Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0617238
Nº Convencional: JTRP00040072
Relator: JOAQUIM GOMES
Descritores: DESPACHO DE PRONÚNCIA
JOGO DE FORTUNA E AZAR
Nº do Documento: RP200702210617238
Data do Acordão: 02/21/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 475 - FLS 06.
Área Temática: .
Sumário: Fora dos locais legalmente autorizados, é ilícita a exploração de jogos cujo resultado dependa exclusivamente do acaso, mesmo que desse resultado não advenha vantagem ou desvantagem económica para o jogador (art. 108º, n.º 1 do Dec-Lei 422/89, na redacção introduzida pelo Dec-Lei 10/95).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto.

I.- RELATÓRIO

1.- No processo n.º …./04.8GCRTR do ..º Juízo do Tribunal de Estarreja, em que são:

Recorrente: Ministério Público.

Recorridos/arguidos: B………., C………., D………. .

foi proferido despacho em 2006/Set./25, a fls. 185-191, que não pronunciou:
a) o arguido C………. pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, nº1, do DL 422/89 de 2 de Dezembro, com a redacção dada pelo DL 19/95 de 19 de Janeiro e pela prática de uma transgressão, p. e p. pelo artigo 28º do DL 12790 de 30 de Novembro de 2006.
b) os arguidos E………., B………. e D………. da prática, em co-autoria material e em concurso real de um crime de exploração ilícita de jogo, p. p. pelas supra referidas disposições legais e um crime de divulgação de material de jogo, p. e p. pelo artigo 115.º do mesmo DL, ambos com referência aos artigos 1º, 3º, e 4º, nº1, alínea g) do mesmo diploma legal.
2.- O Ministério Público insurgiu-se contra esta decisão, interpondo recurso da mesma em 2006/Out./10, a fls. 197-205, pugnando pela sua revogação e substituição por uma outra que pronuncie os arguidos pela prática dos crimes que lhe são imputados na acusação, apresentando as seguintes conclusões:
1.ª) Da leitura do art. 1.º, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, constata-se que o legislador optou por uma definição ampla de jogo de fortuna ou azar, baseando-se numa perspectiva material, elegendo como critério de distinção do jogo de fortuna ou azar perante todos os outros, um desenvolvimento tal que só se possa obter resultados fundados exclusiva ou fundamentalmente na sorte;
2.ª) Isto independentemente da presença ou não de prémios e da qualidade dos mesmos (em dinheiro ou em espécie, de valor económico variável);
3.ª) O legislador quis que as máquinas cujos jogos tenham resultados dependentes essencialmente do acaso tenham o seu uso restrito às zonas de jogos autorizadas e que os jogos proporcionados pelas mesmas sejam considerados de fortuna ou azar quer paguem quer não paguem directamente prémios em dinheiro ou em fichas;
4.ª) O elemento que distingue os jogos de fortuna e azar das modalidades afins não pode ser a existência ou não de prémios previamente fixados, pois que o único elemento diferenciador (entre jogos de fortuna ou azar e modalidades afins) radica nas operações oferecidas ao público existentes nas modalidades afins do jogo de fortuna ou azar e inexistentes no jogo de fortuna ou azar;
5.ª) No caso concreto dos autos, o jogo em questão não se enquadra dentro das operações de oferta ao público e o seu desenvolvimento assenta exclusivamente na sorte, não tenho o jogador qualquer intervenção baseada na sua perícia, pois que o jogador apostava dinheiro, na esperança aleatória de ganhar um prémio maior, sendo o resultado contingente e dependente única e exclusivamente da sorte.
6.ª) E isto independentemente de haver sempre lugar a um prémio, em espécie, de valor económico variável, tendo, naturalmente, os jogadores a expectativa de serem premiados com os melhores prémios – aqueles que tinham inscrito um número –, em reduzido número
7.ª) E corriam, sim, o risco de perder, caso a sorte lhes ditasse a atribuição de um dos prémios menores, em bem maior número, guardados em caixas de papelão e dentro de sacos de plástico;
8.ª) Ou seja, embora sendo certo que lhes sairia sempre um prémio, não só desconheciam que prémio lhes sairia, como esperavam ser premiados ou ganhar um prémio melhor, apostando dinheiro na esperança aleatória de ganhar esse prémio maior, o que podia não acontecer ao fim de 10, 20, 30 ou mais apostas, podendo apenas ganhar em todas essas apostas um dos prémios que tinham inscrita uma letra - cinzeiros, chávenas, pequenas bolas e porta-chaves - indiciariamente aqueles cujo valor era de € 0,25 (três vezes menos do que o valor da aposta, que era de € 1);
9.ª) A Meritíssima Juiz “a quo” fez uma incorrecta interpretação e aplicação dos arts. 1.º, 3.º e 4.º, n.º 1, alínea g), 108.º, n.º 1 e n.º 2, e 115.º, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 10/95, de 19 de Janeiro, tendo a decisão instrutória violado as mesmas.
3.- O arguido B………., contra alegou em 2006/Nov./07, a fls. 212-8, pugnando pela manutenção do decidido, concluindo que:
1.º) o douto Magistrado do Ministério Público, aqui Recorrente, parte de um pressuposto que, salvo o devido respeito, não está a ser correctamente interpretado, ao considerar que se trata nos presentes autos de um jogo de fortuna ou azar com base na interpretação de que foi vontade do legislador penal a restrição do recurso a jogos que “tenham resultados dependentes essencialmente do acaso”;
2.º) Acontece que, salvo o devido respeito, não poderá entender-se assim, pois que conforme se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17/07/1999: “1 - O que distingue o jogo de fortuna ou azar das modalidades afins é o facto de no primeiro, o jogador poder auferir uma vantagem de valor indeterminado, em função da “aposta” que pode multiplicar de uma única vez por forma a que entra num certo risco, auferindo uma vantagem em proporção não controlável por si, enquanto no jogo afim o jogador praticamente nada arrisca, a sua “entrada” não se reveste da característica da aposta, mas apenas do “preço” da jogada, que é simples sem possibilidade de ela mesmo multiplicar-se e o prémio que pode obter é fixo e pré-determinado”;
3.º) Termos em que para que se afirme estarmos perante um jogo de fortuna ou azar teremos de assistir à verificação de certas condições: “o jogador poder auferir uma vantagem de valor indeterminado”, “em função da “aposta”, que pode multiplicar” e “por forma a que entra num certo risco”;
4.º) Condições que não se acham verificadas no caso vertente;
5.º) Na verdade, não existe uma indeterminação do valor auferido pelo jogador, na medida em que o jogador sabe antecipadamente o que pode ganhar, não existindo, portanto, qualquer álea, ou resultado aleatório;
6.º) E, como tal, não se achando verificado o elemento essencial para a censura criminal do comportamento em causa: a álea;
7.º) Além disso, não se desenvolve um tema próprio de jogo de fortuna ou azar, o prémio é fixo e pré-determinado e o preço é simples sem possibilidade de se multiplicar;
8.º) Sendo certo que é precisamente o risco inerente ao jogo, ou melhor, o especial estímulo que esse mesmo risco do resultado em pontuação do jogo e que pode conduzir à viciação do jogador, que o legislador pretendeu evitar ao incriminar a exploração não autorizada desses jogos;
9.º) Com efeito, por todos os argumentos expostos, e tendo em consideração quer o elemento literal quer o elemento teleológico que devem pautar a interpretação conjugada, dos artigos 1.º e 159.º, do citado diploma legal, forçoso será concluir tratar-se, nos presentes autos, de um jogo modalidade afim de jogo de fortuna ou azar;
10.º) Dado que se verificam preenchidos todos os requisitos de aplicação do artigo 159.º, n.º 1, do Decreto-Lei n. o 422/89 de 02/12, não sendo o prémio a atribuir de natureza pecuniária;
11.º) Conforme se conclui o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08/07/1998: “I - Modalidade afim de jogo de fortuna ou azar consiste no jogo em que, além da esperança de ganho residir conjuntamente na perícia e sorte do jogador, ou apenas na sorte, o prémio que atribui é uma coisa com valor económico, mas não dinheiro. Se for dinheiro é jogo de fortuna ou azar.”
4.- Nesta instância o Ministério Público teve vista dos autos, colheram-se os vistos legais, nada obstando que se conheça do mérito deste recurso.
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II.- FUNDAMENTAÇÃO.
1.- FACTOS A CONSIDERAR.
1.- A decisão recorrida, na parte que aqui releva, considerou essencialmente o seguinte:
“Resulta do libelo acusatório que estamos perante uma “máquina/expositor em plástico, constituída por dois corpos: o corpo superior em formato circular em acrílico e tampo de cor amarela com as inscrições “1€” e “SAI SEMPRE UM BRINDE”, contendo no seu interior um número indeterminado de pequenas bolas de plástico, de forma oval; o corpo inferior, de cor azul, verde e amarela, onde se situa um dispositivo para introdução de moedas de 1€, equipado com uma ranhura onde o jogador introduz uma moeda e um manípulo rotativo, desbloqueado para uma só volta após a introdução de uma moeda.
Junto à mencionada máquina/expositor, encontrava-se um cartaz expositor de prémios feitos em papelão, tendo nele afixados vários objectos que, por sua vez, contêm um autocolante onde se encontra inscrito um número ou uma letra, bem como três caixotes de papelão com vários objectos (cinzeiros, copos chávenas e porta-chaves).
Mediante a introdução da moeda de €1 na referida máquina/expositor, o cliente ou jogador extraía da mesma uma bola de plástico, contendo no seu interior uma senha, mencionando um número ou uma letra.
Abertas as senhas, o jogador tinha direito ao prémio, cujo número ou letra da senha coincidisse com um dos números ou letras que identificam os prémios, que se encontram no cartaz expositor de prémios.”
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No caso “sub judice” e à luz de qualquer destas concepções, o modo de funcionamento da máquina/expositor em causa nos autos, e que o arguido não põe em causa, não se subsume ao crime de exploração ilícita de jogo de que vem acusado, por não estarmos perante um jogo de fortuna ou azar.
Com efeito, o jogador introduzia na ranhura da máquina uma moeda de 1€ e, em troca saía um ovo que continha uma senha ou um número, que correspondia sempre a um prémio.
Não podemos afirmar que o jogador corria qualquer risco de perder, apenas desconhecia que prémio lhe sairia, sendo certo que lhe sairia sempre um prémio, entre os que se encontravam expostos: cinzeiros, copos, chávenas e porta-chaves, sem que o jogador esperasse qualquer prémio maior que estes.
Assim, tal máquina não poderá ser classificada como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, uma vez que não há possibilidade de o jogador multiplicar o prémio, sendo a aposta apenas de 1€.
Pelo exposto, e por entendermos que não estamos perante um jogo de fortuna ou azar, não se verifica o elemento objectivo de ilícito de que o arguido vem acusado.
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Quanto ao crime de divulgação de material de jogo de que o arguido vem acusado, p. e p. pelo artigo 115º do DL 422/89 de 2 de Dezembro, prescreve tal disposição legal que quem, sem autorização da Inspecção-Geral de Jogos, fabricar, publicitar, importar, transportar, transaccionar, expuser ou divulgar material e utensílios que sejam caracterizadamente destinados à prática de jogos de azar será punido com prisão até 2 anos e multa até 200 dias.”
Tal conduta refere-se aos factos a que se refere a acusação de que o arguido colocou tal máquina/expositor, cartaz, prémios e senhas no estabelecimento comercial “F……….” sem que tivesse autorização da Inspecção-Geral de Jogos para fabricar, transaccionar, expor ou divulgar material destinado à prática do jogo acima descrito.
Atendendo à exposição supra referida, em que concluímos que tal máquina não configura um jogo de fortuna ou azar, mas sim uma modalidade afim, não está, mais uma vez, preenchido o tipo objectivo de ilícito, pelo que não se pode imputar a prática de tal crime ao arguido.
A conduta que é imputada ao arguido não constitui crime, podendo preencher, em abstracto, a prática das contra-ordenações a que alude o artigo 163º do DL 422/89 de 2 de Dezembro na redacção que foi introduzida pelo DL 10/95 de 19 de Janeiro.
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Prescreve o artigo 307º, nº4 do Código de Processo Penal que “A circunstância de ter sido requerida apenas por um dos arguidos não prejudica o dever de o juiz retirar da instrução as consequências legalmente impostas a todos os arguidos.
Ou seja, não obstante ter sido o arguido B………. que requereu a abertura da instrução, há que retirar as consequências relativas aos demais arguidos.
Quanto aos arguidos E………. e D………., que vêm acusados, em co-autoria com o arguido B………. da prática dos mesmos tipos de ilícito, vale toda a argumentação atrás expendida, pelo que entendemos que não estando perante um jogo de fortuna e azar, não podem os arguidos ser pronunciados pela prática deste crime.
Quanto ao arguido C………., vem o mesmo acusado da prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º, nº1 do DL 422/89 de 2 de Dezembro na redacção introduzida pelo DL 10/95 de 19 de Janeiro, com referência aos artigos 1º, 3º e 4º, nº1, alínea g-) do mesmo diploma legal e de uma transgressão, p. e p. pelo artigo 1º e 28º do Decreto 12790 de 30 de Novembro de 1926.
O arguido, de acordo com a douta acusação, tinha exposto no estabelecimento de café por si explorado, destinado a ser utilizado por clientes desse estabelecimento, um cartaz com a denominação “CABAZ DE NATAL”, dividido em 100 pequenos quadrados, contendo cada um deles um número entre 00 e 99.
Junto ao mencionado cartaz, em cima de uma máquina ali existente, encontrava-se um cabaz de natal com diversas bebidas e produtos alimentares.
Mediante o pagamento de 2,50 euros, o cliente ou jogador fazia a sua aposta, escolhendo um número entre 00 e 99, seguidamente a aposta era anotada pelo arguido escrevendo o nome do jogador em cima do número seleccionado.
Só o jogador, cujo número em que apostou coincidisse com os dois últimos números do primeiro prémio do sorteio da Lotaria do Natal desse ano (2004), é que teria direito ao dito Cabaz de Natal.
O arguido tinha esse cartaz no seu estabelecimento com o propósito concretizado de, proporcionando aos seus clientes a realização de apostas, auferir os correspondentes ganhos, bem sabendo que servia para a prática de uma lotaria paralela às exploradas pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Comecemos pela transgressão a que alude o artigo 28º do Decreto 12790, referente à imputação de uma lotaria paralela às exploradas pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, proibindo no continente da República e ilhas adjacentes a emissão de qualquer lotaria seja qualquer o fim a que se destine e a forma que se realizem.
A Lei 30/2006 de 11 de Julho, procedeu à conversão em contra-ordenações de contravenções e transgressões em vigor no ordenamento jurídico nacional.
Tal Lei entrou em vigor 30 dias após a sua publicação, pelo que, à presente data já se encontra em vigor.
O artigo 37º do referido diploma revoga os artigos 27º, 28º e 29º do Decreto 12790 de 30 de Novembro de 2006. (Negrito nosso).
Assim, a imputação referente à eventual existência de lotaria paralela que o arguido teria instituído com o sorteio do cabaz de Natal encontra-se descriminalizada, pelo que o arguido C………. terá que ser não pronunciado quanto à prática da sobredita transgressão.
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Quanto ao crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º do DL 422/89 de 2 de Dezembro, na redacção introduzida pelo DL 10/95 de 19 de Janeiro, a questão reside em saber se o jogo em que era atribuído o Cabaz de Natal se insere no conceito de jogo de fortuna ou azar.
Em nosso entender, e tendo em conta todas as considerações supra tecidas, entendemos não se tratar de um jogo de fortuna ou azar.
Com efeito, aqui trata-se de um jogo em que o jogador o jogador praticamente nada arrisca, “a sua “entrada” não se reveste da característica da “aposta” mas apenas do “preço” da jogada, que é simples, sem possibilidade de ela mesmo multiplicar-se e o prémio que pode obter é fixo e pré-determinado.”
Não há aqui uma vantagem de valor indeterminado, em função da aposta que o jogador faz e que pode multiplicar de uma só vez, auferindo uma vantagem em proporção não controlável.
O jogador entra com 2,50 euros e sabe que, dependendo da sorte, pode ou não ganhar o Cabaz de Natal e nada mais nem nada menos do que isso.
Assim, e tendo em conta a prova que existe nos autos, não se nos afigura existirem indícios suficientes da prática pelos arguido, dos crimes de que vêm acusados.”
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2.- DO DIREITO.
A questão suscitada neste recurso é saber se o modo de funcionamento da máquina/expositor em causa nestes autos, representa um jogo de fortuna ou azar, já que não está em causa a falta de indícios das condutas imputadas aos arguidos.
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O crime de exploração ilícita de jogo, da previsão do art. 108.º, n.º 1 do Dec.-Lei n.º 422/89, na redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º 10/95, pune “Quem, por qualquer forma, fizer a exploração ilícita de jogos de fortuna e azar fora dos locais legalmente autorizados …”.
Mediante este ilícito pretende-se acautelar a integridade das explorações dos jogos de fortuna e azar, circunscrevendo-as a zonas devidamente autorizadas.
Por sua vez, o art. 1.º, deste diploma, que instituiu o regime jurídico do jogo, considera jogo de fortuna e azar “aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte”.
A propósito, a jurisprudência desta Relação tem sido firme em entender, como sucedeu com o Ac. de 1995/Mai./24 [CJ III/259], que “É ilícita a exploração de jogos cujo resultado dependa exclusivamente do acaso, mesmo que desse resultado não advenha qualquer vantagem ou desvantagem económica para o jogador, como sucede com as máquina “flippers” – neste mesmo sentido Ac. 1997/Fev./05, 2000/Mar./13 [CJ I /249, II/244].
Assim e não havendo razões válidas para alterar este entendimento, será de continuar a considerar que os jogos que dependem essencialmente do acaso e da sorte do jogador, são aqueles em que este não tem qualquer possibilidade de influenciar ou condicionar o resultado do respectivo jogo.
Por outro lado, é necessário que se proceda à exploração desse jogo, o que ocorre quando através do mesmo se desenvolva uma actividade empresarial, de raiz económica, mediante a qual se vise obtenção de lucros, bastando para o efeito que a correspondente máquina de jogo seja acessível ao público.
Nesta conformidade o elemento objectivo deste tipo basta-se com a colocação da máquina, de modo a proporcionar aos eventuais interessados, jogadores, a sua utilização.
No caso trata-se de uma máquina/expositor em plástico, constituída por dois corpos: o corpo superior em formato circular em acrílico e tampo de cor amarela com as inscrições “1€” e “SAI SEMPRE UM BRINDE”, contendo no seu interior um número indeterminado de pequenas bolas de plástico, de forma oval; o corpo inferior, de cor azul, verde e amarela, onde se situa um dispositivo para introdução de moedas de 1€, equipado com uma ranhura onde o jogador introduz uma moeda e um manípulo rotativo, desbloqueado para uma só volta após a introdução de uma moeda.
Existe ainda junto a esta máquina/expositor, um cartaz expositor de prémios feitos em papelão, tendo nele afixados vários objectos que, por sua vez, contêm um autocolante onde se encontra inscrito um número ou uma letra, bem como três caixotes de papelão com vários objectos (cinzeiros, copos chávenas e porta-chaves).
Mediante a introdução da moeda de €1 na referida máquina/expositor, o cliente ou jogador extraía da mesma uma bola de plástico, contendo no seu interior uma senha, mencionando um número ou uma letra.
Abertas as senhas, o jogador tinha direito ao prémio, cujo número ou letra da senha coincidisse com um dos números ou letras que identificam os prémios, que se encontram no cartaz expositor de prémios
Perante esta descrição, não restam quaisquer dúvidas de que o resultado do jogo, em nada pode ser influenciado pelos respectivos jogadores, estando, por isso, mesmo, totalmente dependente da sorte do jogo, motivo pelo qual o jogo que esta máquina proporciona deve ser classificado como de fortuna ou azar.
Nesta conformidade e sem necessidade de mais considerações, o recurso do Ministério Público merece total procedência.
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III.- DECISÃO.
Nos termos e fundamentos expostos, julga-se procedente o presente recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, confirma-se revoga-se a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra, que pronuncie os arguidos pelos imputados crimes.

Não é devida tributação.

Notifique.

Porto, 21 de Fevereiro de 2007
Joaquim Arménio Correia Gomes
Manuel Jorge França Moreira
Manuel Joaquim Braz