Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00040714 | ||
| Relator: | HENRIQUE ARAÚJO | ||
| Descritores: | INSOLVÊNCIA OPOSIÇÃO LISTA DE CREDORES | ||
| Nº do Documento: | RP200710230723408 | ||
| Data do Acordão: | 10/23/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
| Indicações Eventuais: | LIVRO 254 - FLS. 141. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | Na oposição à declaração de insolvência o devedor, a par da invocação de razões de natureza substantiva – inexistência de factos em que se fundamenta o pedido ou inexistência da situação de insolvência – deve, sob pena de não recebimento da oposição, juntar lista dos cinco maiores credores ou declarar que não tem credores ou não tem outros credores para além do requerente. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | PROC. N.º 3408/07-2 REL. N.º 510 * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I. RELATÓRIO B…………….., casado, residente na Rua…….., n.º….., freguesia de……., Vila Nova de Famalicão, requereu a declaração de insolvência da sociedade “C……………., Lda.”. com sede na………….., Edifício …………, n.º….., Póvoa de Varzim. A “C…………….” deduziu oposição, negando que o Requerente lhe tenha fornecido quaisquer serviços e invocando a ilegitimidade deste. A Mmª Juiz não admitiu a oposição da Requerida por esta não ter cumprido o disposto no n.º 2 do art. 30º do CIRE, ou seja, a junção da lista dos cinco maiores credores, apesar de a citação que lhe foi feita conter a necessária cominação. A “C……………..” recorreu deste despacho. O recurso foi admitido como de agravo, com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo – v. fls. 47. Nas alegações de recurso a agravante pede que se revogue o despacho impugnado e formula, para esse fim, as conclusões que seguem: 1. A Requerida, citada do pedido de declaração de insolvência, deduziu oposição, mediante alegação da excepção de ilegitimidade do Requerente. 2. Com fundamento na falsidade dos factos invocados pelo mesmo, pois nenhuma relação contratual teve ou tem com aquele, nos termos invocados, pelo que a pessoa daquele não consta sequer dos documentos de suporte da contabilidade, seja como credor, seja como devedor. 3. Donde, a invocada falsidade de toda a matéria por aquele alegada e devidamente impugnada, por se tratar de pedido infundado nos termos do art. 25º do CIRE. 4. Admitir que qualquer pessoa, sem qualquer legitimidade, possa vir a juízo requerer a insolvência de outrem, com base em factos falsos e que, por via disso, na oposição ou o Requerido na sua defesa tenha, ainda assim, e para que esta tenha validade e seja recebida, de dar cumprimento ao disposto no art. 30º do CIRE, representa desde logo a violação do disposto nos arts. 3º, 9º, 11º e 27º, todos do CIRE. Já que, 5. Só quem seja verdadeiro credor do ou da Requerida, tem legitimidade para o fazer, sendo que o estatuído no art. 30º do CIRE, pressupõe, óbvia e literalmente, o cumprimento legal pelo Requerente do disposto naquelas normas do CIRE, sob pena de responsabilidade civil, ocorrendo esta já após todas as consequências económicas desastrosas para a Requerida. Assim, 6. Se o Requerente violou o disposto nos arts. 1º, 3º, 9º e 11º do CIRE por nem sequer ser titular da relação que invocou, por se tratar de factualidade falsa, não pode o Requerido ou a Requerida, estar sujeito ao ónus constante do art. 30º do CIRE. Porquanto, 7. O cumprimento daquele ónus representa, como é óbvio e foi espírito do legislador, chamar desde logo a juízo os 5 maiores credores e alertar os demais credores da situação do ou da Requerida, numa atitude preventiva e de alerta geral. Ora, 8. O uso abusivo e com base em factos falsos por quem alega uma relação contratual inexistente, não pode merecer a protecção legal do art. 30º do CIRE no que respeita à defesa do ou da Requerida, sob pena de se estar a violar quer a letra, quer o espírito da lei, nos termos das invocadas normas do CIRE e de descredibilizar desde logo, a todos os níveis, a situação da Requerida, no que concerne à sua intervenção no mercado económico. 9. A decisão agravada ao não admitir a oposição com fundamento na ilegitimidade do Requerente e na falsidade dos factos invocados pelo mesmo, para a pretensão formulada, está a dar cobertura a um uso ilegal e abusivo de um instrumento ou meio procedimental judicial e a violar os princípios relativos da adequação formal, art. 265º-A, da cooperação, art. 266º, da boa fé processual, art. 266º-A, todos do CPC, bem como do contraditório e do inquisitório, art. 11º do CIRE, bem como o disposto nos arts. 1º, 3º, 9º e 30 do mesmo. O agravado não apresentou contra-alegações. A Mmª Juiz sustentou o despacho recorrido. Foram colhidos os vistos legais. * Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da recorrente – arts. 684º, n.º 3 e 690º do CPC – a questão a dirimir resume-se a saber se a oposição deveria ter sido admitida por nela ter sido invocada a ilegitimidade do Requerente/agravado. * II. FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Os factos que interessam à decisão do agravo são os que constam do antecedente relatório. O DIREITO O objectivo principal do processo de insolvência é a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores. É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas. A declaração de insolvência pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados, verificando-se algum dos factos descritos nas alíneas a) a h) do art. 20º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo DL 53/2004, de 18 de Março, e alterado pelo DL 200/2004, de 18 de Agosto CIRE. Um desses factos é a falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações – al. b). Foi isso que o requerente credor alegou, referindo que o valor do débito da requerida àquele é, neste momento, de € 132.300,00, e reportando circunstâncias que, no seu entender, colocam a requerida numa situação de insolvência, impossibilitando-a de cumprir a generalidade das suas obrigações. O devedor pode afastar a declaração de insolvência não só através da demonstração de que não se verifica o facto indiciário alegado pelo requerente, mas também mediante a invocação de que, apesar da verificação do mesmo, ele não se encontra efectivamente em situação de insolvência – cfr. ponto 19. do preâmbulo do DL 53/2004. Nesta conformidade, o n.º 3 do art. 30º do CIRE determina que a oposição do devedor à declaração de insolvência pretendida pode basear-se na inexistência do facto em que se fundamenta o pedido formulado ou na inexistência da situação de insolvência. No caso dos autos, a agravante/requerida alegou, na sua oposição, nada dever ao requerente, sustentando que este não tem, por isso, legitimidade para promover o presente processo de insolvência. Esta alegada falta de legitimidade tem natureza substantiva, não processual, na medida em que está ligada à existência ou inexistência do direito invocado pelo requerente como sustentáculo do pedido de insolvência. Além da referida invocação, a oposição da agravante deveria observar o disposto no n.º 2 desse artigo 30º, segundo o qual: “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o devedor junta com a oposição, sob pena de não recebimento, lista dos seus cinco maiores credores, com exclusão do requerente, com indicação do respectivo domicílio” – (sublinhado nosso). Compreende-se a necessidade de a requerida listar, nesse momento, os cinco maiores credores, uma vez que o processo de insolvência não permite mais articulados para além da petição inicial e da oposição, seguindo para julgamento logo após a dedução da oposição, quando a haja – v. art. 35º. Aí, se for declarada a insolvência, haverá que designar-se prazo para a reclamação de créditos, sendo citados os cinco maiores credores conhecidos, com exclusão do que tiver sido requerente – v. arts. 36º, al. j) e 37º, n.º 3. Com a inclusão da cominação prevista no art. 30º, n.º 2, o legislador pretendeu obviar a delongas na obtenção da informação sobre os cinco maiores credores da devedora, permitindo assim, no caso de proceder o pedido de insolvência, a rápida citação daqueles. Ora, não obstante ter sido citada com a cominação de que a não junção da lista dos cinco maiores credores determinava o não recebimento da oposição, a verdade é que a agravante não apresentou, como devia, essa lista. Tal circunstância teve como inexorável consequência o não recebimento da oposição. Diz a agravante que não estava obrigada a fazê-lo, na medida em que a sua oposição se fundamenta na inexistência do crédito do requerente e que o pedido formulado por este é infundado. E acrescenta: “Admitir que qualquer pessoa, sem qualquer legitimidade possa vir a juízo requerer a insolvência de outrem, com base em factos falsos e que por via disso, na oposição ou o requerido na sua defesa, tenha, ainda assim, e para que esta tenha validade e seja recebida, de dar cumprimento ao disposto no art. 30º do CIRE, representa desde logo violação do disposto nos arts. 1º, 3º, 9º, 11º e 27º, todos do CIRE”. Começa por dizer-se que não vislumbramos qualquer violação ao disposto nestes artigos, que se referem, respectivamente, à finalidade do processo de insolvência (1º), à situação de insolvência (3º), ao carácter urgente do processo (9º), ao princípio do inquisitório (11º) e à apreciação liminar da petição inicial (27º). Por outro lado, se o pedido do requerente é infundado – como sustenta – pode a conduta deste ser sancionada de duas maneiras: ou em termos de litigância de má fé (art. 456º do CPC aplicável ex vi art. 17º do CIRE), ou mediante o uso do mecanismo previsto no art. 22º do CIRE (dedução de pedido infundado). O que a agravante não podia era dispensar-se do cumprimento da obrigação imposta pelo n.º 2 do art. 30º, cuja razão de ser está ligada aos confessados objectivos da celeridade e eficiência do processo de insolvência – v. pontos 3. e 12. do preâmbulo do DL 53/2004. Evidentemente que se o devedor não tem (outros) credores, a obrigação da apresentação da referida lista não fará qualquer sentido. Nesse caso, o cumprimento do art. 30º, n.º 2 bastar-se-á com a declaração de que não tem credores ou não tem outros credores para além do Requerente – v., neste sentido, Ac. Rel. Évora de 18.01.2007, proc. n.º 885/06-2, em www.dgsi.pt. Contudo, a agravante também nada disse a tal respeito. Parece-nos, assim, que a sua oposição não podia ser recebida – como não foi – adiantando-se também que ao proferir esse despacho de não recebimento a Mmª Juiz não violou, ao contrário do que a agravante afirma de modo incipiente, os princípios da adequação formal, da cooperação ou da boa-fé processual – art. 265º-A, 266º e 266º-A. A Exª Juiz a quo limitou-se a fazer bom uso das regras específicas do processo de insolvência, não merecendo qualquer censura a decisão emitida. * III- DECISÃO Nestes termos, nega-se provimento ao agravo, mantendo-se o despacho recorrido. * Custas pela agravante. * PORTO, 23 de Outubro de 2007 Henrique Luís de Brito Araújo José Manuel Cabrita Vieira e Cunha João Carlos Proença de Oliveira Costa |