Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
739/09.5TTMTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: DESPEDIMENTO COLECTIVO
PRESUNÇÃO
Nº do Documento: RP20120514739/09.5TTMTS.P1
Data do Acordão: 05/14/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento coletivo quando recebe a compensação prevista no Art.º 366.º, n.º 1 do CT2009.
II - Tendo o empregador transferido para a conta bancária do trabalhador tal compensação e tendo este demorado a devolver tal quantia cerca de dois meses ou mais, tal comportamento faz presumir a aceitação da licitude do despedimento.
III – Para ilidir tal presunção, deveria o trabalhador ter procedido à devolução da compensação imediatamente após o recebimento ou em prazo curto e fazer a prova do contrário.
IV – Não o tendo feito, presume-se a aceitação do despedimento coletivo, o que constitui facto impeditivo da ilicitude do despedimento, integrando uma exceção perentória pelo que, provada aquela, deve o empregador ser absolvido do pedido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Reg. N. º 875
Proc. N. º 739/09.5TTMTS.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B..., em 2009-08-03 e
C... e D..., em 2009-10-26,
interpuseram ações emergentes de despedimento coletivo, com processo especial, vindo a última a ser apensada à primeira, contra E…, S.A., pedindo:
I – Relativamente ao A. B…, que se:
a) Declare a ilicitude do despedimento coletivo e
b) Condene a R. a:
1) Reintegrar o A. B… ao seu serviço, na mesma categoria e com as mesmas regalias retributivas;
2) Facultar ao A. B… o uso de um telemóvel e respetivo cartão SIM, para uso profissional e pessoal;
3) Pagar ao A. B…:
i) Todas as retribuições intercalares vencidas e vincendas, no valor mensal de € 5.405,17, acrescidas dos respetivos juros de mora contados até ao efetivo pagamento;
ii) Uma indemnização por danos não patrimoniais de € 5.000,00 e
iii) Os juros vincendos.
II – Relativamente aos AA. C… e D…, que se:
a) Declare ilícito o despedimento coletivo e improcedentes os fundamentos invocados;
b) Condene a R. a pagar:
1) Ao A. C…:
i) A quantia de € 74.712,77;
ii) As retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nos autos;
2) Ao A. D…:
i) A quantia de € 91.276,98;
ii) As retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nos autos;
iii) A diferença de valores entre o que recebeu a título de subsídios de férias e de Natal, respeitantes aos anos de 2007, 2008 e 2009 e o que deveria ter recebido caso a R. tivesse tomado em consideração os valores das comissões que deveria ter pago nos meses que contribuíram para a formação da média, a fixar em incidente de liquidação e
3) Aos AA. C… e D…, juros, à taxa legal, que se vencerem sobre as quantias peticionadas, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Alegou o A. B..., apenas no que ao recurso interessa, que foi admitido ao serviço da R. em 1998-03-02, que exerceu as funções de Chefe de Departamento de Assistência e que auferia a retribuição mensal de € 5.405,17, sendo € 2.000,00 de retribuição base, € 1.537,17 de designado Seguro de Vida Capitalização e a parte restante correspondente ao valor do veículo que lhe estava atribuído, para uso total e sem qualquer custo para o A., a que acrescia o uso de telemóvel e respetivo cartão SIM, cujos custos de utilização pessoal e profissional eram pagos pela R., para além de outras atribuições patrimoniais que no ano de 2008 ascenderam a € 27.050,00. Mais alega o A. B... que foi objeto de despedimento coletivo, tendo a R. anunciado tal intenção por carta de 2009-04-28 e a decisão por carta de 2009-05-15 [cfr. fls. 44 e 45 ss. do I volume], sendo certo que procedeu ao pagamento da compensação no montante de € 22.820,00, calculada com base em € 2.000,00 mensais, bem como de outros créditos que se venceram face à cessação do contrato (férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal) [cfr. fls. 77]. Alega ainda o A. B... que depositou a referida compensação em 2009-07-30, em conta bancária titulada pela R. [cfr. fls. 78], pretendendo ilidir a presunção de aceitação do despedimento. Alega, por outro lado, que não foram cumpridas as formalidades legais do despedimento coletivo e que não se verificam os fundamentos invocados, o que acarreta a ilicitude do despedimento, com as legais consequências, traduzidas nos pedidos formulados. Por último, alega que sofreu danos não patrimoniais, que descreve, pelo que pede a indemnização de € 5.000,00. Juntou documentos, nomeadamente, carta datada de 2009-06-25 e dirigida à ACT em que requereu inspeção ao processo de despedimento coletivo dos autos e o levantamento de “…todos os devidos processos contraordenacionais.” [cfr. docs. de fls. 79 ss. do I volume].
Alegaram os AA. C... e D..., apenas no que ao recurso interessa, que foram admitidos ao serviço da R. em, respetivamente, 1996-12-02 e 1997-02-03, que exerceram as funções de vendedores de automóveis e que auferiam retribuição mensal mista, composta de retribuição base e comissões nas vendas, sendo a parte fixa de € 475,00, mas não podendo ser inferior a € 548,50 se a soma da parte fixa e da variável ficasse aquém desta última quantia, sendo certo que lhes estava distribuído um veículo para uso total e sem qualquer custo para os AA., a que correspondia o valor mensal de € 750,00. Mais alegam os AA. C... e D... que foram objeto de despedimento coletivo, tendo a R. anunciado tal intenção por carta de 2009-04-28 e a decisão por carta de 2009-05-15 [cfr. fls. 167, 168, 174 e 175 do processo apensado, de ora em diante designado apenas por anexo B], sendo certo que cada um dos AA., por carta que a R. recebeu em 2009-09-17, comunicou a esta que não aceitavam o despedimento coletivo, remetendo cheque com a importância correspondente ao montante da compensação recebida, cheques esses que a R., por seu turno, devolveu aos AA. [cfr. fls. 178 a 184, respetivamente, do anexo B]. Alegam, por outro lado, que não foram cumpridas as formalidades legais do despedimento coletivo e que não se verificam os fundamentos invocados, o que acarreta a ilicitude do despedimento, com as legais consequências, traduzidas nos pedidos formulados. Alegaram também que prestaram trabalho suplemenatr, que quantificaram e liquidaram, que a R. não contemplou todas as atribuições patrimoniais no cálculo das compensações e das restantes retribuições devidas, pelo que formularam os pedidos acima referidos, tendo em conta o pago e o devido.
Contestou a R., no processo do A. B..., por exceção, alegando em síntese que tendo o A. recebido em 2009-05-27 a compensação pela cessação do contrato, no montante de € 22.820,00, aceitou o despedimento coletivo, atento o disposto no Art.º 366.º, n.º 4 do Cód. do Trabalho de 2009 [CT2009], pois só em 2009-07-30 depositou um cheque à ordem da R. para devolver a compensação [cfr. fls. 78 do I volume], sendo certo que em 2009-05-15 já havia comunicado ao A. que iria proceder ao depósito, na conta deste, em 2009-05-31, o que foi efetuado em 2009-05-27, da quantia relativa à compensação e demais créditos devidos pelo despedimento coletivo. Alegou também que cumpriu as formalidades legais do despedimento coletivo e que se verificam os fundamentos do mesmo, que descreve e quanto ao mais, contestou por impugnação.
Contestou a R. [II volume], relativamente aos AA. C... e D..., por exceção, alegando em síntese que a petição inicial é nula, o que conduz à absolvição da R. da instância, porquanto foram deduzidos pedidos a que corresponde processo comum quando o dos autos é especial, sendo certo que a tramitação de todos os pedidos nos mesmos autos é incompatível, dada a diferença de atos processuais que integra cada espécie de processo, nomeadamente, audiência de partes, audiência preliminar, despacho saneador, prova pericial, entre outros. Mais alegou que tendo os AA. recebido em 2009-05-27 a compensação pela cessação do contrato, no montante de € 6.013,50 quanto ao A. C... e € 5.928,00 quanto ao A. D..., aceitaram o despedimento coletivo, atento o disposto no Art.º 366.º, n.º 4 do CT2009, pois só em 2009-09-16 cada um deles depositou um cheque à ordem da R. para devolver a compensação [cfr. fls. 178 ss. do Anexo B], sendo certo que em 2009-05-15 já havia comunicado aos AA. que iria proceder ao depósito, na conta destes, em 2009-05-31, o que foi efetuado em 2009-05-27, da quantia relativa à compensação e demais créditos devidos pelo despedimento coletivo e sendo certo ainda que a R. procedeu à devolução aos AA. dos referidos cheques, por considerar extemporàneo o referido comportamento dos AA [cfr. docs. de fls. 311 a 322 do II volume]. Alegou também que cumpriu as formalidades legais do despedimento coletivo e que se verificam os fundamentos do mesmo, que descreve e, quanto ao mais, contestou por impugnação.
Os AA. responderam às contestações, por impugnação.
No despacho saneador-sentença o Tribunal a quo decidiu:
I – “…improcedendo, embora a invocada nulidade da petição inicial, "…face ao disposto pelo arts. 470º, nº 1, 31º, 288º, nº 1, ai. e) e 493º, nº 2 do Código de Processo Civil, absolver a ré da instância no que respeita aos pedidos de condenação a pagar a cada um dos autores C… e D… a remuneração relativa a trabalho prestado aos sábados, em rotatividade, a remuneração relativa a trabalho prestado aos restantes sábados, aos domingos e feriados, a remuneração relativa ao trabalho prestado de segunda a sexta-feira, fora do horário de trabalho, à privação do uso do veículo automóvel, a comissões de junho e julho de 2009 e às diferenças de valores entre o que receberam a título de subsídio de férias e de Natal respeitantes aos anos de 2007, 2008 e o que deveria ter recebido caso a ré tivesse tomado em consideração os valores das comissões que deveria ter pago nos meses que contribuíram para a formação da média (arts.173º, 174º, 175º, 181º, 182º, 183º, 187º, 188º, 189º, 190º, 196º, 197º e 198º, valores contidos, respetivamente, nos pontos 2), 4) e 6) [correspondentes aos pontos II – b), 1) alínea i) e 2) alíneas i) e iii), supra] do pedido formulado a final da respetiva petição inicial.
II – …absolver a ré E…, S.A. dos pedidos de declaração de ilicitude do despedimento, de reintegração do autor B…, do pagamento a cada um dos autores C… e D… da indemnização pela ilicitude do despedimento, do pagamento a todos os autores das retribuições que deixaram de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, do pagamento ao autor B… de indemnização pelos danos morais e de todos os pedidos relativos a créditos vencidos e exigíveis em virtude da cessação dos contratos de trabalho formulados pelos autores C… e D….
Irresignado com o assim decidido, veio o A. B… interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue [o recorrente referiu confirmação, mas por lapso, certamente, como resulta claramente do contexto] o saneador-sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

01- A sentença sub judicio é nula, em virtude de não se ter pronunciado ou, pelo menos, faltarem os fundamentos de facto e de direito sobre a absolvição da Ré quanto aos pedidos com os números 2, 3 e 4 da Inicial, tudo nos termos das alíneas b) e d) do art° 668° do CPC, o que se invoca expressamente.
02- Como é sabido, as nulidades podem ser processuais, se derivam de atos ou omissões que foram praticados antes da prolação da sentença; podem também ser da sentença, se derivam de atos ou omissões praticados pelo Juiz na sua prolação.
03- As nulidades da sentença, tendo sido praticadas pelo Juiz, podem ser invocadas e fundamentadas no requerimento de interposição do recurso ou expressa e separadamente nas alegações do recurso - Tribunal Constitucional, Acórdão 304/2005, de 2005.06.08, proferido no processo 413/04.
04- Esta situação impede o recorrente de impugnar a sentença na parte em que desconhece, pelo que as alegações apenas versarão questão da presunção da aceitação do despedimento coletivo.
05- Entende o recorrente não ser justa nem legalmente fundamentada a sentença proferida pela Srª. Juiz titular do 2° Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
06- A única questão sobre a qual o recorrente circunscreve o recurso é à exceção perentória relativa à presunção da aceitação do despedimento coletivo pelo Autor com o recebimento da compensação - art° 366°, nºs 4 e 5 - e que a Srª. Juiz "a quo", julgou verificada.
07- Resulta da sentença que tendo o A. recebido na sua conta bancária (sem qualquer ato de vontade própria que demonstre a sua aceitação) uma transferência da Ré, cerca de 2 meses antes de cessar a relação laboral, sem conhecer a decomposição do valor pago, dos fundamentos do despedimento coletivo, dos colegas envolvidos, sem consultar um Advogado, a ACT ou um Sr. Procurador do Tribunal de Trabalho, deveria ter devolvido de imediato o valor recebido da Ré.
08- Atente-se que, como resulta da matéria assente, o A. devolveu o dinheiro à Ré, não dispondo dele efetivamente e que o devolveu ainda era trabalhador da mesma, uma vez que o seu contrato de trabalho só cessaria no próprio dia 30/07/2009.
09- Depois, é certo também, que a Ré conheceu a devolução do dinheiro, mas não o tratou de o restituir ao trabalhador invocando que entendera a aceitação do despedimento coletivo, o que indicia também o afastamento da presunção da aceitação do despedimento.
10- A Ré não só não devolveu o dinheiro ao A. como nem sequer o pôs à disposição do Tribunal, integrando-a na sua tesouraria.
11- Embora a Ré pretendesse que o despedimento coletivo produzisse efeitos a partir de 29/7/2009, o certo é que a comunicação ao recorrente ocorreu apenas em 15/5/2009 (com a antecedência inferior a 75 dias), pelo que a relação laboral apenas cessou em 30/7/2009, data em que o trabalhador devolveu o dinheiro recebido.
12- Mesmo que se entenda que a relação laboral terminou em 29/7/2009, o A. devolveu o dinheiro logo no dia seguinte à cessação da sua relação laboral.
13- Nada existe nos autos que prove que o A. teve conhecimento da entrada do dinheiro na sua conta logo após a sua transferência pelos serviços da Ré e nada lhe era exigível a esse respeito, nomeadamente a verificação diária da sua conta bancária.
14- A Srª Juiz a quo presumiu que o trabalhador conheceu a transferência pelo menos em 31/5/2009, mas sem qualquer fundamento de facto para tal desfecho.
15- É absolutamente compatível com a impugnação do despedimento, o facto de o recorrente ter devolvido à Ré a compensação em 30/7/2009, data até à qual manteve o dinheiro intocado na sua conta bancária sem dele dispor para o que quer que fosse, até recolher informação sobre o que fazer com o mesmo.
16- O A. deu entrada da presente ação logo no dia 3/8/2009, ou seja, no segundo dia útil seguinte à produção de efeitos do despedimento coletivo.
17- É agir como agiu, pagando a compensação com tamanha antecedência face ao terminus da relação laboral e prescindindo de forma ilegal do serviço do A., a Ré encontrou uma forma prática de inviabilizar ou pelo menos dificultar severamente a impugnação do despedimento coletivo.
18- Entendeu o Tribunal a quo que o A. teria de devolver o dinheiro imediatamente após o seu recebimento na sua conta bancária, a qual deveria vigiar desde, pelo menos, 31/5/2009 face ao anunciado pagamento pela Ré.
19- O recorrente alegou que o valor da compensação foi erradamente calculado, uma vez que a sua retribuição mensal não eram 2.000,00 € mas sim cerca de 3.500,00 €, como aliás foi já reconhecido no Processo 800/10.3TTMTS, do 1° Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos, exatamente pelo naipe de razões alegadas para o efeito na inicial.
20- Para se verificar a presunção de aceitação do despedimento é pressuposto que o trabalhador tenha recebido a totalidade da compensação que lhe era devida, como aliás já foi decidido, embora no âmbito da LCCT (DL 64-A/89 de 27.02 na redação anterior à dada pela Lei 32/99 de 18.05), pelo STJ no acórdão de 13.04.2005, proc. 04S3160, disponível em http://www.dgsi.pt./
21- Assim, a Ré não pagou a totalidade da indemnização devida ao trabalhador, pelo que nunca se pode sequer considerar a presunção de aceitação, pois essa implica que seja efectuado a totalidade do valor da compensação e não apenas o seu valor parcial.
22- Estão comprovadas nos autos - fls. 79 a 89 - comunicações do trabalhador à ACT e à DGERT em que demonstra a sua não aceitação do despedimento colectivo, aliás a Srª Juiz a quo reconhece que «... com elas, o autor ter demonstrado que considerava o despedimento ilícito ...»
23- O Código de Trabalho de 2009, depois de consagrar, no seu artigo 366.° n.º 4, uma disciplina literalmente idêntica à do artigo 401.° n.º 4 do CT'03, acrescenta, no seu n.º 5, uma normação do seguinte teor: “A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, à disposição do empregador a totalidade da compensação pecuniária recebida".
24- O legislador revela-se particularmente hostil ao acto do recebimento da compensação pelo trabalhador quando este, não obstante esse recebimento, ainda pretenda questionar o despedimento de que foi alvo.
25- Em tese geral, cabe demonstrar ao visado que o recebimento da compensação não significou, no seu caso específico, aceitação do despedimento, como reconhece a Srª Juiz com as comunicações de fls. 79 a 89, remetidas pelo recorrente à ACT e à DGERT.
26- E, não se duvidando que o possa fazer por qualquer meio probatório legalmente admissível (que in casu foi inviabilizado pela sentença prematura, sem julgamento) a questão que se coloca é a de saber em que circunstâncias se há-­de ter por aceite essa demonstração.
27- Consagrando o art° 366°, nº 4, uma presunção juris tantum, a prova em contrário pode consistir numa qualquer declaração do trabalhador, feita até ao momento do recebimento da compensação, no sentido da não aceitação do despedimento, a qual, não estando sujeita a forma especial, pode ser expressa ou tácita (vide, neste sentido, J. João Abrantes, O Despedimento Colectivo, em Prontuário de Direito do Trabalho, CEJ, nº 45, p. 38). 28- O recorrente devolveu o dinheiro ao empregador no dia 30/7/2010 (no dia da cessação da relação laboral ou, no máximo, no dia imediatamente seguinte), sem qualquer reclamação ou oposição do mesmo.
29- Pelo que não se pode concluir que o autor aceitou tacitamente esta compensação pela cessação do seu contrato de trabalho e o seu despedimento, sendo certo que estamos no âmbito de direitos disponíveis do trabalhador.
30- Ou seja, o autor ilidiu (sem possibilidade de discutir a matéria de facto na audiência de julgamento e, eventualmente, produzir mais prova sobre tais factos) a presunção prevista no 366°, nº 4 e 5 do CT.
31- Por fim, como se descreveu na P.I., o A. foi tecnicamente envolvido num processo de despedimento colectivo, apenas porque era intenção da Ré despedi-lo estando mesmo a submetê-lo a um processo execrável de assédio moral, sendo certo que existiu continuidade do seu posto de trabalho, no qual foi substituído por outro trabalhador.
32- Ou seja, formalmente a cessação da relação laboral com o recorrente tratou-se de um despedimento colectivo, na prática foi o último e derradeiro acto de mobbing, face ao recorrente, um despedimento sem justa causa.
33- A Srª Juiz ignorou, também, toda essa matéria de facto que seria importante para a decisão final, pelo que se impunha, também por aqui, o julgamento.
Irresignados também com o assim decidido, vieram os AA. C… e D… interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue o saneador-sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

1) O tribunal de 1ª instância errou ao considerar ilegal a cumulação do pedido de declaração da ilicitude do despedimento colectivo com o pedido de condenação da R. a pagar aos AA. créditos vencidos relativos a trabalho suplementar, à privação do uso do veículo automóvel e a comissões.
2) Nos termos do disposto na aI. c), do art. 431°, do Código do Trabalho de 2003, o despedimento é ilícito sempre que o empregador não tenha posto à disposição do trabalhador despedido todos os créditos vencidos até ao termo do aviso prévio (vide Pedro Romano Martinez, no Código do Trabalho anotado por este autor, Edição de 2008, em anotação a este art. 431º).
3) Tendo os AA. impugnado o despedimento de que foram alvo, é nesta acção que devem reclamar todos os créditos vencidos, sendo que tal matéria participa do objecto da acção e é fundamento da própria ilicitude do despedimento.
4) Nem faria sentido que tendo o tribunal em sede de acção de impugnação do despedimento colectivo que apreciar a existência de créditos vencidos e não colocados à disposição dos trabalhadores, não pudesse julgar e condenar em conformidade, obrigando as partes a intentarem nova acção com o fim único de obterem a condenação em correspondente ao julgamento já feito sobre a existência de tais créditos. Violar-se-ia o princípio da economia processual.
5) Ao não entender assim, foram violadas as normas legais e o princípio citados.
6) O tribunal de 1ª instância errou ao concluir que os AA. receberam a compensação prevista no n.º 1, do art. 366°, do Código do Trabalho de 2009.
7) Os factos provados e os documentos juntos aos autos não permitem tal conclusão.
8) Não tendo os AA. sido previamente informados pela R., designadamente na comunicação a que se refere o n.º 1, do art. 378° do Código do Trabalho de 2009, do montante exacto que lhes iria ser pago a título de compensação, tendo a R. procedido a transferência bancária para cada um dos AA. de um montante que contemplava diversas verbas não discriminadas nem autonomizadas, não era possível aos AA. identificar se lhes foi pago qualquer montante a título de compensação nem qual o seu valor.
9) Face à factualidade dos autos não podia o tribunal concluir que os AA. receberam a compensação.
10) Mesmo que assim não fosse, os AA. ilidiram a presunção quando, após terem conhecimento do montante da compensação que lhes foi paga por transferência bancária, comunicaram à R. que não aceitavam o despedimento, remetendo cheques à ordem da R. no valor da compensação que lhes havia sido paga, comunicando ainda que o faziam nos termos e para os efeitos previstos no n° 4 do art. 366° do Código do Trabalho.
11) O conhecimento do montante da compensação só ocorreu posteriormente à transferência bancária efectivada pela R.
12) Tendo em conta o prazo fixado no art. 388°, n.º 2, do Código do Trabalho de 2009, de seis meses, para a impugnação do despedimento colectivo, não é legítimo encurtar esse prazo impondo ao trabalhador que decida se vai ou não impugnar o despedimento colectivo no momento em que lhe é paga a compensação, procedendo à devolução da mesma.
13) A devolução da compensação tem que ser feita no prazo para a impugnação e em simultâneo com esta e não antes.
14) O tribunal fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 4 e n.º 5, do art. 366° e do art. 388°, n.º 2, do Código do Trabalho de 2009.
15) O tribunal de 1ª instância errou ao não considerar para efeitos de cálculo dos créditos devidos pela R. aos AA. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, o montante das retribuições variáveis auferidos pelos AA.
16) À relação laboral estabelecida entre os AA. e a R. aplica-se a CCT entre ACAP - Assoc. do Comércio Automóvel de Portugal e outras e a FETESE - Feder. dos Sind. dos Trabalhadores de Serviços e outros, publicado no BoI. Trab. Emp., 1.ª série, n.º 27, de 22/7/2003.
17) Esta CCT que foi objecto de extensão pela Portaria n.º 848/2005, de 15/05/2005.
18) Nos termos das cláusulas 66.ª, n.º 3, 85.ª e 91.ª n.º 6, para efeitos de cálculo da retribuição do período de férias, do respectivo subsídio e do subsídio de Natal dos trabalhadores que aufiram uma retribuição mista, isto é, composta por uma parte fixa e uma parte variável, deverá considerar-se a média da parte variável recebida nos últimos 12 meses, acrescida da parte fixa auferida no momento.
19) O tribunal aplicou erradamente o disposto nos arts. 262, n.° 1, o art. 263°, e 264°, n.° 1 e 2, do Código do Trabalho de 2009, sendo que deveria ter aplicado o disposto nas cláusulas da CCT citadas.

A R. apresentou a sua contra-alegação, relativamente a ambas as apelações, que concluiu pela confirmação da decisão.

O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que não ocorrem as invocadas nulidades da decisão e de que ambas as apelações devem improceder.
Apenas os AA. C… e D… responderam a tal parecer.
Recebido o recurso, elaborado o projecto de acórdão e entregues as respectivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[1], foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:

1) Por documento escrito intitulado contrato de trabalho a termo certo, que constitui fls. 35 a 37, cujo teor se dá por reproduzido, o autor B…, foi admitida ao serviço de F…, Lda, para, a partir de 2 de Março de 1998, exercer, mediante retribuição, as funções correspondentes à categoria profissional de técnico industrial I (Prof. de Engenharia).
2) Com data de 25 de Junho de 2007 e com efeitos a partir de 2 de Julho de 2007, pelo documento escrito de fls. 147/148, cujo teor se reproduz, a F…, Lda e a ré declararam que a primeira cedia à segunda, a título definitivo, a posição contratual que detinha como entidade patronal do autor B…, o qual aceitou a cedência, passando este a desempenhar ao serviço da ré as mesmas funções que desempenhava ao serviço da cedente, sendo o local de trabalho as instalações da ré na …, ….., …, Matosinhos, sendo-lhe contado pela ré o tempo de serviço (antiguidade) prestado à cedente.
3) Em 01/09/1999 o autor havia passado a trabalhar nas instalações da F… na …, desempenhando funções de chefe de departamento de assistência nomeadamente a coordenação da oficina (e serviço pós-venda) pelo menos desde 01/01/2000.
4) Na data da cessação do contrato a ré pagava ao autor a título de retribuição base €2.000,00 e sob a designação de Seg. Vida-Capitalização € 1.534,17 pago nos 12 meses do ano.
5) O autor B… tinha atribuído para sua utilização pessoal e profissional um veículo automóvel (Mercedes-Benz), suportando a ré, pelo menos, as despesas com combustível nas deslocações casa/local de trabalho e vice-versa, bem como nas deslocações ao seu serviço, seguro, manutenção, aparcamento e portagens ao serviço da ré e IUC.
6) Em Janeiro de 2009 a ré pagou ao autor sob a designação de Gratificação Extraordinária a quantia ilíquida de € 27.050,30.
7)) Por documento escrito intitulado contrato de trabalho a termo certo, que constitui fls. 41 a 43 do processo apensado [anexo B], cujo teor se dá por reproduzido, o autor C…, foi admitido ao serviço da ré, a partir de 2 de Dezembro de 1996 para exercer, mediante retribuição, as funções correspondentes à categoria profissional de vendedor de veículos.
8) Por documento escrito intitulado contrato de trabalho a termo certo, que constitui fls. 155 a 157 do processo apensado [anexo B], cujo teor se dá por reproduzido, o autor D…, foi admitido ao serviço da ré, a partir de 3 de Fevereiro de 1997 para exercer, mediante retribuição, as funções correspondentes à categoria profissional de vendedor de veículos.
6)[2] Como contrapartida das respectivas prestações, a ré pagava aos autores C… e D… uma retribuição em dinheiro, composta por uma parte fixa e outra variável.
7)[3] À data da cessação dos contratos de trabalho a parte fixa da retribuição mensal paga em dinheiro pela ré àqueles autores era de € 475,00 para cada um.
8)[4] Em 28/04/2009 os autores receberam as cartas que constituem, respectivamente os documentos de fls. 151, 152 e 154, cujo teor se reproduz, na qual a ré lhes comunicava que era sua intenção proceder ao seu despedimento no quadro do despedimento colectivo a que dava início daquela forma.
9) Em resposta, os autores C… e D…, enviaram à ré, as cartas que esta recebeu em 06/05/2009, informando terem conferido poderes a advogado, identificado quanto ao nome, escritório e contactos telefónicos, para negociar e representá-los em todo e qualquer acordo conexo com a relação laboral, incluindo os poderes previstos pelo art. 361º do Código do Trabalho, conforme documentos nº 323 e 324, cujo teor se reproduz.
10) Em 15/05/2009 todos os autores receberam em mão uma carta da ré onde esta informava ter decidido integrá-los na redução de pessoal a levar a efeito, por via de um despedimento colectivo, que tinha decidido despedi-los, que em consequência, o contrato de trabalho dos autores cessaria no 29/07/2009, e que lhe seriam pagos todos os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato, bem como uma compensação pelo despedimento cujo montante corresponde a um mês de retribuição base por cada ano completo de antiguidade e em caso de fracção de ano, o valor seria calculado proporcionalmente, quantia a pagar através de transferência bancária para a conta habitual no dia 31 de Maio, data a partir da qual os autores ficavam dispensados de comparecer ao serviço, nos termos com o teor dos documentos de fls. 166, 167 e 168, cujo teor se dá por reproduzido, bem como o anexo com o teor de fls. 171 a 201.
11) Em 27/05/2009 a ré pagou ao autor B…, por transferência bancária, as quantias discriminadas no documento de fls. 77, cujo teor se reproduz, sendo € 22.820,00 a título de compensação pelo despedimento colectivo.
12) Em 27/05/2009 a ré pagou ao autor C… as quantias discriminadas no documento de fls. 60 do processo apensado, cujo teor se reproduz, sendo € 6.013,50 a título de compensação pelo despedimento colectivo.
13) Em 27/05/2009 a ré pagou ao autor D… as quantias discriminadas no documento de fls. 77 do processo apensado, cujo teor se dá por reproduzido, sendo € 5.928,00 a título de compensação pelo despedimento colectivo.
14) Em 30/07/2009 o autor B… depositou na conta bancária da ré com a referência "Dev. Comp. B… Desp. Colectiv. E…, SA", por meio de cheque, a quantia de € 22.820,00, conforme documentos de fls. 78, cujo teor se reproduz.
15) Por cartas que a ré recebeu em 17/09/2009 e que constituem os documentos de fls. 178 a 182, cujo teor se reproduz, cada um dos autores C… e D… comunicou à ré que não aceitava o despedimento, remetendo cheques à ordem da ré no valor da compensação que haviam recebido da ré, comunicando ainda que o faziam nos termos e para os efeitos previstos no nº 4 do art. 366º do Código do Trabalho.
16) A Ré devolveu aos autores C… e D…, por cartas datadas de 21/09/2009, os cheques referidos em 15) comunicando, nos termos dos documentos de fls. 319 e 321, cujo teor se reproduz que "A falta de devolução, atempada, da importância em causa permitiu-nos concluir ter V. Exa., aceitado tacitamente a compensação em causa, motivo porque é absolutamente extemporânea a ora pretendida devolução".
1a) Como contrapartida das respectivas prestações a ré pagava a cada um dos autores C… e D… uma retribuição em dinheiro composta por uma parte fixa e uma parte variável;
2a) À data da cessação dos contratos a parte fixa da retribuição mensal paga em dinheiro pela ré a cada um dos autores era de € 475,00, não podendo ser inferior a € 548,50, sendo ajustada para este valor sempre que o somatório da parte fixa e variável era inferior a esse montante.
3a) Além da parte fixa da retribuição a ré pagou ao autor C…:
- em Junho de 2008 € 638,29 a título de comissões;
- em Julho de 2008 € 482,76 a título de comissões;
- em Agosto de 2008 € 462,01 a título de comissões;
- em Outubro de 2008 € 483,34 a título de comissões;
- em Novembro de 2008 € 960,78 a título de comissões;
- em Dezembro de 2008 € 479,87 a título de comissões e € 47,50 a título de retrib. complem. 5%;
- em Janeiro de 2009 € 967,97 a título de comissões, € 26,70 a título de retrib. complem. 5% e € 75,00 a título de gratif. extraordinar.
- em Fevereiro de 2009 € 412,31 a título de comissões e € 53,40 a título de retrib.complem. 5%;
- em Março de 2009 € 241,08 a título de comissões;
- em Abril de 2009 € 26,70 a título de retrib. complem. 5% e € 73,50 a título de diferença vencimento;
- em Maio de 2009 € 686,57 a título de comissões, € 613,11 a título de subsídio de Natal, €1.051,04 a título de sub. de férias, € 613,11 a título de sub. férias proporcional, € 859,94 a título de dias férias p/ gozar referentes a 2008 e € 613,11 a título de dias fér.p/ gozar proporcionais;
- em Junho de 2009 € 750,98 a título de comissões e
- em Julho de 2009 € 240,25 a título de comissões.
4a) Além da parte fixa da retribuição a ré pagou ao autor D…:
- em Junho de 2008 € 1.212,59 a título de comissões;
- em Julho de 2008 € 823,37 a título de comissões;
- em Agosto de 2008 € 1.133,16 a título de comissões;
- em Setembro de 2008 € 1.486,27 a título de comissões;
- em Outubro de 2008 € 1.010,17 a título de comissões;
- em Novembro de 2008 € 634,20 a título de comissões;
- em Dezembro de 2008 € 711,39 a título de comissões;
- em Janeiro de 2009 € 341,34 a título de comissões, € 266,95 a título de retrib. complem 5% e € 75,00 a título de gratif. extraordinário
- em Fevereiro de 2009 € 73,50 a título de diferença vencimento;
- em Março de 2009 € 73,50 a título de diferença vencimento;
- em Abril de 2009 € 73,50 a título de diferença vencimento
- em Maio de 2009 € 757,72 a título de comissões e € 26,70 a título de retrib. complem 5%, €734,29 a título de subsídio de Natal, € 734,29 a título de subsídio de férias proporcional, € 1.373,21 a título de dias de férias p/ gozar referentes a 2008, € 734,29 a título de dias de férias p/ gozar proporcionais e € 1.258,78 a título de subsídio de férias referente a 2008.
5a) Durante todo o tempo de execução dos respectivos contratos de trabalho, por disposição da ré os autores utilizavam uma viatura no estado de novo, propriedade da ré, que utilizavam no respectivo horário de trabalho e com o conhecimento e autorização da ré fora do horário de trabalho, aos fins-de-semana e durante as férias, pagando a ré todas as despesas relativas às viaturas, incluindo o seguro automóvel, o imposto municipal sobre veículos, as despesas de manutenção, as despesas com as revisões, as lavagens, e as despesas com os combustível até ao limite de um depósito por semana, que correspondia entre 50 a 60 litros, com excepção do período de férias no caso do autor C….
[5] 10a) A ré considera e contabiliza o valor da viatura e custos associados como custos fixos de cada autor.
11a) O autor C… não gozou 18 dias úteis de férias dos que tinha direito em 2009;
12a) No ano de 2008 a ré pagou ao autor D… a título de retribuição de férias €1.141,02 e outro tanto a título de subsídio de férias.
13a) O autor D… no ano de 2009 não gozou 15 dias úteis de férias dos 25 a que tinha direito.

Fundamentação
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[6], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo diploma referido na nota (1), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são as seguintes as questões a decidir nestes autos:
I – Na apelação do A. B...:
1) Nulidade da sentença e
2) Aceitação da licitude do despedimento.
II – Na apelação dos AA. C... e D...:
1) Cumulação de pedidos incompatíveis;
2) Aceitação da licitude do despedimento e
3) Créditos vencidos.

A 1.ª questão.
Trata-se de saber, na apelação do A. B..., se a sentença é nula.
Na verdade, aquele A. invocou as nulidades da sentença na alegação e nas très primeiras conclusões do recurso, dirigidas ao Tribunal ad quem, tendo alegado que a sentença é nula porque o Tribunal a quo não se pronunciou acerca dos pedidos deduzidos sob os números 2 a 4 da petição inicial pelo que, a seu ver, foram praticadas as nulidades previstas no Art.º 668.º, n.º 1, alíneas b) e d) do Cód. Proc. Civil.
Vejamos.
As nulidades podem ser processuais, se derivam de actos ou omissões que foram praticados antes da prolação da sentença; podem também ser da sentença, se derivam de actos ou omissões praticados pelo Juiz na sentença.
Aquelas, constituindo anomalia do processado, devem ser conhecidas no Tribunal onde ocorreram e, discordando-se do despacho que as conhecer, pode este ser impugnado através de recurso de agravo. Porém, as nulidades da sentença, tendo sido praticadas pelo Juiz, podem ser invocadas no requerimento de interposição do recurso [dirigido ao Juiz do Tribunal a quo, para que este tenha a possibilidade de sobre elas se pronunciar, indeferindo-as ou suprindo-as] e não na alegação [dirigida aos Juízes do Tribunal ad quem], como dispõe o Art.º 77.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho, sob pena de delas não se poder conhecer, por extemporaneidade[7].
No entanto, recentemente, o Tribunal Constitucional, pelo seu Acórdão n.º 304/2005, de 2005-06-08, proferido no Proc. n.º 413/04 decidiu, nomeadamente, o seguinte:
Julgar inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.ºs. 2 e 3), com referência aos n.ºs. 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição, a norma do n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro [que corresponde, com alterações, ao Art.º 72.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 1981], na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço ao tribunal superior[8].
In casu, o A. B..., ora apelante, invocou a nulidade da sentença na alegação e nas conclusões do recurso, mas não no respetivo requerimento pelo que, sendo intempestiva a respetiva arguição, como se referiu anteriormente, dela não podemos tomar conhecimento.
Improcedem, destarte, as três primeiras conclusões da apelação do A. B....

Quanto às demais questões.
Previamente, convirá considerar que, como se referiu no antecedente relatório, o Tribunal a quo proferiu saneador-sentença certamente por entender que o processo já tinha factos provados bastantes que o habilitavam a decidir conscienciosamente de meritis, sem necessidade de produzir quaisquer outras provas.
Não tendo sido impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, como se vê de ambas as apelações, nomeadamente, das conclusões acima transcritas, apenas poderemos considerar, em princípio, os factos assentes no saneador-sentença.
Por outro lado, iremos tratar, em primeiro lugar, a questão da cumulação de pedidos incompatíveis, invocada na apelação dos AA. C... e D..., por ela poder constituir precedente lógico relativamente às demais.

A 2.ª questão.
Trata-se de saber se os AA. C... e D... deduziram na sua petição inicial pedidos não incompatíveis com os pedidos relativos ao despedimento coletivo, como eles mencionam nas conclusões 1 a 5 da respetiva apelação, sendo certo que o Tribunal a quo entendeu o contrário, isto é, que os pedidos formulados quanto ao despedimento coletivo eram incompatíveis com os pedidos formulados quanto aos créditos vencidos relativos a trabalho suplementar, à privação do uso do veículo automóvel e a comissões.
Vejamos.
Tendo em conta a data da propositura das ações, é aplicável in casu o Cód. Proc. do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro, de ora em diante, designado apenas por CPT.
Na versão deste diploma foi eliminado o Art.º 30.º da versão anterior, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81, de 30 de setembro, em cujo n.º 1 se dispunha:
O autor deve cumular na petição inicial todos os pedidos que até à data da propositura da ação possa deduzir contra o réu, para os quais o tribunal seja competente em razão da matéria, desde que lhe corresponda a mesma espécie de processo.
Ora, como se vê desta norma, a cumulação inicial de pedidos era obrigatória, constituindo a sua inobservância uma exceção, dividindo-se a jurisprudência acerca da sua qualificação como dilatória ou perentória. Mas, apesar de obrigatória, nem por isso se deixava de exigir que a todos os pedidos correspondesse a mesma espécie de processo. Isto é, a todos os pedidos devia corresponder processo especial ou processo comum, estando vedada a cumulação inicial se a um pedido correspondesse processo especial e a outro pedido correspondesse processo comum. Cfr. o disposto no Art.º 46.º do CPT, na versão aprovada pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81, de 30 de setembro.
Na versão vigente do CPT, tendo sido eliminado o referido Art.º 30.º da versão precedente, deixou de existir no foro laboral a cumulação inicial obrigatória de pedidos, regulando-se a matéria pelas disposições do Cód. Proc. Civil [CPC] que prevê apenas a cumulação facultativa, mas sujeita de igual modo à regra da identidade de espécie de processo, como se vê do disposto nos Art.ºs 470.º, n.º 1 e 31.º, n.º 1, nomeadamente.
Tal disciplina compreende-se pela necessidade de evitar a preterição de direitos das partes. Na verdade, passando à hipótese vertente, seguindo os pedidos referentes a créditos vencidos relativos a trabalho suplementar, à privação do uso do veículo automóvel e a comissões a espécie comum do processo laboral, atento o disposto no Art.º 48.º, n.ºs 2 e 3 do CPT e os pedidos derivados do despedimento coletivo o processo especial previsto no Art.º 156 ss. do mesmo diploma, a estrutura de ambos comporta diferenças de processado que são inadequadas à definição dos direitos, tanto processuais como substantivos. Basta atentar na natureza urgente do processo de despedimento coletivo, às regras de competência territorial, à diferença do despacho saneador, à prova pericial, à sua qualificação como processo próximo da jurisdição voluntária, com litisconsórcio ou coligação, ativos, por contraposição com a audiência de partes que existe apenas no processo comum, sem natureza urgente, com jurisdição contenciosa, por exemplo – cfr. o disposto nos Art.ºs 13.º, 14.º, 16.º, 26.º, n.º 1, 54.º, n.º 2, 156.º, n.ºs 2 e 3 e 157.º a 160.º do CPT. Aliás, se a cumulação fosse permitida, para além da incompatibilidade de atos, o processo de natureza urgente tenderia a ser tão demorado, ou mais, que um processo de espécie comum, pois tal processo especial já tem, de per si, uma estrutura complexa.
Daí que, estando nós perante uma exceção dilatória atípica, conducente à absolvição parcial da instância, bem decidiu o Tribunal a quo quando absolveu a R. da instância, relativamente aos referidos pedidos, atento o disposto nos Art.ºs 31.º, n.º 1, 470.º, n.º 1, 494.º, alínea f) e 288.º, n.º 1, alínea e) do Cód. Proc. Civil, ex vi do disposto no Art.º 1.º, n.º 2, alínea a) do CPT.[9]
Improcedem, destarte, as conclusões 1 a 5 da apelação dos AA. C… e D….

A 3.ª questão.
Trata-se de saber se não se verifica, em ambas as apelações, a aceitação da licitude do despedimento coletivo, por banda dos AA.
Vejamos
Tendo a R. despedido os AA. por cartas de 2009-05-15, é aplicável in casu o Cód. do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
Por outro lado, configurando-se os casos dos autos como despedimento coletivo, são aplicáveis as disposições dos Art.ºs 359.º ss., sendo certo que a decisão da questão supra enunciada passa diretamente pela interpretação e aplicação do Art.º 366.º, n.ºs 4 e 5, do seguinte teor:
4. Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo.
5. A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, à disposição do empregador a totalidade da compensação pecuniária recebida.
Ora, a norma do n.º 4 foi antecedida por disposição de idêntico teor, Art.º 401.º, n.º 4 do CT2003.
Da exposição de motivos da proposta de Código do Trabalho de 2003 consta no seu ponto XII. Cessação do contrato, alínea c), o seguinte:
“Estabelecimento da presunção ilidível de que, no despedimento coletivo o trabalhador, quando recebe a compensação, aceita a cessação do contrato”.
Tal norma do referido Art.º 401.º, n.º 4 do CT2003 foi antecedida, por seu turno, pela norma constante do Art.º 23.º, n.º 3 da LCCT[10] que, na sua versão original, dispunha:
O recebimento pelo trabalhador da compensação a que se refere o presente artigo vale como aceitação do despedimento [sublinhado nosso].
Porém, da conjugação dos n.ºs 1 e 2 do Art.º 25.º da LCCT resultava, também na sua versão original, que os trabalhadores que não aceitarem o despedimento podem impugná-lo.
Decorrida uma década, pela Lei n.º 32/99, de 18 de maio, a norma constante daquele n.º 3 do Art.º 23.º da LCCT foi eliminada e da norma do Art.º 25.º foi extirpada a expressão “que não aceitarem o despedimento”[11].
Já o CT2009, para além de manter[12], ipsis verbis, a norma constante do Art.º 401.º, n.º 4 do CT2003, aditou-lhe um n.º 5, acima transcrito.
Desta evolução legislativa pode retirar-se a conclusão de que o legislador, excetuado o de 1999, pretendeu estabelecer a presunção de que, recebendo a compensação, o trabalhador aceita o despedimento.
Trata-se do corolário decorrente de que a licitude do despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho, depende do pagamento da compensação ao trabalhador. No entanto, recebida esta, tudo se passaria como se as partes tivessem feito cessar o contrato de trabalho por mútuo acordo.
Importa precisar, no entanto, que sendo o despedimento um negócio jurídico unilateral receptício que produz o seu efeito na parte contrária, inelutavelmente, qual direito potestativo, não entrando o trabalhador no respetivo processo volitivo, quando a lei refere a aceitação do despedimento, magis dixit quam voluit, pois o que o trabalhador pode juridicamente aceitar é a licitude do mesmo. Mas, tirando esta precisão, podemos continuar a trabalhar com a ficção legal de que o trabalhador, recebida a compensação, aceita o despedimento.
Desde a versão original da LCCT discute-se a natureza desta presunção, entendendo uns que se trata de presunção juris et de jure, estribando-se na letra da lei quando refere que o recebimento da compensação vale como aceitação do despedimento, em vez de dizer que se presume, como acontece em ambos os Cód. do Trabalho de 2003 e de 2009 e estribando-se no elemento racional de que, entendida como ilidível, se o trabalhador não tivesse sucesso na ação de impugnação do despedimento, mesmo assim receberia a indemnização como se o despedimento tivesse sido declarado ilícito, bastando para o efeito nada fazer, isto é, guardar a compensação que anteriormente já havia recebido na decorrência da normal tramitação processual do despedimento coletivo; por último, trata-se-ia, ainda, de uma presunção juris et de jure, porque seria um presunção de direito, derivada diretamente de normas legais e não de factos conhecidos para deles deduzir factos desconhecidos, atenta a noção de presunção constante do Art.º 349.º do Cód. Civil.
Outros, ao contrário, e apesar da letra da lei, ao tempo da LCCT - vale como - entendiam tratar-se de presunção juris tantum com fundamento em que as presunções, por regra, são ilidíveis, só sendo inilidíveis quando a lei o disser expressamente, como resulta do disposto no Art.º 350.º, n.º 2 do Cód. Civil, o que não ocorre in casu.
Deveras problemático era, no entanto, a norma que se extraía da conjugação dos Art.ºs 23.º, n.º 3 e 25.º, n.ºs 1 e 2 pois, aceitando a compensação, o trabalhor aceitava o despedimento [presumia-se] e aceitando o despedimento, a contrario sensu, já não poderia intentar a ação para a sua impugnação. Tratava-se de uma exceção perentória de perda do direito de ação, por aceitação do despediemnto. Daí que de vários lados se tenha entendido que a norma era altamente criticável, nomeadamente, entendida como impedindo o acesso ao direito e aos tribunais, em violação do consignado no Art.º 20.º, n.º 1 da Constituição da República.
Certo é que pela Lei n.º 32/99, de 18 de maio, tal presunção foi eliminada e a ação de impugnação passou a ser admitida sem aquele pressuposto da não aceitação do despedimento.
Passando à norma aplicável in casu, o acima transcrito Art.º 366.º, n.º 4 do CT2009, verificamos que este diploma não coloca qualquer restrição no que respeita à propositura da ação de impugnação do despedimento, mesmo nos casos de recebimento da indemnização por parte do trabalhador. No entanto, mantendo a presunção, ainda que entendida como juris tantum, o recebimento da indemnização, fazendo presumir a aceitação do despedimento [rectius, a aceitação da licitude do despedimento], constitui uma exceção perentória derivada do facto impeditivo de tal aceitação, a determinar a absolvição do pedido, caso o trabalhador não consiga fazer a prova do contrário, atento o disposto no Art.º 350.º, n.º 2 do Cód. Civil.
Daí que se nos afigure que o CT de 2003 – e também o de 2009 – configurando a presunção do recebimento da compensação, não ilidida, como exceção perentória, repercute os seus efeitos apenas ao nível do direito substantivo, da licitude do despedimento e não, como na LCCT, versão original, logo ao nível do respetivo direito de ação. Isto é, agora o trabalhador pode propôr sempre a ação, mesmo que tenha recebido a compensação, simplesmente já sabe que nela decairá se não conseguir ilidir a presunção de aceitação da licitude do despedimento.
Para o efeito, deverá o trabalhador fazer a prova do contrário, atento o disposto no Art.º 350.º, n.º 2 do Cód. Civil, a qual consistirá numa declaração de vontade de sentido contrário à aceitação da licitude do despedimento, para além de factos donde se possa extrair a conclusão acerca da não aceitação do despedimento coletivo, como se tem entendido.
No entanto, esta asserção, aparentemente tão linear, acaba por ser bem mais complexa, frente à riqueza que a vida nos oferece. Na verdade, em primeiro lugar, coloca-se logo a questão de saber se a declaração de vontade tem de ser anterior, coeva ou posterior ao recebimento da compensação, havendo entendimentos em diferentes sentidos. Depois, surgem-nos dificuldades ao nível da base da presunção. É que quem tem a seu favor a presunção não precisa de provar o facto a que ela conduz, mas tem de provar os factos que integram a respetiva base, isto é, os factos donde se há de presumir o facto desconhecido, como dispõe o Art.º 350.º, n.º 1 do Cód. Civil. In casu, a base da presunção consiste no recebimento da compensação. Ora, transferindo o empresário para a conta bancária [prática atualmente corrente] do trabalhador o montante correspondente à compensação, parece que este deverá agir diligentemente, logo que tome conhecimento do ato, caso pretenda não aceitar a compensação, com vista a impugnar o despedimento. Na verdade, tomando conhecimento da transferência, por qualquer meio, deverá informar o empregador do recebimento da compensação, bem como do seu propósito de aceitar a decisão de despedimento coletivo ou de a impugnar.
Aliás, em bom rigor, não aceitando a decisão do empregador e pretendendo impugnar o despedimento, o trabalhador deve agir de acordo com a diligência correspondente ao homem médio, atento o princípio da boa fé, embora a lei não esclareça como, em que prazo, respetivo termo inicial e demais circunstâncias pertinentes, deva o trabalhador restituir o montante da compensação ao empregador.
De resto, dada a referida prática dos empregadores de entregarem a compensação por meio de transferência bancária, ignorando os trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo a data em que a conta foi creditada, colocam-se algumas dificuldades práticas a este nível, embora se venha entendendo que elas devem ser consideradas como removidas, dada a vulgarização das transações através do multibanco, por exemplo; assim, atento o princípio da boa fé e o referido incremento ao nível das referidas transações, deve considerar-se que o acesso à informação das contas bancárias está facilitado e generalizado.
Acresce que a prontidão da devolução da compensação recebida – em simultâneo, refero o mencionado Art.º 366.º, n.º 5 – reporta-se à disponibilidade da quantia em causa, pois significando a aceitação do despedimento, a sua devolução, para produzir a prova do contrário, deve ocorrer em curto prazo, pois não seria curial que o trabalhador pudesse dela dispôr.[13]
Por último, a compensação entregue pelo empregador deve ser na sua totalidade, como a restituição deve ser em igual medida, a significar que é inadmissível que a entrega seja efetuada, por exemplo, em prestações, salvo tratando-se de processo de insolvência.[14]
In casu e analisando criticamente os factos dados como provados, verificamos que a R. pagou a compensação, a cada um dos AA., em 2009-05-27 e que o A. B... depositou a quantia correspondente, através cheque, na conta da R., em 2009-07-30 e que os outros AA. remeteram cartas à R., que esta recebeu em 2009-09-17, declarando não aceitar o despedimento e remetendo cheques com o valor da compensação. Por outro lado, através da carta de 2009-05-15, a R. informou cada um dos AA. que iria proceder ao pagamento da compensação, no dia 2009-05-30, através de transferência bancária.
Desconhece-se a data em que cada um dos AA. tomou conhecimento de que a respetiva conta se encontrava creditada com a quantia correspondente à compensação; no entanto, sabendo-se que o facto ocorreu em 27, quando tinha sido anunciado para 30, através de carta de 15, todos de maio de 2009 e dada a facilidade da informação acerca dos saldos das contas bancárias, seja através de homebanking, multibanco ou agências bancárias, devemos admitir que os AA. tomaram conhecimento da transação em finais de maio ou princípios de junho do mesmo ano. Seja como for, assim deverá ser considerado, atento o princípio da boa fé, que acima se referiu em tese, tanto mais que em 15 de maio foi anunciada a transferência da quantia correspondente a cada uma das compensações. Ora, equacionados tais factos e fundamentos, devemos considerar que os AA. demoraram tempo excessivo a reagir, criando no empregador a ideia da aceitação do despedimento, como a R. refere nas cartas de resposta aos AA. C… e D…. Na verdade, durante dois meses ou mais tiveram ao seu dispor as quantias da compensação, parecendo que aceitaram o despedimento e que mais tarde se arrependeram e decidiram reagir.
Por outro lado, tendo os AA. declarado não aceitar o despedimento, tal traduz-se em mera declaração que, não sendo contrária aos respetivos interesses, não pode constituir prova do contrário da presunção legal; de resto, o A. C... nem essa declaração fez.
Acresce que os AA. não alegaram quaisquer outros factos para ilidir a presunção, pelo que não faria sentido a continuação do processo para julgamento, nem impugnaram a decisão acerca da matéria de facto, pelo que nos encontramos cingidos aos factos provados, acima transcritos, insuficientes para produzirem a prova em contrário que a ilisão da presunção legal demandava.
Em síntese, temos de concluir que os AA. aceitaram a licitude do despedimento coletivo operado pela R.
Improcedem, por isso, as conclusões 6 a 33 do recurso do A. B... e as conclusões 6 a 14 do recurso dos AA. C... e D....

A 4.ª questão.
Trata-se de saber, na apelação dos AA. C... e D…, se os créditos que se venceram em virtude da cessação dos respetivos contratos de trabalho, relativos a férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de duração do contrato no ano da cessação, 2009, para além de férias não gozadas, devem ser contabilizados tendo em atenção a média da parte variável das respetivas retribuições, auferidas nos 12 meses anteriores ao da comunicação da cessação do contrato e ainda o valor que estimam corresponder à utilização da viatura que a ré havia atribuído a cada um deles. Daí que o Tribunal a quo tenha entendido que o que está em causa, nesta sede, é determinar se tais prestações são relevantes para o cálculo daqueles valores e determinar os montantes devidos a cada um daqueles títulos tendo em conta as quantias que a R. já pagou a cada um dos AA.
Vejamos.
Resulta da matéria de facto provada que em alguns meses a R. pagou aos AA. C… e D… quantias, sem caráter de regularidade, nomeadamente, sob a rubrica “retri. complem. 5%” ou “diferença vencimento”. Ora, não tendo tais atribuições patrimoniais caráter de regularidade, não poderiam integrar a retribuição, inclusive o cômputo dos direitos relativos à cessação do contrato.
Por outro lado, estabelecendo a média da retribuição variável derivada das comissões pagas, nos últimos 12 meses, conforme vem provado desde os factos 3a) e ss., por um lado e o pago a título de férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de duração do contrato no ano da cessação, verificamos que não existem diferenças, pois foram pagas quantias superiores, parecendo inclusive que se atendeu no cálculo a todas as atribuições patrimoniais, mesmo não tendo caráter de regularidade.
De resto, vendo os artigos 131.º ss. da petição inicial dos AA. C… e D…, verificamos que eles reclamam o pagamento de outras comissões de vendas, cujo valor médio pretendem que seja integrado no cômputo dos direitos relativos à cessação do contrato a título de férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de duração do contrato no ano da cessação, referindo a R. no art.º 60.º da respetiva contestação que tais valores não integram os créditos vencidos por efeito da cessação do contrato. Daqui resulta que aqui estamos perante comissões não pagas, enquanto ali se trata de comissões pagas.
Por último, deve referir-se que a R. foi absolvida da instância relativamente aos pedidos que respeitam ao trabalho suplementar, comissões nas vendas e valor de uso irrestrito da viatura, por serem incompatíveis com os pedidos derivados do despedimento coletivo, como se deixou transcrito no antecedente relatório, pelo que tais matérias apenas podem ser versadas e decididas em futura ação, tal como deriva do decidido na 2.ª questão, supra.
Daí que a pretensão deduzida não possa ser aqui atendida.
Improcedem, desta arte, as restantes conclusões da apelação dos AA. C… e D…, pelo que a decisão impugnada deve ser confirmada.

Decisão.
Termos em que se acorda em negar provimento a ambas as apelações, assim confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos AA.

Porto, 2012-05-14
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
António José da Ascensão Ramos (Com dispensa de visto)
_________________
[1] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma.
[2] Número também repetido no original.
[3] Número também repetido no original.
[4] Número também repetido no original.
[5] No original também se mostram omitidos os n.ºs 6 a 9.
[6] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[7] Cfr. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1976, pág. 175 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1990-12-13, 1991-01-31, 1991-04-09, 1994-03-09 e 1995-05-30, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 402, págs. 518-522, n.º 403, págs. 382-392, n.º 416, págs. 558-565, n.º 435, págs. 697-709 e n.º 447, págs. 324-329.
[8] In www.tribunalconstitucional.pt.
[9] Cfr. sobre a matéria:
- Alberto Leite Ferreira, in Código de Processo do Trabalho Anotado, 4.ª edição, 1996, págs. 155 e 156, Bernardo da Gama Lobo Xavier, in O processo especial de impugnação do despedimento coletivo, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Julho-Dezembro – 2011, Ano LII (XXV da 2.ª Série) N.ºs 3-4, págs. 49 ss., nomeadamente, a págs. 73 e António Santos Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, 1 – Pincípios Fundamentais 2 – Fase Inicial do Processo Declarativo, Almedina, 1997, págs. 132 a 135.
- Acórdão da Relação de Évora de 1993-12-07, in Coletânea de Jurisprudência, Ano XVIII-1993, Tomo V, págs. 307 e 308.
[10] Vulgo do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de fevereiro.
[11] É a seguinte a nova redação do Art.º 25.º, n.º 1 da LCCT:
1 — Os trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo podem requerer a suspensão judicial do mesmo com fundamento em qualquer das situações previstas no n.º 1 do artigo 24.º, no prazo de cinco dias úteis contados da data da cessação do contrato de trabalho constante da comunicação a que se refere o n.º 1 do artigo 20.º.
[12] Ao contrário do que seria expectável, atento o constante da respetiva Proposta de Lei n.º 216/X:
Artigo 365.º
Compensação por despedimento coletivo
1 – Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
2 - Em caso de fração de ano, a compensação é calculada proporcionalmente.
3 - A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
4 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1 ou 2.
[13] Cfr.:
a) – Para o domínio da aplicação da LCCT:
- Jorge Leite, in A Transposição das Diretivas Comunitárias Sobre Despedimento Coletivo, Prontuário de Direito do Trabalho, Atualização N.º 55, Centro de Estudos Judiciários, págs. 27 a 56, Bernardo da Gama Lobo Xavier, in O Despedimento Coletivo no Dimensionamento da Empresa, Verbo, 2000, págs. 562 a 564 e in Regime do Despedimento Coletivo e as Alterações da Lei n.º 32/99, Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, volume III, Instituto de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito de Lisboa, Almedina, 2002, págs. 225 ss., nomeadamente, págs. 253 e 254 e António Lemos Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 11.ª edição, Almedina, 1999, págs. 569 e 570.
- A Sentença do Tribunal do Trabalho de Setúbal de 1993-03-19, in sub judice, n.º 4, Setembro-Dezembro de 1992, págs. 113 a 116.
b) – Para o domínio da aplicação dos CT2003 e CT2009.
- António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 12.ª edição, Almedina, 2004, págs. 589 e 590, Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, págs. 986 e 987, João Leal Amado, in Algumas Notas Sobre o Regime do Despedimento Contra Legem no Código do Trabalho, VII Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Memórias, Coordenação do Prof. Doutor António Moreira, Almedina, 2004, págs. 273 ss., nomeadamente, 280 a 283 e in Contrato de Trabalho à Luz do Novo Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2009, págs. 387 a 390, Bernardo da Gama Lobo Xavier, in O processo especial de impugnação do despedimento coletivo, cit., nomeadamente, a págs. 83 e 84, Luís Miguel Monteiro, in Processo de Impugnação de Despedimento Coletivo, Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, volume V, Instituto de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito de Lisboa, Almedina, 2007, págs. 77 ss., Chambel Mourisco, in A Compensação pela Extinção do Posto de Trabalho. A Presunção do N.º 4 do Art.º 401.º do Código do Trabalho, Prontuário de Direito do Trabalho, N.ºs 76/77/78, Centro de Estudos Judiciários, Janeiro-Dezembro de 2007, págs. 243 a 248 e César Sá Esteves, in Algumas Reflexões Práticas sobre o Processo de Despedimento Coletivo, Direito do Trabalho+Crise=Crise do Direito do Trabalho?, Atas do Congresso de Direito do Trabalho, Coordenadores Catarina de Oliveira Carvalho e Júlio Vieira Gomes, Escola de Direito do Porto da Universidade Católica Portuguesa, Coimbra Editora, Grupo Wolters Kluwer, 2011, págs. 201 ss., nomeadamente, a págs. 213.
- Os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2010-12-09, Processo 4158/05.4TTLSB.L1.S1 e da Relação do Porto de 2007-05-02, Processo 0647182, in www.dgsi.pt.
[14] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2005-04-13, Processo 04S3160, in www.dgsi.pt e .Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, cit., pág. 986, nota 2380.
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S U M Á R I O
I - Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento coletivo quando recebe a compensação prevista no Art.º 366.º, n.º 1 do CT2009, como dispõe o n.º 4 do mesmo artigo.
II - Tendo o empregador transferido para a conta bancária do trabalhador tal compensação e tendo este demorado a devolver tal quantia cerca de dois meses ou mais, tal comportamento faz presumir a aceitação da licitude do despedimento.
III – Para ilidir tal presunção, deveria o trabalhador ter procedido à devolução da compensação imediatamente após o recebimento ou em prazo curto e fazer a prova do contrário.
IV – Não o tendo feito, presume-se a aceitação do despedimento coletivo, o que constitui facto impeditivo da ilicitude do despedimento, integrando uma exceção perentória pelo que, provada aquela, deve o empregador ser absolvido do pedido.

Manuel Joaquim Ferreira da Costa

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico.