Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0721649
Nº Convencional: JTRP00040409
Relator: MÁRIO CRUZ
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
Nº do Documento: RP200706050721649
Data do Acordão: 06/05/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFLITO DE COMPETÊNCIA.
Decisão: DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA.
Indicações Eventuais: LIVRO 249 - FLS 225
Área Temática: .
Sumário: O tribunal competente para a execução é também competente para instruir e julgar a oposição.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

A Dig.ma Procuradora -Adjunta junto desta Relação suscitou a resolução do conflito negativo de competências entre os M.ºs Juízes do ..º Juízo Cível e da ..ª Vara Mista, ambos de Vila Nova de Gaia, para o julgamento de processo de oposição à execução com valor superior à alçada dos Tribunais da Relação.
Na sua base estão duas decisões, ambas transitadas em julgado, em que ambos os Juízes dessa Comarca se declaram incompetentes para o julgamento:
- O Juiz da ..ª Vara Mista, por ter entendido que, sendo recebida a oposição à execução e devendo o processo seguir, sem mais articulados, os termos do processo sumário (art. 817.º-2 do CPC), deveria, em seu entender, passar a ser da competência do Juiz singular, face ao disposto no art. 791.º-1 do CPC, uma vez que, na sua interpretação, está excluída nos processos sumários a intervenção do Tribunal Colectivo;
- O Juiz do ..º Juízo Cível, por ter entendido que, sendo a execução da competência da Vara Cível (art. 97.º-2-b) da LOTJ), e a oposição à execução sua dependência, deveria esta ocorrer por apenso à execução ali pendente, conforme manda o art. 817.º-1 do CPC, e ainda porque o art. 817.º-2 do CPC apenas se reporta ao ritualismo processual a observar após o recebimento da oposição, nada tendo a ver com a competência de tribunais de competência específica.

Notificados os Ils. Juízes em conflito, nenhum deles veio acrescentar algo aos anteriores despachos.

O M.º P.º emitiu douto Parecer, onde sustenta dever ser fixada a competência na ..ª Vara Mista de Vila Nova de Gaia, não só porque a ..ª Vara Mista de Gaia é incontestavelmente, in casu, a competente para a acção executiva. (art.818.º do CPC), e porque, sendo a oposição à execução sua dependência, correndo por apenso, e onde se discute a validade do título – que no caso não é decisão judicial -, deve continuar a ser competente para dela conhecer o tribunal que tenha sido competente para a execução, conforme decorre do disposto nos arts. 103.º da LOFTJ e arts. 96.º e 353.º-1 do CPC

Cumpre decidir:

Os factos a ter em consideração são os já acima referidos.

Estamos efectivamente perante um conflito negativo de competências, entre Juízes de Vara Mista e de Juízo Cível, na mesma circunscrição territorial, porque estando ambos os despachos transitados em julgado, ambos negam a competência própria.
Interessa ter presente, por outro lado, que o conflito respeita à competência para a instrução e julgamento de
- uma oposição à execução
- fundada em título que não decisão judicial,
- e em que o valor em causa é superior ao valor da alçada do Tribunal da Relação.

Pois bem:

Em Vila Nova de Gaia não existem – pelo menos por agora - juízos de execução

Estipula o art. 97.º-1-b) da LOTJ (Lei 3/99, de 13/01, com a redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 38/2003, de 8/03), que

“Compete às varas cíveis exercer nas acções executiva fundadas em título que não seja decisão judicial, de valor superior à alçada dos tribunais da Relação, as competências previstas no CPC., em circunscrições não abrangidas pela competência dos juízos de execução.”

Assim, face aos pressupostos já atrás enunciados, é inquestionável que é a ..ª Vara Cível de Vila Nova de Gaia a competente para a execução.

A questão que se coloca é a de saber se deixará de ser a Vara Cível a competente para a oposição à execução[1].

Vejamos:

O art. 817.º-1 do CPC estipula que a oposição à execução corre por apenso ao processo do qual dependa, enunciando o seu n.º 2 que, se for recebida a oposição, o Exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 20 dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo sumário de declaração. (sublinhados nossos)
Repare-se na expressão “os termos do processo” (que não “a forma do processo- ou sua qualificação”).
Há que considerar, antes de mais, que a petição de oposição à execução corresponde, na sua estrutura formal, à contestação de uma acção declarativa, e que a contestação à oposição corresponde à resposta/réplica de uma acção declarativa.
Ou seja, o art. 817.º, na expressão “termos do processo sumário” marca o rito, mas não a competência, pelo que o Tribunal competente para a execução é também competente para a oposição que, correndo apensa a ela, tem por objectivo último atacar o título.[2]

E na verdade, mesmo quando a lei admite a intervenção do Tribunal colectivo (como nas Varas), nem por isso deixa de ser o Juiz que a ele presida, o competente para apreciar a matéria de facto e de manter-se ele o competente para proferir Sentença, se a intervenção do Tribunal colectivo não vier a ter lugar.- cfr. 646.º do CPC, designadamente o seu n.º 5.[3]

Assim, mesmo seguindo os termos, ou seja, o ritualismo da acção declarativa sumária após a oposição, nem por isso deixa o Juiz da Vara de ser o competente para instruir e julgar a oposição à execução.

O conflito entre os dois M.ºs Juízes resolve-se, portanto, atribuindo este Tribunal da Relação a competência ao Juiz da ..ª Vara Mista de Vila Nova de Gaia

Porto, 5 de Junho de 2007
Mário de Sousa Cruz
Emídio José da Costa
Alziro Antunes Cardoso

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[1] Perante as normas jurídicas em que cada um dos Ils. Juízes se apoia, temos de encontrar a solução à luz do art. 9.º do CC., ou seja, a solução há-se encontrar-se, pesquisando, a partir dos textos, o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada, não podendo ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, e presumindo o intérprete que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
[2] Ac. RP de 2007.02.22, in www.dgsi.pt proc. 0730569, Pinto de Almeida, Telles de Menezes e Mário Fernandes.
[3] No mesmo sentido, Ac. TRP, de 2006.12.04, in www.dgsi.pt proc.0655190, Macedo Domingues, Sousa Lameira e Mariano Esteves