Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP00032080 | ||
| Relator: | AFONSO CORREIA | ||
| Descritores: | HIPOTECA JUROS ÂMBITO | ||
| Nº do Documento: | RP200110230121318 | ||
| Data do Acordão: | 10/23/2001 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recorrido: | 1 J CIV VIANA CASTELO | ||
| Processo no Tribunal Recorrido: | 446-A/98 | ||
| Data Dec. Recorrida: | 09/20/2001 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
| Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE. | ||
| Área Temática: | DIR CIV - DIR OBG. DIR PROC CIV - PROC EXEC. | ||
| Legislação Nacional: | CCIV66 ART693 N2. CPC95 ART805 N2. | ||
| Sumário: | I - A norma (artigo 693 n.2 do Código Civil) que proíbe que a hipoteca abranja os juros relativos a período superior a três anos é de interesse e ordem pública, podendo ser invocada por qualquer interessado e conhecida oficiosamente pelo tribunal. II - O início desse período de três anos é o dia de vencimento e consequente exigibilidade dos juros. III - Tal período de três anos pode completar-se, na pendência da execução, depois de deduzida a reclamação do pagamento dos juros. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Relação do Porto Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que o Banco A....., S. A., move a António..... e mulher Aline....., residentes em....., ....., e em que foram penhoradas duas fracções autónomas, veio o Banco B....., em 9 de Junho de 1999, reclamar o pagamento da quantia global de 17.312.430$00, quantia que abrange capital, juros vencidos até 4 de Junho de 1999 e despesas dos quatro financiamentos que discrimina, valor ao qual acrescem os correspondentes juros vincendos até ao limite legal de três anos, tudo nos termos e para os efeitos do art. 693º, nº 2, do CC. Depois de identificar os empréstimos e a garantia hipotecária de que beneficiam, pede o Banco B..... se admita a reclamação, se verifique e reconheça o aludido crédito e garantia sobre as fracções penhoradas, graduando-se no lugar que, em razão da sua preferência, lhe competir, para ser pago pelo produto da venda das fracções penhoradas. Reclamados outros créditos e sem qualquer oposição, o Ex.mo Juiz reconheceu a existência de todos os créditos e procedeu à sua graduação, depois de no Relatório da sentença ter deixado escrito que o Banco B..... reclamara créditos no valor de 17.312.430$00, também respeitante a empréstimos e também garantidos por hipoteca. E só este crédito reconheceu e graduou, omitindo os juros vincendos. Alegando que a sentença suscitava dúvidas quanto ao conteúdo e limites do seu crédito reclamado e graduado, o Banco B..... requereu esclarecimento, rectificação e ou aclaração da sentença por forma a que do Relatório da sentença conste que o Banco B..... reclamou créditos no montante de 17.312.430$00, abrangendo capital, juros vencidos até 04/06/99 e despesas, valor ao qual acresce - com relação a cada um dos financiamentos (os discriminados nas als. A), B), C) e D do art. 6º da sua reclamação) os juros vincendos desde 04/06/99 até ao limite legal de três anos. O Ex.mo Juiz indeferiu o requerido por entender que levando-se em conta a data em que tais financiamentos foram realizados, aquele valor (17.312.430$00) engloba já, como juros vencidos, os correspondentes a três anos. ... Do que se retira que a presente reclamação não pode abranger qualquer outro valor relativo a dívida de juros, designadamente, juros vincendos. Foi por isso que na sentença se reconheceu o crédito da reclamante somente nos termos e com os limites que vêm identificados naquela peça, já que só eles são relevantes, como vimos, para o caso. Inconformada, apelou o Banco B...... pedindo que, no provimento do recurso, sejam graduados os seus reclamados créditos, garantidos por hipoteca, emergentes daqueles quatro financiamentos, pelos montantes de capital, despesas e juros vencidos tal como liquidados na reclamação - considerando-se, relativamente a cada um deles, as respectivas datas de início de contagem de juros até 04/06/99 -, bem ainda os correspondentes juros vincendos, contados de 04/06/99, até perfazerem o limite legal de três anos. Como melhor se vê da alegação que praticamente reproduziu naquilo a que chama CONCLUSÕES 1ª) – O Banco B..... reclamou nos presentes autos, nos termos do Art. 865º do CPC, os seus créditos sobre os executados ANTÓNIO..... e mulher, emergentes de quatro financiamentos, conforme discriminação constante do Art. 1º, als. A), B), C) e D) da reclamação; 2ª) - Os créditos reclamados encontram-se garantidos por hipoteca - até ao montante de 18.500.000$00 em capital, respectivos juros até à taxa de 16%,, acrescida da sobretaxa até 4% em caso de mora, despesas extrajudiciais até 740.000$00, com montante máximo de 30.340.000$00 -, sobre as fracções “AL” e “AM” do prédio urbano sito na freguesia de....., descrito na CRP de..... sob o nº --/----, penhoradas nos autos; 3ª) - A dívida reclamada pelo Banco B..... emergente daqueles quatro financiamentos, correspondente a capital e juros vencidos e despesas, foi liquidada na reclamação nos termos constantes do Art. 6º da reclamação e documentos n.os 4, 5, 6 e 7 que a acompanham; 4ª) - Os créditos reclamados, com relação a cada um dos quatro financiamentos, correspondem a capital, despesas, juros vencidos contados de cada uma das datas indicadas nos documentos n.os 4, 5, 6 e 7 (31/03/99, 27/09/96, 10/12/96 e 02/11/96, respectivamente) até à da reclamação (04/06/99), perfazendo a quantia de Esc. 17312430$00 (cfr. Art. 9” da reclamação); 5ª) - A reclamação da ora apelante não se limitou àquela quantia, pois - conforme se extrai da aludida liquidação de juros constante das als. A), B), C) e D) do Art. 6º da reclamação - os juros vencidos e liquidados naquele articulado não perfazem os 3 anos de juros garantidos pela hipoteca; 6ª) - Donde, para além destes juros vencidos em cada uma daquelas operações de crédito, o Banco B..... reclamou, ainda, os juros vincendos desde aquela data - 04/06/99 - até perfazerem o aludido limite de 3 anos que a hipoteca garante, conforme Art. 9º in fine da sua reclamação: “. . valor ao qual acrescem os correspondentes juros vincendos até ao limite legal de três anos, tudo nos termos e para os efeitos do Art. 693º do C. C”, 7ª) - Assim, a douta sentença recorrida errou, por no seu “Relatório”, ao referenciar limitativamente que o Banco B..... reclamou créditos “no valor de 17.312.430$00 ...“ bem ainda por na “Decisão” reconhecer e graduar apenas tal crédito para pagamento pelo produto da venda dos bens hipotecados, dela omitindo o remanescente dos créditos também reclamados pelo Banco B..... correspondentes aos juros vincendos desde 04/06/99 até perfazerem, relativamente a cada um dos financiamentos, o limite legal de 3 anos garantido pela hipoteca; 8ª) - Errou, também, o Meritíssimo Juiz a quo no douto despacho que indeferiu a aclaração do Banco B....., ao levar em consideração para o cômputo dos juros dos três anos garantidos pela hipoteca - à revelia da liquidação e do pedido da reclamante - a data da concessão dos quatro financiamentos em causa; 9ª) - Ou seja, o cômputo dos juros de três anos garantidos pela hipoteca sempre havia de ser considerado nos exactos termos da liquidação efectuada pela reclamante, tomando-se em conta a data de início de contagem de juros expressamente indicada (mormente Art. 6º, Als. A), B), C) e D) e docs. n.os 4, 5, 6 e 7 da reclamação); 10ª) - Preceitua o nº 2 do Art. 693º do Código Civil que a hipoteca garante juros relativos a três anos; 11ª) - O nº 2 do Art. 805º do Código de Processo Civil estabelece que, quando a execução (ou, no caso concreto, a reclamação) compreenda juros que continuem a vencer-se, a liquidação deles é feita, a final, pela Secretaria, em face do título executivo e dos documentos que o exequente (in casu, reclamante) ofereça, em conformidade com ele; 12ª) - Ainda, o nº 3 do Art. 54º do Código das Custas Judiciais consigna que, na contagem das execuções, o valor dos interesses vencidos é considerado, conforme os casos, até ao depósito ou à adjudicação de bens; 13ª) - Por último, o nº 4 do Art. 868º do Código de Processo Civil estabelece que se nenhum dos créditos, nem as correspondentes garantias forem impugnados, serão considerados como reconhecidos; 14ª) - Assim, tendo em conta os elementos e documentos constantes da reclamação e a inexistência de impugnação, no “Relatório” da douta sentença recorrida sempre haveria de constar mais precisamente o seguinte: que o Banco B..... reclamou créditos, garantidos por hipoteca, no montante global de 17.312.430$00, relativos a quatro financiamentos - os identificadas nas alíneas A), B), C) e D) do Art. 6º da reclamação - correspondentes a: a) - capital de 57.250$30 e juros vencidos no valor de 1.575$00, contados de 31/03/99 a 04/06/99, valor ao qual acrescem os juros vincendos desde 04/06/99 até perfazer o limite de 3 anos (ou seja, até 31/03/2002); b) - capital de 7.767.000$00, despesas de 800$00 e juros vencidos no valor de 2.296.182$00, contados de 27/09/96 a 04/06/99, valor ao qual acresce o dos juros vincendos desde 04/06/99 até perfazer 3 anos (ou seja, até 27/09/1999); c) - capital de 17.003$50, despesas de 1.950$00 e juros vencidos no montante de 6.167$50, contados de 10/12/96 a 04/06/99, valor ao qual acrescem os juros vincendos desde aquela data até perfazer o limite de 3 anos (ou seja, até 10/12/1999); d) - capital de 5.000.000$00, despesas de 1.600$00 e juros vencidos de 2.162.897$00, contados de 02/11/96 a 04/06/99, valor ao qual acrescem os juros vincendos desde 04/06/99 até ao limite legal de 3 anos (ou seja, até 02/11/1999); 15ª) - E, consequentemente, a “Decisão” da douta sentença ora recorrida, sempre haveria de verificar e graduar para pagamento “o crédito do reclamante banco B.....”, nos termos expostos supra, ou seja, - com relação a cada um dos financiamentos -, o capital, os juros vencidos tal como liquidados nos documentos que acompanham a reclamação, bem ainda os correspondentes juros vincendos até perfazerem o indicado limite de 3 anos - estes a liquidar a final pela Secretaria; 16ª) - É pois, evidente, considerando as datas indicadas para início de contagem de juros nas alíneas A), B), C) e D) do Art. 6º da reclamação e os correlativos docs. n.os 4, 5, 6 e 7 que ao apelante Banco B..... são devidos os juros vincendos até ao indicado limite legal, previsto no Art. 693º, nº 2 do Código Civil; 17ª) - Donde, por tudo quanto exposto, a douta decisão recorrida, ao decidir como decidiu, fez menos correcta interpretação e aplicação, designadamente, das normas seguintes: nº 2 do Art. 693º do Código Civil, nº 2 do Art. 805º e nº 4 do Art. 868º ambos do Código de Processo Civil. Não houve contra-alegação. Colhidos os vistos de lei e nada obstando, cumpre decidir a questão submetida à nossa apreciação e que é a de saber se os três anos a que se refere o nº 2 do art. 693º do CC se contam desde a data dos financiamentos que a hipoteca garante - tese acolhida pela sentença - ou, pelo contrário e como pretende o Banco B....., desde a data em que os juros reclamados se venceram, como liquidado. Para tal decidir veremos que estão documentalmente assentes os seguintes Factos: 1 - No exercício da sua actividade creditícia, o Banco B..... concedeu aos Executados os seguintes financiamentos: A) - Empréstimo nº 280.000109.982.0019 (contrato de 04/12/95) A.1) - Por contrato de 04/12/95, a BANCO B...... concedeu, a ANTÓNIO..... e mulher ALINE..... um empréstimo da quantia de Esc. 2.500.000$00 (dois milhões e quinhentos mil escudos), pelo prazo de seis meses, taxas e demais condições constantes do contrato de empréstimo de fs. 89 a 91. A.2) - Clausulou-se no citado contrato que o capital mutuado vence juros á taxa nominal de 16,5%, podendo o Banco B..... definir uma nova taxa em caso de eventual renovação da operação e como condição de tal renovação, sendo que, em caso de mora, os respectivos juros são calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que ocorrer a mora, estiver em vigor no Banco B..... para operações activas da mesma natureza (na data do contrato de 16,5%), acrescida de uma sobretaxa legal de 4%, a título de cláusula penal (cfr. cláusulas 9,15 e 16 do citado documento). B) - Empréstimo nº 280.000069.782.0019 (contrato de 27/03/96) B.1) - Por contrato de 27/03/96, a BANCO B..... celebrou com ANTÓNIO..... e mulher ALINE..... um contrato de empréstimo e concessão de apoios financeiros no âmbito do “PROCOM”, no qual interveio o IC......, LDA., através do qual concedeu um financiamento no montante de Esc. 13.500.000$00 (treze milhões e quinhentos mil escudos), pelo prazo, juros e demais condições constantes da fotocópia autenticada do contrato de fs. 96 a 119; B.2) - Clausulou-se no mencionado contrato que o capital mutuado venceria juros à taxa nominal anual de 10,125%, na data do contrato, acrescida de 3%, ou seja 13,125%, alterável pelo Banco B..... no início de cada período de contagem, nos termos constantes do Artigo Quinto, 1 a 8 do citado contrato, acrescendo, em caso de mora, uma sobretaxa até 4%, a título de cláusula penal, tudo conforme melhor consta do Artigo Sétimo, 1 e 2 do dito documento. B.3) - O referido empréstimo destinou-se a apoio financeiro para execução de projecto de investimento no âmbito do PROCOM, tendo em vista a realização de obras de remodelação, aquisição de equipamentos básicos e material de transporte e estudos (cfr. Artigo Primeiro do doc. nº 2). C) - Garantia Bancária nº 280.000160.982.0019 (contrato de 27/03/96) C.1) - No âmbito do contrato de apoio financeiro no âmbito do PROCOM de 27/03/96, vindo de referir, o BANCO B..... prestou uma garantia bancária a favor do IC... - INVESTIMENTOS....., até ao montante máximo de Esc. 682.000$00, garantindo a obrigação dos ora executados de utilização exclusiva do financiamento na realização dos objectivos definidos no projecto de investimento, obrigando-se a liquidar ao IC...-Investimentos... as importâncias que este tiver suportado em virtude do incentivo concedido a título de bonificação de juros, caso os executados não cumprirem essa sua obrigação de utilização exclusiva (cfr. Artigo Décimo Quarto , n.os 1 e 2 do dito documento, a fs. 106/107. C.2) - Clausulou-se no mencionado contrato que a título de comissão de garantia seria pago, semestral e antecipadamente, o valor correspondente a 2% ao ano, do montante total da garantia, ou seja, 682.000$00, convencionando-se ainda que as quantias que o Banco B..... eventualmente venha a desembolsar por virtude daquela garantia, são imediatamente exigíveis e vencerão juros à taxa máxima praticada pelo Banco B..... para operações activas, acrescida de uma sobretaxa até 4%, a título de cláusula penal, conforme consta do Artigo Décimo Quinto do documento, a fs. 107 e 108. D) - Empréstimo nº 280.000128.682.0019 (contrato de 02/05/96) D1) - Por contrato de 02/05/96, o Banco B..... concedeu a ANTÓNIO..... e mulher ALINE....., uma abertura de crédito em regime de conta corrente, até ao limite de 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos) pelo prazo, taxas e demais condições constantes do contrato certificado de fs. 120 a 128. D.2) - Clausulou-se no citado contrato que o capital mutuado venceria juros à taxa nominal de 14%, alterável pelo Banco B..... no início de cada período de contagem de juros, podendo também esta Instituição definir uma nova taxa em caso da eventual renovação da operação e como condição de tal renovação, sendo que, em caso de mora, os respectivos juros serão calculados à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que vigorar a mora, estiver em vigor no Banco B..... para operações activas da mesma natureza, acrescida de uma sobretaxa legal de 4%, a título de cláusula penal, conforme cláusulas NOVE - Um, Dois, Três e Quatro, QUINZE e DEZASSETE do citado documento. D.3) - O referido empréstimo destinou-se a apoio à tesouraria, conforme cláusula SEXTA do dito documento. 2 - Para garantia do cumprimento das obrigações pecuniárias assumidas no citado contrato de 27/03/96 (financiamento e garantia bancária, alíneas B e C acima), abrangendo capital até 18.500 contos, respectivos juros à taxa anual de 16%, acrescida de 4% em caso de mora, e despesas judiciais e extrajudiciais até 740 contos, os executados ANTÓNIO..... e mulher ALINE....., constituíram HIPOTECA a favor do Banco B..... sobre os seguintes bens pessoais: - fracções “AL” e “AM” do prédio urbano sito na Rua....., freguesia de....., concelho de....., descrito na Conservatória do Registo Predial de..... sob o nº../....., tudo conforme melhor consta do citado contrato - Artigo Décimo Sexto, al.) a 1, 2 e 3 do documento a fs. 108/109. 3 - A hipoteca constituída a favor do Banco B..... sobre as identificadas fracções “AL” e ‘AM” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de..... sob o nº.../...., garante “todas e quaisquer responsabilidade ou obrigações pecuniárias assumidas ou a assumir” pelos devedores “em conjunto ou em separado perante o Banco B..... credor, até ao montante em capital de 18.500.000$00, respectivos juros até à taxa anual de 160%, acrescida da sobretaxa até 4%, a título de clausula penal e bem como das despesas extrajudiciais até ao montante de 740.000$00 (...)“ pelo que garante todos os financiamentos identificados em A), B), C) e D), conforme cláusula 21, alínea a) do documento referente ao empréstimo D), a fs. 126. 4 - Esta hipoteca foi registada provisoriamente na Conservatória do Registo Predial de..... através das inscrições ..-.. - Apr. ../.... e convertida em definitivo pelo Averb. ../ Apr. ../....., conforme consta da Certidão da CRP, a fs. .../... para a fracção “AL.” e .../... para a fracção “AM”. 5 - As fracções “AL” e “AM’ do prédio descrito sob o nº .../....., encontram-se penhoradas nos autos, mostrando-se registada a primeira penhora pela Ap. ../...., provisoriamente por dúvidas, convertida pelo Av. .. - Ap. ../..... 6 - Em relação a cada um dos empréstimos o Banco B..... reclamou o pagamento das seguintes quantias, em dívida à data de 4 de Junho de 1999: A) - Empréstimo nº 280.000109.982.0019 (contrato de 04/12/95) CAPITAL 57.250$30 JUROS de 31/03/99 a 04/06/99 1.575$70 TOTAL 58.826$00 agravamento diário quanto a juros: 24$23, à taxa de 15,45% B) - Empréstimo nº 280.000069.782.0019 (contrato de 27/03/96) CAPITAL 7.767.000$00 JUROS de 27/09/96 a 04/06/99 2.296.182$00 DESPESAS 800$00 TOTAL 10.063.982$00 agravamento diário quanto a juros: 2.703$21, à taxa de 11,6513% C) - Garantia Bancária nº 280.000160.982.0019 (contrato 27/03/96) COMISSÕES 17.003$50 JUROS (moratórios) de 10/12/96 a 04/06/99 6.167$50 DESPESAS 1.950$00 TOTAL 25.121$00 [rectifica-se erro de soma.] agravamento diário quanto a juros: 8$02, à taxa de 15,45% D) - Empréstimo nº 280.000128.682.0019 (contrato de 02/05/96) CAPITAL 5.000.000$00 JUROS de 02/11/96 a 04/06/99 2.162.897$00 DESPESAS 1.600$00 TOTAL 7.164.497$00 agravamento diário quanto a juros: 2.467$80, à taxa de 15,45% tudo no montante de 17.312.426$00 (já descontados os 4$00 a que se refere a nota 1). Sendo estes os factos e aplicando-lhes o Direito Como resulta dos art. 687º do CC, 4º, nº 2, e 96º do CRP, a hipoteca deve ser registada, sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes [Trata-se de condição de eficácia, pois a hipoteca não registada é válida e pode a todo o tempo ser registada. Só em relação às hipotecas legais e judiciais o registo funciona como acto constitutivo, dado que não existem sem ele.]. Dispõe, por seu turno, o art. 693º do CC: 1 - A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo. 2 - Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos. 3 - O disposto no número anterior não impede o registo de nova hipoteca em relação aos juros em dívida. São acessórios do crédito, entre outros, os juros, as despesas de constituição da hipoteca e do registo desta, a pena estabelecida para o caso do não cumprimento (arts. 810º e segs.), etc. Quanto a juros, há que atender ... ao disposto no nº 2 deste artigo 693º: a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os juros relativos a três anos. Alterou-se, assim, o princípio que era duvidoso do artigo 900º do Código de 1867, não obstante a alteração introduzida pelo Decreto nº 19.126, de 16 de Dezembro de 1930. Mas, embora a hipoteca não possa abranger senão os juros de três anos, admite o nº 3 que se convencione nova hipoteca em relação a quaisquer juros em dívida. A indicação rígida dos juros de três anos, sem concretização dos períodos a que respeitam, tem a vantagem de afastar muitas dúvidas que se suscitam noutros países, como, por ex., a de saber se estão garantidos por hipoteca os juros vencidos durante a execução, e terá ainda a vantagem de estimular, para além de certo limite, a diligência do credor exequente. Também a proibição de convenção em contrário mostra que é no interesse de terceiros que se estabelece a limitação do nº 2; os juros poderiam acumular-se sem conhecimento destes. Ao mesmo tempo, incluindo na execução hipotecária os juros referidos na lei, evita-se (com real vantagem para todos) a necessidade de instaurar varias execuções: uma, relativa ao capital inicialmente garantido; outra ou outras, quanto a todos os juros posteriormente vencidos e acumulados. E dá-se ainda ao credor um lapso de tempo razoável para ele esperar pelo pagamento de juros sem recorrer a execução. O sistema intermédio fixado na lei tem, assim, reais vantagens [P. Lima - A. Varela, CC Anotado, I, nota 2 ao art. 693º.]. O referido prazo de juros (3 anos) não pode ser ampliado por convenção das partes, como expressamente diz o nº 2 do art. 693º. Tal pacto ou cláusula, a existir, seria nulo ou ter-se-á por não escrito. Trata-se de norma de ordem e interesse público, pode ser invocada por qualquer legítimo interessado, tal como deve ser oficiosamente aplicada pelo tribunal ou autoridade. É que esta limitação inspira-se em motivos e interesses de ordem pública: além de com ela se pretender dar ao credor um prazo razoável para que possa esperar pelo pagamento dos juros sem recorrer à execução, quer a lei também impedir fraudes - o credor, combinado com o devedor, poderia vir a reclamar juros que, entretanto, foram pagos - e evitar ainda que o público, em geral, seja induzido em erro, pois, porque os juros podem ir sendo pagos, regularmente, os terceiros ver-se-iam na necessidade de averiguar, em cada caso, se assim era ou não, para conhecerem, afinal, a exacta situação das coisas. Permitindo-se uma ampliação convencional do prazo, frustrar-se-iam, em boa medida, os objectivos da lei ao fixar o limite deste. De resto, o credor hipotecário sempre tem a seu favor o recurso aos registos especiais a que alude o nº 3 do citado art. 693º[Correia das Neves, Manual dos Juros, 375 e ss.]. Esta doutrina dos Prof. Pires de Lima e Antunes Varela, como de Almeida Costa (Obrigações, 4ª ed., 661) tem sido sistematicamente aplicada pelos nossos Tribunais [R.ão de Lisboa, ac. de 16.2.77, Col. 1977-I-206; e de 11.12.79, Col. 79-V-1618 e Bol. 222-463.], em detrimento da proposta do Prof. Vaz Serra, no BMJ 62-231 e ss, que era no sentido de a hipoteca cobrir os juros do ano corrente à data da penhora e dos dois anos anteriores, bem como os vencidos posteriormente até à fixação da quantia a receber por cada credor. Proposta que não vingou. De acordo com aqueles ensinamentos, o Supremo Tribunal decidiu, por Ac. de 5.12.80[BMJ 301-395.], que A garantia hipotecária não cobre os juros superiores a três anos, sem nova hipoteca. ainda que a execução tenha demorado anormalmente mais tempo, pois o preceituado no artigo 693º nº 3, do Código Civil, destina-se a evitar a acumulação de juros garantidos sem conhecimento de terceiros, sendo até esse o seu campo de aplicação por excelência, sabido que em regra os credores não deixam acumular juros durante três anos sem recorrerem aos meios judiciais. Esta Relação, por ac. de 8.10.91 [Col. Jur. 91-IV-261], reafirmando a mesma doutrina, excluiu da garantia hipotecária os juros vincendos na pendência da execução porque a reclamação abrangia já os juros de três anos. O mesmo não acontecia na espécie julgada no Ac. de 13.7.93, também por esta Relação: haviam sido reclamados juros vencidos de apenas três meses e vincendos. Entendeu-se na decisão recorrida que a reclamação marcava a data limite de contagem de juros garantidos pela hipoteca, mas a Relação mandou se contassem os juros vincendos até à liquidação desde que respeitado aquele limite legal de três anos: Não concretizando, o nº 2 do art. 693º do Cód. Civil, o período a que respeitam a indicação rígida dos juros de 3 anos tem, precisamente, a vantagem de afastar dúvidas sobre se estão, ou não, garantidos por hipoteca os juros vencidos durante a execução: a coberto dessa garantia durante aquele bem definido período, instaurada a execução antes do seu decurso, sempre dela necessariamente hão-de beneficiar até que o mesmo termine. Para além desse limite nenhuns outros favorece, quer vencidos antes, quer depois de intentada a execução. Respeitado aquele limite, os juros devem ser contados até ao momento da liquidação do julgado pela secretaria, na conta que se segue à sentença de extinção da execução [Col. 1993-IV-199.]. Reafirmou-se anterior doutrina e Jurisprudência no claro sentido de que a coberto dessa garantia durante aquele bem definido período (de três anos), instaurada a execução antes do seu decurso, sempre dela (garantia hipotecária) necessariamente hão-de (os juros) beneficiar até que o mesmo (período de três anos) termine. A situação é diferente no caso de as partes convencionarem que os juros serão pagos no fim do contrato, juntamente com o capital, em vez de o serem periodicamente, mormente ao mês, trimestre, semestre ou ao ano, como é prática mais usual. A este propósito, discorre o Prof. VAZ SERRA: «Não podendo então o credor reclamar os juros todos os anos, mas só em conjunto com o capital, não parece haver razão decisiva que se oponha a que todo o montante dos juros seja equiparado ao capital e a que, por isso, a hipoteca garanta juros correspondentes a período excedente ao autorizado na hipótese de se vencerem anualmente. Haverá apenas que exigir que conste do registo o montante total dos juros ou o número de anos por que são devidos, isto é, que se designe, directa ou indirectamente, o quantitativo dos juros, tal como deve designar-se o quantitativo do capital. «As razões por que se limita o número de anos, pelos quais os juros gozam, sem especial inscrição, da garantia hipotecária não têm aplicação ao caso de que se trata. Basta observar que o credor não pode compelir o devedor a pagar-lhe os juros senão no vencimento da divida principal» (Boletim nº 62, já citado, pág. 249). Parece-nos muito duvidosa esta posição do distinto Mestre pois que algumas das razões que levaram a lei a limitar o prazo continuam válidas aqui. Na verdade, pode verificar-se, igualmente, um peso excessivo de juros, a favor do credor hipotecário, em prejuízo dos outros, e, por outro lado, fica sempre aberta a porta à fraude, já que, não obstante o contratado, e até por conluio, o devedor pode ir pagando juros, e o credor aparecer depois a pedi-los na execução por inteiro [Correia das Neves, Manual, 3ª ed., 377/378.]. Esta observação leva-nos precisamente à questão que nos ocupa: o Ex.mo Juiz contou o período de três anos por que se estende a garantia a partir da data dos financiamentos; o Banco B..... liquidou os juros desde as datas em que se venceram e porque a reclamação deu entrada (em 9 de Junho de 1999 - fs. 71) quando se não haviam, ainda, completado os três anos de lei, pediu se considerasse na graduação os juros vincendos, os que se vencessem na pendência da execução, até perfazerem o limite legal de três anos. Temos por certo que o dies a quo deste período de três anos não tem de ser o da data dos financiamentos por mais que uma razão: em primeiro lugar, se o financiamento não vier a beneficiar de garantia real, designadamente hipoteca, não poderão ser reclamados nem o capital nem os juros, por a tanto obstar o disposto no art. 865º, nº 1, do CPC; depois, ainda que os financiamentos beneficiem de contemporânea hipoteca, só o registo desta confere eficácia aos acessórios, aos juros que constem do registo; por último, bem podem as partes convencionar data diferente para o vencimento de juros e enquanto estes se não vencerem não pode o credor reclamar o seu pagamento. Portanto, a data dos financiamentos não é, forçosamente - e não será normalmente - a data de início de contagem dos três anos a que se refere o nº 2 do art. 693º do CC. Atento o visto efeito constitutivo ou condição de eficácia do registo da hipoteca podíamos ser tentados a iniciar a contagem do período legal precisamente na data do registo da hipoteca que se pretende fazer valer. Mas também não é certo que assim possa ser. Se as partes tiverem convencionado data de vencimento dos juros, só a partir de tal data eles são exigíveis e, como tal, só desde então pode contar-se o prazo de três anos de garantia cujo decurso permite ao credor registar nova hipoteca sobre os juros em dívida (art. 693º, nº 3, CC). Resta-nos, pois, como data de início de contagem dos três anos durante os quais os juros beneficiam de garantia o dia de vencimento e consequente exigibilidade dos juros. E se instaurada a reclamação (ou execução) no decurso desses três anos assim contados, a garantia hipotecária cobre os juros até ao fim de tal período. O mesmo resulta do disposto no nº 2 do art. 805º do CPC que manda contar os juros que continuem a vencer-se durante a execução, contagem que há-de fazer-se nos termos dos n.os 4 e 5 do art. 53º do CCJ. No caso em apreço, iniciada a contagem de juros em 31.3.99, 27.09. 96, 10.12.96 e 2.11.96, para os financiamentos descritos em A, B, C e D, respectivamente, é claro que quando a reclamação deu entrada - em 9 de Junho de 1999 - ainda não haviam decorrido os três anos de lei e, por isso, podia o Banco B..... reclamar, como reclamou, o pagamento dos juros que se vencessem na pendência da reclamação até se completar o dito período de três anos. Nem se diga, contra este entendimento, que pode o reclamante pedir pagamento de juros que o reclamado já tenha pago, até por conluio com o devedor em detrimento dos demais credores. Este perigo existe sempre e pode verificar-se logo com a simulação do contrato gerador de juros. Mas é esconjurado pelo contraditório não só do devedor-executado mas também do exequente e demais reclamantes, nos termos do art. 866º, n.os 2 a 4, do CPC. E é a lei - art. 868º, nº 4, do CPC - que manda haver como reconhecidos os créditos (e respectivas garantias) que não forem impugnados. Como aqui aconteceu. Tem, pois, razão o Banco B..... Apelante e não pode manter-se a decisão recorrida. Decisão Termos em que, na procedência da Apelação, se revoga a decisão recorrida, na parte em crise (art. 684º, nº 4, do CPC), e se inclui na graduação operada os juros reclamados pelo Banco B..... desde 4 de Junho de 1999 até se perfazer o limite legal de três anos, período este que teve início em 31.3.99, 27.9.96, 10.12.96 e 2.11.96, respectivamente para os financiamentos descritos em A, B, C e D acima. Sem prejuízo, naturalmente, do comando do art. 53º, n.os 4 e 5, do CCJ. Sem custas, por não devidas. Porto, 23 de Outubro de 2001 Afonso Moreira Correia Albino de Lemos Jorge Rui Fernando da Silva Pelayo Gonçalves, |