L1.S1 - 4.ª Secção, e de 2010.03.03, Recurso n.º 4390/06.3TTLSB.S1 - 4.ª Secção, todos sumariados in www.stj.pt.
[8] Vide João Leal Amado, O contrato de trabalho entre a presunção legal de laboralidade e o presumível desacerto legislativo, in Temas Laborais 2, Coimbra, 2007, pp. 9 e ss..
[9] Vide nesse sentido os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.05.02, Processo 06S4668, de 2010.05.12, Processo 1394/06.0TTPNF.P1.S1, e de 2010.12.16, Processo n.º 996/07.1TTMTS.P1.S1, todos disponíveis in www.dgsi.pt, à luz do Código do Trabalho de 2003.
[10] Seguiremos aqui, no seu essencial, as considerações gerais a este propósito expostas nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2008.02.13 (Recurso n.º 356/07), e de 2008.10.09, Recurso n.º 2447/07 - 4.ª Secção, ambos sumariados in www.stj.pt.
[11] Galvão Teles, Contratos Civis (in B.M.J. 63/165), Mário Pinto, Furtado Martins, e N Carvalho, in Comentário às Leis do Trabalho, I, p 28.
[12] Galvão Teles, in ob. cit., p 166, Albino Mendes Baptista, in Jurisprudência do Trabalho Anotada, 3ª edição, pp. 21 e ss e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2000.04.06 (in B.M.J. 496/139), de 2002.01.09 (proferido na Rev. n.º 881/01 da 4ª Secção), de 2002.04.30 (proferido na Rev. n.º 4278/01 da 4ª Secção), de 2002.05.29 (proferido na Rev. n.º 2419/01 da 4ª Secção), de 2003.01.29 (proferido na Rev. n.º 3497/02 da 4ª Secção), de 2003.05.21 (proferido na Rev. n.º 191/03 da 4ª Secção), todos sumariados in www.stj.pt.
[13] Vide os Acs. do STJ de 90.9.26 (in A.D. 1990, p.1622), de 2005.02.23 (Revista n.º 2268/04), de 2007.05.02 (Rev. n.º 2567/06) e de 2008.01.16 (Rev. n.º 2713/07), todos da 4ª Secção). Repare-se que muitas vezes só mesmo pela execução efectiva do contrato é possível determinar a vontade das partes que o celebraram. Também no sentido de que prevalece a qualificação jurídica “dos factos efectivamente sucedidos” sobre a qualificação dos contratos escritos o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2003.05.28 (Rev. n.º 3302/02 da 4ª Secção).
[14] Vide João Leal Amado, in estudo citado, p. 12.
[15] Vide o Ac. do STJ de 2003.03.27 (Revista n.º 4672/02, da 4.ª Secção).
[16] Nenhum deles é decisivo, e não é pelo número de indícios que se procede à qualificação, exigindo-se sempre um juízo de valoração relativamente ao tipo enunciado no art.º 10.º do Código do Trabalho de 2003.
[17] Vide Bernardo Lobo Xavier, Iniciação ao Direito do Trabalho, 3.ª edição, Lisboa, 2005, p. 228, Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II-Situações Laborais Individuais, Coimbra, 2006, p. 43.
[18] In Temas Laborais, II, Coimbra, 2007, p.17.
[19] Vide, entre muitos outros, os acs. STJ, de 2000.11.22 (Rev. n.º 2450/00), de 2002.04.30 (Rev. n.º 4278/01), de 2002.05.29 (Rev. n.º 4419/01), de 2006.12.06, (Rev. n.º 3318/06) de 2007.05.02 (Rev. n.º 4368/06) e de 2007.10.24 (Rev. n.º 2189/07), todos da 4.ª Secção e sumariados in www.stj.pt.
[20] Vide p. ex. os Acs. do STJ de 2002.04.30 (Rev. n.º 4278/01) e de 2002.05.29 (Rev. n.º 3441/01), ambos da 4ª Secção.
[21] Tem sido jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça a de negar a qualificação laboral a contratos em que o prestador da actividade pode fazer-se substituir por outrem, ainda que, nalgumas das situações, com o conhecimento ou aprovação do beneficiários da actividade, o que no caso sub judice não se provou que a R. exigisse. Segundo o texto do Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2010.11.10, “não resultando provada uma intervenção directa da Ré no modo como deveria ser prestada a actividade do Autor, quedando, daí, improvado, que aquela detivesse o poder conformativo da prestação; não resultando provado que as horas e entradas do Autor fossem controladas pela Ré ou que esta controlasse a sua assiduidade e resultando, ao invés, provado que o Autor, nas suas ausências, poderia fazer-se substituir, na prestação, por outra pessoa – o que é incompatível com o carácter intuitu personae do contrato de trabalho e a natureza infungível da prestação laboral – não pode concluir-se que, entre as partes, vigorasse um contrato de trabalho” - Recurso n.º 684/06.6TTLRS.L1.S1- 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt. Vide também os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2010.12.09, Recurso n.º 1155/07.9TTBRG.P1.S1, de 2011.05.04, Recurso n.º 3304/06.5TTLSB.L1.S1, de 2011.06.30, Recurso n.º 2933/04.6TTLSB.L1.S1, de 2011.09.22, Recurso n.º 192/07.8TTLSB.L1.S1, de 2013.02.14, Recurso n.º 2549/07.5TTLSB.L1.S1, todos da 4.ª Secção
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Nos termos do artigo 713.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos:
I – Deve expurgar-se da matéria de facto a referência conclusiva à caracterização das funções exercidas por remissão para o descritivo de uma categoria profissional institucionalizada, se está em causa a classificação profissional do trabalhador e este formula um pedido de diferenças salariais por entender que auferiu uma retribuição inferior à estabelecida no instrumento de regulamentação colectiva para aquela categoria.
II - Recai sobre o trabalhador que pretende ver reconhecida a existência de um contrato de trabalho, o ónus de alegar e provar os factos necessários ao preenchimento dos elementos constitutivos de tal figura contratual.
III – Caso não funcione a presunção de laboralidade prevista na lei, por não preenchimento de algum dos requisitos cumulativos enunciados em 2003, pode o trabalhador provar que estão preenchidos os elementos constitutivos do contrato de trabalho tal como o mesmo se mostra definido no preceito que o define, caso demonstre factos que os integrem ou que constituam índice relevante da sua verificação.
IV – Não se provando uma forma de direcção e definição concreta do conteúdo da actividade prestada pelo A., nem que a R. exercesse sobre o mesmo um poder de disciplina e conformação da actividade, sequer fixando os limites temporais do seu exercício, e sendo a remuneração fixada exclusivamente em função das vendas e apurada e paga pelo próprio A., interessando à R., apenas, um resultado – a laboração do seu posto de abastecimento de combustíveis no respectivo horário de funcionamento, independentemente da circunstância de o A. ali se encontrar concretamente a exercer funções, pois que podia fazer-se substituir por outrem –, não se divisam os contornos da subordinação jurídica inerente à vinculação laboral, apesar de o A. desenvolver as suas funções exclusivamente para a R. no período em causa.

Maria José Pais de Sousa da Costa Pinto