Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0230589
Nº Convencional: JTRP00034871
Relator: ALVES VELHO
Descritores: TELECOMUNICAÇÕES
COBRANÇA COERCIVA DE CRÉDITO
LEGITIMIDADE
PRESCRIÇÃO
SERVIÇO DE VALOR ACRESCENTADO
Nº do Documento: RP200206200230589
Data do Acordão: 06/20/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: T J BRAGA
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Área Temática: DIR CIV - TEORIA GERAL / DIR CONTRAT.
DIR PROC CIV.
Legislação Nacional: CPC95 ART26.
CCIV66 ART304 N1 ART310 G.
L 23/96 DE 1996/07/26 ART10 N1.
DL 240/97 DE 1997/09/18 ART1 ART2 A ART3 N1 D ART16 N3 D ART26 N1.
DL 381-A/97 DE 1997/12/30 ART9 N4 N5 ART16 N2 N3 .
PORT 160/94 ART2 ART5 N1 A C D N2 D ART6 N1N3.
Sumário: I - Apenas com base num contrato de prestação de serviço telefónico, sujeito ao Regulamento do Serviço Telefónico Público a "Portugal Telecom, S.A" não tem legitimidade para se apresentar como titular do direito a facturação e cobrança de quantias referentes a comunicações de serviços de valor acrescentado.
II - É à entidade prestadora dos serviços de valor acrescentado que a lei comete o direito de cobrar os preços dos serviços por ela prestados aos clientes para o que as operadoras de suporte lhes devem fornecer os elementos necessários à emissão das competentes facturas, excepto nos casos em que, de acordo com o contrato escrito celebrado entre ambas as entidades, se tenha convencionado que a execução da cobrança do serviço do valor acrescentado seja atribuída ao prestador dos serviços de suporte.
III - O direito de exigir o pagamento dos serviços telefónicos prestados em determinado período extingue-se, por prescrição, se a correspondente factura não for apresentada nos seis meses subsequentes a essa prestação, apresentação com a qual se considera interrompido o prazo prescricional iniciado com a prestação do serviço, voltando a correr a prescrição, após esse facto interruptivo, por novo prazo de seis meses.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

1. - No Tribunal Judicial da Comarca de ..... (Vara de Competência Mista),
"PORTUGAL TELECOM, S.A" intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra JOÃO ........, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia global de esc. 7.252.794$00 (6.235.785$00 de capital e 1.017.009$00 de juros), acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal.
Para tanto, a A. alegou que o R. lhe requereu a prestação de serviço de telefone mediante o pagamento mensal das taxas fixadas no tarifário sujeito ao Regulamento do Serviço Telefónico Público em consequência do que a A. montou na residência do R. o posto telefónico e este passou a usar a rede pública comutada, mediante o débito mensal das facturas correspondentes àquela utilização, as quais incluem o valor das chamadas e as taxas de assinatura mensal, sendo que delas não pagou o R., apesar de interpelado, as relativas aos meses de Fevereiro a Junho de 1999, inclusive, do referido valor de 6.235.785$00).
O R. contestou.
Por excepção, invocou a prescrição do direito da A., por decorridos mais de seis meses sobre os pedidos de pagamento e o abuso de direito, por a A. não ter satisfeito atempadamente o seu pedido de bloqueamento de chamadas de valor acrescentado; por impugnação, alegou não ter efectuado as chamadas em causa, que serão da autoria as pessoas que ficaram a viver na sua anterior residência, cujo chamamento para intervenção deduziu.
Realizada audiência preliminar, foi proferido saneador-sentença em que se decidiu:- julgar a A. parte ilegítima quanto ao pedido de pagamento de quantias relativas a serviços de valor acrescentado, com a correspondente absolvição do R. da instância; e, julgar procedente, quanto aos valores excedentes, a excepção peremptória da prescrição, com a inerente absolvição do R. do pedido respectivo.
A Autora apelou, arguindo a nulidade do «acórdão» e pedindo a declaração da sua legitimidade e a improcedência da excepção da prescrição, com a condenação de R. no pedido.
Para tanto, levou às conclusões:
A - O acórdão de que se apela deve ser declarado nulo, por violação do disposto no art. 668.º-1-c) CPC, pois os fundamentos estão em oposição com a decisão na medida em que o Tribunal, ao considerar como provado que a celebração do contrato de prestação de serviço telefónico com o R., não pode concluir pela ilegitimidade da A. na parte em que são peticionadas quantias relativas a serviços de audiotexto, dado que também estes são parte integrante das condições acordadas ao abrigo do contrato celebrado entre as partes e do serviço prestado;
B - De facto, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão, nomeadamente as constantes do Reg. do Serviço Telefónico Público deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido de pressupor a integração também dos serviços de audiotexto na "oferta ao público em geral do serviço telefónico público, prestado ao utente desde que suportadas na RFC (rede telefónica pública comutada), bem como a respectiva facturação mediante as taxas previstas em tarifário que são devidas à operadora pelo assinante sendo-lhe aplicável o Regime de Exploração do Serviço Telefónico Público;
C - Por outro lado, tal fundamentação jurídica devia ter sido conjugada não só com a regulamentação específica aplicável à prestação de serviços de audiotexto como também com as normas constantes quer do art. 3.º-1-d) do DL 240/97, de 18/9, quer dos art.s 6.º-4, 7.º e 11.º da Port. 160/94, de 22/3, quer das normas posteriores dos art.s 7.º-2 e 10.º do DL 177/99,de 21/5;
D - Da aplicação das normas invocadas decorre a legalidade, quer da prestação dos serviços de audiotexto pela A. no âmbito do serviço fixo de telefone, cujo direito de acesso está garantido ao R., não podendo ser restringido unilateralmente pela A., quer da respectiva facturação, incluída na facturação do serviço telefónico público;
E - Donde se terá de concluir pela inclusão na causa petendi da A. também dos serviços de valor acrescentado, facturados e pedidos pela A., e que não carecem de contrato autónomo ao do serviço de telefone fixo.
F - As facturas foram apresentadas a pagamento ao R. no prazo de seis meses após a prestação do serviço;
G - Na parte em que decidiu pela prescrição, a sentença recorrida fez incorrecta aplicação do disposto nos art.s 9.º-5 e 16.º-3 do DL 381-A/97, de 30/12.
O Apelado apresentou resposta em defesa do julgado.
O Ex.mo Juiz não reconheceu a comissão da nulidade arguida e sustentou a decisão quanto à legitimidade, enquanto matéria de agravo.
2. - MÉRITO DO RECURSO.
2. 1. - Nulidade da decisão.
A Apelante argui a nulidade da sentença recorrida, quanto à questão da sua ilegitimidade, a pretexto da existência de oposição entre os fundamentos jurídicos e a decisão, na medida em que, considerando provada a celebração do contrato de prestação de serviço telefónico, não pode concluir pela ilegitimidade da Autora para exigir o pagamento das quantias relativas a serviço de audiotexto, dado que estes são parte integrante das condições acordadas ao abrigo do contrato celebrado entre as partes e do serviço prestado.
O vício arguido pela Recorrente, e previsto no art. 668-1-c) CPC ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz deveriam logicamente conduzir ao resultado oposto ao expresso na decisão , ou seja, quando exista um real vício do silogismo judiciário.
Tal não se verifica, obviamente, no caso presente.
É que as premissas utilizadas pelo julgador não coincidem com as que a Apelante refere na sua alegação e reproduz na conclusão A.
Com efeito, basta uma simples leitura da parte da decisão impugnada relativa ao conhecimento da excepção da ilegitimidade activa para imediatamente se dar conta que, se é certo que nela se teve como pressuposta a celebração entre as Partes de um contrato de prestação de serviço telefónico e se admitiu mesmo que a A./recorrente tivesse prestado serviços de valor acrescentado, nunca na peça se admitiu que estes serviços fossem parte integrante das condições acordadas ao abrigo do contrato celebrado entre as Partes, como acrescenta a Apelante.
Bem pelo contrário, como premissa do silogismo, deixou escrito o Julgador que «(...) o prestado ou prestadores do serviço (de valor acrescentado) cujo preço vem agora a Autora exigir judicialmente ao Réu foram ou terão sido outras entidades que não a Autora (pelo menos ela não o diz expressamente, dizendo apenas que contratou com o réu a prestação do serviço público de telefone, o que não abrange a contratação dos referidos serviços de valor acrescentado) - e assim (...)».
Em suma, só a sofismática construção da Recorrente autoriza a arguição da nulidade que, como dito, de todo não foi cometida.
2. 2. - A legitimidade.
2. 2. 1. - Insiste a Recorrente que a prestação dos serviços de audiotexto no âmbito do serviço público de telefone, cujo direito de acesso está garantido ao Recorrido, e a respectiva facturação, incluída na facturação do serviço telefónico público, decorrem da lei, donde se terá de concluir pela inclusão na causa petendi - baseada na celebração do contrato de prestação de serviço telefónico e respectiva prestação de serviços - também dos serviços de valor acrescentado, facturados e pedidos pela Autora, e que não carecem de contrato autónomo ao de serviço telefónico público. Daí a sua legitimidade para facturar e exigir o respectivo pagamento.
2. 2. 2. - Os elementos de facto a considerar na apreciação da questão proposta são os constantes do relatório supra, os quais se dão aqui por reproduzidos, e ainda os seguintes:
- Em quatro das cinco facturas apresentadas para cobrança pela Autora ao Réu constam verbas relativas a comunicações automáticas de serviços de valor acrescentado;
- Essas quantias ascendem ao montante global de esc. 6 156 911$12.
2. 2. 3. - A legitimidade é um pressuposto processual que a lei relaciona e faz depender da existência de interesse directo em demandar ou em contradizer, aferido pela utilidade ou pelo prejuízo decorrente da procedência ou da improcedência da acção, e que define, subsidiariamente, através do critério da titularidade da relação jurídica material em litígio, tal como o autor a apresenta em juízo - art. 26.º CPC.
Por expressa opção legislativa (vd. preâmbulo do DL 329-A/95), a legitimidade processual tem de aferir-se tendo em conta as posições das partes em relação ao objecto do processo, isto é, ao alegado elo autor visando a utilidade derivada da procedência e ao alegado pelo réu para obviar ao correspondente prejuízo, independentemente da possibilidade ou viabilidade do reconhecimento do direito invocado, que já é questão de mérito.
Ora, no caso presente, a A., invocando a prestação do serviço de telefone, mediante o pagamento mensal das taxas fixadas no tarifário em vigor sujeito ao Regulamento do Serviço de Telefone Público (DL 240/97, de 18/9) emitiu a débito do Réu facturas que incluem o valor de chamadas efectuadas e taxas de assinatura, cujo pagamento exige judicialmente.
Entre as verbas discriminadas nas facturas accionadas constam as referentes a serviços de valor acrescentado (SVA).
Como concorda a Recorrente pode interessar à apreciação do problema, concorrendo para a respectiva solução, o preceituado no Regulamento de Exploração do Serviço Fixo de Telefone, aprovado pelo DL 240/97, de 18/9 (art.s 2.º-a), 3.º-1-d) e 26.º-1) e o Regulamento de Exploração dos Serviços de Telecomunicações de Valor Acrescentado estabelecido pela Portaria 160/94, de 22/3, diplomas que se encontravam em vigor ao tempo dos factos em apreciação.
A matéria regulada pelo DL 381-A/97, de 30/12, não se relaciona directamente com a questão, a não ser no que tange à revogação do DL 329/90, de 23/10 que, este sim, tinha por objecto a prestação - regime de acesso e exercício da actividade - de telecomunicações de valor acrescentado e o DL 177/99, de 21/5 (entretanto alterado pela Lei 95/2001, de 20/8), não se encontrava ainda em vigor, apesar de, ao que aqui releva, não divergir do regime estabelecido na Portaria de 94 referida.
Pois bem:
Não está em causa que, por via do contrato celebrado com a Autora e dos serviços que em sua execução esta pôs à sua disposição, o Réu tenha acedido a comunicações sonoras contidas no âmbito da «oferta, ao público em geral, do transporte directo de voz (...) através de equipamento (...)» que compõe o posto telefónico montado na sua residência, nem que, enquanto assinante, que era, não assistisse ao Réu o direito de aceder a serviços de telecomunicações de valor acrescentado com suporte no serviço fixo de telefone (SFT), o qual, por outro lado, estava obrigado à utilização do SFT nas condições de exploração regulamentadas e acordadas, como tudo se prevê nos citados art.s 1.º, 2.º-a), 3.º-1-d) e 26.º-1 do RESFT (DL 240/97).
Em causa está saber se, por isso e apenas com base num contrato de prestação de serviço telefónico sujeito ao Regulamento do Serviço Telefónico Público (art. 2.º da p.i.) - contrato de que se não mostra junto aos autos qualquer exemplar -, se apresenta a Autora como titular do direito à facturação e cobrança de quantia referentes a comunicações de serviços de valor acrescentado.
Estranha-se, desde logo, que, peticionando o valor de comunicações de valor acrescentado, a A./recorrente tenha omitido qualquer referência aos termos da cláusula contratual a que alude a al. d) do n.º 3 do art. 16.º do RESFT (DL 240/97). Na verdade, sendo a prestação do SFT objecto de contrato escrito e dele devendo constar a «manifestação expressa da vontade do assinante sobre o acesso, ou não, aos serviços de telecomunicações de valor acrescentado, de modo selectivo», sob pena de nulidade (art. 17º), logo aí deveria constar um dos fundamentos da Autora relativamente ao direito que pretende fazer valer em juízo, qual era o de a prestação desses serviços estar incluída no âmbito do objecto do contrato. Porém, nem documentado, nem alegado.
Mas, convoquemos o que estabelece a Portaria 160/94.
Foi a sua publicação, como se diz no respectivo preâmbulo, motivada pelo desígnio de colmatar «desajustamentos relativamente a situações (...) das quais assume maior relevo a do relacionamento entre os prestadores de serviços de valor acrescentado e os operadores de serviços de suporte.», pois «(...) verificou-se, atentos os sistemas utilizados para a contabilização e cobrança das receitas geradas pelo tráfego próprio dos prestadores de serviços de valor acrescentado, a inexistência de mecanismos que permitissem ao utente a correcta distinção entre as várias entidades com que respectivamente se relacionava.».
E é assim que neste diploma se consigna que são serviços de telecomunicações de valor acrescentado os que, tendo como único suporte os serviços fundamentais ou complementares, não exigem infra-estruturas próprias e são diferenciáveis em relação aos próprios serviços que lhes servem de suporte, do mesmo passo que se estabelecem como direitos dos prestadores daqueles serviços os de: - aceder e utilizar os serviços prestados pelos operadores de suporte, de acordo com a lei e de acordo com as condições a convencionar com os respectivos operadores; - cobrar preços correspondentes à prestação dos serviços efectuados, através de unidades de contagem suplementares introduzidas pelos operadores dos serviços de suporte, por si livremente fixados dentro das possibilidades técnicas destes e nos termos contratualmente estabelecidos; e, - receber dos operadores dos serviços de suporte os elementos que lhes permitam emitir as facturas aos clientes dos respectivos serviços. Como obrigação dos mesmos prestadores de SVA ressalta a de emitir facturas pelos serviços utilizados e facultar aos clientes informação sobre as chamadas a que as mesmas respeitam, quando não seja contratualmente acordada com os operadores de serviços de suporte essa facturação (art.s 2.º e 5.º- 1- a), c) e d) e 2-d)).
Relativamente às relações entre os prestadores de SVA e os operadores de serviços de suporte estabelece-se o princípio da liberdade de convenção das condições da prestação dos serviços, mas exige-se que os respectivos contratos obedeçam à forma escrita, deles devendo constar, designadamente, as regras aplicáveis em caso de não pagamento pelos clientes das importâncias correspondentes aos sva, quando a cobrança seja assumida pelo operador dos serviços de suporte, cobrança cujos termos devem ser contratualmente fixados pelos operadores - art. 6.º-1, 3-e) e g) e 4.
Do transcrito conjunto normativo que regula a matéria resulta claro, ao menos a nosso ver, que os serviços de telecomunicações de valor acrescentado utilizam como suporte os serviços prestados pelos serviços de telefone, mas são serviços diferenciáveis e inconfundíveis com estes, porque prestados por pessoas diferentes e com preços diferentes.
É à entidade prestadora dos SVA que a lei comete o direito de cobrar os preços dos serviços por ela prestados aos clientes para o que as operadoras de suporte (como a A.) lhes devem fornecer os elementos necessários à emissão das competentes facturas, excepto nos casos em que, de acordo com o contrato escrito celebrado entre ambas as entidades, se tenha convencionado que a execução da cobrança SVA seja atribuída ao prestador dos serviços de suporte.
Sujeitos da relação jurídica de prestação dos SVA são, assim, aos olhos da lei, o cliente consumidor e o prestador desses serviços. É a este que, como regra, a lei reconhece o direito de exigir o seu pagamento directamente ao cliente, mediante a colaboração do operador de suporte, salvo o caso de estipulação formal que cometa ao último o direito de cobrança ao consumidor.
Consequentemente, contrariamente do que sustenta a Recorrente, da lei e da mera prestação do serviço de telefone de acordo com o RESFT, como fundamento único da acção invocado na petição inicial, não decorre que lhe caiba o direito de facturar os serviços de valor acrescentado prestados por outrem ao Recorrido.
Para desse direito se apresentar como titular na acção, haveria a Apelante, enquanto operadora dos serviços de suporte, de invocar o contrato eventualmente celebrado com a entidade prestadora dos serviços que, de acordo com o regime legal referido, lhe conferiria tal direito, originariamente na esfera jurídica desta última.
Só assim a Autora se teria apresentado como titular da relação creditícia e inerente direito de exigir judicialmente as quantias que facturou a título de SVA.
Só assim, numa palavra, a A. asseguraria a sua legitimidade para a causa e fundamentaria a sua pretensão relativamente a essa parte do pedido.
Ora, apesar de suscitada a questão da legitimidade na audiência preliminar, a Apelante nada fez no sentido do suprimento da excepção, apesar de, ao que agora alega, existir, realmente, um contrato celebrado entre "D.......", que será a prestadora dos serviços em causa e a "PT", prestadora dos serviços de suporte, que preverá a facturação e cobrança por esta última daqueles serviços, alegação cuja relevância está fora do âmbito do objecto do recurso, desde logo por afastada pelo teor das conclusões da Recorrente.
Não merece, consequentemente, qualquer censura a declaração de ilegitimidade da Autora e a absolvição do Réu da instância quanto ao pedido de pagamento das quantias respeitantes aos serviços de valor acrescentado facturados.
2. 3. - A prescrição.
2. 3. 1. - A questão proposta é a de saber se o prazo de extinção do direito da Autora de exigir judicialmente o pagamento se extingue por prescrição decorridos que se mostrem seis meses sobre a data da apresentação da factura ao cliente ou se esse prazo de seis meses se refere apenas ao lapso temporal entre a prestação dos serviços e a apresentação da respectiva factura, sendo, a partir de então, aplicável o caso prescricional de 5 anos.
Está em causa a interpretação e conjugação do preceituado nos art.s 10.º-1 da Lei nº 23/96, de 26/7, 9.º-4 e 5 (ou 16.º-2 e 3) do DL 381-A/97, de 30/12 e 310.º-g) do C. Civ..
2. 3. 2. - A matéria de facto que vem assente não mereceu impugnação das Partes, nem há alterações a introduzir-lhe.
Assim, no uso da faculdade concedida pelo art. 713.º-6 CPC, remete-se para os termos em que a mesma consta na douta decisão recorrida.
2. 3. 3. - Como da matéria de facto resulta, as facturas accionadas foram apresentadas ao Réu para pagamento antes de decorridos seis meses sobre a data da prestação dos serviços nelas discriminados e a citação, como a propositura da acção, tiveram lugar mais de um ano e menos de dois anos após a referida apresentação de cada uma das facturas.
Na douta sentença impugnada entendeu-se que o direito de exigir o pagamento dos serviços prestados em determinado período se extingue, por prescrição, se a correspondente factura não for apresentada nos seis meses subsequentes a essa prestação (art. 9.º-4 e 5 do DL 381-A/97), apresentação com a qual se considera interrompido o prazo prescricional iniciado com a prestação do serviço, voltando a correr a prescrição, após esse facto interruptivo, por novo prazo de seis meses (art. 10.º-1 da Lei 23/96).
Concordamos, adianta-se, com tal entendimento.
Ninguém duvida de que através da Lei e normas do DL citadas se teve em mente a protecção dos consumidores dos serviços neles referidos, como resulta das respectivas epígrafes: « ... Mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais» e «Protecção dos utentes», respectivamente.
O fundamento do estabelecimento desse prazo prescricional "muito curto", escreve CALVÃO DA SILVA (RLJ 132.º-154), entronca na «chamada ordem pública de protecção ou ordem pública social, própria da reluzente temática da tutela do consumidor, tirado da necessidade de prevenir a acumulação de dívidas, que o utente pode (deve) pagar periodicamente mas encontrará dificuldades em solver se excessivamente agregadas».
Mas, se assim é, então parece não deverem restar dúvidas e ter-se como adquirido que o legislador quis estabelecer um prazo novo e bem mais curto que o que se encontrava previsto na al. g) do art. 310.º C. Civil, prazo esse que, para satisfazer o desiderato da lei, só pode ser o que se refere ao direito de exigir judicialmente o pagamento do serviço prestado após prestação, coincida o começo do decurso desse prazo com a data da possibilidade de apuramento do preço ou, quando efectuada a liquidação dentro do período de seis meses, com o da apresentação da factura.
Deste modo, quer a liquidação da factura, quer o direito de exigir o preço prescrevem no prazo de seis meses.
Interpretação diferente do que se encontra nos n.º.s 4 e 5 do art. 9.º (ou dos nºs 2 e 3 do art. 16.º) do DL 381-A/97 pressuporia, por um lado, o entendimento de que o diploma, designadamente através daqueles n.º.s 5 e 3 dos art.s 9.º e 16.º, teria revogado, quanto ao serviço de telefone, o disposto na Lei 23/96 e, por outro lado, a desaplicação da regra vertida no n.º 2 do art. 326.º C. Civ., regra segundo a qual a nova prescrição está sujeita ao prazo de prescrição primitiva, como, de resto, bem se faz notar na douta decisão apelada.
Assim, ou, como defende CALVÃO DA SILVA (loc. cit., 156), o prazo prescricional de seis meses corre após a prestação do serviço e não após a facturação ou, como temos por melhor conciliável com o n.º 5 do art. 9.º, a apresentação da factura funciona como facto interruptivo da prescrição de seis meses iniciada com a possibilidade da liquidação do preço dos serviços, contando-se a partir dessa apresentação os seis meses para a extinção do direito ao pagamento.
O que não poderá é aplicar-se a este último prazo o previsto na al. g) do art. 310.º (5 anos), valendo o de seis meses só para liquidação da dívida, por tal interpretação se mostrar incompatível com o escopo legal e com o princípio de que não estabelecendo a lei dois prazos sucessivos de prescrição, o prazo da nova prescrição é o mesmo da prescrição primitiva interrompida.
Invocada que foi a prescrição pelo devedor, e verificado, como está, o decurso do respectivo prazo, tinha de se reconhecer ao Réu o direito de recusar o pagamento - art. 304.º-1 C. Civ..
Nenhum reparo, também nesta parte, nos parece ser devido à bem elaborada peça impugnada.
Por isso, improcedem, como todas as anteriores, as últimas conclusões da Recorrente.
3. - Decisão.
De harmonia com o que ficou exposto, decide-se:
- Julgar improcedente a apelação;
- Confirmar, na totalidade, o saneador-sentença impugnado; e,
- Condenar a Recorrente nas custas.
Porto, 20 de Junho de 2002
António Alberto Moreira Alves Velho
Camilo Moreira Camilo
António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha