Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0441161
Nº Convencional: JTRP00037110
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
ADVOGADO
NOMEAÇÃO
HONORÁRIOS
Nº do Documento: RP200407080441161
Data do Acordão: 07/08/2004
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA A DECISÃO.
Área Temática: .
Sumário: I - A nomeação de patrono e o pagamento de honorários ao patrono escolhido são duas modalidades diferentes do apoio judiciário.
II - A acção só se considera proposta na data em que o apoio judiciário foi requerido, quando haja sido pedida a nomeação de patrono.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:


B.......... instaurou contra C.......... e D.......... acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que condene os RR. a pagarem ao A. a quantia de € 15.039,26, sendo € 4.489,18 de indemnização por rescisão do contrato com fundamento em justa causa invocada pelo A. e o restante relativo a salários, férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal proporcionais, para além de juros de mora, à taxa de 7.%, desde a citação até integral pagamento.
Alega, para tanto, que rescindiu o contrato de trabalho em 2000-07-10, com fundamento na falta de pagamento dos salários de Janeiro a Junho de 2000, sendo certo que os RR. não lhe pagaram quaisquer quantias.
Citados editalmente, os RR. não contestaram.
Citado o Ministério Público, veio contestar invocando a prescrição dos créditos reclamados, pois a rescisão do contrato ocorreu em 2000-07-10 e a presente acção foi instaurada em 2002-09-25, sendo certo que o apoio judiciário que lhe foi concedido na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido se destinou à acção n.º .../01, que correu termos entre as mesmas partes, no mesmo Tribunal do Trabalho, com o mesmo pedido e causa de pedir e que foi arquivada por falta ou irregularidade do mandato, pelo que aquele benefício não é extensível à presente acção, atento o disposto no Art.º 17.º, n.º 2 da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro.
O A. respondeu que lhe foi nomeado patrono por carta de 2002-09-17 da Ordem dos Advogados, tendo a acção sido proposta no dia 25 seguinte, sendo certo que o pedido de apoio judiciário foi apresentado nos serviços da Segurança Social em 2001-02-12, pelo que a acção se considera proposta nesta data.
Procedeu-se a julgamento, tendo-se proferido sentença em que se julgou improcedente a excepção de prescrição e se condenou os RR. a pagarem ao A. a quantia de € 12.991.92, sendo € 4.050,00 de indemnização de antiguidade, acrescida de juros às taxas legais.
Inconformado com o assim decidido, veio o Digno Magistrado do M.º P.º recorrer da sentença pedindo a sua revogação e substituição por acórdão que julgue procedente a excepção de prescrição ou, caso assim se não entenda, devem os RR. ser absolvidos do pedido de indemnização, formulando a final as seguintes conclusões:
1. O pedido de apoio judiciário na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido não interrompe o prazo de prescrição.
2. Nem tão pouco a acção intentada por patrono escolhido se considera proposta na data em que aquele pedido foi formulado.
3. Por isso, tendo o contrato de trabalho cessado em 2000-07-10, o prazo de prescrição previsto no Art.º.38.º, n.º 1 da LCT completou-se em 2001-07-11, ou seja, em data anterior àquela em que foi intentada a presente acção, a determinar a verificação da prescrição dos créditos reclamados pelo A.
4. Não existe no caso qualquer situação de interrupção da prescrição, nomeadamente as previstas no Art.º.323.º, n.º 1 do Cód. Civil.
5. A rescisão do contrato de trabalho pelo trabalhador com justa causa deve ser feita por escrito.
6. Não está provado que o A. tenha comunicado por escrito a rescisão do contrato.
7. Por isso, tal rescisão não pode ser havida com justa causa.
8. Pelo que o A. não tem direito à indemnização que peticionou.
9. A sentença violou, assim, o disposto nos Art.ºs 34.º, n.º 4 da Lei 30-E/2000, de 20 de Dezembro, 12.º e 323.º, n.º 1, ambos do Cód. Civil e 34.º, n.ºs 2 e 3 e 36.º, ambos da LCCT.
O A. apresentou a sua alegação, pugnando pela manutenção da decisão recorrida e invocou o abuso do direito por parte dos RR.
Foi admitido o recurso e colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:
a) Em 2000-01-25 os RR. celebraram verbalmente um contrato de trabalho com o A. para no seu interesse, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercer as funções de armador de ferro e cofragem da construção civil, na Madeira.
b) Foi acordado entre o A. e os RR. a retribuição líquida de € 5,00 por hora.
c) Os RR. forneciam ao A. alimentação e alojamento, bem como as deslocações ao continente.
d) O A. trabalhava todos os dias, incluindo sábados e feriados, descansando aos domingos.
e) O A. trabalhava em média 10 horas por dia.
f) Os RR. não pagaram ao A. os salários de Janeiro a Junho de 2000.
g) Em 2000-07-10 o A. rescindiu o contrato de trabalho com os RR. com fundamento na falta de pagamento de salários.
h) Os RR., apesar de insistentemente instados para o efeito, nada pagaram ao A. até hoje.
i) O A. trabalhou para os RR. um total de 1.420 horas, de 2000-01-25 a 2000-07-10.
Importa ainda consignar a seguinte matéria por interessar à decisão do recurso:
j) Em 2001-02-26 o A. requereu à Segurança Social a concessão do beneficio do apoio judiciário na modalidade de pagamento de honorários a patrono por si escolhido (Dr. E..........), dispensa de pagamento de taxa de justiça, dispensa do pagamento dos demais encargos do processo – cfr. fls.117 dos autos.
k) Por carta datada de 2001-03-26, registada e com aviso de recepção, o A. foi notificado de que aquele pedido tinha sido deferido – cfr. fls.7 dos autos.
l) Por carta registada de 2002-09-17 a Delegação da Ordem dos Advogados de Viana do Castelo, e no que respeita ao referido em j), nomeou patrono do A. o Dr. E.......... – cfr. fls. 6 dos autos.
m) A presente acção deu entrada em juízo em 2002-09-25.
n) O apoio judiciário que foi concedido ao A. na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido destinou-se à acção n.º .../01, que correu termos entre as mesmas partes, no mesmo Tribunal do Trabalho, com o mesmo pedido e causa de pedir e que foi arquivada por falta ou irregularidade do mandato – cfr. fls. 99 e segs. e fls. 7.
O Direito.
São as seguintes as questões a decidir:
I – Saber se os créditos reclamados pelo A. estão prescritos.
II – Saber se os RR. deveriam ter sido condenados na indemnização por rescisão do contrato de trabalho com justa causa.
Vejamos a 1.ª questão, relativa à prescrição dos créditos.
Trata-se de saber se, tendo o pedido de apoio judiciário na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido sido deduzido durante o prazo de prescrição de um ano previsto no art.º 38.º do regime jurídico do contrato de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969, a contagem de tal prazo se suspende até à data em que tal incidente é objecto de decisão. Pois, se a suspensão se verifica, o prazo prescricional só se completa em data posterior àquela em que se mostra efectuada a citação, não ocorrendo a invocada excepção peremptória.
Ora, formulado o pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono na pendência da causa, o prazo que estiver em curso interrompe-se – não se suspende – e, formulado o pedido na mesma modalidade antes da propositura da acção, esta considera-se intentada na data em que foi formulado o pedido, como resulta do disposto nos Art.ºs, respectivamente, 25.º, n.º 4 e 34.º, n.º 3, ambos da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro. Formulado o pedido na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido, não se verifica a suspensão ou interrupção de qualquer prazo – para contestar ou para propôr a acção. Pois, apesar de constarem da mesta alínea do Art.º 15.º da referida Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro – alínea c) – trata-se de duas modalidades distintas de apoio judiciário, com regimes jurídicos também distintos. Na modalidade de nomeação de patrono, o impetrante não pode propôr a acção e o demandado não pode contestar enquanto não lhe for indicado um Sr. Advogado pela respectiva Ordem; na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido, o Sr. Advogado está determinado, faltando no máximo [Veja-se a hipótese de deferimento tácito prevista no Art.º 26.º, n.º 2 da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro] uma declaração de concordância da Ordem dos Advogados, atento o disposto no Art.º 50.º da referida Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro.
Ora, tratando-se de modalidades do apoio judiciário completamente distintas, o seu regime jurídico não pode ser idêntico, como não é. Na verdade, na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido, como é o caso dos autos, o Sr. Advogado, estando determinado, pode logo agir, não sendo necessário esperar pela decisão do incidente para se saber quem assumirá o patrocínio da parte. Daí que, nesta modalidade, não haja necessidade de interromper o prazo processual em curso no caso de acção já intentada ou de considerar a acção proposta na data da formulação do pedido de apoio judiciário no caso de acção a intentar.
Tal significa que, não tendo sido suspensa a contagem do prazo previsto no Art.º 38.º do regime jurídico acima referido, a citação dos RR. acabou por ser efectuada decorrido mais de um ano desde a data em que terminou o contrato de trabalho, pelo que se verifica a prescrição dos créditos dele emergentes.
Vejamos, agora, a 2.ª questão.
Consiste em saber se os RR. deveriam ter sido condenados na indemnização por rescisão do contrato de trabalho com justa causa.
O conhecimento desta questão está prejudicado pela solução dada à anterior, pois estando todos os créditos prescritos, não importa cuidar do surgimento de um deles: o direito à indemnização.
Por último, na sua alegação, veio o A. invocar o abuso do direito por parte dos RR. quando invocam a falta de forma na rescisão do contrato. Porém, dado o decidido nas questões anteriores, fica prejudicado também o conhecimento do abuso de direito.
Em suma, procede a apelação, pois se verifica a prescrição dos créditos reclamados, pelo que deve ser revogada a sentença.
Termos em que, na procedência da alegação dos recorrentes, se acorda em conceder provimento apelação no que respeita à prescrição dos créditos, assim se revogando a sentença.
Custas pelo A.

Porto, 8 de Julho de 2004
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Domingos José de Morais
Maria Fernanda Pereira Soares (vencida conforme declaração de voto que junto)
Da prescrição dos créditos.
Na sentença recorrida e no que respeita à prescrição é referido o seguinte: ...«O Autor peticionou o benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono antes da instauração da presente acção, o que nos termos do disposto no art. 34 nº 3 da Lei 30-E/00 de 20.12, torna tempestiva a acção».
Os recorrentes defendem que o pedido de apoio judiciário na modalidade de pagamento de honorários a patrono escolhido não interrompe o prazo de prescrição.
Analisemos então.
Para se responder a tal questão importa fazer uma pequena «viagem» pela anterior lei do apoio judiciário com vista a compreender o espírito e alcance das normas em apreço.
A. O D.L. 387-B/87 de 29.12.
Nos termos do art. 15 do referido diploma judiciário compreendia, para além da modalidade de dispensa, total ou parcial, de preparos e do pagamento de custas ou o seu diferimento, a dispensa do pagamento dos serviços do advogado ou solicitador. A esta última modalidade chamava a lei de patrocínio judiciário - art. 22 nº 2.
Com efeito, concedido o patrocínio judiciário - a dispensa do pagamento dos serviços a advogado -, e não se verificando a indicação pelo requerente do advogado - art. 50 - o Juiz solicitava a sua nomeação à Ordem dos Advogados - art. 32.
Da conjugação dos referidos artigos conclui-se que na vigência do D.L. 387-B/87 o apoio judiciário, na modalidade de dispensa de pagamento dos honorários a advogado, implicava a nomeação de patrono: a) que era feita pelo Juiz, se ocorresse a indicação nos termos do art. 50, e sem prejuízo da indicação não ser atendida nos termos do art. 51; b) que era solicitada à Ordem dos Advogados se tal indicação não constasse.
B. A Lei 30-E/00 de 20.12.
Nos termos do art. 15 da Lei 30-E/00 de 20.12 o apoio judiciário compreende as seguintes modalidades: a) a dispensa total ou parcial de taxa de justiça e demais encargos do processo; b) diferimento do pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo; c) nomeação e pagamento de honorários de patrono ou, em alternativa, pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente.
E em que consiste a terceira e última modalidade referida?
O requerente do apoio judiciário não tendo possibilidades económicas para pagar os honorários a advogado pode pedir a dispensa do dito pagamento. E por razões que aqui agora não importa analisar pode o requerente ter preferência por algum advogado. Se assim é pede a dispensa de pagamento de honorários ao advogado que indica, ou então, não indicando nenhum, pede a dispensa de pagamento de honorários a advogado a indicar pela Ordem dos Advogados. Ou seja, o que está em causa é essencialmente a dispensa de pagamento de honorários a advogado, seja ele, ou não, indicado pelo requerente do apoio judiciário.
E pedida a dispensa de pagamento de honorários e sendo a mesma concedida, tal decisão é notificada à Ordem dos Advogados - art. 27 nº 1 -, para esta proceder à nomeação de patrono.
Tal nomeação ocorrerá nos termos do art. 32 nº 1 se o requerente não indicou nenhum advogado, ou então nos termos do art. 50 («é atendível a indicação pelo requerente do pedido de apoio judiciário de advogado» ... «quando estes declararem aceitar a prestação dos serviços requeridos»), e sem prejuízo do disposto no art. 51 da mesma Lei. (não atendibilidade da indicação feita pelo requerente).
Assim, conclui-se que: a) o actual regime do apoio judiciário nada difere do anterior, no que respeita ao caso em análise; b) a modalidade de apoio judiciário consistente na dispensa de pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente, pressupõe sempre a nomeação de patrono; c) contudo, tal nomeação é feita nos termos do art. 32 com referência ao art. 50 da citada Lei, quando o requerente indica patrono, e sem prejuízo do disposto no art. 51.
Aliás, se assim não fosse, não se compreenderia a razão da notificação da decisão que concede o apoio judiciário à Ordem dos Advogados quando se trata unicamente de pagamento de honorários - art. 27 nº 1 - e também não se alcançaria o sentido e a utilidade do disposto nos arts. 50 e 51 da referida Lei.
Para isso, há que interpretar o pedido de apoio judiciário do Autor como um pedido de nomeação de patrono, com indicação do patrono escolhido, a determinar a aplicação ao caso do disposto no art. 34 nº 3 da Lei 30-E/00.
C. O disposto no art. 34 nº 3 da Lei 30-E/00.
Nos termos da citada disposição legal a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, que no caso dos autos ocorreu em 26.2.01.
E que repercussões tem o citado artigo sobre a prescrição?
Ficcionando a lei que a acção se considera proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, tal não significa que o prazo a decorrer, no que respeita à prescrição, se interrompe nessa data, mas antes que a prescrição considera-se interrompida decorridos que sejam 5 dias após aquela data - 26.2.01 -, atento o disposto no art. 323 nº 2 do C.C..
No caso dos autos a interrupção da prescrição ocorreu no dia 4.3.01 (a prescrição dos direitos invocados pelo Autor ocorreria no dia 11.7.01).
Assim, não se verifica a invocada excepção de prescrição.