Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP00037179 | ||
| Relator: | HENRIQUE ARAÚJO | ||
| Descritores: | ACIDENTE DE VIAÇÃO VALOR INDEMNIZAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RP200409280423204 | ||
| Data do Acordão: | 09/28/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - A reconstituição natural é o meio impróprio ou inadequado quando houver manifesta desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor, e o custo que a reparação natural envolve para o responsável. II - Este princípio não poderá resultar em benefício do lesante para não restituir o lesado à situação que existiria se não se tivesse verificado a lesão. III - Não basta apenas ter em conta o valor venal do veículo, mas ainda e cumulativamente, o valor que tem o uso que o seu proprietário dele extrai e que se manifesta na possibilidade de dele dispor sempre que quiser. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I. RELATÓRIO B....., casado, reformado, residente na Rua....., ....., Luxemburgo, propôs contra C....., na qualidade de proprietário da estação de recolhas sita na Rua....., ......, a presente acção declarativa de condenação, em processo ordinário, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de Esc. 3.367.210$00 pelos prejuízos sofridos em consequência da queda do seu veículo automóvel no momento em que este era deslocado para o piso superior numa plataforma elevatória. Na contestação o Réu arguiu a sua ilegitimidade, baseado em que a proprietária da estação de recolhas é a sociedade comercial “D....., Lda.”, sendo ele apenas seu sócio gerente. Nos restantes artigos da sua defesa, o Réu impugnou ainda a factualidade alegada pelo Autor. O Autor replicou mantendo o alegado na petição inicial e pedindo a intervenção principal da sociedade comercial “D....., Lda.”. O Réu nada opôs ao referido incidente, tendo sido admitida, no despacho de fls. 71, a intervenção principal provocada da dita sociedade que, uma vez citada, fez seu o articulado de defesa do Réu primitivo. Realizou-se a audiência preliminar no decurso da qual se julgou improcedente a excepção da ilegitimidade. Elencaram-se os Factos Assentes e organizou-se a Base Instrutória. O Réu C..... interpôs recurso de agravo da decisão que julgou improcedente a excepção da ilegitimidade, recurso esse que foi admitido com subida diferida e com efeito devolutivo (v. fls. 113). Nas respectivas alegações o agravante conclui do seguinte modo: A. O réu-recorrente não é titular da relação material controvertida, nem sequer na perspectiva do autor, face à posição por este assumida na réplica (vide art. 6º e art. 3º do incidente da intervenção principal provocada). B. O réu-recorrente não é titular de qualquer dever ou sujeição, perante o autor. Pois, C. O réu-recorrente não celebrou com o autor qualquer contrato, não é proprietário da Estação de Recolhas em que se produziu o sinistro, não tem qualquer posição na causa de pedir configurada pelo autor, nem praticou qualquer facto violador do direito que aquele se arroga e, daí, ser parte ilegítima. D. O, aliás, douto despacho recorrido violou os arts. 26º, 288º, 1, al. d), 493º, 2 e 494, al. e) do CPC. Não houve contra-alegações do agravado e a Mmª Juiz exarou despacho tabelar de sustentação (v. fls. 134). O processo prosseguiu com a realização da audiência de julgamento, finda a qual se respondeu à matéria da Base Instrutória pela forma e com a fundamentação que consta de fls. 149 a 150, tendo o Autor reclamado da omissão de resposta ao quesito 47º, o que foi deferido a fls. 154. Foi, por fim, proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou a Ré “D....., Lda.” a pagar ao Autor a quantia de € 7.539,16 a título de danos patrimoniais, bem como a quantia de € 498,80, a título de danos morais, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até integral liquidação. Na mesma sentença declarou-se a absolvição do pedido do Réu C...... Por não se conformar com tal decisão dela recorreu a Ré “D....., Lda”. Tal recurso foi admitido como sendo de apelação, fixando-se-lhe, já neste Tribunal da Relação, o efeito meramente devolutivo. Nas alegações de recurso, a apelante pede a revogação da sentença recorrida por forma a que a sua condenação não ultrapasse a verba de Esc. 600.000$00, formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: A. Para a determinação dos danos patrimoniais, a sentença recorrida teve essencialmente por base os factos dados como provados nos quesitos sob os n.ºs 15, 38 e 39 da Base Instrutória. B. Na sentença recorrida omitiu-se em absoluto a discriminação do facto provado no quesito n.º 47 da Base Instrutória. C. E não conheceu da questão que o mesmo encerrava, de que devia conhecer. Assim, D. Quer por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, quer por não se pronunciar sobre questão que devia apreciar, a sentença é nula – ut arts. 659º, 2 e 668º. 1, b) e d) do CPC. E. É manifesto que também houve erro de interpretação e aplicação das normas legais impendentes, pois o montante da indemnização pelos danos provocados no veículo, não pode, nem deve ser igual ao montante orçamentado para a sua reparação. Pois, F. Sendo o valor comercial do veículo, à data do sinistro de 600.000$00, e o custo orçamentado para a sua reparação de 1.500.000$00, não há lugar à restauração natural, sob pena de manifesto abuso de direito e enriquecimento do lesado à custa do responsável. G. Quanto aos danos morais, não têm gravidade, nem merecem a tutela do direito, no âmbito da responsabilidade contratual, os meros “transtornos e incómodos”. E, H. Ainda quando exista obrigação de indemnizar, a sua quantificação sempre deverá ser proporcionalmente equivalente ao da obrigação incumprida, in casu reduzindo-se a menos de metade. I. A sentença recorrida violou, com erro de interpretação e aplicação as já referidas normas legais e, ainda, o disposto nos arts. 566º, 1 e 2, 334º e 496º, 1 e 3 do Cód. Civil. Não houve contra-alegações. A Mmª Juiz proferiu o despacho a que aludem os arts. 688º, n.º 4 e 744º do CPC, concluindo não existirem as nulidades apontadas nas alegações da apelante. Foram colhidos os vistos legais. * Sendo o âmbito dos recursos delimitados pelas conclusões dos recorrentes, as questões a decidir são:No agravo: - é o Réu C..... parte ilegítima na causa? Na apelação: - enferma a sentença das nulidades das alíneas b) e d) do n.º 1 do art. 668º do CPC? - a indemnização pelos danos materiais não deverá exceder a quantia de Esc. 600.000$00? - é devida indemnização ao Autor a título de danos não patrimoniais? * II. FUNDAMENTAÇÃOOS FACTOS Vêm provados da 1ª instância os seguintes factos: 1. No dia 9 de Janeiro de 1986, no Cartório Notarial de..... - ....., E..... e mulher declararam trespassar à sociedade D....., Lda, e F..... e G....., o estabelecimento de recolha de automóveis que possuem, instalado no r/c e cave de um prédio urbano sito na rua da....., com o nº.. a ... na freguesia de....., ...... Mais declararam os representantes da referida sociedade, que aceitam o referido trespasse, conforme doc. de fls 49 a 53 dos autos. 2. Esta garagem, que serve de local de depósito a muitos outros veículos, é composta por dois pisos sendo que um deles é térreo, dando acesso para o exterior, e o outro é uma cave, onde normalmente está recolhida grande parte das viaturas, entre as quais a do Autor. 3. Para tornar possível o acesso de viaturas a estes dois pisos, existe um elevador de automóveis, constituído por uma plataforma e por um cabo que suporta essa plataforma. 4. O R. predispôs-se a alugar um automóvel para o Autor, durante dois meses, até ao dia 3 de Setembro de 1999, pois que este necessitava de regressar ao Luxemburgo nessa data, pois terminava o seu período de permanência em Portugal. 5. O R. telefonou para a firma "H....." pedindo um automóvel para o A. 6. O A. começou a circular com um Renault-Clio a gasolina. 7. Chegado que foi o dia 3 de Setembro de 1999, o A. teve de entregar o automóvel no H...... 8. Como o A. não tinha dinheiro suficiente para a reparação do Audi matricula YS-...., começa a encetar diligências para accionar judicialmente o réu, ao mesmo tempo que procura arranjar bilhetes de avião para si e para a sua esposa, para regressar ao Luxemburgo. 9. O A. adquiriu no Luxemburgo o veículo de passageiros marca Audi, modelo..., matricula YS-..... 10. Durante o transporte da viatura do A. do piso inferior para o piso superior no referido elevador, o cabo que suporta a respectiva plataforma elevatória, por estar em mau estado de conservação, quebrou-se. 11. Em 5 de Julho de 1999, o A. que se encontrava de férias em Portugal, dirigiu-se à garagem de recolha a fim de proceder ao levantamento da referida viatura, que aí se encontrava há algum tempo recolhida e parqueada. 12. O facto descrito em 10. originou a queda da plataforma elevatória, da viatura do A. e também de um mecânico que nela seguia, de uma altura de cerca de três metros. 13. Em consequência da queda, o referido veículo sofreu danos ao nível da carroçaria, suspensão e mecânica. 14. O R. prontificou-se imediatamente para reformar todos os danos do veículo decorrentes daquela queda. 15. O R. acrescentou também que lhe iria colocar à disposição uma viatura de aluguer para que pudesse retomar a sua vida normal. 16. O A. foi à garagem do réu, onde lhe foi comunicado que a sua viatura já estava pronta e se quisesse já a poderia levar. 17. O A. confrontou o R. com o facto de a viatura não ser reparada numa oficina especializada da marca Audi. 18. O A. recorreu às oficinas da Audi para que fosse enviado um reboque, a expensas suas, para transportar o seu automóvel para essas oficinas, o que foi feito através do ACP onde o A. é lá sócio, para que fizesse uma estimativa dos custos de uma eventual reparação da viatura no sentido de restabelecer a situação que existia antes do acidente, cifrando-se na quantia de 1.500.000$00 + IVA (estimativa sem desmontagem da reparação). 19. A reparação não foi devidamente feita. 20. Assim, a viatura continuou: - Encurvada no sentido longitudinal; - Com grandes discrepâncias nas folgas das portas e pára-choques; - Com o banco do condutor danificado; - Com a pintura deficiente das partes esquerdas; - Com ressonância de escape; - Com os amortecedores ineficazes; - Com o trem traseiro desalinhado. 21. O automóvel Audi, encontrava-se em perfeitas condições antes do acidente. 22. O A. viu-se privado do seu automóvel desde o dia 5 de Julho de 1999. 23. Na sequência do acordado, entre as partes referido nos antecedentes pontos 4. e 5., o réu alugou um Renault Clio, a gasolina. 24. Em consequência do sucedido, o A. passou noites sem dormir e preocupado. 25. O A. ainda hoje vive momentos de tensão sempre que fala sobre o assunto. 26. Na peritagem realizada na Audi, referida no ponto 18., o A despendeu 11.466$00. 27. A reparação dos danos referidos em 20. importa a quantia de 1.500.000$00+IVA. 28. O veículo de marca Audi é de 1989. 29. O valor comercial do veículo à data do acidente era de 600.000$00 (v. fls. 154). O DIREITO Do agravo Começaremos pela análise do recurso de agravo, interposto pelo Réu C....., de acordo com a regra do art. 710º, n.º 1, do CPC. Decorre dos nºs 1 a 3 do art. 26º do CPC que: O réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer. O interesse em contradizer exprime-se pelo prejuízo que possa advir da procedência da acção. Pondo fim a longa polémica, o n.º 3 do art. 26º do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo DL 329-A/95, acolheu o conceito de legitimidade processual perfilhada pela tese subjectivista. Assim, na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor. No despacho recorrido a Mmª Juiz entendeu que o Réu C..... era parte legítima na medida em que, na perspectiva do Autor, o contrato aludido na petição inicial havia sido realizado com aquele. E, de facto, ao longo de toda a petição inicial o Autor apenas se refere à pessoa do Réu como sujeito passivo da relação jurídica que serve de causa de pedir, não havendo uma única referência à sociedade comercial “D....., Lda.”. Daí que, após a contestação do Réu C....., o Autor se tenha apressado a pedir a intervenção dessa sociedade no processo, como sua associada, “sem prejuízo do já alegado relativamente ao Réu” – v. art. 6º da réplica. Com esse incidente visou o Autor prevenir “uma eventual ilegitimidade passiva do Réu” – v. art. 7º do requerimento de intervenção. Cremos, assim, que a decisão proferida no despacho saneador sobre a legitimidade do Réu C..... não merece qualquer censura, justamente porque aferiu a existência desse pressuposto processual de acordo com a configuração que o Autor deu à relação controvertida. Da apelação Defende a apelante que a sentença enferma das nulidades das alíneas b) e d) do n.º 1 do art. 668º do CPC: não especificação dos fundamentos de facto e de direito justificativos da decisão e omissão de pronúncia. Fundamenta tal arguição na circunstância de a sentença não se ter referido à matéria resultante da resposta ao quesito 47º, omitindo em absoluto esse facto e a sua consequência jurídica. É efectivamente verdade que a sentença não elencou nos factos provados o relativo à resposta restritiva do quesito 47º, a que corresponde o ponto 29. supra. Todavia, como tem sido entendido pela doutrina e pela jurisprudência, só a falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito é motivadora de nulidade da sentença. Já o não é a fundamentação deficiente – v. Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, pág. 669. Por isso, no caso vertente, a falta de indicação do facto resultante da resposta ao quesito 47º não invalida a sentença, podendo contudo dizer-se que a sua fundamentação de facto é deficiente. E também não se vê como possa sustentar-se a existência da nulidade consistente na omissão de pronúncia. Com efeito, o facto da resposta ao quesito 47º não interfere nem prejudica a solução jurídica dada à causa, como melhor se verá infra. Improcedem, pelo exposto, as conclusões A. a D. O custo da reparação do veículo do Autor ascende a Esc. 1.500.000$00, montante ao qual acresce o IVA – v. 18. e 27. Esse veículo, à data do sinistro, valia Esc. 600.000$00 – v. 29. Pretende a apelante que o valor da indemnização pelos danos patrimoniais não ultrapasse o montante de Esc. 600.000$00, de acordo com uma das excepções ao funcionamento do princípio da restauração natural aflorado nos arts. 562º e 566º, n.º 1, do CC.: a de que a restauração natural é excessivamente onerosa para a apelante, constituindo até abuso de direito ou enriquecimento sem causa. Mais uma vez parece-nos não lhe assistir qualquer razão. A reconstituição natural é meio impróprio ou inadequado quando houver manifesta desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor, e o custo que a reparação natural envolve para o responsável – v. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, 4ª edição, Vol. I, pág. 813. Porém, como acertadamente se refere no Ac. do STJ de 07.07.1999, relatado pelo Exº Conselheiro Aragão Seia e publicado na CJSTS, Ano VII, Tomo III, págs. 16 e ss., este princípio não poderá resultar em benefício do lesante para não restituir o lesado à situação que existiria se não se tivesse verificado a lesão. Um veículo muito usado fica desvalorizado e vale pouco dinheiro, mas, mesmo assim, pode satisfazer as necessidades do dono, enquanto a quantia, muitas vezes irrisória, equivalente ao seu valor comercial, pode não conduzir à satisfação dessas mesmas necessidades, o que é o mesmo que dizer que pode não reconstituir a situação que o lesado teria se não fossem os danos. Por isso, vem-se entendendo que, para efeitos de considerar se a reconstituição natural traduzida na reparação do veículo é ou não excessivamente onerosa para o devedor, não basta apenas ter em conta o valor venal do veículo, mas, ainda e cumulativamente, o valor que tem o uso que o seu proprietário dele extrai e que se manifesta na possibilidade de dele dispor sempre que quiser – v. Ac. STJ de 21.11.2000, CJSTJ, Ano VIII, Tomo III, págs. 124/125. O que não pode suceder é que o lesado saia beneficiado com a restauração natural. Ora, o valor da viatura do Autor era de 600.000$00 e a sua reparação, orçada em oficina da marca, ascende à importância de 1.500.000$00, a que acresce o IVA – v. 18., 27. e 29. À primeira vista pode parecer grande a diferença. Há, contudo, que atender a alguns aspectos: o elevado valor dos veículos novos da marca do sinistrado, que é facto notório por ser do conhecimento de todos (art. 514º, n.º 1, do CPC); a extensão dos danos e a sua incidência em elementos estruturais da viatura; e o facto de o Audi se encontrar em perfeitas condições de funcionamento antes do acidente (v. 21.). Por outro lado, deve compreender-se a preocupação do Autor em realizar a reparação num representante da marca, que, em princípio, oferece mais e melhores garantias ao dono do veículo, embora, também em princípio, seja mais onerosa do que se realizada numa vulgar oficina. Por todas estas razões, e não obstante a fria disparidade dos números, supomos que a restauração natural não se mostra excessivamente onerosa para a apelante. Como se disse no primeiro dos acórdãos citados, “o interesse do lesado não tem de ser equacionado com o valor comercial do veículo; o que há é que repor este no estado em que se encontrava se não tivesse ocorrido o acidente”. Após a reparação, o veículo do Autor não ficou, com toda a certeza, com um valor mais elevado do que possuía à data do acidente: continuou a ser o mesmo automóvel, nas condições de funcionamento que tinha antes do evento. A reposição da situação que existia antes da lesão, não pode nunca ser tida como abuso de direito ou enriquecimento sem causa do lesado. Improcedem, assim, as conclusões E. e F. Questão seguinte: ressarcibilidade dos danos não patrimoniais. Não merece qualquer reparo o tratamento jurídico dado na sentença sobre o tipo de contrato celebrado entre o Autor e a chamada “D....., Lda”, nem sobre a responsabilidade civil que dele emergiu para esta. Do mesmo modo, também sufragamos o entendimento, que é maioritário na doutrina e na jurisprudência, de que são ressarcíveis os danos não patrimoniais decorrentes de um ilícito contratual – v. Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, 7ª edição, pág. 385, Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 7ª edição, pág. 523, e Vaz Serra, RLJ, Ano 108º, pág. 222; Acs. do STJ de 17.01.93 e de 09.12.1993, em CJSTJ, Ano II, Tomo I, pág. 61 e Tomo III, pág. 175, respectivamente. A questão está em saber se os factos dos pontos 24. e 25. constituem danos não patrimoniais indemnizáveis. De acordo com o art. 496º, n.º 1, do CC só são susceptíveis de indemnização os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. A avaliação dessa gravidade tem que ser feita segundo um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos. Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado – v. Antunes Varela, ob. cit., pág. 532. Costumam dar-se como exemplos de danos não patrimoniais as dores físicas e psíquicas, a perturbação da pessoa, os sofrimentos morais, a vergonha, o desgosto resultante de má imagem de carácter para com terceiros, os prejuízos na vida de relação, etc. Entendemos, todavia, que os meros incómodos ou contrariedades não se incluem no leque de danos não patrimoniais indemnizáveis, por não atingirem o nível de gravidade objectiva necessário para a atribuição de uma compensação monetária. Mais a mais, esses incómodos ou contrariedades variam consoante a pessoa do lesado e a personalidade deste. O Autor dedicou os arts. 67º a 75º da petição inicial para alegação dos factos relativos aos danos não patrimoniais. Esses artigos deram origem aos quesitos 32º a 37º. Os quesitos 33º e 35º tiveram respostas positivas, deles emergindo a matéria dos pontos 24. e 25. Os restantes quesitos foram respondidos negativamente. Ora, os factos dos pontos 24. e 25., só por si, desacompanhados da matéria incluída nos quesitos 32º e 34º (nos quais se falava de um estado depressivo e de consternação pelo comportamento da chamada), não traduzem a existência de dano não patrimonial indemnizável nos termos acima enunciados. E a resposta negativa ao quesito 37º (no qual se aludia ao dano consistente na privação da viatura no país onde o Autor se encontra emigrado), também não permite a atribuição de qualquer quantia a título de dano não patrimonial. Por outro lado, se é verdade que o início do fraseado do ponto 24. (em consequência do sucedido) parece apontar para uma situação originadora da falta de sono, da preocupação e da tensão do Autor, percorrida toda a matéria de facto provada não se antolha qualquer circunstância que tenha podido desencadear esses estados de espírito. Já assim não sucederia se tivesse resultado provada a matéria do quesito 32º, em relação à qual a dos quesitos 33º e 35º estava umbilicalmente ligada. Por conseguinte, nesta parte - a que respeitam as conclusões G) a I) - a apelação terá de proceder. * III. DECISÃODe acordo com o exposto, decide-se: 1. Negar provimento ao agravo mantendo-se o despacho recorrido. 2. Julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se em parte a sentença recorrida e determinando-se a absolvição da chamada “D....., Lda” relativamente aos danos não patrimoniais em que foi condenada em 1ª instância. 3. Confirmar, quanto ao restante, a sentença impugnada. * Custas do agravo pelo agravante.Custas da apelação pelo Autor e pela apelante na proporção de vencidos. * PORTO, 28 de Setembro de 2004Henrique Luís de Brito Araújo Alziro Antunes Cardoso Albino de Lemos Jorge |