Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00036768 | ||
| Relator: | SALEIRO DE ABREU | ||
| Descritores: | CAUÇÃO ADMISSÃO | ||
| Nº do Documento: | RP200403030430877 | ||
| Data do Acordão: | 03/03/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recorrido: | 4 V CIV PORTO | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | O julgar-se válida, idónea e suficiente uma caução só faz sentido e tem cabimento no pressuposto de que a caução é, em concreto, possível. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Por apenso aos autos de providência cautelar nº .../.. ......... a correr termos na .. Secção da .. Vara Cível do .......... apresentou-se JOSUÉ ............. a requerer lhe fosse admitida a prestação de caução com vista à substituição da providência decretada. Alegou, para tanto, que é inquilino de um estabelecimento de carvões instalado na Rua ..........., nºs ../.., ...........; que naquela providência foi ordenada a entrega desse estabelecimento; e que a concretização da entrega acarretar-lhe-á enormes prejuízos. Propôs-se prestar uma caução de € 14.963,95, na modalidade de fiança bancária. Notificada a requerente do procedimento cautelar – M............., Ldª - nos termos e para os efeitos do art. 387, nº 3 do CPC, a mesma deduziu oposição, negando a alegada qualidade de arrendatário do requerido e a existência de qualquer estabelecimento no local em causa; e alegando não existir qualquer fundamento para a prestação de caução, tanto mais que a entrega já tinha sido feita. Por despacho proferido a fls. 19 foi julgada “válida e idónea a caução oferecida pelo requerente”, devendo a mesma “ser prestada no prazo de 10 dias”. Contra o assim decidido interpôs a requerente M............., Lda, recurso de agravo, o qual foi admitido, mas veio a ser julgado deserto, por falta de alegações, por despacho proferido a fls. 96. Tendo o incidente prosseguido a sua tramitação, foi junto aos autos, a fls. 44, termo de fiança bancária, após o que o M.mo Juiz a quo proferiu, a fls. 56, o seguinte despacho: “Face ao termo de fls. 44, julgo validamente prestada a caução oferecida pelo requerente”. Inconformada com este despacho, interpôs a requerente M..........., Lda o presente recurso de agravo, tendo terminado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. A recorrente deduziu oposição à pretensão do recorrido de substituir a providência de restituição provisória de posse por caução; 2. No melhor entendimento, as providências cautelares nominadas não são substituíveis por caução; 3. Concretamente, a restituição provisória de posse não admite a sua substituição por caução; 4. A substituição da caução pretendida e admitida é ilegal, violando a lei; 5. Sendo assim, como é, a caução jamais poderá ser válida e tão pouco idónea; 6. Até porque, não assistindo ao recorrido o direito a prestar caução, o valor é insindicável ou inqualificável; 7. Sem prejuízo, acresce que a garantia bancária apresentada não foi em termos adequados ao fim que pretendia; 8. O douto despacho recorrido violou, por erro de interpretação, os arts. 387º, 393º, 394º, 395º, 983º, 984º e 998º, todos do CPC. Pede a revogação daquela decisão e a sua substituição por outra que “reconheça a impossibilidade de substituir a restituição provisória da posse por caução e julgue a caução como não válida e inidónea”. Contra-alegando, o agravado pugna pela manutenção do despacho recorrido. Corridos os vistos, cumpre decidir. II. Versam os presentes autos sobre um incidente de prestação de caução. Escreveu-se no Ac. do STJ, de 18.5.99 (in CJ/STJ, 1999, II, 97 e BMJ, 487º-251) que o processo de prestação de caução comporta duas fases: uma primeira, cujo objectivo é o de saber se é possível ou não à pessoa que oferece a caução prestá-la, ou se é ou não possível ao credor exigir do devedor a prestação da caução que pretende; e uma segunda fase (fase burocrático-executiva), com o objectivo de implementar o direito reconhecido. Numa primeira fase, decide-se se a caução pode ou deve ser prestada; concluindo-se pela afirmativa, entra-se na segunda fase, destinada a saber qual a forma da caução, se esta é ou não idónea e se é ou não suficiente. É manifesto que, num processo desta natureza, a primeira coisa a resolver é saber se é ou não admissível a prestação de caução. Só depois de tal questão estar decidida é que vem a questão da modalidade da garantia, da sua idoneidade e do seu montante. No caso sub judice, estamos perante um incidente de prestação espontânea de caução, nuns autos de procedimento cautelar (de restituição provisória de posse, ao que resulta das alegações da recorrente), em que o aí requerido pretende a substituição da providência decretada pela prestação de uma caução. Após a requerente ter oferecido a sua oposição, foi proferido despacho a julgar “válida e idónea a caução oferecida” e a fixar prazo para a sua prestação. Embora sem decisão expressa, tal despacho tem, quanto a nós, pronúncia implícita quanto à questão da admissibilidade da caução. Na verdade, não faria qualquer sentido um julgamento sobre a validade e idoneidade da caução, caso não se tivesse concluído que a mesma era admissível. Porquê um tal juízo e para quê fixar prazo para a prestação da garantia se, só posteriormente, viria a decidir-se da sua admissibilidade ou não ? Por isso, - e a não ser que se tenha querido dizer que a concretização da substituição da providência decretada só poderá ter lugar após a efectiva prestação da caução - discordamos do entendimento expresso pelo M.mo Juiz a quo quando escreve, a fls. 56 vº, que “só a partir do momento em que é julgada válida a caução prestada é que o tribunal poderá apreciar o pedido de substituição, o que significa que (...) a decisão sobre o incidente da prestação da caução não representa qualquer decisão no sentido de ser admitida a requerida substituição (...)”. Repete-se: o julgar-se válida, idónea e suficiente uma caução só faz sentido e tem cabimento no pressuposto de que a caução é, em concreto, possível. Ou seja, e no caso em apreço, de que a substituição da providência decretada por caução era legalmente admissível. Ora, ainda que inicialmente inconformada com o despacho que julgou válida e idónea a caução oferecida, o certo é que a requerida não apresentou alegações no agravo que, a propósito interpôs. Razão por que tal recurso foi julgado deserto. E, assim sendo, tal decisão transitou em julgado ([Deverá a recorrente notar que, no Ac. do STJ, de 18.5.99, por ela invocado nas alegações, o que estava em causa era o trânsito em julgado do despacho final, que julgara prestada a caução. Não o primeiro despacho, que julgara válida a substituição da providência por caução, despacho esse de que estava pendente recurso. Se deste não tivesse sido interposto recurso, ou se, como no caso em apreço, tivesse sido julgado deserto, o mesmo teria transitado em julgado]). Não pode, por isso, a ora recorrente pretender discutir, no presente agravo, a questão da admissibilidade da caução. Nem este Tribunal tem que sobre ela se pronunciar ([Dir-se-á, apenas, que de modo algum é pacífico o entendimento sobre a possibilidade, ou não, de substituição da providência de restituição provisória de posse, judicialmente decretada, por caução. No sentido da inadmissibilidade se pronunciaram os Acs. do STJ, de 18.5.99 e de 25.5.2000, CJ/STJ, 1999, II, 97 e 2000, II, 83; e Acs. da RE, de 15.4.99 e 20.5.99, BMJ, 486º-376 e 487º-376. Admitindo a substituição, vd. Ac. do STJ, de 16.3.2000, in Boletim nº 39 de Sumários do STJ e da RE, de 25.2.99, CJ, 1999, I, 278; Lebre de Freitas, CPC anotado, 2º, 81; Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV, 57; Lopes do Rego, Comentários ao CPC, 282]). Acresce que o presente recurso tem como objecto o despacho de fls. 56, que julgou “validamente prestada a caução oferecida pelo requerente”. No fundo, tal despacho limita-se a declarar que a caução se mostra prestada em conformidade e nos termos em que foi previamente admitida. Concretamente, o despacho em causa apenas “decide” que a caução se mostra bem prestada, de acordo com o despacho de fls. 19, que julgou “válida e idónea a caução oferecida pelo requerente”, ou seja, uma garantia bancária, no montante de € 14.963,95. Ora, sabido que os recursos não se destinam a apreciar questões novas, salvo as de conhecimento oficioso, o objecto do presente agravo teria que limitar-se a pôr em causa a justeza do aludido despacho de fls. 56. E o certo é que não foi sindicada a bondade de uma tal decisão, nem se vislumbra que o possa ser. O despacho recorrido não merece, na verdade, qualquer censura. III. Em face do exposto, e sem necessidade de outras considerações, nega-se provimento ao agravo, mantendo-se aquele despacho. Custas pela recorrente. Porto, 3 de Março de 2004 Estevão Vaz Saleiro de Abreu Henrique António de Passos Lopes Fernando Manuel de Oliveira Vasconcelos |