Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
92/12.0PAESP-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ARTUR OLIVEIRA
Descritores: FURTO QUALIFICADO
ESPAÇO FECHADO
Nº do Documento: RP2012051692/12.0PAESP-A.P1
Data do Acordão: 05/16/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Para o efeito da alínea f) do nº 1 d art. 204º do Código Penal o «espaço fechado» tem de ser um espaço físico conexionado com a habitação ou o estabelecimento comercial ou industrial.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA)
- no processo n.º 92/12.0PAESP-A.P1
- com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade,
- após conferência, profere, em 16 de maio de 2012, o seguinte
Acórdão
I - RELATÓRIO
1. Nos Autos de Inquérito (Atos Jurisdicionais) n.º 92/12.0PAESP, do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Espinho, em que é arguido B… e OUTRO, após o primeiro interrogatório judicial de arguido detido o Exmo. Juiz de Instrução Criminal proferiu o seguinte despacho [fls. 93-102]:
«(…) Nos autos está fortemente indiciado que:
1 - No dia 07/02/2012, a hora não concretamente apurada, os arguidos B… e C…, decidiram por mútuo acordo, entrar, durante a noite, no estaleiro de construção civil da D…, Lda. sito na Rua …, …, neste concelho e comarca de Espinho, com o propósito de se apropriarem de objectos de valor que lá se encontrassem;
2 - Naquelas circunstâncias de tempo e de lugar, os arguidos fazendo-se transportar no veículo automóvel ligeiro de mercadorias de marca Renault, modelo …, com a matrícula ..-..-AX, dirigiram-se ao referido estaleiro de construção civil;
3 - Na data referida em 1. pelas 01h15m, os arguidos actuando em conjugação de esforços e mediante o plano previamente gizado entre ambos, subiram a vedação do mencionado estaleiro de construção civil, introduzindo-se no seu interior.
4 – Seguidamente o arguido B…, munido de um alicate e de uma tesoura de cortar ferro, subiu à grua lá existente e cortou o cabo de cobre da mesma, sendo que posteriormente o arguido C…, que se encontrava no solo, enrolou o referido cabo de cobre, com cerca de 25 metros e colocou-o no interior do referido automóvel.
5 – Os arguidos apoderaram-se ainda, de modo não concretamente apurado, de dois rolos de arame queimado, uma peça de cobre indiferenciada e dois rolos de metal e guardaram-nos no interior da viatura automóvel.
6 – Os objectos referidos em 4. e 5. possuem valor não concretamente apurado mas superior a uma unidade de conta (€ 102,00).
7 – Posteriormente os arguidos introduziram-se no interior da referida viatura automóvel, conduzida pelo arguido C… e colocaram-se em fuga, tendo sido interceptados a poucos metros de distância do referido estaleiro pelos agentes da PSP de Espinho que procederam à sua detenção e à apreensão dos mencionados objectos.
8 - Os arguidos B… e C… actuaram com o propósito de fazerem seus os objectos referidos em 4. e 5., o que efectivamente sucedeu, bem sabendo que os mesmos se encontravam num local vedado e interdito ao público.
9 – Mais sabiam que tais objectos não lhes pertenciam e que ao retirá-los do referido estaleiro, actuavam contra a vontade, sem a autorização e em prejuízo do seu legítimo dono, a empresa D…, Lda.
10 – Os arguidos agiram pois de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e puníveis por lei.
11 – O arguido C… conduzia o veículo automóvel referido em 2. sem possuir título de condução válido que o habilitasse a conduzir o referido veículo na via pública,
12 – O referido arguido, apesar de bem saber que não poderia conduzir o veículo na via pública por não ser titular de carta de condução, não se coibiu de o fazer.
13 – O arguido C… é solteiro e reside em união de facto, com uma companheira e dois filhos menores, de 5 e 2 anos, sendo que aquela se encontra desempregada e não aufere qualquer rendimento.
14 – Exerce profissionalmente a actividade de taqueiro, auferindo o rendimento mensal de €800,00.
15 – Reside em casa arrendada pela qual paga a renda mensal de € 175,00, pagando ainda cerca de € 100,00 mensais pelas despesas correntes como água e luz e € 50,00 de prestação mensal para o infantário de um dos filhos.
16 – Segundo referiu tem um processo pendente no Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia pela prática de crime de tráfico de estupefacientes, no âmbito do qual lhe foi aplicada a medida de coação de apresentações diárias, as quais tem cumprido.
17 – O arguido B…, é solteiro e está desempregado, não auferindo qualquer tipo de rendimento ou subsidio.
18 - Tem um filho menor com 16 meses que se encontra a cargo da irmã do arguido.
19 – Reside sozinho, numa morada sita em …, Ovar, de “mero favor” a qual, segundo afirmou, mão tem as mínimas condições de habitabilidade.
20 – Segundo referiu, tem um processo pendente no Tribunal Judicial de santa Maria da feira pela prática de crime de furto qualificado, no âmbito do qual lhe foi aplicada a medida de coação de apresentações semanais.
21 - O arguido C… foi condenado por sentença de 26/11/2007, transitada em julgado em 17/12/2007, proferida pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ovar no âmbito do Proc. Nº 652/07.0GCOVR, pela prática em 25/11/2007 de um crime de condução sem habilitação legal na pena de admoestação.
22 - Foi também condenado por sentença de 26/01/2012, devidamente transitada em julgado, proferida pelo 2º Juízo de Instância Criminal de Ovar, Comarca do Baixo Vouga, no âmbito do Proc. Nº 738/10.4GCOVR, pela prática em 03/12/2010 de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 40 dias de multa à taxa diária de € 5,00.
23 - Encontram-se actualmente a correr os seus termos junto dos Serviços do Ministério Público deste Tribunal, contra o arguido C…, o inquérito nº 279/10.0PAESP, ao qual estão apensos os inquéritos nºs 308/10.7PAESP e 462/10.8JAPRT e o Inquérito nº 19/12.9PAESP onde se investiga a eventual prática de vários crimes de furto qualificado.
24 - O arguido B… foi condenado por sentença de 26/11/2002, transitada em julgado em 11/12/2002, proferida pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Estarreja no âmbito do Proc. Nº 111/02.8GCETR, pela prática em 13/07/2011 de um crime de desobediência na na pena de 80 dias de multa à taxa diária de € 6,00.
25 - Foi condenado por sentença de 23/02/2006, transitada em julgado em 20/03/2006, proferida pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ovar no âmbito do Proc. Nº 311/05.9GBOVR, pela prática em 18/05/2005 de um crime de desobediência e um crime de desobediência qualificada na pena única de 270 dias de multa à taxa diária de € 5,00.
26 - Foi condenado por sentença de 12/12/2007 transitada em julgado em 09/01/2008, proferida pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial de Vale de Cambra no âmbito do Proc. Nº 31/05.4GAVLG, pela prática em 10/02/2005 de um crime de furto qualificado na pena de prisão de 3 anos suspensa na sua execução por igual período.
27 - Foi condenado por acórdão de 06/02/2008 transitado em julgado em 12/03/2008, proferida pelo 3º Juízo do Tribunal Judicial de Ovar no âmbito do Proc. Nº 35/05.7GAOVR, pela prática em 03/10/2005 de um crime de furto qualificado na pena de prisão de 2 anos e 9 meses suspensa na sua execução por igual período e sujeita a acompanhamento pelo IRS.
28 - Foi condenado por sentença de 23/09/2010 transitada em julgado em 25/10/2010, proferida pelo 1º Juízo de Instância Criminal de Ovar, Comarca de Baixo Vouga, no âmbito do Proc. Nº 147/05.7PAOVR, pela prática em 28/02/2005 de um crime de detenção de arma proibida, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00.
29 - Foi ainda condenado por sentença de 24/10/2011 transitada em julgado em
23/11/2011, proferida pelo 2º Juízo de Instância Criminal de Ovar, Comarca de Baixo Vouga, no âmbito do Proc. Nº 420/10.2GCOVR, pela prática em 29/07/2010 de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da Comunidade.
30 – Foi designada a data de 16/02/2012 para a realização de interrogatório judicial aos arguidos B… e C…, sendo que só o segundo compareceu neste Tribunal na data designada, tendo sido ambos regularmente notificados.
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A convicção do Tribunal acerca dos factos supra descritos resultou do teor do auto de notícia por detenção de fls.3, auto de apreensão de fls. 7, documentos de fls. 11 e 16, reportagem fotográfica de fls. 18 a 27, aditamento de fls. 28, guias de entrega de fls. 29 e 30, CRC dos arguidos de fls. 35 e ss., listagem dos inquéritos pendentes de fls. 47., depoimentos prestados pelas testemunhas E… a fls. 94 e 95, F… a fls. 96 e 97, G… a fls. 98 e 99, agentes da PSP, bem como nas declarações prestadas pelo arguido C….
Efectivamente resulta dos autos, designadamente do auto de notícia de fls. 3 que os arguidos, em 07/02/2012 foram detidos em flagrante delito tendo acabado de abandonar as instalações da referida empresa e já com os objectos de cobre no interior do veículo, se puseram em fuga no mesmo, tendo então de imediato sido interceptados pelos agentes da PSP. Por outro lado, nesse momento os arguidos explicaram aos agentes de autoridade o modo como levaram a cabo o referido furto, o que se encontra descrito no auto de notícia a fls. 4, e foi igualmente confirmado pelo agente E… a fls. 94 o qual elaborou o referido auto bem como pelos outros agentes F… e G… que testemunharam os factos, inquiridos a fls. 96 e 98. Mais resulta do auto de notícia de fls. 4 que o arguido C… foi surpreendido a conduzir a referida viatura sem deter documento legal que a tanto o habilitasse, facto que motivou igualmente a detenção do mesmo. Por outro lado, foram apreendidos aos arguidos, encontrando-se no interior da viatura na qual aqueles se faziam transportar, dois rolos de fio de cobre e dois rolos de arame queimado, uma peça de cobre, uma tesoura de cortar ferro e um alicate que terão usado para cortar os referidos fios de cobre bem como um pé de cabra bem como os objectos identificados no aditamento de fls. 28, o que bem demonstra que os arguidos vinham já perfeitamente preparados e munidos dos utensílios necessários para levar a cabo o referido furto e o que bem indicia também a existência do plano previamente gizado entre ambos para o efeito.
O arguido B… não prestou declarações quanto aos factos, tendo apenas esclarecido o Tribunal acerca da sua situação económica e social.
Por sua vez, o arguido C…, tendo prestado declarações, assumiu parcialmente os factos que resultam indiciados, tendo confessado a prática do crime de condução sem habilitação legal. No entanto, não colheu a sua versão de que, não combinou previamente o furto com o arguido B… e de que recebeu uma chamada do mesmo, tendo ido ao referido estaleiro para buscá-lo e tendo sido só aí que decidiu auxiliar o outro arguido a concretizar o furto. É que os próprios agentes da PSP referiram em declarações a fls. 94 e ss. terem recebido uma chamada na esquadra, por volta da 1h00 dando conta de que no estaleiro se encontravam dois indivíduos a furtar cobre, um dos quais estava pendurado numa grua, sendo certo que aqueles três agentes confirmaram ter visto ainda os dois arguidos a saltar um muro para a rua e entrarem na carrinha. Convenceu-se pois o Tribunal de houve uma acordo prévio entre os arguidos e de que também o arguido C… se introduziu no interior do referido estaleiro, ao contrário do referido pelo arguido. Também não é crível que não tivesse havido acordo prévio e o arguido B… se tivesse dirigido sozinho a pé inicialmente ao referido estaleiro transportando consigo ferramentas pesadas como o alicate, a tesoura e o pé de cabra e só depois de quase concretizado o furto ter chamado o arguido C… para o auxiliar, tendo de partilhar depois com este os proventos do mesmo. Mas mesmo que o acordo se tivesse realizado só no momento do furto tal sempre seria indiferente para a qualificativa do furto e co-autoria, porquanto como tem referido a jurisprudência do STJ “o acordo pode surgir antes do começo da execção…durante ela...ou depois de consumada parcialmente por um dos agentes...”. No que se refere à peça de cobre, o arguido C… referiu que a mesma era de metal e era proveniente do seu trabalho já se encontrando na carrinha. Também tal não convenceu o Tribunal, porquanto a referida peça parece efectivamente ser de cobre e assim foi identificada pelos agentes da PSP, não sendo crível que a mesma, sendo de cobre, não tivesse sido furtada pelos arguidos e já se encontrasse na carrinha. Mais referiu o arguido C… que o estaleiro estava vedado por um pequeno muro com uma entrada aberta, não tendo os arguidos usado a entrada por ser mais fácil o transporte pelo outro lado saltando o muro. Estranha-se que assim fosse, não tenham os arguidos estacionado a carrinha à frente da entrada e usado a mesma para entrar e sair do estaleiro. Além do mais, do auto de noticia de fls. 4 e das declarações dos três agentes da PSP de fls. 94 e ss não resulta que o estaleiro estivesse aberto mas antes vedado por um muro, sendo que, como se disse, os agentes ainda presenciaram os dois arguidos a saltarem o referido muro.
Referiu o arguido C… que acha que as peças furtadas não valiam mais de € 100,00 estando o cobre actualmente a 4 euros o kilo. Entende o Tribunal que tal não resulta indiciado nos autos, sendo que, em nosso entender e de acordo com as regras da experiencia comum, os dois rolos de cobre, os dois rolos de arame e a peça de cobre valem certamente mais do que uma unidade de conta e nenhuma prova em contrário até agora foi produzida. Tanto mais que o arguido C… disse que os objectos eram para serem queimados e vendidos a uma empresa de sucatas de nome “H…”, não sendo crível que os arguidos se arriscassem a realizar um furto desta natureza entrando em propriedade alheia por tão pouco dinheiro.
No que se refere à situação económica e social dos arguidos, o Tribunal considerou as declarações dos mesmos que nessa parte nos mereceram credibilidade, bem como os documentos de fls. 11 e 16.
O Tribunal considerou igualmente o CRC do arguido C… junto aos autos a fls. 35 a 37 bem como a listagem dos inquéritos contra aquele pendentes de fls. 47. E ainda o CRC do arguido B… a fls. 38 a 46.
Assim, face aos factos descritos conclui-se que os arguidos B… e C…, terão praticado em co-autoria material e na forma consumada, um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1, 204º nº 1 alínea f) do C. Penal, sem prejuízo do desenvolvimento do inquérito e de uma consequente adequação da qualificação jurídica aos factos descritos. É também evidente que um estaleiro de uma obra em construção consubstancia ao menos, um espaço fechado para efeitos da referida qualificativa, porque vedado ao público.
Mais se conclui que o arguido C… terá praticado igualmente e em concurso efectivo um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelos artigos 130º nº 2, al. a) e nº 6 do Decreto lei nº 114/94 de 03 de Maio, alterado pelo Decreto lei nº 44/2005 de 23/02 e 3º nºs 1 e 2 do Decreto lei nº 2/98 de 3 de Janeiro.
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Cumpre apreciar neste momento da necessidade de aplicação de medidas de coacção aos arguidos e, na positiva, por qual (ou quais) optar.
Nos termos do art. 191.º do CPP a liberdade das pessoas só pode ser limitada, total ou parcialmente, em função de exigências processuais de natureza cautelar, pelas medidas de coacção e de garantia patrimonial previstas na lei.
E determina o art. 193.º do CPP que as medidas de coacção e de garantia patrimonial a aplicar em concreto devem ser adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, sendo que a prisão preventiva só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção.
Por sua vez, nos termos do art. 204.º do CPP, nenhuma medida de coacção, à excepção do Termo de Identidade e Residência, pode ser aplicada se, em concreto se não verificar: fuga ou perigo de fuga; perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação e veracidade da prova, ou perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.
Considerando o supracitado art. 204.º do C.P.P, entendemos efectivamente existir, em concreto, no que se refere a ambos os arguidos perigo de continuação da actividade criminosa no que ao crime de furto qualificado diz respeito, porquanto resultou fortemente indiciado que em relação ao arguido C…, pese embora este tenha sido efectivamente condenado apenas pela prática de dois crimes de natureza totalmente diferente do que está em causa nestes autos, encontram-se actualmente pendentes contra o referido arguido diversos inquéritos, nos quais se investiga a eventual prática de crimes de furto qualificado pelo mesmo. Por outro lado este arguido encontra-se perfeitamente inserido social, familiar e profissionalmente.
Por sua vez e em relação ao arguido B… tal perigo resulta ainda mais evidenciado, uma vez que aquele foi já condenado pela prática do crime de furto qualificado por três vezes, em 12/12/2007, 06/02/2008 e 24/10/2011 por factos praticados em 2005 e em 2010, sendo certo que as duas últimas condenações foram já em penas de prisão, uma delas suspensa na sua execução e a outra substituída por prestação de trabalho a favor da Comunidade, o que leva a crer que, havendo condenação nos presentes autos será efectivamente em pena de prisão efectiva e o que arguido está de facto a enveredar por uma “carreira criminosa”. Note-se que a última condenação data de 24/10/2011 e os factos datam de 07/02/2012, o que bem demonstra que o arguido não interiorizou minimamente o mal cometido, nem a pena surtiu qualquer efeito pedagógico, não o demovendo da prática de novos ilícitos. È igualmente de salientar as condições económicas deste arguido B… que se encontra desempregado, sem qualquer tipo de rendimento, vivendo numa morada de “mero favor”.
Note-se que o furto de cobre é agora o “crime da moda” na nossa Sociedade sendopraticado com extrema frequência por se revelar um ilícito bastante proveitoso.
Por outro lado, em relação ao arguido B… verifica-se igualmente, em nosso entender o requisito previsto na alínea a) do art. 204º, ou seja, perigo de fuga do referido arguido, porquanto este arguido está desempregado, não tem paradeiro certo, morando em residência de terceiros de favor, sendo certo que quando notificado para estar presente no dia 16/02/2012 para a realização de interrogatório judicial não compareceu, de tal forma que teve agora de comparecer coercivamente através da emissão de mandados de detenção (facto nº 30).
Parece-nos pois que em relação ao arguido B… é manifestamente previsível que este continue a cometer ilícitos da natureza do que está em causa nestes autos, se permanecer em liberdade. Tal juízo de prognose resulta além da situação económica, social e profissional do arguido, igualmente da personalidade do mesmo, o qual se revela completamente insensível às penas.
Entendemos pois que para fazer cessar tal perigo de continuação da actividade criminosa, bem como o concreto perigo de fuga que se evidencia, terá de ser necessariamente aplicada ao arguido a medida de coação de prisão preventiva, sendo certo que as outras medidas de coação se revelam insuficientes e inadequadas a acautelar o referido perigo, encontrando-se em concreto preenchidos os pressupostos de aplicação daquela medida por haver fortes indícios da prática de crime de furto qualificado punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos (art. 202º nº 1 alínea d) do C.P.P).
Por outro lado, a medida de coação de prisão preventiva é proporcional à gravidade do crime fortemente indiciado, bem espelhada na moldura penal abstracta cominada, sendo igualmente previsível a aplicação em julgamento ao arguido B… de uma pena de prisão efectiva (art. 193º nº 1 do C.P.P).
Face ao exposto, considerando a necessidade de acautelar os perigos de continuação da actividade criminosa de fuga que em concreto se verificam, determino que o arguido B… aguarde os ulteriores termos do processo sujeito a medida de coação de prisão preventiva, nos termos dos artigos 191º nº 1, 193º, 202º nº 1 alínea d) e 204º alíneas a) e c) do C.P.P.
No que se refere ao arguido C…, não se evidencia em relação ao mesmo qualquer perigo de fuga, uma vez que o mesmo se encontra social, familiar e profissionalmente inserido, residindo com uma companheira e tendo dois filhos menores a seu cargo, exercendo uma actividade profissional estável e remunerada. Para mais compareceu em juízo voluntariamente sempre que tal lhe foi solicitado.
Assim, para fazer face ao concreto perigo de continuação da actividade criminosa que se manifesta em relação a este arguido, afigura-se-nos suficiente, adequado e proporcional submetê-lo, para além do TIR já prestado, à obrigação de apresentações diárias no posto da GNR da sua área de residência, durante o período de abertura ao público daquele Serviço, nos termos dos artigos 191º, 193º nº 1, 196º, 198º nº 1 e 204º alínea c) do CPP.
Fica o arguido C… notificado nos termos do disposto no art. 194º nº 8 com a advertência das consequências de um eventual incumprimento da supra referida medida de coação, nos termos do art. 203º nº 1 do C.P.P.
Passe os competentes mandados de detenção do arguido B… ao estabelecimento prisional, devendo o arguido ser conduzido ao EP pela PSP de Espinho. (…)»
2. Inconformado, o arguido recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [fls. 113-116]:
«1. Existe errada qualificação jurídica aos factos indiciariamente apurados.
2. De facto, estamos perante uma obra em fase de construção, portanto inacabada, a céu aberto, ainda sem qualquer utilidade concreta, seja para habitação, seja para estabelecimento comercial, seja para estabelecimento industrial ou para outra finalidade específica.
3. A Meritíssima Juiz Estagiária confunde no seu douto despacho "obra em construção" ou "estaleiro de construção civil" com a noção de "espaço fechado" para os efeitos previstos na alínea f) do n.°l do art. 204.° do C. Penal.
4. De facto, a jurisprudência já fixada bem como a doutrina especializada nesta matéria revela que o conceito "espaço fechado" desta disposição legal deve ser interpretado com o restrito sentido de lugar fechado dependente de casa.
5. Desde logo, o Acórdão de fixação de jurisprudência, Assento n.°7/2000 do Supremo Tribunal de Justiça, D. R., I-A, 07-03-2000, em síntese conclusiva, é muito claro ao fixar a seguinte jurisprudência: "A expressão "espaço fechado" que consta da alínea e) do n.°2 do art. 204.° do Código Penal (e também a referida na alínea f) do n.°l do mesmo preceito) tem, forçosamente, de ser entendida com o restrito sentido de lugar fechado dependente de uma casa, entendimento este reforçado pelo facto de o conceito definido na alínea d) do art. 202.° do Código haver sido alvo, relativamente ao que se estipulava no n.°l do art. 298.° do Código Penal de 1982, de uma redução no seu âmbito, por virtude da supressão do segmento "ou de outros móveis destinados a guardar quaisquer objectos,...".
6. De igual forma, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-03-2000, Proc. n.°17/2000, de que foi relator o Exm.° Cons. Armando Leandro, ajuíza o conceito "espaço fechado" como "um espaço semelhante à habitação ou estabelecimento comercial ou industrial ou dependente de um destes tipos de casa, como resulta do elemento teleológico "intenção de protecção de bens guardados neste tipo de construção ("casa") com utilização humana especialmente relevante" e ainda do elemento sistemático (cfr. art. 202.°, alíneas d) e e))".
7. Para além disso, a doutrina especializada nesta área também esclarece de forma lapidar o que se entende por "lugar fechado dependente de casa". O Prof. José de Faria Costa, in "Comentário Conimbricense ao Código Penal", tomo II, págs. 16, em anotação art. 202.°, alínea d) do Código Penal afirma que "este lugar mais não é do que o recinto que dá acesso à casa e que não precisa de ser vedado. É o pátio, o jardim ou o terraço ligado à casa e com passagem para ela como já reconheciam os comentaristas no CP de 1886 (Osório IV 150)".
8. O mesmo insigne professor reafirma ainda com mais clareza na anotação que faz à alínea f) do n.°l do art. 204.° do C. Penal que "convém também salientar que não é pelo facto de se estar num edifício que se está em uma habitação. Não só o edifício pode ter uma natureza pública ou, muito embora privada, ter público acesso, ou não ter por finalidade a habitação, como pode, outrossim, ser um edifício com fins habitacionais mas estar, inquestionavelmente, devoluto. De sorte que um furto aí praticado não pode ser considerado, todos o percebem de imediato, como um furto qualificado" (cfr. in "Comentário Conimbricense ao Código Penal", tomo II, págs. 67 e 68).
9. Não se deve confundir "espaço fechado" com o conceito de "lugar vedado", uma vez que este implica uma separação física, que pode consistir numa sebe, num muro, num arame, numa barreira, numa simples fita, não se podendo confundir os conceitos e as definições. O termo "vedado", na definição do Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia de Ciências de Lisboa, significa murado ou cercado com vedação e visível e adequado à função: impedir a entrada de estranhos (cfr., neste sentido, o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 25-03-2009, relator Exm.° Desemb. Cravo Roxo, in
10. No conteúdo do presente despacho, em concreto na qualificação jurídica dos factos em questão, admite-se considerar obra em construção como um lugar vedado e não acessível ao público pelo facto de aparentemente existir um muro à volta da obra, mas não é exequível, em face do exposto e das circunstâncias de espaço e lugar referidos, como um "espaço fechado" para os efeitos previstos na alínea e) do n.°l do art. 202.° do Código Penal.
11. Poderão os factos em presença subsumirem-se, em abstracto, ao tipo legal de crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo art. 191.° do Código Penal e ao tipo legal de crime de furto simples, previsto e punido pelo art. 203.°, n.°l do Código Penal.
12. No entanto, são de natureza diversa, protegendo interesses distintos, o crime de furto qualificado (ou de furto simples, acrescentado nosso) e o crime de introdução em lugar vedado ao público, pelo que este deve ser autonomizado em relação àquele (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-06-1992, relator Exm.° Desemb. Costa de Morais, in www.dgsi.pt).
13. Neste caso concreto, em face do exposto, não funcionando a qualificativa agravante prevista na alínea f) do n.°l do art. 204.° do C. Penal, mas sim os tipos legais de crime concretamente referidos e autonomamente aplicados, não se encontra cumprido um dos pressupostos previstos no art. 202.°, n.°l, al. a) ou ai. d) do Código de Processo Penal para a aplicação da medida de coação prisão preventiva, por serem crimes cujas molduras penais abstractas são inferiores a três anos de prisão.
14. Quanto ao pressuposto do perigo de fuga do arguido, este não se presume.
15.Este fundamento tem de ter correspondência com a realidade social e económica do arguido.
16.Ou seja, é necessário verificar se, neste momento, o arguido tem condições económicas ou de apoio logístico para a empreender uma fuga ou se alguma vez se eximiu à acção da justiça, o que não é o caso.
17.Na verdade, o arguido encontra-se desempregado, não recebe qualquer tipo de rendimentos ou subsídio não ostentando posses e rendimentos que lhe permitem encetar uma estratégia de fuga (cfr. ponto 17. dos factos indiciários).
18.Mora em residência de terceiros por mero favor que não possui as mínimas condições de habitabilidade (cfr. ponto 19. dos mesmos factos).
19.Conforme decorre dos autos, encontra-se a cumprir a medida de coação de apresentações semanais à ordem de um processo pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Santa Maria da Feira e apenas não compareceu no dia 16/02/2012 para a realização do interrogatório judicial à ordem dos presentes autos, dado que, como resulta do senso comum para qualquer cidadão mediano em face destas condições, não tinha posses para pagar o bilhete de ida e volta de um transporte público uma vez que reside fora da comarca, ou seja, ern Ovar (cfr. pág. 3. do despacho recorrido).
20.O perigo de continuação da atividade criminosa tem de ser concretamente avaliado com base em elementos e princípios factuais e não meramente indiciários.
21.Para aferir concretamente desta avaliação em cada em dos crimes já praticados com sentenças transitadas em julgado, deveriam os autos ser instruídos com as competentes certidões das condenações já transitadas em julgado para que, comparando os factos que sustentaram esta condenação, ainda que não definitiva, com os que haviam justificado as anteriores, ser possível detetar entre uns e outros a possibilidade de existir ou não perigo concreto (ainda que reforçado) de continuação da atividade criminosa.
22.Da matéria de onde constam os factos considerados indiciariamente nenhuma referência é feita a um conjunto de circunstâncias factuais, de tempo, modo e lugar de onde se possa extrair a conclusão de estarmos perante um indivíduo que revele um modo de ser particularmente gravoso em termos de incumprimento deste pressuposto.
23.Por outro lado, nos termos do disposto no art. 193.°, n.°2, a prisão preventiva só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coação.
24.Na verdade, tem natureza excecional, na medida em que todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado de sentença condenatória e deve ser preservado o espírito de prevenção especial positiva que preside ao sistema penal português vigente (cfr. art. 28.°, n.°2 e art. 32.°, n.°2 da CRP).
25.Na verdade, a este propósito, o tribunal "a quo" limita-se a referir que "as outras medidas de coação se revelam insuficientes e inadequadas a acautelar o perigo de fuga", omitindo as razões concretas dessa insuficiência e inadequação em relação às outras medidas de coação (cfr. pág. 17 do despacho).
26.Por conseguinte, limita-se a justificar, ainda que de forma insípida, as razões de direito para a aplicação da prisão preventiva, nomeadamente invocando o art. 193.°, n.°l do CPP, mas não esclarece os motivos da não aplicação de qualquer outra medida concretamente aplicável e que seja menos gravosa, atendendo à salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados, maxime, o direito à liberdade do arguido que urge acautelar (cfr., neste sentido, art. 193.°, n.°4 do CPP).
27.Na realidade, não foram apresentadas quaisquer fundamentos para a não aplicação de outras medidas de coação, v.g., obrigação de apresentação periódica (art. 198.° do CPP) ou, na pior das hipóteses, a proibição e imposição de condutas (art. 200.° do CPP).
28.Assim, em face do exposto e atendendo ao disposto nos artigos 27.°, 28.° e 32.° da CRP, aos artigos 191.° a 193.°, 202.°, n.°l, ai. d) e 204.°, alíneas a) e c) do CPP e aos artigos 191.°, 202.°, 203.° e 204.°, n°l, alínea f) do C. Penal, o arguido considera que a prisão preventiva que lhe foi imposta é ilegal, injusta, desadequada e desproporcional aos elementos indiciários apurados e às circunstâncias concretas do seu comportamento.
Nestes termos e pelo mais que for doutamentente suprido por V. Excias., deve conceder-se provimento ao presente recurso e, em consequência:
a) Seja revogada a medida de coação prisão preventiva que restitua o arguido à liberdade ou, se assim não for entendido,
b) Substituir por outra medida coativa menos gravosa que respeite os direitos fundamentais do arguido e seja compatível com as exigências cautelares que o caso requer. JUSTIÇA! (…)»
3. Na resposta, o Ministério Público refuta os argumentos do recurso, sustentando, desde logo, que é irrelevante para a decisão dos autos utilizar o termo “estaleiro” ou “edifício em construção”. Pugna pela manutenção do decidido [fls. 117-131].
4. Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-geral Adjunto acompanha a resposta, emitindo parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso [fls. 136-138].
5. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência.
II – FUNDAMENTAÇÃO
6. Face às conclusões apresentadas, que delimitam o objeto do recurso, o recorrente questiona (i) a qualificação jurídica dos indícios, (ii) a verificação dos requisitos de perigo de fuga e de perigo de continuação da atividade criminosa e (iii) violação dos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade atinentes às medidas de coação.
7. (i) Qualificação jurídica dos indícios. Diz o recorrente que os indícios recolhidos [apropriação de bens guardados em um estaleiro de obra (de construção civil)] não integram o conceito de “espaço fechado” para os efeitos previstos na alínea f) do n.º 1 do artigo 204.º do Cód. Penal [conclusão 3 e 10]. E, em abono desta afirmação, cita jurisprudência e doutrina relevantes.
8. Tem razão. De acordo com os indícios recolhidos, os arguidos, atuando em conjugação de esforços e mediante plano previamente gizado, subiram a vedação do estaleiro de uma obra de construção civil e daí retiraram, fazendo seus, um cabo de cobre com cerca de 25 metros, dois rolos de arame queimado, uma peça de cobre indiferenciada e dois rolos de metal, tudo no valor não concretamente apurado “mas superior a uma unidade de conta (€ 102,00)” [pontos 1 a 10].
9. Com base nestes indícios, entende o despacho recorrido que “os arguidos terão praticado em coautoria material e na forma consumada, um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º nº 1, 204º nº 1 alínea f) do C. Penal, sem prejuízo do desenvolvimento do inquérito e de uma consequente adequação da qualificação jurídica aos factos descritos”. E, apoiado nesta qualificação jurídica dos indícios e no disposto nos artigos 202.º, n.º 1, alínea d), 191.º, n.º 1, 193.º e 204.º, alíneas a) e c), do Cód. Proc. Penal, decidiu aplicar a medida de coação de prisão preventiva.
10. Ora, dispõe o artigo 204.º, n.º 1, alínea f), do Cód. Penal:
1 - Quem furtar coisa móvel alheia:
(…)
f) Introduzindo-se ilegitimamente em habitação, ainda que móvel, estabelecimento comercial ou industrial ou espaço fechado, ou aí permanecendo escondido com intenção de furtar;
(…)
é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias (…)
11. A doutrina e a jurisprudência têm sustentado que o que carateriza e justifica esta agravante qualificativa do furto não é o facto de o agente se introduzir num espaço fechado, mas sim, a circunstância de o espaço fechado estar conexionado com a habitação ou com o estabelecimento comercial ou industrial.
12. O que se compreende. A introdução [com arrombamento, escalamento ou chaves falsas, no caso da alínea e) do n.º 2] em espaço fechado, só por si, não representa um dano acrescido que justifique a previsão da qualificação proposta para a ação do furto [veja-se que os crimes de Violação de domicílio ou perturbação da vida privada, do artigo 190.º, n.º 1 e de Introdução em lugar vedado ao público, do artigo 191.º, ambos do Cód. Penal, punem as respetivas ações com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 240 dias e pena de prisão até três meses ou pena de multa até 60 dias]. O que verdadeiramente reclama uma tutela penal reforçada é a habitação e o estabelecimento comercial ou industrial, conceitos que, para este efeito, incluem os espaços fechados limítrofes, anexos ou a eles agregados. Há um reduto de mais-valias ligado ao espaço físico dedicado à habitação e ao estabelecimento comercial ou industrial e suas dependências contíguas e fechadas que o legislador entendeu ser merecedor de uma tutela acrescida do bem jurídico.
13. E se assim é, então o espaço de construção de um edifício [estaleiro de obra], ainda que vedado, nenhuma conexão tem com as realidades subjacentes aos conceitos de habitação e de estabelecimento comercial ou industrial e seus espaços fechados dependentes – pelo que não configura a previsão da alínea f) do n.º 1 do artigo 204.º, do Cód. Penal. [Nesse sentido, Assento n.º 7/2000 (quando afirma: “(…) a expressão «espaço fechado» a que se reportam a alínea f) do n.º 1 do artigo 204.º deste diploma e a alínea e) do n.º 2 do mesmo normativo não poderá deixar de ser compreendida com o significado restrito de lugar dependente de casa”); Ac. STJ de 15.06.2000, proc. 00P182, in www.dgsi.pt; Ac. STJ 01.06.2005, proc. n.º 2362/04 - 3.ª Secção, Antunes Grancho (relator), in www.stj.pt; Ac. STJ de 23.2.2005, in CJ-STJ, I, pág. 207; AcRC de 14.05.2008 e AcRG de 22.02.2010, ambos in www.dgsi.pt. E na doutrina, Faria Costa, in Comentário Conimbricense, Parte Especial, tomo II, em anotação aos artigos 202º e 204.º; e Código Penal Anotado, Leal-Henriques e Simas Santos, 3ª ed., 2º volume, Parte Especial, onde se refere: “(…) a expressão ‘espaço fechado’ constante da al. f) do n.º 1 e da al. e) do n.º 2, passou a ter de ser compreendida com o sentido restrito de ‘lugar fechado dependente de casa’ (…)”.
14. Concluímos, pois, que, de acordo com os indícios apurados nos autos, a conduta do recorrente é suscetível de integrar a prática, em coautoria, de um crime de Furto, do artigo 203.º, n.º 1, do Cód. Penal, eventualmente em concurso real com um crime de Introdução em lugar vedado ao público, do artigo 191.º, do Cód. Penal.
15. A pena máxima prevista para o crime de Furto (simples) não satisfaz as exigências do artigo 202.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, pelo que a medida de coação de prisão preventiva aplicada pelo despacho recorrido tem de ser revogada – dando, assim, procedência aos argumentos do recurso.
16. Considerando as exigências de cautelares identificadas no caso presente [acentuadas por condenações anteriores pela prática de crimes da mesma natureza – pontos 26, 27 e 29], a fraca relevância das consequências do facto [o valor dos objetos é reduzido e foram recuperados – pontos 6 e 7] e a precaridade das condições de vida do arguido [está desempregado, não aufere qualquer tipo de subsídio ou rendimento, reside sozinho em casa cedida “de favor”, sem condições de habitabilidade – pontos 17, 18 e 19], entendemos que, nos termos do disposto nos artigos 193.º, n.º 1 e 198.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, se torna necessário e adequado impor ao recorrente a obrigação de apresentação semanal no posto policial mais próximo da sua residência.
A responsabilidade pela taxa de justiça
Sem tributação, face à procedência do recurso [artigo 513.º, n.º 1, a contrario, do Cód. Proc. Penal].
*
III – DISPOSITIVO
Pelo exposto, os Juízes acordam em:
● Conceder provimento ao recurso interposto pelo arguido B…, revogando o despacho recorrido na parte em que determinou a aplicação da medida de coação de prisão preventiva, medida que é substituída pela obrigação de apresentações semanais no posto policial mais próximo da sua residência.
Passe mandados de libertação imediata do recorrente.
Sem tributação.
[Elaborado e revisto pelo relator – em grafia conforme ao Acordo Ortográfico de 1990]

Porto, 16 de maio de 2012
Artur Manuel da Silva Oliveira
José Joaquim Aniceto Piedade