Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0525693
Nº Convencional: JTRP00038535
Relator: CÂNDIDO LEMOS
Descritores: DIVÓRCIO
CASA DA MORADA DE FAMÍLIA
Nº do Documento: RP200511220525693
Data do Acordão: 11/22/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEDADO PROVIMENTO.
Área Temática: .
Sumário: O acordo sobre a atribuição de morada de família conseguido no divórcio por mútuo consentimento depois de homologado por sentença transitada, não pode ser alterado em processo de jurisdição voluntária, a pedido ou por imposição de uma das partes.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

No Tribunal Judicial de Ovar, ...º Juízo, e por apenso ao respectivo processo Litigioso de Divórcio (transformado em mútuo consentimento) veio B........, com os sinais dos autos, ao abrigo do disposto no art. 1413.º do CPC, intentar incidente de atribuição da cada da morada de família.
Tal requerimento foi liminarmente indeferido.
Inconformada apresenta este recurso de agravo e nas suas alegações formula as seguintes conclusões:
1.ª- Os acordos celebrados pelas partes ao abrigo do disposto no art. 1419 do C. Processo Civil, uma vez homologados por sentença transitada em julgado vigoram para o futuro.
2.ª- Tais acordos podem ser alterados ao abrigo do art. 1411 que prevê expressamente a possibilidade de alteração de todas as resoluções tomadas em processos de jurisdição voluntária, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a sua alteração.
3.ª- A atribuição da casa de morada de família é um incidente que se insere sistematicamente nos processos de jurisdição voluntária, previsto no art. 1413.
4.ª- A Requerente fundamenta o pedido de alteração da atribuição da casa de morada de família com matéria de facto posterior à sentença que decretou o divórcio e homologou o acordo em questão.
5.ª- Deve portanto, o pedido da Requerente ser apreciado pelo Tribunal "a quo".
Indica como violados os arts. 1411.º e 1413.º do C. Processo Civil.
Pugna pela procedência do recurso, prosseguindo os autos os trâmites legais.
Contra-alega o requerido em defesa do decidido e o despacho foi tabelarmente mantido.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Com interesse para a decisão, temos como assentes os seguintes factos:
1- Na acção de divórcio respectiva foi proferida sentença decretando o divórcio entre requerente e requerido por mútuo consentimento e homologando os acordos celebrados pelas partes.
2- Fora acordado atribuir a ambos o direito à casa de morada de família, antes tomada de arrendamento.
3- Transitada em julgado a sentença, vem agora a requerente pedir a atribuição a si do arrendamento da habitação em exclusivo, pretendendo que o ex-cônjuge marido abandone a casa.
Sendo estes os factos tidos como assentes, cumpre conhecer do objecto do recurso, delimitado como está pelas conclusões das respectivas alegações (arts. 684.º n.º3 e 690.º n.º1 do CPC).
A única questão colocada é a de saber-se se é possível, transitada em julgado a sentença que homologou os acordos necessários para haver divórcio por mútuo consentimento, alterar a atribuição da cada da morada de família através do processamento de jurisdição voluntária.
O despacho posto em crise seguiu a posição que colhe maioria na jurisprudência, mas não é uniforme.
No sentido da possibilidade de alteração por alteração das circunstâncias, face ao disposto no art. 1411.º do CPC, podem ver-se os Acórdãos desta Relação de 3/3/2004- Processo 2808/03- 2ª secção Relator Alziro Cardoso; e de 30/9/2002, processo 994/02- 5ª Secção, Relator Caimoto Jácome.
É, porém, conhecida a posição do relator destes autos, com o seu voto expresso no Acórdão de 2 de Maio de 1995, publicado na CJ, Ano XX, T3, 197, no sentido do aqui decidido.
Também o Supremo Tribunal de Justiça se tem pronunciado no mesmo sentido:
- Acórdão do STJ de 14/11/2002 processo 1727/03B, Relator Ferreira Girão: “É inadmissível a alteração, através do processamento da jurisdição voluntária, do acordo sobre o destino da casa de morada de família homologado por sentença transitada em julgado, proferida em acção de divórcio por mútuo consentimento”.
- Acórdão do STJ de 15/2/2005 no processo 3621/04A, Relator Alves Velho: “No divórcio por mútuo consentimento, a questão do destino da casa de morada da família não se apresenta nem pode ser tratada apenas como um dos efeitos do divórcio mas, antes e diferentemente, como condição da admissibilidade dessa modalidade de divórcio, enquanto elemento do complexo de vontades e acordos que nele se interligam e interdependem. Por isso, na medida em que poderia conduzir à frustração do equilíbrio e interesses que foram postos em equação e ponderação pelos cônjuges e pelo próprio juiz (ou Conservador), o acordo obrigatoriamente celebrado no processo sobre a atribuição da casa de morada da família não é modificável por iniciativa e imposição de uma das partes apenas”.
Salvo o devido respeito, não vemos razões convincentes que nos levem a alterar a posição assumida, tanto mais que o único argumento invocado no sentido do pretendido (possibilidade de alteração) é o mesmo que já antes se havia combatido: o valor das decisões dos processos de jurisdição voluntária, sempre passíveis de alteração.
Temos, assim, como correcta a posição assumida no despacho posto em crise, aderindo-se à decisão e seus fundamentos, a qual, por sua vez, adere ao nosso anterior Acórdão de 2/5/95, que cita.
DECISÃO:
Nestes termos se decide negar provimento ao agravo.
Custas pela agravante, tendo em atenção o benefício concedido.

Porto, 22 de Novembro de 2005
Cândido Pelágio Castro de Lemos
Alberto de Jesus Sobrinho
Mário de Sousa Cruz