Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0555805
Nº Convencional: JTRP00038689
Relator: CUNHA BARBOSA
Descritores: ARBITRAMENTO DE REPARAÇÃO PROVISÓRIA
REQUISITOS
EQUIDADE
Nº do Documento: RP200601160555805
Data do Acordão: 01/16/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: .
Sumário: I - A procedência do procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória – art. 403º do Código de Processo Civil – depende da prova, pelo requerente, da necessidade económica, carência de meios, em consequência dos danos sofridos, e da existência de nexo de causalidade entre tais danos e tal necessidade, em que se encontra por causa do acidente.
II - Se o acidentado ficar impossibilitado, por causa da lesão, de manter o seu estilo de vida, a renda mensal provisória a fixar, com base na equidade, deve contemplar uma quantia que lhe permita assegurar os rendimentos que usufruía antes do acidente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório:
No Tribunal Judicial de Lousada, sob o nº ..../05..TBLSD-A (.º Juízo), foram instaurados uns autos de procedimento cautelar, para arbitramento de reparação provisória, por B.......... contra Fundo de Garantia Automóvel, C.........., Ldª e D.........., pedindo que se:
«… fixe ao requerente uma quantia certa sob a forma de renda mensal desde a data do acidente até à liquidação definitiva dos danos sofridos pelo requerente em montante nunca inferior a 452,32 Euros (vencimento mensal do requerente na data do acidente) e consequentemente condene a 1ª requerida provisoriamente a pagar tal montante, incluindo a quantia mensal global fixada desde a data do acidente até à presente data e a quantia mensal que se for vencendo até liquidação definitiva do danos».

Em fundamento do seu pedido, alega, em essência e síntese, que:
- No dia 12 de Março de 2004, cerca das 20 horas, no .........., freguesia de .........., Lousada, ocorreu um acidente de viação;
- Nele interveio o ciclomotor de matrícula .LSD-..-.., propriedade do requerente e por ele conduzido;
- E a máquina industrial escavadora com o nº ....V...., propriedade da 2ª requerida e manobrada e conduzida pelo 3º requerido;
- O acidente ocorreu num entroncamento formado pela via em que seguia o requerente e a via donde provinha a máquina, sendo que esta entronca naquela e pelo lado direito, atento o sentido de marcha do ciclomotor;
- E, ficou a dever-se ao facto de o condutor da máquina não ter parado a um sinal de STOP que se lhe apresentava na via em que seguia, antes de atingir a via em que circulava o requerente, tendo prosseguido a sua marcha até se dar o embate;
- Em consequência do acidente, o requerente sofreu fractura dos ossos da perna e pé direitos ao nível do tornozelo, bem como ruptura de tendões e ligamentos;
- Foi dado como clinicamente curado pelos serviços médicos, em 26 de Janeiro de 2005, com incapacidade permanente para o trabalho;
- O requerente desde a data do acidente que está incapacitado para o exercício da sua actividade, facto este evidenciado até pela locomoção arrastada e com sacrifício sobre canadianas;
- Não está a receber qualquer subsídio de doença ou outro de qualquer espécie e como tal está sem auferir qualquer rendimento;
- À data do acidente, o requerente exercia a actividade profissional por conta de outrem, no ramo de marcenaria, com a categoria profissional de maquinista de 1ª, tendo como salário base o montante de 399,30 euros mais 53,02 euros de subsídio de alimentação a que acrescia normalmente trabalho suplementar do qual o requerente auferia em média mensalmente 150 euros;
- O requerente está incapaz de forma definitiva para o exercício da sua actividade profissional;
- O requerente não é titular de quaisquer outros rendimentos ou fortuna pessoal, apenas tendo a casa de morada de família;
- O requerente sempre viveu dos seus rendimentos de assalariado;
- O seu agregado familiar é composto por si e pela esposa;
- A esposa é assalariada de confecção, auferindo o vencimento mensal de 413,85 euros;
- O requerente teve inicialmente despesas de transporte e medicamentosas onde despendeu a quantia global de 683,90 euros;
- A máquina industrial interveniente no acidente, à data deste, não dispunha de seguro que respondesse pelos danos resultantes da sua circulação na via pública.
Conclui pela procedência da providência.
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Os 2º e 3º requeridos deduziram oposição, impugnando os factos articulados, e concluem pela improcedência da providência.
O FGA deduziu oposição, alegando a sua ilegitimidade e, bem assim, impugnando os factos alegados pelo requerente.
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Produziram-se as provas apresentadas e, em seguida, elaborou-se despacho em que se fixaram os factos considerados provados e não provados e, bem assim, se proferiu a seguinte decisão:
«…
- Julga-se procedente a excepção de ilegitimidade do F.G.A., pelo que se absolve o mesmo da presente instância;
- Julga-se parcialmente procedente o pedido de arbitramento de reparação provisória e, em consequência fixa-se a renda mensal de 400,00 euros, devendo o 2º e 3º requeridos provisoriamente pagar tal montante ao requerente, incluindo a quantia mensal que se for vencendo até liquidação definitiva dos danos».
…».
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Não se conformado com tal decisão, dela os requeridos condenados apresentaram recurso de agravo e, tendo alegado, formularam as seguintes conclusões:
1ª - Nos termos do art. 403º, nº 2 do CPC, a providência cautelar de reparação provisória dos danos só deverá ser deferida se se verificar e comprovar uma situação de necessidade do lesado e esteja indiciada a obrigação de indemnizar;
2ª - No caso vertente o requerente (lesado) não alega, nem quantifica, despesas extraordinárias que seja obrigado a suportar em decorrência do acidente, nomeadamente à época da propositura da providência, tanto mais que, conforme resulta da matéria provada, o mesmo foi dado como clinicamente curado em data muito anterior à propositura da providência cautelar, e não logrou provar qual o grau de incapacidade de que padece, e se a mesma o impede de trabalhar, pelo que a providência em causa deveria ser totalmente indeferida;
3ª - De resto, visando este tipo de providência apenas proporcionar o estritamente indispensável para o sustento do lesado, e não por qualquer outro tipo de necessidades, tendo em conta a situação sócio-económica do requerente e seu agregado familiar, valor atribuído na douta decisão sob recurso pecaria por exagero, devendo, segundo as regras da equidade, nunca ser fixada a renda mensal em quantia superior a 250,00 euros, pelo que a douta decisão sob recurso deve ser revogada, por violar, nomeadamente, o disposto nos nº 2 e 3 do artigo 403º do Código de Processo Civil.
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O requerente apresentou contra-alegações em que, em essência e síntese, pugna pela manutenção do decidido.
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Foram colhidos os vistos legais, cumprindo decidir.
Assim:
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2. Conhecendo do recurso (agravo):
2.1 – Dos factos assentes:
Com relevância para o conhecimento do recurso, foram considerados assentes pelo tribunal de 1ª instância os seguintes factos:
– No dia 12 de Março de 2004, cerca das 20 horas no .......... da freguesia .......... deste concelho ocorreu um embate;
- Nesse acidente foram intervenientes o ciclomotor de matrícula .LSD-..-.., propriedade e conduzido pelo requerente B.......... e a máquina industrial escavadora de matrícula ou com o nº ....V...., propriedade da segunda requerida e conduzida pelo terceiro requerido D.......... enquanto sócio e gerente da mesma;
- O requerente no momento do acidente circulava no referido .......... no ciclomotor identificado e na estrada municipal que liga as freguesias de .......... a .........., deste concelho, pela metade direita da faixa de rodagem, a 0,85 cm da berma direita, atento o sentido ..........-..........;
- Por sua vez o 3º requerido conduzia a aludida máquina que circulava numa estrada que liga o campo .......... da dita freguesia de .......... ao ............, estrada esta que entronca na estrada por onde circulava o requerente, pelo lado direito, atento o sentido ..........-..........;
- No final da estrada por onde circulava o 3º requerido e próximo do ponto de intercepção com a estrada onde circulava o requerente existia no momento do acidente um sinal vertical de paragem obrigatória vulgo STOP;
- O 3º requerido, ao chegar ao entroncamento atrás referido, não parou e como tal não respeitou o sinal vertical de paragem obrigatória e entrou na estrada por onde circulava o requerente;
- Indo chocar com este e com o ciclomotor por si conduzido;
- O 3º requerido circulava com a pá da máquina por si conduzida em posição horizontal o que o obrigava a ocupar parcialmente a metade direita da faixa de rodagem da estrada municipal que liga ......... a .........., e nesse sentido, antes que tivesse possibilidade de visualizar quem ali circulava;
- O 3º requerido entrou com a máquina na estrada ..........-.......... e ocupou, até ocorrer o embate no ciclomotor, cerca de 85 cm da metade direita desta estrada, atento o sentido ..........-...........;
- O requerente nada pode fazer para evitar o acidente, já que a máquina conduzida pelo 3º requerido surgiu-lhe repentinamente e no momento em que o mesmo passava na zona do entroncamento referido;
- A máquina conduzida pelo 3º requerido embateu com a pá escavadora na perna direita do requerente estatelando-se este e o seu motociclo cerca de 11 metros à frente;
- Em consequência do mesmo o requerente sofreu fractura dos ossos da perna e pé direitos ao nível do tornozelo bem como ruptura de tendões e ligamentos;
- Foi internado no E.........., S.A. em .........., onde foi submetido a intervenção cirúrgica;
- O requerente desde a data do acidente que está incapacitado para o exercício da sua actividade, facto este evidenciado até pela locomoção arrastada e com sacrifício sobre canadianas;
- Não está a receber qualquer subsídio de doença ou outro de qualquer espécie e como tal está sem auferir qualquer rendimento;
- À data do acidente o requerente exercia a actividade profissional por conta de outrem no ramo de marcenaria com a categoria profissional de maquinista de 1ª, tendo como salário base o montante de 399,30 euros mais 53,02 euros de subsídio de alimentação a que acrescia normalmente trabalho suplementar do qual o requerente auferia em média mensalmente 150 euros;
- O requerente não é titular de quaisquer outros rendimentos ou fortuna pessoal que não seja a casa de morada de família;
- Sempre viveu dos seus rendimentos de assalariado;
- O seu agregado familiar é composto por si e pela esposa que é assalariada de confecção auferindo o vencimento mensal de 413,85 euros;
- O requerente teve inicialmente despesas de transporte e medicamentosas onde despendeu a quantia global de 683,90 euros;
- A máquina escavadora referida não tinha à data do acidente seguro que permitisse à mesma circular na via pública;
- O requerente, imediatamente antes da colisão, circulava na Estrada Municipal que liga .......... a ..........;
- Esta via configura-se como uma extensa recta com grande visibilidade para quem circula no sentido de marcha do requerente;
- A faixa de rodagem tem 7,05 m de largura, sendo constituída por duas vias de trânsito em sentido oposto;
- O ângulo proporcionado pelo dito entroncamento possui zonas encobertas existindo reduzida visibilidade para o trânsito que se processa no sentido ..........-.......... .
2.2 – Dos fundamentos do recurso:
De acordo com as conclusões formuladas, as quais delimitam o objecto do recurso – cfr. arts. 684º, nº 3 e 690º do CPCivil, temos que as questões a resolver são duas, a saber: verificação dos pressupostos que permitem a fixação da reparação provisória; limites da quantia a fixar a título de reparação provisória.
Vejamos de cada uma delas.
a) – Dos pressupostos que permitem a fixação de reparação provisória:
O arbitramento de reparação provisória constitui um procedimento cautelar (nominado) inovatório e tem como objectivo, como resulta do preâmbulo do Dec. Lei nº 329-A/95, de 12/12, «... reparar provisoriamente o dano decorrente de morte ou lesão corporal como também aqueles em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de por seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado», sendo que o seu regime jurídico – requisitos e regras processuais – se encontra previsto nos arts. 403º a 405º do CPCivil.
Dispõe-se no art. 403º do CPCivil que:

1. Como dependência da acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal, podem os lesados, bem como os titulares do direito a que se refere o nº 3 do artigo 495º do Código Civil, requerer o arbitramento de quantia certa, sob a forma de renda mensal, como reparação provisória do dano.
2. O juiz deferirá a providência requerida, desde que se verifique uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos e esteja indiciada a existência de obrigação de indemnizar a cargo do requerido.
3. A liquidação provisória, a imputar na liquidação definitiva do dano, será fixada equitativamente pelo tribunal.
4. O disposto nos números anteriores é também aplicável aos casos em que a pretensão indemnizatória se funde em dano susceptível de pôr seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado.

Tendo em conta o normativo citado, designadamente o seu nº 2, a providência de arbitramento de reparação provisória tem como pressupostos específicos – uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos e a indiciação de existência da obrigação de indemnizar a cargo do requerido.
Será que a factualidade considerada provada, no caso concreto, permite concluir, contrariamente ao pretendido pelos agravantes, pela sua existência e tal como veio a concluir-se na decisão sob recurso?
Afigura-se-nos que a resposta não poderá deixar de ser afirmativa.
Antes de mais, no que concerne à obrigação de indemnizar a cargo dos requeridos, ela resulta claramente da factualidade considerada assente pela decisão sob recurso que não foi minimamente colocada em causa pelos agravantes (requeridos).
Efectivamente, de tal matéria de facto resulta que o acidente ocorreu quando a máquina escavadora, propriedade da segunda requerida, circulava na via pública conduzida pelo terceiro requerido, ficando o embate a dever-se à conduta culposa deste, na medida em que não parou a um sinal de STOP que se lhe apresentava na via em que circulava, antes de atingir aquela em que ia entroncar e onde seguia o ciclomotor tripulado pelo requerente, que aí veio a ser atingido pela referida máquina escavadora.
Ao proceder dessa forma, o condutor da mencionada ‘escavadora’ violou o disposto no art. 21º - Sinal B2 (STOP), do Regulamento de Sinalização do Trânsito (Decreto Regulamentar nº 22-A/98, de 1 de Outubro), violação essa adequadamente causal do acidente, em consequência do que se colocou na situação de ter que responder pelos danos daí resultantes para o proprietário e condutor do ciclomotor – cfr. arts. 483º, nº 1 e 562º do CCivil.
A requerida responde, de igual forma, enquanto proprietária e na medida em que não havia transferido para outrem (seguradora) a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiro em consequência da circulação da mencionada ‘escavadora’ – arts. 483º, nº 2 e 503º do CCivil.
Assim, indiciada que se mostra a obrigação de indemnizar por parte dos requeridos (agravantes), vejamos se ocorre ou não a situação de necessidade em consequência dos danos sofridos justificadora do arbitramento de reparação provisória.
Antes de mais, devemos notar que este requisito, verdadeiramente, se subdivide em dois, como sejam: existência de uma situação de necessidade e existência de nexo causal entre os danos sofridos e essa necessidade; efectivamente, de acordo com o disposto no nº 2 do art. 403º do CPCivil, só a necessidade resultante dos danos sofridos pelo requerente justifica o arbitramento de reparação provisória, na medida em que nele se refere (limitando) expressamente «... uma situação de necessidade em consequência dos danos sofridos ...», afastada ficando qualquer outro tipo de necessidade que deles não resulte, designadamente, uma situação de necessidade anterior à ocorrência do evento danoso e que com ele, portanto, nada tenha a ver, o que tudo é compreensível face ao carácter antecipatório da providência em causa e à circunstância de o requerido apenas se encontrar obrigado a reparar os danos resultantes do evento danoso que lhe é imputável e nada mais.
No caso ‘sub judice’, a providência requerida assenta numa situação em que ocorreu lesão corporal, como abertamente resulta da matéria de facto considerada provada, pelo que ao requerente, enquanto lesado, era consentido suscitar o arbitramento de quantia certa, sob a forma de renda mensal, como reparação provisória do dano – artº 403º, nº 1 do CPCivil, desde que, desse dano, resultasse para si uma situação de carência ou necessidade económica, isto é, que lhe tenha provocado uma diminuição nos seus ganhos e de modo a comprometer de forma acentuada a sua capacidade económica e tendo em vista a satisfação das suas necessidades mais elementares, tendo sempre em conta o nível de vida que vinha experimentando anteriormente à ocorrência do evento danoso.
Como referem J. Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto [Código de Processo Civil (Anotado), volume 2º, nota 4, pág. 111], a propósito dos casos mencionados no nº 1 do art. 403º do CPCivil, tal situação de necessidade económica não se encontra limitada «... ao sustento, habitação e vestuário. Se o lesado ficar impossibilitado, pela lesão corporal, de continuar a auferir o rendimento do seu trabalho, qualquer sua necessidade, tido em conta o seu estilo de vida, há-de poder ser coberta pela reparação provisória, desde que outro meio não tenha de a satisfazer»; ainda a propósito dos casos inseridos no mencionado normativo legal, também, Célia Sousa Pereira [Arbitramento de Reparação Provisória, pág. 129] afirma que «... Nestes casos, a lei não impôs limitações, de qualquer ordem, ao tipo de necessidade que está na origem do deferimento da providência. Daí que o requisito de procedência se encontre preenchido qualquer que seja a situação de carência em que se encontra o requerente, podendo esta dizer respeito ao sustento, habitação, vestuário, educação ou ainda qualquer outro tipo de carência que tenha afectado o seu estilo de vida. ...».
No caso presente, temos que o requerente, em consequência do acidente, sofreu fractura dos ossos da perna e pé direitos, ao nível do tornozelo, bem como ruptura de tendões e ligamentos, sendo que, apesar de ter sido submetido a intervenção cirúrgica, está, desde a data do acidente, incapacitado para o exercício da sua actividade, encontrando-se sem auferir qualquer rendimento, quer a título de subsídio de doença ou outro, quando é certo que, à data do acidente, exercia a actividade profissional por conta de outrem, no ramo de marcenaria, com a categoria de maquinista de 1ª e o salário mensal de 399,30 euros, acrescido de 53,02 euros de subsídio de alimentação e de 150,00 euros por trabalho suplementar em média e por mês.
Acresce que o requerente não é titular de quaisquer outros rendimentos ou fortuna pessoal, que não seja a casa de morada de família, sendo o seu agregado familiar composto por si e pela esposa, a qual aufere a quantia mensal de 413,85 euros, a título de assalariada de confecção.
Ora, de tais factos impõe-se concluir por uma redução drástica da situação económica do requerente em consequência das lesões sofridas no acidente em causa, pois vê reduzidos os seus rendimentos globais familiares (incluindo, portanto, o salário da esposa) em mais de 50%, o que se torna tanto mais acentuado quanto é certo que estamos a considerar rendimentos de natureza laboral muito próximos do ‘salário mínimo nacional’, tido como o núcleo básico necessário à satisfação das mais elementares necessidades de subsistência humana, abaixo de cujo patamar a situação será já de manifesta e acentuada situação de insuficiência económica (indigência).
Assim, impõe-se concluir pela sem razão dos agravantes, por verificados os pressupostos que permitem o deferimento da providência, tal como bem se entendeu na decisão sob recurso que, quanto a este aspecto, deve ser confirmada.
b) – Dos limites da quantia a fixar a título de reparação provisória:
Verificados os pressupostos que consentiam o deferimento da providência, havia que liquidar ou determinar a quantia mensal que, ficando a cargo dos requeridos, deveria ser entregue ao requerente a título de reparação provisória.
O requerente peticionou que fosse fixada tal quantia em 452,32 euros, sendo que na decisão sob recurso se fixou a mesma em 400,00 euros, pretendendo os agravantes que a mesma seja fixada em 250,00 euros.
Do disposto no nº 3 do art. 403º do CPCivil resulta que inexiste um critério concreto legalmente estabelecido que deva ser seguido para encontrar a quantia a fixar, pois em tal normativo apenas se determina que a liquidação da reparação provisória deverá ser fixada equitativamente pelo tribunal.
A propósito de tal determinação, isto é, de que o tribunal deve, para efectuar a liquidação provisória, fazer uso da equidade, afirmam J. Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto [Ob. cit., vol. 2º, pág. 111] que «… deve o juiz, ao fixar equitativamente (nº 3) o montante da renda mensal provisória, ter em conta que a providência em causa, tendo natureza antecipatória, visa ocorrer a situações de necessidade que não podem esperar a composição definitiva do litígio, pelo que a renda mensal não deve exceder os limites da prudência que a consideração da sua provisoriedade impõe; …».
No caso ‘sub judice’, está provado que em consequência das lesões padecidas pelo requerente, este está incapacitado para o exercício da sua actividade e não está a receber qualquer subsídio de doença ou outro de qualquer espécie, sendo certo que auferia até ao acidente, no exercício da sua actividade profissional como maquinista de 1ª em marcenaria, o montante global de 602,32 euros (399,30 euros – salário base; 53,02 euros – subsídio de alimentação; 150,00 euros – em média por trabalho suplementar mensal).
De tal factualidade resulta, portanto, que, para além de ter deixado de receber aquele montante mensal, o requerente não usufrui de qualquer subsídio de doença ou outro de qualquer espécie, pelo que se vê numa situação de não dispor de qualquer rendimento pessoal, encontrando-se totalmente dependente do salário mensal de sua esposa, no valor de 413,85 euros, para prover às necessidades inerentes à subsistência do seu agregado familiar, constituído por ambos, e bem assim às necessidades pessoais de cada um.
Ora, atentando-se em tal factualidade e, bem assim, em que a satisfação das necessidades básicas inerentes à sua subsistência e de sua esposa, sem esquecer a situação sócio-económica de que usufruíam antes do acidente, exigirá um rendimento próximo do ‘salário mínimo nacional’ para cada um, sob pena de tal subsistência se vir a situar abaixo do patamar mínimo, entende-se que a quantia mensal que veio a ser fixada na decisão recorrida se mostra adequada, apesar de se tratar de uma reparação provisória e antecipatória e se não ter provado quer a ocorrência de cura clínica quer o grau de incapacidade de que virá a ficar afectado de forma definitiva.
Acresce que, face ao valor encontrado para a prestação a título de reparação provisória, só uma situação económica dos requeridos próxima ou inferior à do requerente, que de todo em todo se não mostra minimamente indiciada (antes pelo contrário, já que um dos requeridos é uma sociedade comercial), justificaria a diminuição do valor daquela prestação.
Assim, improcede, também e quanto a este aspecto, o recurso.
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3. Decisão:
Nos termos supra expostos, acorda-se em:
a) – negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida;
b) – custas do recurso pelos recorrentes.
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Porto, 16 de Janeiro de 2006
José da Cunha Barbosa
José Augusto Fernandes do Vale
António Manuel Martins Lopes