Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0644648
Nº Convencional: JTRP00040358
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: PROVA TESTEMUNHAL
INABILIDADE
MUDANÇA
Nº do Documento: RP200705210644648
Data do Acordão: 05/21/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO. APELAÇÃO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO. PROVIDO PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: LIVRO 43 - FLS 133.
Área Temática: .
Sumário: I - O facto de a testemunha arrolada pelo autor ser seu médico psiquiatra e ter elaborado relatórios médicos juntos aos autos não o tornam inábil para depor como testemunha, sendo antes elementos a ponderar segundo o princípio da livre apreciação da prova.
II - São requisitos cumulativos da verificação do “jus variandi”: i) ausência de estipulação em contrário; ii) carácter temporário do exercício das novas funções; iii) existência de interesse sério da empresa (interesse de carácter objectivo, ligado às ocorrências ou situações anómalas na vida da empresa, o que não é confundível com as conveniências do empregador); iv) não modificação substancial da posição do trabalhador e v) tratamento mais favorável (designadamente em termos remuneratórios, que corresponda às novas funções).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório

B………., instaurou acção declarativa de condenação, com processo comum contra C………., Lda, pedindo, a declaração e o reconhecimento, com todas as consequências legais, de que as funções do autor na ré são as de vendedor comissionista, no distrito de Aveiro e no concelho de Vila Nova de Gaia, das quais, sem qualquer fundamento legal ou contratual, foi ilicitamente afastado, em Novembro de 2003, funções que tem direito a exercer efectiva e imediatamente, tal como até esse momento e não quaisquer outras, nomeadamente, as funções administrativa que identificou; a condenação da ré a reconhecer, com todas as consequências legais, que as funções do autor na ré, são as de vendedor comissionista, no distrito de Aveiro e no concelho de Vila Nova de Gaia, das quais, sem qualquer fundamento legal ou contratual, foi ilicitamente afastado, em Novembro de 2003, funções que tem direito a exercer efectiva e imediatamente, tal como até esse momento e não quaisquer outras funções, nomeadamente as funções administrativas identificadas, cujo exercício deve permitir, sob pena de vir a ter de pagar uma sanção pecuniária compulsória, a seguir identificada; a condenação da ré numa sanção pecuniária compulsória do montante diário de 250 euros por cada dia em que não permita que o autor exerça efectivamente as suas funções de vendedor comissionista; a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de 5.000,00 euros, a título de comissões que teria auferido e não auferiu, quando no ano 2000, lhe foi retirada metade do distrito de Aveiro; a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de 14.610,00 euros, que não lhe pagou desde 1989 até ao momento, a título de 1/12 das comissões devidas nos 12 meses imediatamente anteriores às férias anuais que gozou e lhe deveriam ser pagas no mês seguinte àquele em que tenha gozado essas mesmas férias; a condenação da ré pagar ao autor a quantia de 14.914,00 euros, a título de diferença entre as comissões efectivamente pagas, que variavam entre 0,0% e 0,6%, e as comissões a que tinha direito receber à percentagem de 1%, e isto entre 1989 e a data da propositura da presente acção; a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de 2.429,00 euros, a título de diferença no subsídio de férias e de Natal, em virtude de estes terem sido calculados, com base nas comissões efectivamente pagas, que variaram entre 0,0% e 0,6%, e não calculadas, como deviam, em conformidade com as comissões a que tinha direito receber à percentagem de 1%, e isto entre 1989 e a data da propositura da presente acção; a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de 4.529,00 euros, a título de comissões vencidas no ano de 2003 e não pagas; a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de 25.114,00 euros, a título de comissões que este não recebeu, em virtude de ter sido ilicitamente afastado das funções de vendedor comissionista, e não ter efectuado as vendas que identificas, que iria efectuar, de montante global de cerca de 517.500,00 euros; a condenação da ré a pagar ao autor, as comissões, à percentagem de 1%, calculadas sobre a totalidade das vendas efectuadas entre o dia em que ilicitamente o afastou das funções de vendedor e o dia em que passe efectivamente a exercer essas mesmas funções, comissões essas a liquidar em execução de sentença, em virtude de nesta data se desconhecer o seu exacto montante; a condenação da ré a pagar ao autor, a título de dano não patrimonial, a quantia de 150.000,00 euros; a condenação da ré a pagar ao autor as quantias que discrimina, acrescidas de juros de mora, às taxas legais sucessivamente em vigor, vencidos e vincendos desde a data da constituição em mora, ou seja, a data em que deveriam ter sido pagas e não foram.
Alegou, para tanto, e em síntese, que é vendedor comissionista da ré, mas esta afastou-o destas suas funções, obrigando-o a desempenhar outras contra a sua vontade.
Mudou-o do distrito de Aveiro para outras zonas e reduziu a área geográfica onde vendia, o que lhe causou prejuízo.
Não lhe pagou parte das comissões nos subsídios de férias e de Natal, bem como não lhas processou na percentagem fixa de 1%, nem fez repercutir esta nos subsídios de férias e de Natal.
Deve-lhe comissões vencidas no ano de 2003, bem como deixou de recebê-las, em virtude de ter sido afastado das suas funções de vendedor comissionista.
A actuação da ré causou-lhe danos não patrimoniais graves que pretende ver ressarcidos.

A ré contestou aduzindo, no essencial, que a petição inicial é inepta quanto ao pagamento da quantia de € 14.914, a título de diferença entre comissões pagas e as que reclama. O autor não tem direito ao pagamento dos créditos que reclama. Nunca foi acordada uma percentagem fixa de 1% sobre as vendas efectuadas, pelo que também não há lugar ao pagamento de quaisquer diferenças a título de férias e subsídios de férias e de Natal, não tendo o mesmo direito a comissões, quer por não ter feito as vendas que alega, quer porque relativamente às que fez, ainda não terem sido regularizadas. Mais diz que a mudança de zona não prejudicou o autor e que a alteração de funções daquele se deveu à necessidade de reestruturação da ré, sendo, em qualquer caso, garantida a retribuição do trabalhador com referência aos últimos doze meses. E ainda que sempre tratou o autor da mesma forma que o fazia em relação aos outros trabalhadores, não lhe tendo causado qualquer dano não patrimonial. Para além disso, prescreveram os juros devidos há mais de cinco anos.
Conclui pela improcedência da acção.

O autor respondeu, mantendo o alegado inicialmente.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento.

A ré, a fls. 1332 a 1334, interpôs recurso de agravo do despacho de fls. 1203 que considerou que D………., médico do autor, não era inábil para depor nessa qualidade. Concluiu, em síntese a ré que, no caso em apreço existem factores que não permitem garantir ab initio a completa isenção do depoimento médico do psiquiatra D……….. uma vez que esta testemunha é médico particular do autor pelo que estará sempre condicionado no seu depoimento pelo contacto que terá mantido com o autor, pela versão subjectiva e unilateral dos factos que este último lhe terá transmitido e, em última análise, pelo que já escreveu nos relatórios que estão juntos aos autos, esta inabilidade deve ser tanto mais considerada procedente e atento o facto de o autor solicitar da ré uma indemnização por danos morais de euros 150.000,00, para a qual a única prova que apresentou e foi aceite pelo tribunal foram os relatórios do dito médico psiquiatra, pelo que não tendo sido ordenada oficiosamente pelo tribunal uma perícia médica, nos termos do art. 568 do CPC, ficam irremediavelmente postos em causa os princípios do contraditório e da igualdade de armas.

Não foi apresentada contra-alegação.

A ré interpôs também recurso de agravo do despacho de fls. 1202, que lhe indeferiu o adiamento do depoimento de testemunha D………., concluindo que, ao ser indeferido o incidente de inabilidade da referida testemunha, deveria ter sido assegurada a assistência técnica de médico psiquiatra ao mandatário da agravante nos termos do art. 42, n.º 1, do CPC a fim de se assegurar o principio do contraditório e da igualdade de armas; a designação no dia 23.11.2005 da data da inquirição da testemunha médico psiquiatra para o dia 29.11.2005 não possibilitava à ré o exercício do direito conferido no art. 42, n.º 2; não mediavam dez dias, o incidente deveria ter sido admitido, razão pela qual se justificava o adiamento da inquirição da testemunha com vista ao cumprimento do citado art. 42, n.º 2.

Não foi apresentada contra-alegação.

Os recursos foram admitidos como agravos, com subida diferida e efeito devolutivo.

Respondeu-se à matéria de facto, sem reclamações.

Proferida sentença, julgou-se improcedente a arguida excepção e foi a acção julgada parcialmente provada e procedente. Aí se declarou reconhecer, com todas as consequências legais, que as funções do autor na ré são as de vendedor comissionista, na zona norte, das quais, sem qualquer fundamento legal ou contratual, foi ilicitamente afastado, em Novembro de 2003, funções que tem direito a exercer efectiva e imediatamente, tal como até esse momento e não quaisquer outras funções, nomeadamente as funções administrativas identificadas no artigo 26º da petição inicial; condenou-se a ré numa sanção pecuniária compulsória no montante diário de € 100 (cem euros) por cada dia em que não permita que o autor exerça efectivamente as suas funções de vendedor comissionista; condenou-se a ré a pagar ao autor a quantia que vier a liquidar-se em fase de execução de sentença, a título de 1/12 das comissões devidas nos 12 meses imediatamente anteriores às férias anuais que gozou e lhe deveriam ser pagas no mês seguinte àquele em que tenha gozado essas mesmas férias; condenou-se a ré a pagar ao autor a comissão correspondente à venda do equipamento no montante de € 169.591, efectuada ao cliente E……….., logo que seja vendida a retoma que entrou no negócio; condenou-se a ré a pagar ao autor a diferença entre a retribuição paga por aquela a este e aquela que poderia auferir caso tivesse continuado nas vendas, no montante que vier a liquidar-se em fase de execução de sentença; condenou-se a ré a pagar ao autor, a título de dano não patrimonial, a quantia que vier a liquidar-se em fase de execução de sentença; condenar a ré a pagar ao autor juros de mora, às taxas legais sucessivamente em vigor, actualmente de 4% ao ano, vencidos e vincendos, desde a data em que deveriam ter sido pagas ao A. as quantias referidas. Absolveu-se a ré do pedido quanto ao mais.

Inconformada com esta decisão dela recorre de apelação a ré, concluindo que a mudança de categoria do autor encontra arrimo em “processo de reestruturação empresarial” conduzido pela ré, sendo a mesma lícita pelo motivo de se encontrarem preenchidos os respectivos requisitos legais (interesse fundamentado da empresa ré na alteração da prestação de trabalho do autor, conforme pontos 61º a 69º da matéria de facto; não ter havido diminuição da retribuição nem abaixamento da “categoria – função” e/ou “categoria – estatuto” do autor – vide pontos 69º, 1º, 15º e 32º da matéria de facto), razão pela qual, sendo a mudança de categoria lícita, não havia justificação para a condenação da ré na parte em que a douta sentença foi objecto do presente recurso, competia ao autor a alegação e prova de que as novas funções que lhe foram atribuídas pela ré, em resultado da reestruturação empresarial operada, correspondiam a um abaixamento da categoria profissional de vendedor – vide artigo 342º, n.º 1 do Código Civil, o que aquele não fez; de qualquer forma, as novas funções determinadas pela ré ao autor correspondem à categoria de “apontador”, as quais estão em nível igual (“apontador menos de um ano” – nível 10) ou superior (“apontador mais de um ano” – nível 9) às de vendedor (nível 10 do CCTV do Sector Automóvel), funções estas que, para além disso, o autor já desempenhou no passado – vide pontos 1º, 15º e 32º da matéria de facto e carta da ré de 12.11.2003; caso este Colendo Tribunal considere que a alteração das funções (e categoria) do autor é ilícita, o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio, mesmo neste caso não assiste razão ao tribunal recorrido ao condenar a ré nos pontos 1º, 2º, 5º e 6º da parte decisória da sentença; quanto à condenação da ré a pagar ao autor o diferencial de comissões (ponto 5º da parte decisória da sentença), a mesma deve ser revogada porquanto a premissa de que parte o pedido formulado pelo autor – sua substituição pelo vendedor F………., que veio exercer as mesmas funções do autor para a ré em igual zona geográfica – não se verificou (vide pontos 56º a 59º da matéria de facto); ainda que a conclusão anterior não proceda, o que apenas academicamente se configura como hipótese de raciocínio, a condenação da ré a liquidar em execução de sentença deve ficar limitada no tempo, no espaço e no objecto, ou seja: ao pagamento do valor correspondente às comissões das vendas de equipamentos “heavy” efectuadas no distrito de Aveiro e concelho de Vila Nova de Gaia (vide ponto 9º dos factos provados) entre 12.11.2003 e 01.07.2005 (data em que o autor rescindiu o contrato de trabalho), calculadas de acordo com os critérios seguidos pela Ré e expostos sob o número 41º dos Factos Provados (vide sentença a fls. 1455), a que há a deduzir o valor da retribuição paga efectivamente pela ré ao autor, no mesmo período, sendo certo que se o valor de comissões for igual ou inferior ao valor da retribuição paga pela ré ao autor, nada esta lhe tem a pagar; no que concerne agora à condenação da ré no pagamento de danos morais ao autor deve também a mesma ser revogada por este tribunal na medida em que não podia o tribunal ou o Juiz a quo condenar a ré no pagamento de uma indemnização a este título, a relegar em execução de sentença quando o autor não fez prova dos factos exigidos por lei para a existência dessa obrigação de indemnizar (vide pontos 76º e 77º da matéria de facto); na hipótese da conclusão anterior não proceder, situação que apenas se configura como hipótese de raciocínio, estava vedado ao Sr. Juiz, por força do artigo 661º, n.º 2 do CPC, relegar para execução de sentença a liquidação da respectiva indemnização; finalmente, também a condenação da ré a reintegrar o autor nas suas funções de vendedor e no pagamento de sanção pecuniária compulsória, deve ser alterada, caso o pedido de rectificação de erros materiais não seja atendido pelo Sr. Juiz a quo (vide “Questão Prévia” atrás deduzida), devendo a Ré ser absolvida do respectivo pedido face à extinção, por iniciativa do autor, da relação laboral em 01.07.2005; foram, pois, violados os artigos 23º (a contrario sensu) da LCT, 342º, n.º1 do CC, 661, n.º 2, do CPC e as cláusulas 4º, 5ª e 7ª do CCTV para o Sector Automóvel; ao contrário do referido pelo Sr. Juiz a quo, o artigo 22º da LCT (“ius variandi”) não se aplica aos casos de “reestruturação empresarial”, como foi o caso da levada a cabo pela ré com respeito ao autor.

O autor não contra-alegou.

Irresignado também com aquela decisão dela recorre de apelação autor, concluindo em síntese que: se verificam os pressupostos legais que permitem a modificação da matéria de facto; devem dar-se como provados os factos que a sentença deu como não provados, bem como devem dar-se como totalmente provados factos que apenas restritivamente o foram, com base no teor integral do relatório pericial e dos esclarecimentos prestados fls. 588 a 593 e 1370, mapas de comissões de 1989, 1990 e 1991, fls. 908, 911, 913, 916, 917, 918, 919, 920 e 923. Comunicação interna de 2001, fls. 1382 a 1383, 6 facturas, que dizem respeito às vendas feitas por F………., no local de trabalho do recorrente e no ano seguinte à retirada de funções em Novembro de 2003, de montante global de 774.081,58 euros – documentos 2, 3, 5, 6, 7 e 8 juntos aos autos pela recorrida em 2.12.2004 e documentos de fls. 1303 e 1304; o local de trabalho do recorrente nos termos contratuais era o distrito de Aveiro e concelho de Vila Nova de Gaia e não a zona norte, como refere a sentença recorrida e apenas com o acordo do recorrente podia ser alterado; por causa da retirada de ½ do distrito de Aveiro no ano de 2000 o recorrente viu as suas vendas e consequentemente comissões, ilicitamente reduzidas, sofrendo por isso um dano patrimonial do qual deve ser indemnizado; a simples retirada e o consequente prejuízo patrimonial é um facto notório e que contrariamente ao afirmado na decisão recorrida; o recorrente com apenas metade do distrito de Aveiro fez vendas de montante de, à época, 100.810.000$00, conferindo-lhe o direito a comissões de valor superior a 5.000 euros; o recorrente terá, assim, direito a igual quantia, ou então, às comissões geradas pelas vendas feitas no seu local de trabalho, por quem o foi substituir, a liquidar em execução de sentença, ou a apurar de acordo com outro critério que os julgadores reputem mais adequado e justo para reconstituir o mais aproximadamente possível, esfera-jurídico patrimonial do recorrente, não fora essa retirada; o recorrente e recorrida acordaram no início de 1989, aquando do início de funções de vendedor comissionista, que este receberia, por cada venda – preço real – que efectuasse, uma comissão de 1% sobre o valor da mesma – deduzido apenas o valor da retoma, em caso de existir; esta comissão foi mantida pela recorrida nos anos de 1989, 1990 e 1991; a partir de 1992 a recorrida, de forma unilateral, sem acordo do recorrente e violando o contrato e lei laboral, alterou, por várias vezes, tal método, tornando-a uma fórmula matemática, complicada, ao ponto de, em 2001, ter que ser esclarecida através de uma comunicação interna, pois introduziu-lhe vários factores, concretamente preço de tabela mínimo, preço de venda de tabela, reparações, crédito de peças e equipamentos complementares, a ter em linha de conta e introduzindo ainda o valor, novo de 2% para, na aparência, que não na realidade, a tornar mais atractiva; estas alterações de fórmula apenas contribuíram para um benefício da recorrida e um prejuízo do recorrente, pois a média de comissões pagas a este foi de apenas 0,74% sendo consequentemente credor da diferença, ou seja de 026%; o valor global de vendas efectuadas pelo recorrente até à data da retirada de funções, 6 de Novembro de 2003, ascenderam a, pelo menos, 9.616.306,40 de euros, identificados no art. 8 destas alegações e os clientes aí identificados e em 109 vendas; a recorrida neste universo de vendas pagou ao recorrente comissões superiores a 1% em 5 dessas 109 vendas; a sentença recorrida, no que concerne às consequências da decretada ilicitude e retirada de funções de vendedor comissionista ao recorrente em Novembro de 2003, não retirou as consequências adequadas e razoáveis, previstas na lei, argumentando com base nas seguintes 2 premissas:
- Que a recorrida assegurou ao recorrente, no exercício das novas funções, retribuição igual à auferida nos 12 meses anteriores
- na hipótese de se provar que o trabalhador, caso continuasse nas vendas, auferiria uma retribuição superior à proposta e paga pela empregadora, terá direito a que esta lhe pague a diferença; a recorrida não provou que tenha assegurado ao recorrente, nas novas funções retribuição igual à auferida nos 12 meses anteriores; a sentença recorrida, ao afirmar que o recorrente na hipótese de se provar que o trabalhador caso continuasse as vendas, auferiria uma retribuição muito superior, cai em algo sem sentido, não se vislumbrando como é que se pode concretizar, dar vida e existência, tornar útil este comando; o recorrente após tal retirada deixou de efectuar vendas e de receber as respectivas comissões, encontrando-se consequentemente, a sua esfera jurídica afectada por uma LESÃO, não justificada e ilícita, a qual deve ser reparada, e reconstituída a situação anterior, com maior grau de aproximação, razoabilidade e justiça social; o critério mais adequado para reparar tal dano patrimonial será condenar a recorrida a pagar-lhe a comissão de 1% calculada, nos termos referidos nestas alegações, ou seja deduzido ao preço da venda, apenas o valor da retoma, sobre cada venda efectuada no distrito de Aveiro e concelho de Vila Nova de Gaia, entre a data da retirada de funções e o momento da cessação do contrato, 1 de Julho de 2005, cujo valor deve ser relegado para liquidar em execução de sentença; a matéria de facto dada como provada permite desde já a fixação de indemnização a título de danos não patrimoniais, a qual atenta a gravidade, extensão, profundidade do dano sofrido e que continuará a sofrer deve ser de valor adequado, razoável e justo, fixando-se dentro de valor pedido pelo recorrente; é a seguinte a matéria dada como provada a esse respeito:
Em meados de 2003 o recorrente tinha 54 anos de idade.
Nessa data a recorrida fez cessar imediatamente o contrato de trabalho, sem estar disposta a indemnizá-lo, adequada, razoável e justamente.
Como não conseguiu os seus intentos a recorrida ilícita e extrajudicialmente, forçou o recorrente a rescindir o contrato, o que conseguiu, 2 anos mais tarde e por iniciativa do recorrente, consubstanciando um despedimento indirecto.
À data da retirada de funções ao recorrente, este era trabalhador da recorrida havia quase 23 anos
O recorrente sempre trabalhou para a recorrida com todo o zelo, respeito, fidelidade, empenho, competência, saber, sabedoria e inteligência e com total e integral assiduidade, qualidades que esta sempre lhe reconheceu
Por causa da conduta ilícita da recorrida o recorrente viu a sua saúde seriamente afectada a qual o incapacitou para o trabalho e o obrigou a recorrer a baixa médica e sentiu-se injusta e precocemente atirado para fora do mundo laboral e inútil
A baixa médica iniciada em 13 de Dezembro de 2003 e que durou 18 meses e 15 dias, foi a que o recorrente recorreu desde o início da vigência do contrato
O recorrente viu a sua relação laboral como um casamento para a vida planeando e acreditando que da empresa transitaria directamente para a reforma
Atenta sua idade, o recorrente nunca mais terá possibilidades reais e sérias de encontrar emprego como o que tinha na recorrida, quer pela retribuição auferida quer pela importância desta no mercado nacional e internacional
O recorrente, cessada a baixa médica, apresentou-se ao trabalho para desempenhar as novas funções, porém, como não tinha tido forças e capacidades para tal, após trabalhar os dias 27 a 30 de Junho, no dia 1 de Julho de 2005, resolveu, com justa causa, o contrato, conforme consta da certidão judicial junta aos autos extraída da acção de processo comum …/05.9TTVNG, também pendente – intentada pelo recorrente contra a recorrida – no .º de Juízo do tribunal de Trabalho de VNG, facto que deve ser atendido, com todas as consequências jurídicas ao abrigo do disposto no art. 663 do CPC
Desde então encontra-se desempregado a receber o respectivo subsídio. O recorrente como refere o médico psiquiatra Dr. D………., que o acompanhou e tratou e continuará a acompanhar e tratar no futuro, por causa da conduta da recorrida, sentiu, sente e sentirá no futuro, a longo prazo, por mais 5, 10 anos, stress, assemelhado a stress pós traumático de guerra, usando a linguagem daquele médico, desgosto, tristeza e angústia; a douta sentença proferida na parte em que aqui é impugnada decidindo no sentido em que o fez violou os artigos 342 e 483, do Código Civil, 661 e 663 do CPC, artigos 19, 21 a 24, 82 a 85 da Lei do Contrato de Trabalho, revogada pela actual legislação em vigor aplicável ao contrato dos autos, no que concerne à matéria de facto deve ser a mesma reapreciada e modificada no sentido pedido neste recurso, bem como seja também reapreciada a aplicação do direito que na mesma foi feita e a final, na parte em que julgou acção não provada e improcedente, seja a mesma revogada, com todas as consequências legais, e substituída por outra que julgue a acção provada e procedente, nos termos pedidos, conforme for de direito.

A ré apresentou contra-alegação, pugnando pelo não provimento do recurso do autor.

A Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação emitiu parecer no sentido de que dos recursos interpostos pelas partes, merece parcial provimento a apelação da ré.

A ré respondeu ao aludido parecer discordando do entendimento deste quanto aos agravos, bem como quanto aos pontos 1 e 2, relativos à sua apelação.

Recebidos os recursos foram colhidos os vistos legais.

2. Matéria de Facto

Na primeira instância foram dados como provados os seguintes factos:
1.º- Por contrato de trabalho a prazo, escrito, datado de 16 de Fevereiro de 1981, a demandada admitiu ao seu serviço o demandante para trabalhar para a mesma, na sua filial de ……….., Vila Nova de Gaia, sendo o local de trabalho a zona Norte, podendo definir-se outro local desde que acordado entre ambas as partes, com a categoria profissional, no âmbito administrativo, de apontador oficinal, na secção de controlo e todos os serviços no âmbito da actividade da empresa, compatíveis com a categoria atribuída, pelo prazo de 6 meses, com início de vigência no dia 16 de Fevereiro de 1981, que incluiu um período experimental de 2 meses, prazo renovável por iguais períodos, se nenhuma das partes o denunciar nos termos legais, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, mediante o vencimento mensal, à época de 15.000$00, hoje 74,82 euros, beneficiando das regalias dadas pela P.R.T. para a indústria metalúrgica e metalomecânica, convenção pela qual se regeriam as ligações enquanto durasse o trabalho a prazo, conforme documento junto aos autos a fls. 34;
2.º - Em Janeiro de 1989, por mútuo acordo com a demandada, o demandante, que tinha a categoria profissional de escriturário de 2ª, passou a desempenhar as funções de vendedor comissionista, concretamente de máquinas industriais e equipamentos de vibração e compactação, no distrito de Aveiro e no concelho de Vila Nova de Gaia, mantendo o mesmo salário, sendo que a diferença que recebia a mais relativamente aos vendedores, seria descontada nas comissões a receber, conforme documento junto aos autos a fls. 35 e 36;
3.º - Funções que desempenha, ininterruptamente, há quase 14 anos;
4.º - O demandante passou a auferir comissões sobre o valor das vendas que efectuava;
5.º - O demandante para além dessa comissão, tinha ainda direito à retribuição fixa mensal, ilíquida, a qual teve, ainda em escudos, a seguinte progressão:
- Fevereiro de 1990: 58.000$00 e a quantia de 41.400$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 1991: 65.000$00 e a quantia de 44.000$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 1994: 68.000$00 e a quantia de 60.500$00, a título de ajudas de custo; Maio de 1995: 70.300$00 e a quantia de 57.750$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 2000: 100.000$00 e a quantia de 55.000$00, a título de ajudas de custo; Abril de 2003: 498,80 euros e a quantia de 325,00 euros, a título de ajudas de custo;
6.º - O demandante, na data da propositura da presente acção, ainda se encontra ao serviço da demandada, embora com outras funções, concretamente as de vendedor comissionista iniciadas em Janeiro de 1989; [1]
7.º - Posteriormente, no ano de 2000, foi-lhe retirado metade do distrito de Aveiro, mantendo também o concelho de Vila Nova de Gaia;
8.º - Nos anos de 2001 – no mês de Novembro – e 2002, foi transferido para os distritos de Braga e Viana do Castelo;
9.º - Em Novembro de 2002, foi de novo transferido para todo o distrito de Aveiro e para o concelho de Vila Nova de Gaia, tal como se encontrava no início do exercício das funções de vendedor comissionista;
10.º - Desde o início de vigência do contrato o demandante sempre trabalhou para a demandada, com todo o zelo, respeito, fidelidade, empenho, competência, saber, sabedoria e inteligência e com total e integral assiduidade;
11.º - Qualidades que a demandada sempre reconheceu na pessoa do demandante;
12. º - O demandante, apenas com metade do distrito de Aveiro, efectuou vendas cujo valor global, à época ainda em escudos, ascenderam ao montante de 100.810.000$00, dos seguintes valores parcelares e feitas às seguintes pessoas:
- H………., Lda.: 6.400.000$00
- I……….: 17.860.000$00
- J………., Lda.: 15.500.000$00
- L………., Lda.: 5.800.000$00
- M……….: 4.000.000$00
- N………., S.A.: 18.500.000$00
- O……….: 8.500.000$00
- P……….., Lda.: 19.400.000$00
- Q………., Lda.: 4.850.000$00
13.º - A demandada, desde 1989, e relativamente às vendas constantes dos documentos de fls. 52 a 113, pagou ao da mandante comissões que variavam entre 0,15% e 2,00% e cuja média de comissões sobre as mesmas vendas é de 0,74%;
14.º - A demandada propôs ao autor uma negociação para a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho na sequência da reestruturação da empresa;
15.º - A demandada por carta de 12 de Novembro de 2003, comunicou ao demandante, que a partir dessa data, não mais exerceria as suas funções de vendedor comissionista e passava antes a prestar colaboração na área do controle oficinal, com as seguintes tarefas: elaboração de folhas de saída de caixa;
- arquivo de folhas de serviço;
- manutenção do arquivo dos processos de máquinas;
- levantamento e expedição de correspondência;
- efectuar depósitos (bancos);
- classificação de facturas de fornecedores.
16.º - O demandante respondeu à demandada por e-mail e por carta registada com aviso de recepção, respondeu por carta do dia 13 de Novembro de 2003, comunicando que não aceitava exercer as novas funções e pretendia manter as suas de vendedor comissionista;
17.º - O demandante gozou alguns dias de férias e de seguida iniciou um período de baixa;
18.º - O demandante apresentou propostas de venda aos respectivos interessados como consta de fls. 122 a 158;
19.º - O demandante pretende continuar a exercer as funções de vendedor comissionista;
20.º - O autor nasceu em 22/03/1949;
21.º - O autor não pretendia a cessação do contrato de trabalho;
22.º - A mudança de zona implicou para o autor um período de adaptação;
23.º - Em primeiro lugar, no dia 28 de Julho de 2003, o demandante foi convocado pelo seu superior hierárquico para estar presente no dia 31 de Julho, às 10.30 horas, numa reunião em ……….., Lisboa, quando a reunião era em Vila Nova de Gaia;
24.º - De novo, no dia 23 de Setembro de 2003, o autor foi convocado pelo seu superior hierárquico para um curso de formação, a realizar nas novas instalações em ………., Lisboa, nos dias 2 e 3 de Outubro, onde estariam presentes, para além do demandante, mais 18 vendedores de todo o país, o qual teria como objecto formação final e entrega do sistema de apoio comercial (SFA), sendo que o dia atribuído a si era o dia 2;
25.º - No dia 2 de Outubro de 2003, o autor em cumprimento da convocatória recebida às 9.30 horas, estava presente em Lisboa, a fim de se submeter à formação em causa;
26.º - Situação de que todos os colegas do autor imediatamente se aperceberam;
27.º Foi-lhe entregue um outro veículo automóvel para regressar ao seu local de trabalho;
28.º - No dia 27 de Outubro de 2003, realizou-se pelas 10 horas nova reunião de vendedores em ………., Lisboa, não tendo o autor sido convocado no dia 24 para a mesma;
29.º - O autor enviou à ré em 28/10/2003 um e-mail como consta de fls. 163;
30.º - De novo o autor por carta registada com aviso de recepção, fax e e-mail, de 4 de Novembro de 2003, comunicou à ré, fundamentadamente, as razões pelas quais não aceitava ser apartado das suas funções de vendedor comissionista, pedindo mais uma vez para nas mesmas ser mantido, em virtude de tal atitude ser ilegal e injusta;
31.º - O autor, por carta registada com aviso de recepção de 10 de Novembro de 2003, comunicou à ré que obedecia a essas ordens, apesar de as mesmas serem ilegais, reiterando o seu pedido de ser mantido nas funções de vendedor, alertando para as consequências legais dessa conduta, nomeadamente fazer incorrer a empresa em responsabilidade civil, decorrente dos danos não patrimoniais causados;
32.º - Por carta de 12 de Novembro de 2003, a ré comunicou ao autor que as suas novas funções eram as de colaborador na área do controle oficinal, com as tarefas já identificadas no artigo 26º desta petição inicial;
33.º - O autor, por carta registada com aviso de recepção de 13 de Novembro de 2003, comunicou à ré que não aceitava a cessação das funções de vendedor pretendida por esta;
34.º - O autor acompanhou o vendedor F………. na visita aos clientes;
35.º - O autor submeteu-se a tratamento e acompanhamento médico e psiquiátrico e recorreu a baixa médica, situação em que se encontra nesta data;
36.º - Nunca foi acordada por escrito ou verbalmente, entre o autor e a ré, a percentagem fixa de 1% sobre as vendas efectuadas, sem a ponderação de quaisquer outros factores de cálculo;
37.º - Todas as comissões pagas ao autor foram determinadas de acordo com os sucessivos métodos de cálculo adoptados pela ré, os quais foram, desde o início do contrato, comunicados ao autor;
38.º - Desde 1989 (início da actividade do autor como vendedor) e até hoje foram três os métodos de atribuição de comissões adoptados pela ré;
39.º - Até 1992 o cálculo das comissões obedecia às seguintes regras:
(a) O preço de venda de tabela de um equipamento (sem descontos) correspondia a uma comissão de 1%;
(b) O valor da eventual retoma do equipamento ao cliente era abatido ao valor da venda e o vendedor recebia a sua comissão sobre o diferencial desse valor;
(c) O apuramento do valor base para o cálculo da comissão era feito do seguinte modo: Preço da venda - valor de aquisição da retoma = Preço de Venda Real (PVR);
(d) A comissão é calculada sobre este valor, recorrendo a uma “regra de três simples”: se o preço de venda de tabela corresponde a 1%, o PVR corresponderá a x%;
(e) A percentagem assim obtida é depois multiplicada pelo valor base, obtendo-se, assim, o valor da respectiva comissão;
(f) Ao valor da comissão assim obtido, o responsável por cada sucursal da ré poderia atribuir um prémio adicional, excepcional e não obrigatório, calculado caso a caso e dentro de determinados parâmetros, como por exemplo o facto de se tratar da captação de um novo cliente ou da compra ser efectuada a pronto pagamento;
(g) Quem vendia a retoma recebia a comissão sobre o valor dessa venda, podendo ser o mesmo vendedor que realizou o negócio ou outro;
40.º - Entre os anos de 1992 e 2000, a atribuição de prémios de vendas era feita de acordo com as regras explanadas na directiva interna que são, resumidamente, as seguintes:
(a) As comissões de vendas poderiam ascender aos 2% nos casos em que os equipamentos fossem vendidos ao preço de venda de tabela, sem retomas, sem imobilizações financeiras e sem quaisquer créditos especiais;
(b) O apuramento do valor base para o cálculo da comissão era feito do seguinte modo: Preço de venda (valor do contrato) – Valor de aquisição da retoma + valor da venda da retoma = Preço de Venda Real (PVR);
(c) A comissão era calculada sobre este valor, recorrendo a uma “regra de três simples”: se ao preço de venda de tabela correspondia uma percentagem 2%, ao PVR haveria de corresponder uma percentagem de x%;
(d) A percentagem assim obtida é depois multiplicada pelo valor base, obtendo-se, assim, o valor da respectiva comissão;
(e) Ao valor da comissão assim apurado poderiam acrescer outros valores referentes à conquista de novos clientes ou prémios de tesouraria (valores recebidos num prazo de 30 dias após a entrega do equipamento);
41.º - Desde o ano de 2000 até à data, o método de cálculo adoptado pela ré para determinar as comissões das vendas de máquinas é o seguinte:
(a) O preço de venda de tabela de um equipamento (sem descontos) corresponde a uma comissão de 1%;
(b) Numa primeira fase, é feito o apuramento do valor base para o cálculo da comissão, o qual corresponde aos valores recebidos [preço real de venda da máquina nova (PRV) + valor recebido pela “retoma” (diferença entre o preço de compra e o preço de venda da “retoma”)] menos os créditos concedidos ao comprador (em peças ou serviços);
(c) Numa segunda fase, para apurar o valor da respectiva percentagem, é feita uma “regra de três simples”, ou seja se o preço de venda ao público (PVP) corresponde a 1%, o valor base apurado nos termos acima descritos haveria de corresponder a x%;
(d) A percentagem assim obtida é depois multiplicada pelo valor base, obtendo-se, assim, o valor da respectiva comissão;
42.º - Quanto à venda das retomas, a ré adoptou, desde 1992, o seguinte método de cálculo:
- No caso da retoma ser revendida pelo vendedor que a negociou, o saldo entre o valor de aquisição da retoma e o valor de revenda da mesma (positivo, negativo ou nulo) é, como acima se disse, incluído no valor base para apuramento da comissão devida ao vendedor;
- No caso da “retoma” ser revendida por outro vendedor, a comissão corresponde a um dos seguintes valores:
a) a 2% se o preço de revenda for igual ou superior ao preço de aquisição da retoma + custos de preparação, reparação e transporte;
b) a 1,5% se o preço de revenda for inferior ao preço de aquisição da retoma + custos de preparação, reparação e transporte;
43.º - As comissões das vendas só são pagas pela ré aos seus vendedores quando o equipamento vendido se encontra completamente “regularizado” (pago) pelo cliente, incluindo a revenda da “retoma” que eventualmente tenha entrado no negócio;
44.º - O pagamento das comissões depende do cumprimento de um processo interno na empresa da ré para processamento do respectivo valor, o qual se estende normalmente por cerca de três meses e se consubstancia nas seguintes fases 1) aprovação pelo director comercial; 2) confirmação do pagamento da máquina e da eventual retoma pelo departamento de crédito; 3) aprovação pela direcção de máquinas; 4) processamento pelo departamento de recursos humanos;
45.º - Os documentos juntos com a p.i. sob os números 82, 83 e 84 são simples propostas de compra e venda que se inserem na primeira fase do processo interno da ré de pagamento de comissões;
46.º - Relativamente ao negócio no montante de € 113.975,00 que o autor diz ter realizado, o cliente S………., Lda. desistiu da compra do equipamento, não havendo qualquer venda;
47.º - No que respeita ao negócio realizado com a firma T………., Lda, no valor de € 169.591,00, o equipamento foi vendido e paga a respectiva comissão;
48.º - No que concerne à venda do equipamento no valor de € 169.591,00 à firma E………., Lda., a retoma que entrou no negócio ainda não foi vendida, não estando, por isso, o negócio “regularizado”;
49.º - A ré só procede ao pagamento das comissões de venda após os negócios se encontrarem totalmente “regularizados”;
50.º - A alteração das zonas de actuação dos vendedores é uma política há muito implantada na empresa ré, tendo já sido vários os vendedores objecto de mudanças de zona;
51.º - A Direcção de Vendas da ré sempre propôs alterações dos métodos de trabalho com o objectivo de melhorar a performance dos vendedores e a sua produtividade;
52.º - Evitando simultaneamente os aspectos negativos inerentes à permanência do mesmo vendedor em determinada zona de actuação durante um período de tempo mais ou menos longo;
53.º - No ano de 2000, actuando em metade do distrito de Aveiro e no distrito de Vila Nova de Gaia, o autor vendeu um total de oito máquinas novas;
54.º - Já em 2001 e 2002, com os distritos de Braga e Viana do Castelo a seu cargo, o autor vendeu dezasseis e nove máquinas novas, respectivamente;
55.º - De Novembro de 2002, altura em que regressou aos distritos de Aveiro e Vila Nova de Gaia, por sinal os distritos que o autor sempre desejou para si, até Dezembro de 2003, o autor apenas vendeu duas máquinas;
56.º - O vendedor F………. não foi admitido ao serviço da ré para o substituir;
57.º - O autor desenvolve e sempre desenvolveu a sua actividade exclusivamente no mercado de equipamento pesado (heavy) – escavadoras, dumpers, pás-carregadoras, cilindros e pavimentadoras;
58.º - Enquanto o vendedor F………. foi contratado pela ré, em Abril de 2003, com o objectivo específico de promover e dinamizar as vendas dos equipamentos “light” - rectro-escavadoras e mini-escavadoras - sendo um especialista neste mercado;
59.º - Os dois sectores (heavy e light) são completamente distintos um do outro, tendo em conta os equipamentos, suas características e âmbito de actuação dos vendedores, não se podendo considerar sectores concorrenciais, mas sim mercados paralelos;
60.º - A actividade prosseguida pela ré consiste nomeadamente no comércio de máquinas para a construção civil e obras públicas, bem como a reparação dos mencionados equipamentos;
61.º - O volume de negócios desceu nos anos de 2002 e 2003;
62.º - A ré pretende proceder a uma reestruturação da sua parte comercial, com vista a reduzir custos de exploração, com o objectivo de salvaguardar a rentabilidade mínima do seu negócio de máquinas para construção civil e obras públicas;
63.º - Tal reestruturação foi aconselhada pelas próprias fábricas de que a ré é representante no nosso país (nomeadamente pela G……….);
64.º - Essa reestruturação implicou, ao nível da sucursal da ré de Vila Nova de Gaia, uma diminuição da força de vendas, constituída pelos seguintes vendedores:
1. U………, chefe de vendas da Ré, admitido em 01.03.1987;
2. O autor, B……….., cujo exercício de funções de vendedor ocorreu em Fevereiro de 1989.
3. V………., vendedor, contratado em 2.04.1990, especificamente para a zona de Trás-os-Montes, zona esta onde reside e exerce a sua actividade (vendedor residente);
4. W………., vendedor da Ré desde 4.02.1998;
5. X……….., vendedor desde 2.05.2001, com contrato a termo certo;
65.º - A ré negociou com o vendedor W………., detentor de menor antiguidade relativamente ao autor, a cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo, justificada com base na dita reestruturação, tendo cessado o respectivo contrato em 12.11.2002;
66.º - E denunciou o contrato a termo certo existente com o vendedor X………., com efeitos a contar de 12.11.2002;
67.º - A ré propôs a cessação do contrato de trabalho ao autor:
- O Sr. U………. era chefe de vendas e, além disso, tinha uma antiguidade superior a qualquer dos outros dois vendedores - Sr. V………. e o autor - sendo também um “comercial”.
- O vendedor V………, para além de ter uma antiguidade no posto inferior ao autor, de apenas 1 ano e dois meses, sendo ambos efectivos, tinha a particularidade de ser um vendedor “residente” na zona de Trás-os-Montes;
68.º - O autor não aceitou a proposta da ré e não apresentou qualquer contraproposta indemnizatória;
69.º - A ré assegurou ao autor, no exercício das suas novas funções, retribuição não inferior à média dos últimos doze meses auferidos na função de vendedor;
70.º - O autor gozou um período de férias de dezanove dias úteis com início em 14.11.2003;
71.º - Após o termo das férias, o autor entrou de baixa médica em 9.12.2003, situação esta em que ainda hoje se encontra;
72.º - Por lapso da ré, o autor foi convocado para uma reunião com a sua Directora de Recursos Humanos – Y………. – em ………., quando o local da reunião eram as instalações da ré em Vila Nova de Gaia.
73.º - De facto, nessa mesma data (31.07.2003), a Directora de Recursos Humanos da ré deslocou-se propositadamente a Vila Nova de Gaia para a reunião com o autora, só aí lhe sendo comunicado que este último se encontrava nas instalações da ré em ……….;
74.º - Face a este lapso, a Directora de Recursos Humanos da ré contactou de imediato o autor para esclarecer o mal entendido, tendo-se a reunião acabado por realizar ainda nesse mesmo dia, em Vila Nova de Gaia, da parte da tarde;
75.º - A reunião em causa tinha previstos dois dias de trabalho, para dois grupos de vendedores diferentes;
76.º - No primeiro dia (2.10.2003) a reunião tinha duas vertentes: da parte da manhã, formação de CRM e durante a tarde formação de produtos de construção civil;
77.º - Que alguns dos vendedores convocados para a reunião do dia 2.10.2003 – na qual esteve presente o autor – não puderam estar presentes, por razões profissionais, o que levou a ré a ter que alterar, no próprio dia, a ordem de trabalhos estabelecida, ocupando toda a reunião com a formação em CRM;
78.º - O autor, já tinha participado, no dia 16 de Setembro de 2003, numa formação de informática e CRM em tudo semelhante à do dia 2.10.2003, motivo pelo qual, a ré achou não ser necessária a sua presença da parte da tarde, uma vez que já tinha conhecimento das questões que iriam ser abordadas, não havendo assim necessidade de estar ausente do seu local de trabalho.
79.º - O autor fez cessar por sua iniciativa em 1.07.2005 o contrato de trabalho que o ligava à ré.[2]

3. O Direito

De acordo com o preceituado nos artigos 684, n.º 3 e art.º 690, n.º s 1 e 3, do Código de Processo Civil[3], aplicáveis ex vi do art. 1, n.º 2, alínea a) e art.º 87 do Código de Processo do Trabalho, é pelas conclusões que se afere o objecto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Importa, assim, apreciar:

A) 1.º Recurso de agravo da ré
Inabilidade da testemunha D……….. e violação do principio do contraditório e da igualdade de armas.

B) 2.º Recurso de agravo da ré
Adiamento da inquirição para assegurar assistência técnica ao mandatário da ré e violação do principio do contraditório e do principio da igualdade de armas

C) Recurso de apelação do autor.
1. Impugnação da matéria de facto
2. Consequências, em termos de comissões, da retirada de metade do distrito de Aveiro como área de vendas do autor.
3. Alterações quanto ao modo de cálculo das comissões e suas implicações.
4. Consequências da mudança de funções ordenada pela ré
5. Fixação de indemnização por danos não patrimoniais

D) Recurso de apelação da ré.
1. Validade da mudança de funções por si imposta ao autor
2. Inexistência de diferencial a título de comissões devido ao autor
3. Inexistência da obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais
4. Consequências da extinção da relação laboral por iniciativa do autor em 1.07.2005.

De harmonia com o preceituado no art. 710, a apelação e os agravos que com ela tenham subido são julgados pela ordem da sua interposição. No caso vertente, dado que os agravos foram interpostos pela ré, conhecer-se-á desses recursos.

3 A) Pretende a ré, ora agravante, que D………., médico psiquiatra, apresentado como testemunha do autor, é inábil para depor nessa qualidade, face ao contacto que terá mantido com aquele e, porque, solicitando o autor da ré uma indemnização por danos morais de euros 150.000,00, a única prova que apresentou e foi aceite pelo tribunal foram os relatórios desse médico.
Adianta-se já que não assiste razão à ré. Com efeito, resulta dos artigos 616 e 617, que: “Têm capacidade para depor como testemunhas todos aqueles que não estando interditos por anomalia psíquica, tiverem aptidão física e mental para depor sobre os factos que constituem objecto de prova”.
Estão ainda impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes.
Resulta, com clareza, daqueles normativos que o legislador consagrou o principio da capacidade da generalidade das pessoas para deporem como testemunhas, desde que não se encontrem em qualquer das situações ali previstas e que, obviamente, não se trate de caso de inadmissibilidade de prova testemunhal, como decorre dos estritos termos, dos artigos 393 a 395, do Código Civil.
Ora, no caso em apreço, D………., não se encontra em qualquer das descritas situações, pelo que é o mesmo hábil para depor na qualidade de testemunha. O facto de ser o médico psiquiatra do autor e de ter elaborado relatórios médicos juntos aos autos, serão elementos a ponderar segundo o principio da livre apreciação da prova, por força do qual, o julgador deve decidir sobre a matéria de facto segundo a sua intima convicção, formada no confronto dos vários meios de prova e de acordo com as máximas da experiência – artigos 635 e 655.
Tão pouco se verifica a violação do princípio do contraditório. Este, como um dos corolários do princípio da igualdade das partes, concede a estas o direito de responder a qualquer acto processual, tanto no que respeita aos aspectos de direito, como no que concerne à matéria de facto (artigos 486, n.º1, 783 e 794, n.º1). Dele emana, ainda, o princípio da audiência contraditória das provas, previsto no art. 517. Ora, no caso em apreço (fls. 1309), a ré teve oportunidade de contra-interrogar a testemunha em causa, cumprindo-se, assim, o referido principio em termos probatórios e, como tal, o direito de resposta no capítulo da prova e o da igualdade de armas.
Improcedem as conclusões de recurso da ré quanto ao seu primeiro agravo.

3. B) Entende a ré, ora agravante, que a inquirição da dita testemunha, D………., deveria ter sido adiada para que o seu mandatário pudesse também fazer-se acompanhar, em sede de inquirição, de médico psiquiatra, nos termos do art. 42, n.º 1.
De acordo com este normativo legal, “Quando no processo se suscitem questões técnicas, para as quais não tenha a necessária preparação, pode o advogado fazer-se assistir, durante a produção da prova e discussão da causa de pessoa dotada de competência especial para se ocupar das questões suscitadas.”
Acontece que, também quanto a este aspecto, carece de razão a ré.
No preceito referido está prevista a intervenção de assistente técnico quando no processo se suscitem questões técnicas. No caso vertente, as questões suscitadas não levantam questões técnicas, dizendo antes respeito, no que àquele depoimento concerne, à matéria dos danos não patrimoniais (artigos 75 a 77, da petição inicial). Acresce que D………. não interveio nos autos na qualidade de técnico em apoio do mandatário do autor, mas antes, como se viu, na qualidade de testemunha. Desta forma, porque não ocorre a situação prevista no mencionado preceito legal, não pode o mandatário da ré usar daquela prerrogativa (art. 41, n.º 2) por falta de fundamento legal.
À semelhança do que se disse no ponto antecedente, não ocorre, também, qualquer violação dos citados princípios do contraditório e da igualdade de armas, pois, não sendo caso de aplicação do art. 42, nº 1, a ré teve oportunidade de contra-interrogar a mencionada testemunha.
Improcedem as conclusões deste (2.º) recurso de agravo.

3 C) 1. Impugna o autor a decisão da matéria de facto. Pretende que se consideram provados os factos dados como não provados (artigos 17, 18, 20, 25, 31, 32, 43, 45, 48, 49, 52, 67, 68, 73 a 75, da petição inicial), que se considerem provados integralmente aqueles que apenas o foram parcialmente (artigos 3, 4, 7, 8, 15, 22, 23, 24, 44, 47, 50, 55, 60, 62, 64, 72 e 77 da petição inicial) e que se dêem como não provados o factos que se deram como provados (36, 37, 38, 39, 50, 51, 52, 56, 58 e 69, da contestação).

De acordo com o art. 712, n.º 1, “ A decisão do tribunal de primeira instância sobre matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada nos termos do art. 690-A, a decisão com base neles proferida.
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa insusceptível de ser destruída por qualquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
(…)”

Nos presentes autos, a prova foi gravada, sendo pois aplicável o art. 690-A, que reza o seguinte:
“1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.”

Resulta dos citados normativos, que, para além da especificação dos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, bem como dos meios probatórios que imponham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto, o recorrente deverá concretizar os meios probatórios com referencia a cada um do pontos concretos da matéria de facto que pretende ver alterada porque incorrectamente julgados.

Elucidativo é neste sentido o teor do relatório do preambular do DL 183/2000, que introduziu a transcrita redacção ao art. 690-A. Aí se diz que:
“A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.
Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1.ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido.
A consagração desta nova garantia das partes no processo civil implica, naturalmente, a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação”.

E, porque a garantia desse duplo grau de jurisdição tem os limites assinalados, tem a jurisprudência sustentado que, com a reapreciação da matéria de facto pela Relação, não se pretende postergar o princípio fundamental da livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância, pelo que a alteração da matéria de facto pela Relação deve ser realizada com a necessária ponderação e somente em casos excepcionais e pontuais. Na realidade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas poderão ser apreendidos, interiorizados e valorados, por quem os presencia directamente, e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador.
Por ser assim, é que se tem entendido, com respeito pelos princípios da imediação, oralidade e contraditório, que a alteração da matéria de facto pela Relação só ocorrerá se, dos meios prova indicados pelo recorrente, valorizados no amplexo global da prova produzida, se verificar que tais elementos probatórios, em concreto, se revelam inequívocos no sentido pretendido.[4]

No caso em análise (fls. 1566 a 1796), o recorrente limitou-se a indicar os depoimentos das testemunhas tendo, para tanto, efectuado uma transcrição genérica e indiscriminada, total ou parcial desses depoimentos, sem indicar, quais as partes, os pontos, os aspectos desses depoimentos, que conduziriam, em seu modo de ver, a uma solução diferente daquela que foi tomada em 1.ª instância no âmbito da decisão da matéria de facto.
Para além disso, se bem atentarmos no teor das respostas da matéria de facto (fls. 1413 a 1435) e na impugnação feita pelo autor à respectiva decisão, bem se vê que essa impugnação, no fundo, o que pretende é provocar um volte face na quase totalidade da matéria de facto consignada em primeira instância.

Não obstante isso, e visando salvaguardar outros possíveis entendimentos, sempre se dirá que, ouvida toda a prova gravada, se nos afigura razoável e ponderada a decisão da matéria de facto da 1.ª instância.

(i) Assim, e começando pelos factos da petição inicial, não provados, que o autor pretende se dêem como provados.
17 - Deve manter-se como não provado, pois da totalidade da prova produzida não resulta, minimamente, que o autor se tivesse todo o distrito de Aveiro teria auferido o montante que aí alega.
18 – Igualmente se deve manter como não provado, visto não resultar da globalidade da prova testemunhal (ou documental) produzida que tivesse ocorrido tal acordo aquando da celebração do contrato ou posteriormente.
20 - Deve também manter-se como não provado, uma vez que como emerge das demais respostas (provadas) se não provou que a percentagem das comissões a pagar ao autor fosse a de 1% sem a ponderação de outros factores. Sobre essa matéria se pronunciaram, com conhecimento, as testemunhas Z………., superior hierárquico do autor, U………., chefe de vendas; K………., Chefe de Departamento Comercial, que explicaram pormenorizadamente as fórmulas utilizadas pela ré ao longo do tempo para calcular as comissões e também AB………., escriturária com mais de 20 anos de serviço e experiente no processamento de comissões aos vendedores, que explicitou os moldes em que se processa os cálculos das comissões.
25 – Deve também manter-se como não provado. Das testemunhas da ré ouvidas, todas foram unânimes em dizer que o F………. não foi substituir o autor, que trabalhava nas vendas de máquinas pesadas, tendo aquele sido contratado para vender máquinas leves. Explicaram este ponto, com precisão, as testemunhas AC………., Responsável pelo Departamento de Vendas e AD………. que esclarecerem qual foi a estratégia da ré e a reestruturação nela operada face à quebra de vendas das máquinas pesadas destinadas à construção civil, e à entrada de novo tipo de máquinas, que implicou a entrada de novos vendedores, entre os quais, o F………., que se foi buscar à concorrência.
31 - É conclusivo.
32 – Mantêm-se como não provado. Contém a alegação de uma previsão que, da globalidade da prova produzida, não resulta minimamente demonstrada, sendo certo, que também da totalidade da prova produzida não resulta que o autor enquanto vendedor tivesse as qualidades que se arroga. As testemunhas U………. (Chefe de Vendas) e K………. (Chefe de Departamento da Direcção Comercial), foram mesmo peremptórios em observar que o autor estava longe de atingir os objectivos de vendas que lhe eram propostos, apontado como média anual razoável de vendas entre 15 a 20 máquinas.
43 e 45 – Deve manter-se a resposta dada. O que se pretende, para além de irrelevante, não resultou apurado da prova produzida.
48 – Deve igualmente manter-se o teor desta resposta. Na verdade, da prova produzida, apenas AE………., mulher do autor falou em indemnização que teria sido proposta a este. Mas, esta testemunha apenas o referiu por o autor lho ter contado, uma vez que não assistiu às reuniões tendentes à cessação do contrato. Das demais testemunhas ouvidas, com responsabilidade na ré no que concerne à reestruturação que esta levou a cabo, que implicou a redução da frota de vendedores, todas se referiram à tentativa de negociar com o autor no sentido de uma resolução amigável do contrato de trabalho, o que este não aceitou, sem que tivessem falado em quaisquer quantias concretas que a esse título tivessem sido propostas. Do próprio depoimento da testemunha Y………., responsável pela Direcção dos Recursos Humanos da ré, que negociou directamente com o autor com vista à resolução amigável do contrato, não resulta a concretização de valor e esse título.
49 – Também deve manter-se, pois, do conjunto da prova produzida, em particular do depoimento de Y………., não resulta que tivessem sido discutidas, nos moldes descritos pelo autor, as particulares condições aí mencionadas.
52 – É de manter a resposta dada. Para além de semi-conclusivo, da globalidade da prova não se retira, com segurança, o aí alegado.
67 – Mantém-se a resposta. É conclusiva. E, para além disso, irrelevante o seu teor, em face da demais factualidade apurada.
68 – Mantém-se a resposta dada, face à globalidade da prova produzida e em particular do depoimento de AC………., que, convictamente, negou o aí descrito.
73 – Mantém-se a resposta negativa. Além de semi-conclusiva, da prova produzida não se pode concluir nesse sentido e se não apurou, como já se referiu, que o autor tenha sido substituído pelo colega que refere.
74 e 75 – São de manter as respostas negativas. Da prova efectuada não é possível concluir no sentido do alegado.

(ii) Passando agora aos factos provados restritivamente que, no entender do autor, deveriam ser dados integralmente como provados.
3 - Mantém-se a resposta, pois do total da prova produzida, não se pode concluir que o autor sempre “pretendeu ficar” na ré.
4 - Mantém-se a resposta. A percentagem de 1% era apenas um dos elementos da fórmula que dava origem ao valor final da comissão. Assim o esclareceram as testemunhas Z………., e os referidos U………., K………., todos com funções de responsabilidade na actividade desenvolvida pelo autor. E também a dita escriturária AB………. que processava as comissões aos vendedores.
7 e 15 – Mantêm-se as repostas. Na realidade, nenhuma prova consistente foi feita no sentido de o autor se ter oposto à mudança de zona, ou de que, em consequência dessa mudança, as comissões auferidas tivessem passado a ser inferiores.
8 – È de manter a resposta, pois também quanto a esta mudança nada se provou no sentido de o autor se ter oposto (verbalmente ou por escrito) à mesma.
19 – Deve manter-se a resposta. È que resulta da documentação junta aos autos e da prova pericial produzida, sendo irrelevante o demais pretendido.
22 – Deve manter-se. Das testemunhas ouvidas sobre a matéria em causa, em particular do depoimento de Y………., que iniciou conversações com o autor com vista à resolução do contrato, nada resultou no sentido de pretender a ré a cessação imediata do contrato de trabalho contra indemnização.
23 e 24 – São conclusivos e irrelevantes. Nada a consignar.
44 - Mantém-se a resposta. O teor pretendido é irrelevante e conclusivo.
47 – É também de manter esta resposta. Apenas se apurou o que resulta da resposta ao n.º 26 da p.i. e nada no sentido de ter havido esvaziamento de funções.
50 - A resposta mantém-se. Da prova produzida nada resulta do sentido do alegado, mas sim, como de resto se provou, que o mesmo não pretendia a cessação do contrato, como o referiu a testemunha Y………. e resulta das cartas que o autor escreveu à ré, também dadas como provadas.
55 – É de manter a resposta. Das testemunhas ouvidas sobre a matéria em causa e com responsabilidades a reflectir-se na ré na área do autor, nenhuma afirmou que a mudança de zona implicasse prejuízo para o autor enquanto vendedor em termos de rentabilidade e produtividade e comissões recebidas. Pelo contrário, dos seus depoimentos resulta que a mudança é salutar e integra-se em estratégia comum de gestão da ré. Neste sentido depuseram Z………., U………., e também resulta da factualidade apurada relativamente à performance irregular alcançada pelo autor em temos de vendas nos anos em que ocorreram mudanças de zonas.
60 – Mantém-se o teor da resposta. Das testemunhas ouvidas, AC………. e Y………., com responsabilidades pela reunião mencionada todas foram firmes em asseverar tão só o que consta das respostas aos pontos 82 e 85 da contestação.
62 e 72 – Também se mantém a resposta. Dos vários depoimentos ouvidos nada de seguro se apurou no sentido do que o autor refere ter sentido.
64 - Igualmente é de manter esta resposta. Nada se apurou no sentido do alegado pelo autor.
77 - Mantém-se igualmente esta resposta. Na verdade, do depoimento da testemunha D………., médico psiquiatra do autor e única testemunha ouvida que poderia com rigor atestar do seu estado de saúde do autor, apenas resulta, com segurança o que se consignou como provado, ignorando-se qual o estado (geral) de saúde do autor e a sua capacidade de trabalho.

(iii) Por fim, os factos provados (da contestação) que, no entendimento do autor, deveriam ter sido dados como não provados.
36 – È de manter a resposta, face aos depoimentos das testemunhas, U………., Chefe de Vendas e K………., como se disse já responsáveis, respectivamente, chefe de vendas e responsável chefia do departamento da direcção comercial, que revelando perfeito domínio sobre a matéria em causa assim o asseveraram.
37, 38 e 39 – São também de manter estas respostas. É o que resulta dos depoimentos das testemunhas supra referidas.
50, 51 e 52 - Mantém-se o seu teor. Assim resulta do depoimento prestado por Z……….. e U………. .
56 e 58 – É de manter também esta resposta. Com efeito, todas as testemunhas inquiridas – o referido AC………. e AD………., director geral da área de negócios - com responsabilidades na ré e conhecimento da reestruturação aí levada a cabo, foram assertivas no sentido de que vendedor F………. foi admitido ao serviço da ré, mas para vender outro tipo de máquinas light, enquanto o autor vendia máquinas pesadas e de que F……….. era vendedor especialista nesse tipo de mercado de máquinas.
69 – Mantêm-se a resposta. A mesma resulta da documentação junta aos autos que a prova testemunhal não infirmou.

O autor também invocou os documentos de fls. 588 a 593 e 1370 (relatório pericial e esclarecimentos), de fls. 908, 911, 913, 916 a 920 e 923 (mapas das comissões) e de docs. 2, 3, 5, 6, 7 e 8, fls. 1303 e 1304 (facturas). Ora, dessa documentação (toda ela de livre apreciação) não se retira conclusão diversa daquela a que se chegou na decisão fáctica, para além de que esses elementos (em obediência ao valor legal das provas), não impõem decisão diversa insusceptível de ser destruída por outra provas (alínea b), do n.º1, art. 712).
Mantém-se, assim, a decisão da matéria de facto da primeira instância.

3. C.2. Pretende o autor, apelante, que com a retirada de ½ distrito de Aveiro no ano de 2000, as suas vendas e consequentemente as suas comissões foram ilicitamente reduzidas, sofrendo dano patrimonial do qual deve ser indemnizado. Argumenta, para o efeito, que o prejuízo patrimonial nessas circunstâncias é um facto notório que até dispensa prova, mas a mesma foi feita pelo que, tendo o autor com apenas metade daquele distrito feito vendas correspondentes a 5.000,00 euros de comissões, terá o mesmo direito a igual quantia ou, então, às comissões geradas por quem o substituiu, montante a liquidar em execução de sentença.
Não assiste razão ao recorrente. Na verdade, não só não se demonstra que essa diminuição de zona assuma carácter ilícito, em face dos termos amplos em que foi definido o seu local de trabalho (inicialmente a zona norte e depois o distrito de Aveiro e Concelho de Vila Nova de Gaia - factos provados 1 e 2), como se não demonstra a existência de dano. É que, pese embora em 2000 o autor tivesse actuado em metade do distrito de Aveiro e no distrito de Vila Nova de Gaia, e vendido oito máquinas, não provou o mesmo que se lhe tivesse sido atribuído todo aquele distrito teria vendido mais máquinas do que as (oito) que vendeu. As vendas e as correspondentes comissões dependem de um complexo de factores, alguns deles de carácter perfeitamente imprevisível ou aleatório[5], não podendo com antecipação ter-se a noção das vendas que se vão efectuar, nem consequentemente, das comissões que se irão auferir. E, tanto assim é, que o recorrente em 2002 tendo regressado aos distritos de Aveiro e Vila Nova de Gaia, apenas vendeu duas máquinas.
Acresce que, sustentar-se, como o recorrente faz, que o prejuízo decorrente da diminuição da área do distrito de Aveiro constitui facto notório, não faz, também por isso, qualquer sentido. O facto notório pressupõe um conhecimento de tal modo extenso, que o mesmo aparece como que revestido de (quase) certeza, sendo do conhecimento de grande maioria dos cidadãos. [6]
Destarte, não tendo o autor provado a existência de todos os elementos integrantes da obrigação de indemnizar (art. 483, do Código Civil), não tem o mesmo direito aos valores que reclama. A hipótese de liquidação de sentença, obviamente também não se coloca, pois não estão demonstrados os danos, alegadamente, sofridos pelo autor.

3. C. 3. Pretende o autor que o cálculo das comissões foi alterado relativamente ao valor de 1% que havia sido acordado entre si e a ré em 1989, o que originou que a partir de 1992 a média de comissões tivesse sido apenas de 0,75, sendo credor da diferença de 0,26%.
O autor parte de um entendimento baseado em facto, que como se assinalou antecedentemente, se não provou. E ele traduz-se na circunstância de o autor se firmar na percentagem de 1% para a fixação das comissões, quando é certo, se provou, que as partes nunca acordaram na fixação de 1% de comissões sem a ponderação de outros factores de cálculo.
Acresce que a circunstância de a ré ter alterado ao longo dos anos a fórmula de cálculo das comissões não revela, só por si, a prática de qualquer acto contrário à lei, pois, designadamente, dessa alteração não se vislumbra ocorrer diminuição da retribuição (art. 21, alínea c), da LCT) – o que, aliás, o autor nem invoca.
As alterações ao modo de calcular as comissões são comuns e inserem-se nas estratégias comerciais das empresas, sujeitas actualmente a forte concorrência e aos impulsos do mercado aberto e dinâmico em que nos inserimos. Ponto decisivo dessas alterações é que as mesmas não consubstanciem violação das garantias dos trabalhadores e, concretamente, não signifiquem um abaixamento da retribuição destes.
No caso em apreço, as modificações operadas na fórmula de cálculo das comissões - para além do autor não ter provado que se tivesse oposto às mesmas - não se demonstra tenham significado uma diminuição da sua retribuição, levando-se naturalmente em conta que esta assume, por sua própria natureza, carácter variável.

3. C. 4. Sustenta ainda o recorrente que a sentença recorrida não retirou as consequências adequadas e razoáveis previstas na lei decorrentes da decretada ilicitude da retirada de funções de vendedor comissionista em Novembro de 2003. Invoca que após tal retirada deixou de efectuar vendas e de receber as respectivas comissões, sofrendo lesão injustificada e ilícita. Deve ser reparada e reconstituída a situação anterior, com maior grau de aproximação, razoabilidade e justiça possível, sendo o critério mais adequado para reparar tal dano patrimonial a condenação da recorrida a pagar-lhe a comissão de 1% sobre cada venda efectuada, nos termos que alegou, entre a data da retirada de funções e o momento da cessação do contrato, cujo valor deve ser relegado para liquidação.

Como se decidiu na sentença recorrida, e infra se deixará enunciado a propósito do recurso de apelação da ré, a mudança de funções ordenada pela ré não obedeceu aos requisitos cumulativos a que alude o art. 22, n.º 7, da LCT, por não ter assumido carácter temporário e significar alteração substancial da posição do autor.
O autor, ora apelante, sustenta que a sentença recorrida ao determinar, na sequência daquele facto, que o recorrente tem direito a ser reintegrado nas suas anteriores funções de vendedor comissionista deveria ter retirado as devidas consequências e ser reparado o dano por si sofrido.
Ora, acontece que, o recorrente não demonstrou efectivamente ter sofrido quaisquer danos na sequência da alteração de funções. Para além disso, tendo sido assegurado ao recorrente, após a determinação das novas funções, a remuneração média dos últimos 12 meses como vendedor, critério aceitável face à natureza variável da sua retribuição como vendedor e ao preceituado no art. 84, n.º2, da LCT, não se pode concluir por qualquer ilegítimo abaixamento da retribuição, nem tão pouco pela existência de qualquer dano ou prejuízo a esse título sofrido, não havendo, assim, lugar a qualquer liquidação.

3. C. 5. Relativamente à pedida indemnização por danos não patrimoniais, não demonstrou o autor, ora apelante, a verificação de todos os pressupostos da obrigação de indemnizar (art. 483, do Código Civil), pois, manifestamente, se não provou a existência do nexo de causalidade entre os invocados danos e a conduta da ré (os artigos da petição inicial donde resultaria esse nexo não se provaram), razão pela qual nada há a fixar a esse título.
Improcedem, pois, como se vê, as conclusões do presente recurso de apelação do autor.

3 D) 1. Invoca a ré que a mudança de categoria do autor encontra arrimo na reestruturação por si conduzida, mostrando-se preenchidos os requisitos legais para esse efeito.
Com relevo para a apreciação da presente matéria resultou provado, em síntese, o seguinte:
- A ré apelante admitiu ao seu serviço o autor para trabalhar para a mesma, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, na filial de ………., Vila Nova de Gaia, com a categoria profissional, no âmbito administrativo, de apontador oficinal, na secção de controlo e todos os serviços no âmbito da actividade da empresa, compatíveis com a categoria atribuída, pelo prazo de 6 meses, com início de vigência no dia 16 de Fevereiro de 1981, mediante o vencimento mensal, à época de 15.000$00 (fls. 34).
- Em Janeiro de 1989, por mútuo acordo entre o autor e a ré apelante, aquele que tinha a categoria profissional de escriturário de 2ª, passou a desempenhar as funções de vendedor comissionista, no distrito de Aveiro e no concelho de Vila Nova de Gaia, mantendo o mesmo salário, sendo que a diferença que recebia a mais relativamente aos vendedores, seria descontada nas comissões a receber.
- O autor passou a auferir comissões sobre o valor das vendas que efectuava;
- O autor para além dessa comissão, auferia ainda retribuição fixa mensal, ilíquida, que teve a seguinte progressão:
Fevereiro de 1990: 58.000$00 e a quantia de 41.400$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 1991: 65.000$00 e a quantia de 44.000$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 1994: 68.000$00 e a quantia de 60.500$00, a título de ajudas de custo; Maio de 1995: 70.300$00 e a quantia de 57.750$00, a título de ajudas de custo; Janeiro de 2000: 100.000$00 e a quantia de 55.000$00, a título de ajudas de custo; Abril de 2003: 498,80 euros e a quantia de 325,00 euros, a título de ajudas de custo;
- Em 4 de Novembro de 2003 o autor comunicou à ré as razões pelas quais não aceitava ser apartado das suas funções de vendedor comissionista, pedindo mais uma vez para nas mesmas ser mantido, em virtude de tal atitude ser ilegal e injusta.
- O autor, por carta registada com aviso de recepção de 10 de Novembro de 2003, comunicou à ré que obedecia a essas ordens, apesar de as mesmas serem ilegais, reiterando o seu pedido de ser mantido nas funções de vendedor, alertando para as consequências legais dessa conduta, nomeadamente fazer incorrer a empresa em responsabilidade civil, decorrente dos danos não patrimoniais causados.
- A ré por carta de 12 de Novembro de 2003, comunicou ao autor, que a partir dessa data, não mais exerceria as suas funções de vendedor comissionista e passava antes a prestar colaboração na área do controle oficinal, com as seguintes tarefas: elaboração de folhas de saída de caixa, arquivo de folhas de serviço, manutenção do arquivo dos processos de máquinas, levantamento e expedição de correspondência; realização de depósitos (bancos) e classificação de facturas de fornecedores.
- O autor, por carta registada com aviso de recepção de 13 de Novembro de 2003, comunicou à ré que não aceitava a cessação das funções de vendedor pretendida por esta.
- A ré pretendeu proceder a uma reestruturação da sua parte comercial, com vista a reduzir custos de exploração, com o objectivo de salvaguardar a rentabilidade mínima do seu negócio de máquinas para construção civil e obras públicas;
- Tal reestruturação foi aconselhada pelas próprias fábricas de que a recorrida é representante no nosso país (nomeadamente pela G……….);
- Essa reestruturação implicou, ao nível da sucursal da recorrida de Vila Nova de Gaia, uma diminuição da força de vendas, constituída por vendedores, entre os quais, o autor.
- A ré assegurou ao recorrente, no exercício das suas novas funções, retribuição não inferior à média dos últimos doze meses auferidos na função de vendedor;
- O autor gozou um período de férias de dezanove dias úteis com início em 14.11.2003;
- Após o termo das férias, o autor entrou de baixa médica em 9.12.2003, situação esta em que ainda hoje se encontra.[7]

Resulta do apontado excurso factual, que o autor desde 1989 vinha desenvolvendo funções de vendedor comissionista de máquinas industriais e equipamentos de vibração e compactação, tendo-lhe a ré ordenado, em Novembro de 2003, que passasse a exercer outras funções, mais propriamente, na área do controle oficinal, que consistiam na elaboração de folhas de saída de caixa, arquivo de folhas de serviço, manutenção do arquivo dos processos de máquinas, levantamento e expedição de correspondência, realização de depósitos bancários e classificação de facturas de fornecedores.

Sabido como é, que o trabalhador deve, em princípio, exercer as funções integrantes da sua categoria profissional (art. 22, n.º 1, do DL 49 408, de 29.11.69 - LCT) e que só em casos bem delimitados é admissível ao empregador determinar a realização de tarefas diversas daquelas para as quais foi contratado (vd. artigos 21 e 23, da LCT), importa verificar se é legítima a descrita actuação da ré.
Não deve olvidar-se que, desempenhando o autor desde 1989 a as funções de vendedor de máquinas e que lhe foi determinado que passasse a desempenhar tarefas de tipo administrativo, essa alteração consubstancia uma modificação do conteúdo funcional da prestação laboral do autor, pelo que, a questão que se coloca, é, concretamente, a de saber, se as novas funções atribuídas poderão integrar-se em qualquer uma das modalidades da chamada flexibilização funcional das empresas, neste caso da ré, não se podendo ignorar que o verdadeiro leimotiv da flexibilidade, a sua força motivadora, se traduz na necessidade de assegurar a competitividade das organizações ou a sua sobrevivência.[8]
Mas, porque flexibilização significa sempre um reforço do poder e iniciativa do empregador, a nossa legislação laboral, à luz da Constituição da República, não deixa de lhe traçar limites.
Assim, a flexibilização funcional pode ter lugar através de dois mecanismos: a polivalência funcional e o jus variandi ou direito de variação, ambos previstos, respectivamente, nos números 2 a 6[9] e no número 7, do art. 22, da LCT.

Por não ser caso de aplicação da figura da polivalência funcional, que, entre o mais, pressupõe (novas) funções com afinidade ou ligação funcional às funções normais - o que no presente caso se não verifica, pois as funções ultimamente atribuídas ao autor são completamente distintas das funções de vendedor - apreciaremos apenas a figura do jus variandi.
O n.º 7, do art. 22 prescreve que, “Salva estipulação em contrário, a entidade patronal pode, quando o interesse da empresa o exija, encarregar temporariamente o trabalhador de serviços não compreendidos no objecto do contrato de trabalho, desde que tal mudança não implique diminuição da retribuição, nem modificação substancial da posição do empregador”.

Face ao aludido texto normativo, costumam apontar-se, como requisitos cumulativos para a verificação do jus variandi os seguintes:[10] [11]
a) Ausência de estipulação em contrário (que fixe dentro dos limites do objecto do contrato os serviços exigíveis ao trabalhador).
b) Carácter temporário do exercício das novas funções (pois, caso contrário, tratar-se-ia de uma mudança de categoria).
c) Existência de interesse sério da empresa (interesse de carácter objectivo, ligado às ocorrências ou situações anómalas na vida da empresa, o que não é confundível com as conveniências do empregador).
d) Não modificação substancial da posição do trabalhador (o trabalhador não pode ficar colocado numa situação hierárquica injustamente penosa, que lhe provoque desprestígio ou que afecte a sua dignidade profissional).
e) Tratamento mais favorável (designadamente em termos remuneratórios, que corresponda às nova tarefas).

No presente caso é inequívoco que os citados requisitos se não verificam integralmente. Na verdade, pese embora não resulte haver estipulação em contrário, e a recorrente tenha provado que levou a cabo uma reestruturação na sua área comercial, reestruturação essa aconselhada pela própria G………., de que a mesma é representante, o que originou uma diminuição da sua força de vendas (e implicou, designadamente, a denúncia do contrato de trabalho com um dos seus vendedores, a cessação por mútuo acordo do respectivo contrato de trabalho com outro dos vendedores e a tentativa, frustrada, de negociar como autor também naquele sentido), o que poderia fazer pressupor a existência de interesse sério da empresa, o que é facto, é que não provou a recorrente, como se lhe impunha, de acordo com o art. 342, do Código Civil, que a mudança de funções assumisse carácter temporário ou transitório. Nada se apurou no sentido da temporalidade daquela mudança (plano objectivo), nem tão pouco que tenha sido dado conhecimento ao trabalhador da transitoriedade dessa situação (plano subjectivo). Cfr. Mário Pinto, Pedro Furtado Martins, e Nunes de Carvalho, Comentário às Leis Laborais, Lex, Vol. I, pág. 112.
Para além disso, é óbvio, que tendo sido atribuídas ao autor funções completamente distintas daquelas que o mesmo vinha desempenhando, sempre isso significaria uma modificação substancial da posição deste, pois, manifestamente, não existe qualquer afinidade ou ligação entre as novas tarefas e as que correspondiam à sua qualidade de vendedor.
A ordem dada pela recorrente no sentido de o autor desempenhar as mencionadas novas funções, não goza, pois, do apoio da lei, sendo ilegítima, podendo à mesma opor-se o autor.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso da ré.

3 D) 2. Sustenta a ré, ora apelante, que não deve ser condenada a pagar ao autor o diferencial de comissões a que se refere o ponto 5 da parte decisória da sentença, porquanto a premissa de que parte o pedido formulado pelo autor - a sua substituição pelo vendedor F………., não se verificou.
No aludido ponto 5 da parte decisória da sentença, o tribunal a quo condenou “a demandada a pagar ao demandante a diferença entre a retribuição paga por aquele a este e aquela que poderia ter auferido caso continuasse nas vendas, no montante que vier a liquidar-se em fase de execução de sentença”.
Para melhor se perceber este aspecto da decisão convirá ter presente que o mesmo se prende com a parte 9 da respectiva fundamentação (fls. 1454), onde se referiu que o autor foi ilicitamente afastado das tarefas de vendedor comissionista e que “o certo é que se não pode garantir que se este continuasse nas vendas não auferiria uma remuneração superior”, dizendo ainda que, “os autos não contêm elementos para se dar resposta a esta dúvida. Na hipótese de se provar que o trabalhador, caso continuasse nas vendas, auferiria uma retribuição superior à proposta e paga pela empregadora, terá direito a que esta lhe pague a diferença”. “Assim, a ré será condenada a pagar a eventual diferença que vier a liquidar-se em fase de liquidação de sentença” (sublinhados nossos).

Sucede, porém, que a ré não deverá ser condenada no referido diferencial a título de comissões.
Se é um dado, nos termos assinalados, que a ré atribuiu ilicitamente diferentes tarefas ao autor, determinando que o mesmo passasse a exercer funções de foro administrativo, deixando, o mesmo de receber as correspondentes comissões, nada se provou no sentido de que o autor, caso continuasse a desempenhar as funções de vendedor comissionista, receberia montante superior àquele que a ré lhe pagou no ano das novas funções (2003), que correspondeu à média dos últimos 12 meses em que desenvolveu funções de vendedor – valor esse ponderável de acordo com o critério de determinação da retribuição variável previsto no art. 84, n.º 2, da LCT. Tão pouco se provou que o autor tenha sido substituído nas suas funções de vendedor, pelo colega de trabalho que refere.

Não está, assim, demonstrado que o autor em virtude da mudança de funções tenha sofrido dano ou prejuízo, quer na perspectiva de dano emergente, quer na de lucro cessante (art. 564, do Código Civil).

A propósito do lucro cessante, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, pág. 580, escreveram que o mesmo “compreende benefícios que o lesado não obteve, mas deveria ter obtido … deve ser determinado segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade. São vantagens que segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido não fora o facto lesivo.”
Ponderando a factualidade provada, nada nos permite concluir, que o autor em 2003, ano em que lhe foram determinadas as novas tarefas, deveria ter auferido, no caso de se manter no exercício das funções de vendedor, uma remuneração superior à que lhe foi assegurada pela ré nesse ano e que, como já vimos, correspondeu à média que o trabalhador recebeu a título comissional em 2002. Não deve, para tanto, esquecer-se que o autor apresentou totais de vendas bem diversos (a fazerem-se obviamente reflectir nos valores das comissões) entre 2000 e 2003. Com efeito, no ano de 2000, vendeu oito máquinas novas; em 2001 vendeu dezasseis e em 2002, nove máquinas novas. No período de Novembro de 2002 a finais de 2003, o autor apenas vendeu duas máquinas;
Indemonstrada está, assim, a existência do dano ou prejuízo, pelo que, não poderia relegar-se o seu apuramento para liquidação como, erradamente, se fez na sentença recorrida.
A liquidação a que se refere o art. 661 – onde se diz que “Se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida” – apenas tem lugar, “não como consequência do fracasso da prova, mas sim como consequência de ainda se não conhecerem com exactidão as unidades componentes da universalidade ou de ainda se não terem revelado ou estarem vias de revelação algumas ou todas as consequências do facto ilícito, no momento da propositura da acção”. Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26.06.97, processo 846.96, 1.ª.
Ou, dito de outra maneira, em liquidação de sentença não é admissível demonstrar que se teve determinados prejuízos e qual o seu montante, é apenas permitido alegar e provar o montante dos prejuízos cuja existência ficou demonstrada na acção declarativa. Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9.07.2002, proc. 208.02, 2.ª [12]

Deste modo, não se tendo provado, nos termos sobreditos, que o autor tenha sofrido prejuízos, não pode a ré ser condenada em qualquer diferencial a título de comissões.
Procedem, nesta parte, as conclusões de recurso da ré.

3 D) 3. Entende a ré apelante que o juiz a quo não a podia ter condenado no pagamento de danos morais ao autor, pois este não fez prova dos factos exigíveis para a existência dessa obrigação. Adianta-se desde já que assiste razão à apelante.
O autor alegou que a conduta da ré lhe causou danos não patrimoniais que quantificou em 150.000,00 euros, todavia, a este propósito apenas se provou que o mesmo se submeteu a tratamento e acompanhamento médico e psiquiátrico e recorreu a baixa médica. E, se é verdade, por tudo quanto se aduziu, que o autor foi alvo de uma mudança ilícita de funções, não provou o mesmo que aquele tratamento, acompanhamento médico e baixa, se tenham ficado a dever à nova situação profissional imposta pela ré. Aliás, os artigos 76 e 77, da petição inicial onde se diz(ia) que foi por causa do comportamento da ré que o autor ficou doente e se viu obrigado a submeter-se a tratamento médico, receberam a resposta de não provados. Decorre do art. 483, do Código Civil, onde se prevêem os requisitos da obrigação de indemnizar, que é necessário (a) a verificação de um facto voluntário do agente capaz de violar direitos alheios ou de agir contra disposições legais; (b) que esse facto seja ilícito; (c) que se verifique um dano e, por fim, (d) que exista um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima, “de modo a poder afirmar-se, à luz do direito, que o dano é resultante da violação”. Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil, Anotado, Coimbra, Vol. I, 4.ª Edição, pág. 471.
No caso vertente, não se verificam todos os requisitos da obrigação de indemnizar, pois não se apurou factualidade integradora do nexo de causalidade. Mal andou, pois, o Mmo. juiz ao condenar a ré por danos não patrimoniais.
Procedem, assim, quanto a esta questão as conclusões de recurso da ré.

3 D) 4. Invoca ré, ora apelante, que tendo-se extinguindo por iniciativa do autor a relação laboral em 1.7.2005, deve ser revogada a sentença na parte que a condenou a reintegrar o autor nas funções de vendedor, bem como no pagamento de sanção pecuniária compulsória.
Assiste razão à ré.
Na realidade, tendo a relação laboral cessado em 1.07.2005 (fls. 907 a 909), não pode o autor já ser recolocado nas suas anteriores funções de vendedor comissionista, nem tão pouco beneficiar de sanção pecuniária compulsória imposta à ré. Como resulta do art. 829-A, do Código Civil, a sanção pecuniária compulsória é um meio de constranger o devedor a obedecer à condenação, determinando-o a realizar o cumprimento devido e no que foi condenado. A sanção pecuniária compulsória é uma medida exclusiva das prestações de facto infungíveis positivas (como é o caso) e negativas (n.º 1, do citado art. 829-A), assumindo a mesma particular relevo, nos casos das prestações duradouras, de natureza continuada, como meio de prevenir a continuação ou renovação do incumprimento, provocando a obediência do devedor à condenação e o respeito devido pela prestação originária. (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9.05.2002, proc. 0213666 e também Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 1995, pág. 407).

Atento o seu carácter coercivo e de medida destinada a provocar o futuro cumprimento da obrigação, assim como o respeito pelo devedor da condenação judicial, bem se vê que a sanção pecuniária compulsória não tem efeitos retroactivos, não podendo ser fixada para data anterior à própria decisão. Uma vez que a relação laboral cessou em 1.07.2005 e a sentença foi proferida em 18.03.2006, fls. 1457, não tendo, como se viu, a medida eficácia retroactiva, torna-se evidente que não pode a ré ser condenada em sanção pecuniária compulsória (para forçar a ré a cumprir o quê se a relação laboral já se extinguiu?) nem tão pouco, logicamente, a reintegrar o autor nas anteriores funções.
Procedem, também quanto a este ponto, as conclusões de recurso da ré apelante.

4. Decisão
Em face do exposto:
Nega-se provimento aos recursos de agravo da ré.
Concede-se provimento parcial ao recurso de apelação da ré, revogando-se a sentença, como decorre do supra exposto, nos seus pontos 1, 2, 5 e 6, no mais se mantendo a mesma sentença.
Nega-se provimento ao recurso de apelação do autor.

Custas pela ré (agravos e apelação na parte em que nesta decaiu).
Custas pelo autor, na proporção, no que concerne à apelação da ré. Custas pelo autor na sua apelação.

Porto, 21 de Maio de 2007
Albertina das Dores Nunes Aveiro Pereira
José Carlos Dinis Machado da Silva
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho

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[1] Este ponto de acordo com o conjunto dos demais e versão aceite por ambas as partes ser entendido como querendo dizer “… embora com outras funções relativamente às de vendedor comissionista…”
[2] Facto que se adita à matéria factual em virtude da confissão operada pelo autor (fls. 971 e 972).
[3] Serão deste diploma todas as referências normativas sem menção específica.
[4] Crf. Ac. do TRP de 19.03.2007, proc. 3302.06- 4
[5] Vd. Acórdão do STJ de 2.12.1998, CJ ASTJ, III Vol. pág. 280 e 281.
[6] Vd. Alberto dos Reis, CPC Anotado, Coimbra, III Volume, pág. 259.
[7] A parte final deste ponto da matéria de facto reporta-se naturalmente à data da propositura da acção.
[8] Rebecca Morales, sustenta mesmo, que a flexibilidade produtiva das empresas depende da habilidade intrínseca em se adaptarem à mudança, Flexible Prodution, Polity Press, Cambridge, 1994, pág.5
[9] Aditados pela Lei 21/96, de 23.07, que visou operar uma maior adaptabilidade da organização do trabalho na linha da chamada flexibilização interna.
[10] Vd. Amadeu Dias, Questões Laborais, Ano IV, pág. 9 e 10.
[11] Monteiro Fernandes, Ob Cit. pág. 208 e 209
[12] Também referido pela Ex.ª Sr.ª Procuradora Geral-Adjunta no seu douto parecer.