Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP00039274 | ||
| Relator: | SOUSA LAMEIRA | ||
| Descritores: | EXTINÇÃO PRIVILÉGIO CREDITÓRIO HIPOTECA LEGAL CRÉDITO DA SEGURANÇA SOCIAL | ||
| Nº do Documento: | RP200606120652985 | ||
| Data do Acordão: | 06/12/2006 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA. | ||
| Indicações Eventuais: | LIVRO 264 - FLS 48. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - A extinção de privilégios de privilégios creditórios emergente da declaração de falência – prevista no art. 152º do CPEREF – não abrange a hipoteca legal que garante os créditos do IGFSS-Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. II - Os créditos garantidos por hipoteca (legal ou outra) devem ser graduados à frente dos créditos salariais garantidos por privilégio imobiliário geral. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO 1- A) No Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, foi declarada a falência de B………., Lda, tendo sido apreendidos para a massa falida um bem imóvel e diversos bens móveis. Foram oportunamente reclamados créditos, tendo sido proferida sentença de graduação de créditos, (fls. 118 a 143). Dessa decisão vieram os credores C………. e outros devidamente identificados a fls. 32, 33 e 34 interpor recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: I- A extinção dos privilégios creditórios das entidades referidas no artigo 152 do CPEREF, e nomeadamente das instituições da Segurança Social acarreta a simultânea extinção das respectivas hipotecas legais. II- O artigo 152 do CPEREF ao referir-se a “privilégios creditórios” das instituições da Segurança Social abrange não só tais garantias strictu sensu consideradas mas igualmente outras garantias, como é o caso da hipoteca legal dada a manifesta afinidade desta com aqueles. III- Tal resulta da integração de uma lacuna legislativa, através do recurso à analogia, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 10º do CC. IV- Os créditos do IGFSS reconhecidos pelo Tribunal a quo em sede de verificação do passivo da falida devem, por isso, e na sua totalidade ser considerados créditos comuns, pelo que, os créditos dos ora Recorrentes, dotados de privilégio imobiliário geral, devem ser graduados prioritariamente àquele no que toca ao pagamento pelo produto da venda do imóvel da falida (verba n.º 1). Concluem pedindo a procedência do recurso. 2 – D………. e outras aderiram ao recurso interposto, apresentaram alegações (fls. 7 a 14) e formularam as seguintes conclusões: I. Na douta sentença de graduação de créditos, que ora se recorre, foram os créditos das recorrentes graduados atrás do crédito do IGFSS. II- Em virtude de tal crédito se encontrar garantido por uma hipoteca legal, sendo por isso, segundo o seu entendimento, de afastar do regime do artigo 152 do CPEREF, que apenas se aplicará aos privilégios creditórios. III- Salvo o devido respeito por melhor e mais douta opinião, entendemos que a Mmª Juiz “a quo” fez uma errada interpretação do preceituado no artigo 152 do CPEREF. IV- Sempre se dirá que, na opinião das ora recorrentes, a extinção dos privilégios creditórios, consagrada no artigo 152 do CPEREF, implica a extinção das respectivas hipotecas legais, concluindo-se pela sua aplicação ao caso em apreço. V- Do preambulo daquele diploma legal decorre a clara intenção do legislador de procurar incentivar a recuperação das empresas em situação difícil, economicamente viáveis, de forma a impedir a sua extinção, incentivo que deve partir do próprio estado, colaborando, antes de qualquer outro credor, na recuperação financeira das empresas que se encontrem nessa situação, abolindo ou restringindo os privilégios que injustamente prejudicam os demais credores. VI- Consideram as recorrentes que excluir as hipotecas legais de tal disposição seria desvirtuar a intenção do legislador. VII- No caso em apreço, e uma vez que existe um verdadeiro e semelhante conflito de interesses de natureza substancial, e não meramente formal, o juízo de valor emitido pela lei no caso dos privilégios creditórios imobiliários deve ser o mesmo a aplicar ao caso das hipotecas legais. VIII- O facto de no preambulo do citado Decreto-Lei apenas se fazer alusão aos privilégios creditórios de que gozam o Estado, autarquias locais e instituições de segurança social consubstancia uma lacuna legislativa que justifica o recurso à analogia, nos termos do artigo 10º n.º s 1 e 2 do CC. IX- Assim, a extinção dos privilégios creditórios acarreta simultaneamente a extinção das respectivas hipotecas legais, cujas afinidades com aqueles são manifestas. X- Com efeito, tratando-se de privilégios creditórios que incidem sobre valores imobiliários, a garantia que deles decorre é igual à garantia decorrente da constituição de uma hipoteca. XI- Assim sendo deverá aplicar-se ao caso concreto o artigo 152 do CPEREF, aplicando-se o seu regime não só aos privilégios creditórios mas também às hipotecas legais. XII- Dessa forma, os créditos das aqui recorrentes terão que ser graduados em primeiro lugar ficando à frente do crédito do IGFSS, nos termos do disposto no artigo 12 da Lei 17/86 de 14 de Junho, alterada pela Lei n.º 96/2001 de 20 de Agosto. XIII- Sem prescindir, contrariamente ao alegado na douta sentença recorrida, a Lei 17/86 de 14 de Junho, alterada pela Lei n.º 96/2001 de 20 de Agosto, regula matéria relativa à concorrência dos créditos dos trabalhadores com outras garantias, tais como, a hipoteca, não se concordando por isso com o recurso à analogia que a Mmª Juiz faz. XIV- A Lei 17/86 de 14 de Junho, alterada pela Lei n.º 96/2001 de 20 de Agosto, é uma lei especial que, nesta medida, revoga o regime geral previsto no CC, fixando um regime de preferência aos referidos créditos. XV- Indo de encontro, aliás, à manifesta intenção do legislador, que decorre do preambulo daquele diploma legal, em beneficiar os créditos dos trabalhadores em prejuízo dos demais créditos, nomeadamente àqueles sobre os quais incidem garantias reais. XVI- A referida Lei contraria a tendência do CC de restringir a atribuição de privilégios imobiliários gerais, criando e atribuindo aos trabalhadores esse privilégio imobiliário. XVII- Justifica-se, por isso, o recurso à interpretação teleológica, aplicando-se ao caso concreto o disposto no artigo 751 do CC, segundo o qual os privilégios imobiliários são oponíveis a terceiros e preferem à hipoteca, ainda quando esta garantia seja anterior. XVIII- Os créditos por salários em atraso, que gozam do privilégio imobiliário geral do artigo 12 da referida Lei, devem ser graduados com preferência sobre os créditos garantidos por hipoteca. XIX- Deverá a douta sentença ser substituída por outra que gradue os créditos das aqui recorrentes com preferência sobre o crédito do IGFSS. XX- Na douta sentença violou-se o disposto no artigo 12 da a Lei 17/86 de 14 de Junho, alterada pela Lei n.º 96/2001 de 20 de Agosto. Não houve contra-alegações. II - FACTUALIDADE PROVADA Encontram-se provados os seguintes factos: 1. Foi declarada a falência de B………., Lda, tendo sido apreendido para a massa falida um bem imóvel e diversos bens móveis. 2. Foram reclamados diversos créditos, melhor descritos na sentença recorrida, designadamente o IGFSS – Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social reclamou o crédito de 9753315,39 Euros (crédito n.º 70), proveniente de contribuições e juros de mora e os trabalhadores, ora Recorrentes, reclamaram créditos emergentes do contrato individual de trabalho. 3. O crédito do IGFSS – Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a encontra-se garantido por uma hipoteca constituída sobre o imóvel apreendido para a massa falida e registada a seu favor. 4. Pelo produto da venda do imóvel o crédito do IGFSS (crédito n.º 70), foi graduado em 1º lugar, até ao valor da hipoteca (à frente do crédito dos Recorrentes). III – DA SUBSUNÇÃO - APRECIAÇÃO Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir. O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente, artigo 684 nº 3 do Código de Processo Civil. A) A questão a decidir é apenas uma, a saber: Será que o disposto no artigo 152 do CPEREF se aplica não só aos privilégios creditórios, mas também às hipotecas (legais ou não), devendo o crédito do IGFSS, o qual se encontra garantido por uma hipoteca, ser graduado à frente do crédito dos Recorrentes? B) Vejamos. 1- O DIREITO Dispõe o artigo 152 do Código dos processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, aprovado pelo Dec. Lei n.º 132/93 de 23 de Abril, aplicável ao concurso de credores em causa, que “com a declaração de falência extinguem-se imediatamente os privilégios creditórios do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social, passando os respectivos créditos a ser exigíveis apenas como créditos comuns”. Será que o legislador quis ao referir aos privilégios creditórios do Estado neles incluir a Hipoteca? Perante a redacção deste preceito dividiu-se a doutrina e a jurisprudência quanto ao seu alcance. Uns defendiam que apesar do preceito se ter “esquecido” das hipotecas atenta a ratio legis do mesmo outra não podia ser a solução senão entender que às hipotecas (atribuídas às entidades referidas nesta norma) lhes seria aplicável o regime do preceito, extinguindo-se também de forma imediata com a declaração de falência. [Cfr a título meramente exemplificativo Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Código dos processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, notas 4 e 5 ao artigo 152, a páginas 381 e 382 e as referências aí feitas no mesmo sentido] Pelo contrário outros entendem que sendo o artigo 152 em apreço uma norma excepcional a mesma não é susceptível de aplicação extensiva ou analógica, pelo que nunca seria aplicável à hipotecas legais. [Cfr. igualmente a título meramente exemplificativo Salvador da Costa, o Concurso de Credores, 1998, p. 329 e os Ac. do STJ de 21.02.2006, Relator Conselheiro João Camilo, Ac. STJ de 16.06.2005, Relator Conselheiro Araújo de Barros, Ac. STJ de 21.02.2006, Relator Conselheiro Pereira da Silva e desta Relação do Porto de 21.03.2006, Relator Desembargador Cândido Lemos] Pensamos que após larga discussão se firmou como corrente largamente maioritária na Jurisprudência, a que aderimos, a posição de que o estabelecido na primeira parte do artigo 152 do CPEREF não compreende as hipotecas legais que garantem os créditos, no caso, do IGFSS. Afigura-se-nos que ao legislador não podia ser desconhecido o facto de existirem não só “privilégios creditórios do Estado” como também “hipotecas legais” e se na norma apenas ficou a constar “privilégios creditórios do Estado” não deve nem pode o intérprete colocar naquele preceito algo que o legislador de forma deliberada (pois sabia da sua existência) não pretendeu colocar. Deste modo e sem necessidade de outras considerações (remetendo-se para os argumentos expostos nos diversos acórdãos citados e que nos dispensamos de repetir, ainda que por outras palavras), entendemos que com a declaração de falência não se extinguem as hipotecas legais de que goza a segurança social, extinguindo-se tão somente os privilégios creditórios do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social os quais passam a ser exigíveis apenas como créditos comuns. [Cfr. neste sentido os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: - de 21.02.2006, Relator Conselheiro Pereira da Silva “I. o estatuído na lª parte do art 152º do CPEREF não compreende as hipotecas legais que garantem os créditos devidos à segurança social (art. 12º do DL nº 103/80, de 9 de Maio). II. O privilégio imobiliário geral concedido aos créditos reconhecidos aos trabalhadores de sociedade falida, a que se re portam o art. 12º nº 1 b) da Lei nº 17/86, de 14 de Junho, e o art. 4º nº 1 b) da Lei nº 96/01, de 20 de Agosto, não goza de preferência relativamente às hipotecas, legais ou contratuais, maxime às primeiras que garantem os créditos da segurança social, por ser aplicável o art. 749º do CC (versão inicial), que não o art. 751º desse Corpo de Leis (redacção inicial)”; - de 21.02.2006, Relator Conselheiro João Camilo “A extinção de garantias legais prevista no art. 152º do CPEREF não abrange a hipoteca legal de que gozem os créditos da segurança social”. - de 16.06.2005, Relator Conselheiro Araújo de Barros “O artigo 152º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, quando declara que, com a declaração de falência, se extinguem imediatamente os privilégios creditórios do Estado, das autarquias locais e das instituições de segurança social, não abrange outras garantias que não os privilégios creditórios, designadamente não havendo que aplicar o regime por ele estabelecido às hipotecas legais constituídas a favor da Segurança Social. - da Relação do Porto de 21.03.2006, Relator Desembargador Cândido Lemos “As hipotecas legais estão afastadas da aplicação do disposto no art. 152.º do CPEREF (redacção do DL 315/98 de 20/10), que nem por analogia se lhes pode aplicar.”] Bem andou pois em nossa opinião a decisão recorrida em considerar que a hipoteca legal de que gozava o crédito do IGFSS não se extinguiu com a declaração de falência da requerida B.........., Lda. C) Resolvida esta questão e assente que o IGFSS beneficia de uma hipoteca legal como garantia do seu crédito (verba n.º 70) e que os créditos dos Recorrentes igualmente se encontram garantidos por um privilégio imobiliário geral, decorrente do artigo 12 n.º 1 al. b) da Lei n.º 17/86 de 14 de Junho como os graduar? Dispõe o artigo 733 do Código Civil (serão deste diploma legal todos os preceitos indicados sem referência de origem) que "privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros". Os privilégios creditórios são de duas espécies: mobiliários e imobiliários, artigo 735 nº 1, sendo que os privilégios imobiliários são sempre especiais, artigo 735 nº 3. O artigo 751 dispunha que os privilégios imobiliários são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores. Hoje tal preceito dispõe que "Os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores", artigo 751, na redacção do artigo 5º Dec. Lei nº 38/2003 de 8 de Março. "O privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente", artigo 749. Nos termos do artigo 686 "a hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo". Apesar de uma primeira leitura dos preceitos legais citados, concretamente do artigo 735 nº 3, indicar que os privilégios imobiliários são sempre especiais, sucede que diversos diplomas legais posteriores ao Código Civil vieram criar privilégios imobiliários gerais. Concretamente estabelece o artº 12º n.º. 1, al. a) e b) da Lei n.º 17/ 86, de 14.06., que “os créditos emergentes do contrato individual de trabalho regulados pela presente lei gozam dos seguintes privilégios: privilégio mobiliário geral; privilégio imobiliário geral”. A Lei n.º 17/86 de 14 de Junho foi alterada pela lei n.º 96/2001 de 20 de Agosto, a qual altera o regime de privilégios dos créditos dos trabalhadores resultantes da lei dos salários em atraso e dos restantes créditos emergentes do contrato de trabalho de trabalho e graduação dos mesmos em processos instaurados ao abrigo do CPEREF. Dispõe o artº 4º da Lei n.º 96/2001, que “Os créditos emergentes de contrato de trabalho ou da sua violação não abrangidos pela Lei n.º 17/86 de 14 de Junho, gozam dos seguintes privilégios: a) privilégio mobiliário geral; b) privilégio imobiliário geral. Perante estes princípios jurídicos também se têm perfilado duas correntes na jurisprudência. Uma seguida pelos Recorrentes defende que os privilégios imobiliários gerais de que gozam os créditos dos trabalhadores preferem sobre o crédito de terceiro garantido por hipoteca. Uma outra, a que aderimos e pensamos ser largamente maioritária, entende que mesmo após a entrada em vigor da Lei n.º 96/01 de 20 de Agosto os privilégios imobiliários gerais de que gozam os créditos dos trabalhadores não preferem sobre o crédito de terceiro garantido por hipoteca. Já tivemos oportunidade de afirmar e mantemos essa posição “que o artigo 751 determinava que os privilégios imobiliários (não distinguindo entre especiais e gerais) são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele, e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores. Todavia já alguma Jurisprudência entendia que o disposto no citado artigo 751 apenas valia para os privilégios imobiliários especiais (que foram os tidos em consideração pelo legislador do Código Civil) e não para os privilégios imobiliários gerais, como é o caso presente. Neste sentido o Acórdão do STJ de 3 de Abril de 2001 do qual foi Relator o Exmº Conselheiro Dr. Azevedo Ramos, onde se pode ler "o referido artigo 751 contém um princípio geral insusceptível de aplicação ao privilégio imobiliário geral, pelo facto dos privilégios imobiliários não serem conhecidos aquando do início da vigência do actual Código Civil e ainda porque não estando sujeitos a registo, afectam gravemente os direitos de terceiro" [Cfr. ainda a Doutrina citada neste Acórdão, Prof. Almeida Costa, Direito das Obrigações e A. Luís Gonçalves, Privilégios Creditórios, Evolução Histórica, Regime e sua Inserção no Tráfico Creditício, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. LXVII. Ainda no mesmo sentido Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 2º Vol. p. 500 e 501]. No mesmo sentido igualmente o Ac. do STJ de 6.3.2003, proferido no processo nº 4/2002. Pensamos que este entendimento se mostrava o mais adequado, face aos valores em confronto e à evolução legislativa relativamente aos privilégios imobiliários. Aliás a recente alteração legislativa (Dec. Lei nº 38/2003 de 8 de Março) veio sufragar esta posição, uma vez que o artigo 751 em apreço se refere agora expressamente aos privilégios imobiliários especiais afastando claramente (pois não os desconhece como o legislador do Código Civil) os privilégios imobiliários gerais. Deste modo não sendo aplicável o disposto no artigo 751 ter-se-á que aplicar o regime previsto no artigo 749 (o privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente)”, cfr. Ac. desta Relação de 26.01.2004, proferido no Processo 6492/03, de que fomos Relator. [Neste sentido para além dos Acórdãos referidos supra nota 3, cfr.: - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-11-2005, Relator Conselheiro Nuno Cameira “1 - Os privilégios imobiliários gerais de que gozam os créditos dos trabalhadores, previstos no art.º 12º da Lei dos Salários em Atraso (Lei 17/86) não preferem sobre o crédito de terceiro garantido por hipoteca, mesmo depois da entrada em vigor da Lei 96/01, de 20 de Agosto. 2 - São privilégios creditórios que por analogia se enquadram na previsão do art.º 749º e não do art.º 751º, ambos do Código Civil.”, in www.dgsi.pt. - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-10-2005, Relator Conselheiro Siva Salazar “I- O artigo 751 do CC contém um princípio geral insusceptível de aplicação ao privilégio imobiliário geral, por este não incidir sobre bens determinados, pelo que não está envolvido de sequela. II- Assim, os direitos de crédito garantidos por tais privilégios cedem perantes direitos de crédito garantidos por hipoteca”., Col. Jur. (Ac. STJ), Ano XIII, tomo III, pag. 86; - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-07-2005, Relator Conselheiro Lopes Pinto “III- Um privilégio imobiliário geral não é um direito real de garantia, sendo-lhe aplicável o regime do artigo 749 do CC. IV- Concorrendo um crédito hipotecário com créditos laborais que gozem de privilégio imobiliário geral, aquele é graduado antes destes., Col. Jur. (Ac. STJ), Ano XIII, tomo II, pag. 116] Por tudo o que se vem de dizer já tivemos oportunidade de afirmar, (pelo que mantemos, não vislumbrando razões válidas para alterar a posição) não só em Acórdão de que fomos Relator mas também em vários outros de que fomos Adjunto, que estando os créditos dos Recorrente (trabalhadores) garantido por um privilégio imobiliário geral não podem os mesmos preferir ao crédito do IGFSS que se encontra garantido por uma hipoteca legal. Este crédito goza de prioridade, na sua graduação, sobre os créditos do Recorrentes que beneficiam de um privilégio imobiliário geral. D) Ainda que se não concorde com a conclusão que se formulou supra sempre o crédito dos Recorrente deveria ser graduado atrás do IGFSS. Tem sido orientação do Tribunal Constitucional sufragada em diversos Acórdãos julgar inconstitucionais as normas constantes de diplomas que conferem privilégios imobiliários gerais, quando tais normas são interpretadas no sentido de que o privilégio imobiliário geral nelas estabelecido confere prioridade relativamente à hipoteca nos termos do artigo 751. O Tribunal Constitucional julgou inconstitucionais tais normativos por violação do princípio da confiança. Podemos ler no Ac. nº 160/2000, de 22.3.00, publicado no DR de 10.10.2000, II. Série, que o princípio da confiança, ínsito na ideia de Estado de Direito democrático, postula um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhes são juridicamente criadas, censurando as afectações inadmissíveis, arbitrárias ou excessivamente onerosas, com as quais não se poderia moral e razoavelmente contar. [No mesmo sentido os Acs. do T. C. nº 354/00 de 5.07.00 e nº 109/01 de 5.03.01, publicados, respectivamente, no DR. de 07.11.00 e de 24.04.02, II. Série] A ideia de segurança e de protecção que os particulares encontram no registo da hipoteca seria gravemente afectada com uma interpretação que confira aos privilégios imobiliários gerais uma amplitude tal que neutralizasse aquela garantia. Deste modo, deveremos entender que os privilégios imobiliários gerais, que não incidem sobre bens concretos e determinados, apenas devem prevalecer relativamente a titulares de créditos comuns. Assim, como se concluiu supra o regime aplicável terá de ser o previsto no artigo 749 e não o do artigo 751. Podemos, desta forma, concluir que não assiste razão aos Recorrentes em pretenderem ver o seu crédito graduado com prioridade ao do IGFSS. 3- CONCLUSÃO Em suma, o disposto no artigo 152 do CPEREF aplica-se só aos privilégios creditórios, e não às hipotecas (legais ou não), devendo o crédito do IGFSS, o qual se encontra garantido por uma hipoteca, ser graduado à frente do crédito dos Recorrentes, (trabalhadores) que se encontra garantido por um privilégio imobiliário geral. IV – DECISÃO Por tudo o que se deixou exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação deduzido pelos Apelantes e, consequentemente, confirma-se a decisão recorrida. Custas pelos Recorrentes. Porto, 12 de Junho de 2006 José António Sousa Lameira José Rafael dos Santos Arranja Jorge Manuel Vilaça Nunes |