Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
474/04.0TBOAZ-I.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: CONTESTAÇÃO
RÉU
REVELIA
EFEITOS
LITISCONSÓRCIO VOLUNTÁRIO
DESISTÊNCIA DO PEDIDO
Nº do Documento: RP20100921474/04.0TBOAZ-I.P1
Data do Acordão: 09/21/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Legislação Nacional: ARTº 485º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: I - A situação de revelia e os efeitos da mesma aferem-se à ocasião da contestação e perduram até à decisão final do processo.
II - Numa situação de pluralidade de réus, em litisconsórcio voluntário, se apenas um deles contesta, mas impugna todos os factos articulados pelo autor, quer os que lhe são imputados quer os que são imputados ao seu co-réu, a contestação do réu contestante aproveita ao réu não contestante, por força da citada ai. a) do art.° 485.° do C.P.Civil.
III - Se posteriormente o autor desiste do pedido que formulou contra o réu contestante, e ele é, por isso, absolvido do pedido, a situação de revelia não operante do réu não contestante perdura nos autos, tendo o autor de provar, em sede de audiência de julgamento, os factos que lhe imputa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação
Processo n.º474/04.0 TBOAZ-I.P1
Tribunal Judicial de São João da Madeira – ..º juízo
Recorrente – Massa falida de “B………., Ld.ª
Recorridos – C……….
D………., Ld.ª
Relator – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. Sílvia Pires
Desemb. Ana Lucinda Cabral


Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I – Por apenso ao respectivo processo de falência a Massa falida de “B………., Ld.ª”, representada por Inácio Peres, liquidatário judicial da referida falida, intentou no Tribunal Judicial de São João da Madeira a presente acção declarativa de condenação com forma ordinária contra E………., F………., “B………., Ld.ª”, com sede em São João da Madeira, C………., e “D………., Ld.ª”, com sede em São João da Madeira, pedindo:
I – Que os réus fossem condenados a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre os bens móveis e direito de trespasse e arrendamento do estabelecimento comercial da autora;
II – Que fosse declarada a nulidade do contrato de mútuo celebrado pelo primeiro e segundo réus, em representação da terceira ré, e o quarto réu, e bem assim, a declaração de nulidade do penhor mercantil associado a tal negócio;
III – Que fosse declarada a nulidade da dação em pagamento operada pelos dois primeiros réus, em representação da terceira ré, em benefício do quarto réu, em virtude de simulação; declarar-se a transmissão dos bens do quarto para a quinta ré nula, com a consequente reversão de tais bens e direitos para a autora;
IV – Que fosse declarada a nulidade de registos matriciais, comerciais e/ou prediais que tenham por objecto tais bens e direito;
V – Que fossem os três primeiros réus condenados em multa pela litigância de má fé.
Subsidiariamente, a autora pediu que fosse declarada a ineficácia do contrato de mútuo, penhor mercantil, dação em pagamento e cessão patrimonial, em decorrente de impugnação pauliana, revertendo para a autora património alienado.
Alegou para tanto e, em síntese, que os réus E………. e F………., em representação da B………., celebraram com o quarto réu, C………. em contrato de mútuo nulo por falta de forma, tendo aqueles primeiros réus, para garantia de tal contrato, e mais uma vez em representação da B………. constituído a favor do quarto réu um penhor mercantil. Este penhor encontrar-se-ia também ferido de nulidade, decorrente da nulidade do contrato de mútuo a que estava associado, e seria também inválido por ter sido constituído sobre bens onerados com duas penhoras e um arresto prévios ao aludido negócio. Além do mais, esse mesmo contrato de mútuo, e o penhor associado, seriam nulos em virtude de terem sido simulados, pois que os dois primeiros réus, actuando em representação da terceira ré, e o quarto réu, não quiseram celebrar tal negócio, mas antes subtrair os bens da B………. aos seus credores e beneficiar o quarto réu, que é irmão do segundo réu. Assim como seriam nulos, por simulados, a dação em pagamento, consubstanciada em transacção judicial, no proc. n.º 1597/03.9 TBSJM, que correu os seus termos no ..º Juízo deste Tribunal, operada pelos dois primeiros réus, em representação da B………. ali era ré. (que nessa data já havia sido declarada falida), e o quarto réu. (que ali era autor), pois que essa acção tinha por causa de pedir o referido contrato de mútuo. Consequentemente, será também nula a transmissão desses bens e direito de trespasse e arrendamento do estabelecimento efectuada pelo quarto réu à quinta ré.
Finalmente alega a autora que os réus actuaram com má fé e foi atribuído ao quarto réu vantagem patrimonial desproporcionada relativamente a um eventual crédito deste. Por tal motivo, o contrato de mútuo e a constituição de penhor, bem como as subsequentes dação em pagamento e transacção judicial.
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Todos os réus foram pessoal e regularmente citados e apenas os réus E………. e C………. vieram contestar o pedido formulado, pedindo a improcedência da acção.
Para tanto alegaram a validade dos contratos invocados pela autora, impugnando os factos que ela alegou na p. inicial.
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Por despacho proferido a fls. 154 a 162 foram os réus E………., F………. e, “B………., Ld.ª” julgadas partes ilegítimas e consequentemente foram absolvidos da instância.
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Desta decisão recorreu a autora, contudo não obstante o agravo ter oportunamente admitido, a recorrente não juntou aos autos quaisquer alegações.
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Dispensou-se a realização de audiência preliminar, foi proferido o despacho saneador, seleccionada a matéria de facto e elaborada a base instrutória, de que não houve reclamações.
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Por requerimento junto a fls. 744 dos autos veio o réu C………. confessar os pedidos formulados nos autos.
Sobre tal requerimento recaiu o seguinte despacho:
“Veio o R. C………. confessar o pedido deduzido na presente acção, o que fez através de mandatário munido de poderes especiais para o efeito - cfr. fls. 129.
Sucede que é também R. na mesma acção a sociedade comercial "D………., Lda.", da qual aquele co-réu é sócio de acordo com a certidão que consta de fls. 85, mas não exerce a gerência.
Considerando os pedidos formulados na petição inicial, especialmente sob o número IV (fls. 14) de declaração de nulidade por simulação de negócio jurídico que envolve estes dois réus, ocorre manifestamente entre eles um litisconsórcio necessário passivo - art. 28°/2 do Código de Processo Civil.
De acordo com o disposto no art. 298°/2 do Código de Processo Civil, no caso de litisconsórcio necessário, a confissão de algum dos consortes só produz efeitos quanto a custas.
Como assim, e face ao exposto, não obstante a aludida confissão do pedido, mantém-se a data designada para a audiência de julgamento, sendo as implicações dessa confissão a apreciar na sentença, afinal”.
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Por requerimento assinado pelo réu C………., junto a fls. 749 dos autos veio a ré “D………., Ld.ª” declarar que confessa os pedidos formulados nos autos.
Sobre tal requerimento veio a recair o seguinte despacho:
“A fls. 749 veio a ré "D………." declarar que confessa os pedidos formulados na presente acção, encontrando-se tal declaração assinada pelo réu C………..
Sucede que, conforme se retira da certidão do registo comercial ora junta, o referido C………. figura aí apenas como sócio da sociedade "C………." e já não como gerente, cabendo a gerência a G………. e H………., sendo necessária a intervenção dos dois gerentes para obrigar a sociedade.
Acresce que, conforme resulta da mesma certidão, a sociedade "D………." foi declarada insolvente, tendo sido proferida decisão judicial de encerramento do processo de insolvência com o fundamento de não ter sido requerido o complemento da sentença nos termos do art. 39.º nº 7 al. b) do CIRE.
De acordo com a al. a) do mesmo preceito legal, não tendo sido requerido o complemento da sentença, o devedor não fica privado dos poderes de administração e de disposição do seu património, nem se produzem quaisquer dos efeitos que normalmente correspondem à declaração de insolvência. Significa isto que na situação vertente quem terá poderes para confessar os pedidos por parte da ré "D………." serão os seus referidos gerentes G………. e H………. Como tal, não e valida a confissão do pedido feita a fls. 749 pelo réu C………., por não assumir essa qualidade, mas apenas a de sócio da sociedade.
Pelo exposto, não se homologa aquela confissão do pedido, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos”.
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Entretanto, a pedido do réu C………. foi concedido prazo para que fosse obtida declaração de confissão da ré “D……….” subscrita pelos seus gerentes. Todavia decorrido esse prazo nada foi junto aos autos pela referida ré.
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Realizou-se o julgamento da matéria de facto após o que foi proferida a respectiva decisão, sem censura das partes.
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Finalmente proferiu-se sentença onde se julgou a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, absolveram-se os réus C………., e "D………., Lda", dos pedidos formulados pela autora Massa falida de "B………., Lda”.
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Inconformada com tal decisão dela veio a autora recorrer pedindo que a mesma seja revogada e substituída por outra que julgue a acção procedente.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões que nada mais são do que a reprodução do teor daquelas alegações:
I. A Massa Falida propôs a acção ora recorrida contra E………., F………., "B………., Lda.", C………. e "D………., Lda.". No entanto;
II. Apenas apresentaram contestação os RR. E………. e C………..
III. Por despacho de fls. 154, os RR. E………., F………., "B………., Lda." foram julgados partes ilegítimas na presente acção. Deste modo,
IV. Apenas restavam como partes os RR. C………. e "D………., Lda.",
V. Contudo, o R. C………. confessou o pedido por requerimento junto aos autos a fls. 129, e na acção de restituição, referente aos mesmos bens objecto dos presentes autos, no Apenso E, esse mesmo R. (aí A.) desistiu do pedido, reconhecendo a improcedência do pedido de restituição.
VI. Dito isto, verifica-se, por um lado que a R. D………., Lda. não contestou a presente acção, o que implica a confissão dos factos nos termos do art.º 480.º do CPCivil,
VII. Por outro, a norma que estabelece que a contestação de uma das partes aproveita àquelas que não contestaram - cfr. art.º 485.º, alínea a) do CPCivil - apenas se pode entender no sentido de que se mantém tal aproveitamento enquanto aqueloutra parte estiver no processo e enquanto levar a cabo a sua defesa.
VIII. Ora, a R. D………., Lda., não teve nenhuma intervenção processual, pelo que não lhe poderá aproveitar o que quer que seja.
IX. Ainda assim, sempre se verifica que a R. D………., Lda. foi declarada insolvente por sentença datada de 06.01.2006;
X. E o processo de insolvência foi encerrado em 08.05.2006, sem que os bens em causa nos presentes autos fossem apreendidos para a Massa Insolvente de D………., Lda., isto porque a propriedade dos mesmos não era da R. D……….;
XI. Não com isto se bastando, e considerando que apenas é R. a sociedade D………., Lda., os bens chegaram à posse da mesma em momento posterior à própria declaração de insolvência, pelo que se presume a má-fé de tal "aquisição";
XII. Presunção essa que a R., por não ter tido qualquer intervenção processual, não conseguiu ilidir.
XIII. Pelo que a decisão de que ora se recorre não poderia ter sido outra senão a procedência da acção, por tudo quanto resulta supra exposto.
XIV. A decisão recorrida violou o disposto nos supra citados artigos do CPCivil, razão pela qual se pugna pela prolação de acórdão que revogue a decisão recorrida julgando-se procedente a acção proposta.
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Não foram juntas aos autos contra-alegações.

II – Tudo visto, cumpre decidir.
Da 1.ª instância chegam-nos provados os seguintes factos:
1. No âmbito da acção declarativa com processo ordinário com o n.º1597/03.9TBSJM do ..º Juízo deste Tribunal, em que foi autor o aqui R. C………. e R. B………., Lda., foi homologada por sentença proferida em 17/10/2003 transacção das partes nessa mesma data entrada em juízo, cujo teor consta de fls. 238 a 240 e aqui se dão por integralmente reproduzido.
2. B………., Lda. é uma sociedade comercial que tem como sócios F………. e E………., tendo a primeira exercido a gerência até 16/07/2002 e daí em diante, tendo cessado aquela tais funções, o segundo; foi declarada falida por decisão de 16/09/2004.
3. Foi elaborado um documento designado de "Contrato de mútuo com penhor mercantil" em que figuram como contraentes o ora R. C………. e B………., Lda., cujo teor consta de fls. 250 e ss. e aqui se dá por reproduzido.
4. Foi ainda elaborado um outro documento com os mesmos contraentes designado de "Contrato de Reforço de Garantias" cujo teor consta de fls. 264 e ss., e aqui se dá por reproduzido.
5. A acção declarativa referida em A) tem como petição inicial o articulado que consta de fls. 277 a 281, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
6. Os bens objecto do penhor mercantil referido em C) foram também objecto dos seguintes actos judiciais:
I - penhora realizada em 10/04/2003 no âmbito da execução ordinária n.º 402/03.0TBJSM do ..º Juízo deste Tribunal, conforme autos cuja cópia consta de fls.28 e ss. e aqui se dá por reproduzido;
II - penhora realizada em 31212004 no âmbito da execução comum n.º 144/04.0TBSJM do ..º Juízo deste Tribunal, conforme cópia do auto de penhora de fls. 30 a 33, que aqui se dá por reproduzido;
III - arresto realizado em 10/0412003 no âmbito do procedimento cautelar n.º 793/03.3TBSJM do ..º Juízo deste Tribunal, conforme auto cuja cópia consta de fls. 34 e ss. e se dá aqui por integralmente reproduzido;
IV - arresto realizado em 25/06/2003 no âmbito do procedimento cautelar n.º 1362/03.3TBSJM do ..º Juízo deste Tribunal, conforme auto cuja cópia consta de fls.19 a 25 e aqui se dá por reproduzido.
7. A sociedade R. D………., Lda., foi constituída por escritura pública de 26/06/2003, tendo como sócio o aqui R. C………. casado com F………..

III - O âmbito do recurso é definido pelas conclusões das alegações, não podendo o tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se trate de questões de conhecimento oficioso, cfr. art.ºs 684.º n.º 3 e 690.º n.ºs 1 e 3, ambos do C.P.Civil, sendo certo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, é o seu objecto delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
Vendo o teor das conclusões da recorrente são duas as questões a decidir nos autos:
1.ª – Saber se a confissão do pedido efectuada nos autos pelo réu C………. tem alguma relevância no desfecho dos autos?
2.ª – Saber se, não obstante a situação de revelia da ré D………., Ld.ª, devem ser considerados confessados os factos que contra ela a autora articulou na sua p. inicial?
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Nota prévia - Ao presente recurso não é aplicável o regime processual estabelecido pelo DL 303/2007, de 24.08, por respeitar a acção instaurada antes de 1 de Janeiro de 2008, cfr. n.º 1 do art.º 11.º e art.º 12.º do citado DL.
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Vejamos a 1.ª questão – confissão do pedido por parte do réu C………..
Resulta dos autos que por requerimento junto a fls.744 o réu C………. veio declarar que “confessa os pedidos formulados nos presentes autos pela autora massa falida de B………., Ldª”.
No caso dos autos, depois de terem sido absolvidos da presente instância, por decisão transitada em julgado, proferida a fls. 154 a 159, os demandados E………., F………. e B………., Ldª, os primeiros porque os actos nulos ou ineficazes invocados não foram por si praticados a título próprio, mas em representação da sociedade B………., Ldª, cuja massa falida é autora nos autos, representada pelo seu liquidatário judicial e a segunda porque manifestamente não tem legitimidade passiva para contra ela se pedir a declaração de nulidade ou de ineficácia dos actos por si celebrados, uma vez que esses pedidos são efectuados nos autos pela mesma pessoa jurídica, agora representada pelo seu liquidatário judicial, restaram como réus – C………. e D………., Ldª.
Contra eles peticionava-se na acção:
- I- Que réus fossem condenados a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre os bens móveis e direito de trespasse e arrendamento do estabelecimento comercial da autora;
- II – Que fosse declarada a nulidade do contrato de mútuo celebrado entre a autora e C………. (4.ºréu), e bem assim, a declaração de nulidade do penhor mercantil associado a tal negócio;
- III – Que fosse declarada a nulidade da dação em pagamento operada pela autora em benefício de C………. (4.º réu), em virtude de simulação; declarar-se a transmissão dos bens deste réu para a ré D………., Ld.ª (5.ªré) nula, com a consequente reversão de tais bens e direitos para a autora;
IV – Que fosse declarada a nulidade de registos matriciais, comerciais e/ou prediais que tenham por objecto tais bens e direito.
Sobre a supra referida confissão do pedido formulada pelo réu C………. recaiu despacho, devidamente transitado em julgado, pelo qual se decidiu que essa mesma confissão, a nível processual, apenas revelava em termos do custas, por força do disposto nos art.º 28.º n.º2 e 298.º n.º 2 ambos do C.P.Civil.
Em termos substantivos e como resulta do disposto no art.º 352.º do C.Civil: “Confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária”, situando-se, portanto, esta figura, no domínio da prova, designadamente a parte a quem aproveita a confissão fica dispensada de provar o facto, ou seja, não tem qualquer influência directa e imediata na relação processual, pois que o juiz sempre terá de apreciar do mérito da causa. E assim a confissão feita pelo litisconsorte é eficaz se o litisconsórcio for voluntário, embora o seu efeito se restrinja ao interesse do confitente; mas não o é se o litisconsórcio for necessário, cfr. art.º 353.º n.º 2 do C.Civil. A sua eficácia está prevista no art.º 358.º, segundo o qual: a confissão tem força probatória plena contra o confitente quando se trate de confissão judicial escrita (358.º n.º1); de confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular e nos termos que lhe sejam aplicáveis e feita à parte contrária (358.º n.º 2). Nos outros casos, é apreciada livremente pelo tribunal (358.º n.ºs 3 e 4). Finalmente e por força do disposto no art.º 361.º do C.Civil o reconhecimento de factos desfavoráveis, que não possa valer como confissão, vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente.
Processualmente, a confissão do pedido é um acto de auto-composição da lide, pois que por via da confissão do pedido o réu reconhece que a pretensão do autor é fundada, ou a razão daquele e sendo eficaz, põe termo à causa, compõe o litígio existente, tendo funcionalmente o mesmo efeito de uma sentença de mérito. Actua assim sobre a relação jurídica substantiva e põe termo não só à instância mas também à acção, cabendo ao juiz apenas averiguar da validade da confissão, verificando se estão reunidos os necessários requisitos relativos às pessoas e ao seu objecto.
O princípio da liberdade da confissão preceituado no art.º 293.º n.º 1 do C.P.Civil sofre limitações ao nível dos seus efeitos no caso da existência de pluralidade de partes, como resulta do disposto no art.º298.º, por exemplo, sendo vários réus, um deles confessar, enquanto os demais continuam a não aceitar a pretensão do autor. Ora, porque nestes casos surgem dois interesses em conflito, mantendo-se o princípio da liberdade de confissão, se o caso for de litisconsórcio voluntário, a confissão só produzirá efeitos em relação à quota-parte do interesse que o confitente tinha na acção, ficando assim o interesse dos demais réus incólume; mas se estivermos perante um caso de litisconsórcio necessário, sem se relegar o princípio da liberdade da confissão mas havendo de proteger activamente os interesses dos outros co-réus, a confissão só produz efeitos quanto a custas, ou seja, o confitente só deixa de ser parte para efeito se não ser responsável pelas custas do processo relativas aos actos posteriores, o objecto da acção subsiste tal qual, não se reduz nem se modifica pelo facto de um dos co-réus ter confessado.
No caso em apreço nos autos e como foi, e bem, considerado em 1.ª instância, estamos perante uma pluralidade de réus (com unicidade de relação material controvertida) que lhe é imposta pela natureza da própria relação material controvertida, ou seja, a situação dos autos, vistos a causa de pedir e os pedidos é de litisconsórcio necessário passivo natural, cfr. art.º 28.º n.º2 do C.P.Civil, isto é, impõe-se a presença de ambos os réus na acção, pois doutro modo, a decisão judicial a obter não produz o seu efeito útil normal, atenta a natureza da relação jurídica em discussão. Entendendo-se que o efeito útil normal de uma decisão judicial consiste na composição definitiva entre as partes relativamente ao pedido formulado, de modo que o caso julgado material possa abranger todos os interessados, evitando tornar-se incompatível com a decisão eventualmente obtida numa outra acção.
É verdade, que a co-ré D………., Ldª pretendeu também confessar o pedido formulado nos autos, contudo tal confissão não foi julgada válida, por ter sido subscrita por quem tinha poderes legais para vincular tal sociedade em juízo, conforme teor do despacho proferido a fls. 358 e 359, devidamente transitado em julgado. Não obstante ter sido concedido prazo para o efeito, a ré não juntou aos autos confissão subscrita pelos seus legais representantes.
Pelo que, atento o que acima se deixou consignado, a confissão do pedido efectuada pelo réu C………., processualmente não tem outra virtualidade para além do que foi decidido em 1.ª instância a fls. 747. Substantivamente, essa confissão só pode valer como elemento probatório a apreciar livremente pelo tribunal, cfr. art.º 361.º do C.Civil, o que no caso dos autos, nenhuma relevância teve em face da total ausência de prova dos factos por quem a isso estava obrigado, ou seja, por parte da autora, cfr. art.º 342.º n.º 1 do C.Civil.
Improcedem assim as respectivas conclusões da apelante.
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2.ªquestão – revelia da ré D………., Ldª
Diz a apelante que a ré D………., Ld.ª não contestou a presente acção, o que implica a confissão dos factos nos termos do art.º 480.º do C.P.Civil, pois que a norma que estabelece que a contestação de uma das partes aproveita àquelas que não contestaram, cfr. art.º 485.º al. a) do C.P.Civil, só pode ser entendida no sentido de que se mantém tal aproveitamento enquanto a outra parte estiver no processo e enquanto levar a cabo a sua defesa. Ora, tendo o co-réu C………. confessado o pedido por requerimento que juntou aos autos, este deixou de estar no processo e de levar por diante a sua defesa, daí que a co-ré D………., Ldª não poderá aproveitar da defesa daquele, devendo ser considerados confessados os factos articulados pela autora na p. inicial.
Manifestamente nenhuma razão assiste à apelante.
Na verdade, resulta dos autos que a ré D………., Ldª, tendo sido, pessoal e regularmente, citada para contestar, em tempo útil nenhuma oposição deduziu aos pedidos formulados, não constituiu mandatário, nem por qualquer forma interveio no processo, logo, por força do disposto no art.º 483.º do C.P.Civil, encontra-se a mesma numa situação de revelia.
Como é sabido, por regra, a revelia, dizendo-se operante, tem por efeito serem considerados confessados os factos articulados pelo autor na petição inicial, (ficta confessio) cfr. art.º 484.º n.º 1 do C.P.Civil. Todavia, há casos previstos na lei, em que, excepcionalmente, aquele efeito se não produz. Neste caso, a revelia diz-se inoperante, ou seja, não obstante o réu não ter apresentado contestação, e apesar de ter sido citado na sua própria pessoa, não se consideram confessados os factos articulados pelo autor na petição inicial.
Ora, o efeito de prova da falta de contestação do réu, pessoal e regulamente, citado não se verifica nos casos previstos nas alíneas do art.º 485.º do C.P.Civil.
Restringindo-nos à situação que releva nos autos, verificamos que a al. a) do citado preceito legal impõe que sendo vários réus, a contestação de um aproveita aos restantes, quanto aos factos que o contestante impugnar. O que tem aplicação em qualquer situação de pluralidade de réus, seja em litisconsórcio necessário ou voluntário ou ainda em caso de coligação, limitando-se, contudo, a sua eficácia aos factos de interesse para o réu contestante e para o réu revel.
Como já acima deixamos consignado os réus C………. e D………., Ldª encontram-se na acção numa situação de litisconsórcio necessário. Tempestivamente, o réu C………. apresentou nos autos a sua contestação, e do teor da mesma verificamos que o mesmo aí, expressamente, impugna todos os factos, não só os factos cuja autoria lhe é individualmente imputada, designadamente que tenha efectuado qualquer adjudicação dos bens, alegadamente pertença da autora, à ré D………., Ldª e que esta os esteja a usufruir e, mas também que tenha havido entre os réus qualquer concertação no agir e intenção de prejudicar a massa falida da autora e os credores desta.
Pelo que dúvidas não restam de que a situação de revelia da ré D………., Ldª é inoperante, por força do disposto na al. a) do art.º 485.º do C.P.Civil, ou seja, a contestação apresentada pelo réu C………. aproveita integralmente àquela ré, na medida em que são impugnados os factos de interesse para ela.
Finalmente, sempre se dirá que, contrariamente ao afirmado pela autora, e não querendo repetir-nos, o réu C………. mantém-se no processo, já que os efeitos da confissão do pedido que efectuou nos autos se limitaram às custas processuais. Todavia, a situação de revelia e os efeitos da mesma aferem-se à ocasião da contestação e perduram até à decisão final do processo. Por exemplo, numa situação de pluralidade de réus, em litisconsórcio voluntário, apenas um deles contesta, mas impugna todos os factos articulados pelo autor, quer os que lhe são imputados que os que são imputados ao seu co-réu. A contestação do réu contestante aproveita ao réu não contestante, por força da citada al. a) do art.º 485.º do C.P.Civil. Se posteriormente o autor desiste do pedido que formulou contra o réu contestante, e ele é, por isso, absolvido do pedido, a situação de revelia não operante do réu não contestante perdura nos autos, tendo o autor de provar, em sede de audiência de julgamento, os factos que lhe imputa.
Pelo exposto, improcedem as restantes conclusões da apelante.
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E não tendo a autora/apelante produzido nos autos qualquer prova, como se lhe impunha, cfr. art.º 342.º n.º 1 do C.Civil, “sib imputet”, tendo a acção de necessariamente de improceder.

IV – Pelo exposto acordam o s Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação improcedente por não provada.
Custas pela apelante, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.

Porto, 2010.09.21
Anabela Dias da Silva
Sílvia Maria Pereira Pires
Ana Lucinda Mendes Cabral