Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0750228
Nº Convencional: JTRP00040241
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
SENTENÇA
LIQUIDAÇÃO
Nº do Documento: RP200704160750228
Data do Acordão: 04/16/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 296 - FLS 12.
Área Temática: .
Sumário: I- A liquidação emergente de um título judicial é efectuada nos próprios autos de acção declarativa através do incidente previsto no art. 378.º e seguintes.
II- A partir da entrada em vigor do DL n.º 38/2003 a liquidação da dívida exequenda quando resulte de condenação ilíquida e cuja liquidação não dependa de simples cálculo aritmético, deixou de ter lugar a liquidação como preliminar da acção executiva e passou a efectivar-se no próprio processo declarativo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I
B………., veio agravar do despacho que indeferiu liminarmente o requerimento executivo, considerando a Vara Cível materialmente incompetente para conhecer do incidente de liquidação por si interposto na sequência da sentença que condenou a Ré a pagar ao Autor o que se liquidar em execução de sentença, e, declarou materialmente competentes os Juízos de Execução do Porto.
Na inconformidade dessa decisão veio concluir as suas alegações do seguinte modo:

1 – Requerido o incidente de liquidação de sentença, para apurar a parte ilíquida da condenação proferida na presente acção, o, aliás douto despacho recorrido indeferiu-o liminarmente, com o fundamento de tal liquidação dever processar-se na acção executiva, em conformidade com o disposto no nº 1 do artº 805º C.P.C.
2 – Por virtude do disposto no artº 1º do Dec-Lei nº 38/2002, de 8 de Março, o nº 5 do artº 47 CPC passou a estabelecer a condenação genérica, os termos do nº 2 do artº 661º do mesmo diploma, se não despender de simples cálculo aritmético, só constituirá título executivo após liquidação posterior, e o nº 2 do artº 378 CPC, acrescentado por aquele artº 1º do Dec-Lei nº 38/2003, estabelece que essa liquidação se deverá processar, como incidente, na própria acção declarativa, posteriormente à sentença.
3 – Nessa conformidade, por virtude dessa alteração, o nº 2 do artº 661 CPC deixou de fazer referência à liquidação em execução de sentença, e o nº 1 do artº 805 CPC só poderá ser aplicável aos títulos executivos que não sejam sentença (já que estas se não forem líquidas não constituem título executivo – citado nº 5 do artº 47 CPC), mas tendo em atenção o disposto na alº c) do nº 1 do art. 46 CPC (alterado pelo citado art. 1º do Dec-Lei 38/2003).
4 – Assim, o, aliás, douto despacho recorrido violou o disposto nos artºs 1 do Dec-Lei nº 38/2003 de 8 de Março, 47º nº5, 661 nº 2 e 378 nº 2 do CPC, e fez errada aplicação do disposto no nº 1 do artº 805 deste diploma, pelo que deve ser revogado e, consequentemente, ordenado o prosseguimento do incidente.

O tribunal a quo sustentou o despacho recorrido.
Os factos são os dos autos.
III
O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer das matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (artºs 684º nº 3 e 690º nº 1 e 3 do CPC).

É a seguinte a questão a decidir:
As questões suscitadas no recurso reportam-se à existência ou inexistência do título executivo e, se a pretensão do autor se reconduz a uma acção executiva para pagamento de quantia certa, com prévia liquidação, dependendo esta de simples cálculo aritmético.

Quid iuris?
Quanto à liquidação da decisão condenatória estabelece o art. 47 nº5 do CPC que tendo havido condenação genérica, nos termos do nº2 do art. 661 e não dependendo a liquidação obrigatoriamente de simples cálculo aritmético a sentença só constitui título executivo após a liquidação no processo declarativo.
Deste preceito resulta que a liquidação emergente de um título judicial é efectuada nos próprios autos de acção declarativa através do incidente próprio previsto no art. 378 e ss do CPC.
Quanto à liquidação do pedido.
A questão a decidir nesta sede reside apenas em saber se o caso “sub iudice” é subsumível ao incidente de liquidação da obrigação genérica, instituído pelo DL 38/2003, 8.03 que empreendeu a reforma da acção executiva.
Estamos, in casu, perante sentença que condenou a Ré a pagar ao Autor, no que se liquidar em execução de sentença, com juros a partir da citação, relativamente aos benefícios que este deixou de auferir, no período compreendido entre 26 de Março de 1998, data da sua demissão, até Março de 2000 (reportadas à utilização de uma viatura e gastos inerentes, subsídio de doença e seguro de vida, deslocações pagas ao estrangeiro, para valorização pessoal, etc).
O DL 38/2003, 8-03, aboliu a liquidação em execução de sentença e deslocou obrigatoriamente para o âmbito do processo declaratório a liquidação da condenação genérica (não dependente de simples cálculo aritmético), criando uma espécie de incidente posterior ou subsequente a tal decisão judicial, enxertado no processo declaratório que nela culminou e determinando a renovação da instância extinta (arts 47.º/5, 378.º/2, 380.º/3 e 4, 380.º-A, 471.º/2, 661.º/2 do CPC). [Vide Lopes do Rego, in Comentários ao C.P.Civil, 2ª edição p. 337].
Em síntese, a partir da entrada em vigor do Dec. Lei 38/2003 a liquidação da dívida exequenda quando resultante de condenação ilíquida (art. 661 nº2 do CPC) e cuja liquidação não dependa de simples cálculo aritmético, como é o caso, deixou de ter lugar a liquidação como preliminar da acção executiva e passou a efectivar-se no próprio processo de declarativo.
Daí concluir-se que só haverá título executivo depois dessa liquidação.
Deve, por isso, dar-se prosseguimento ao incidente.
II
Nestes termos, decide-se conceder provimento ao agravo, revogando a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que ordene o prosseguimento do incidente.
Custas pelo agravante considerando o proveito obtido com o recurso (art. 446º nº 1 do CPC).

Porto, 16 de Abril de 2007
Anabela Figueiredo Luna de Carvalho
António Augusto Pinto dos Santos Carvalho
Baltazar Marques Peixoto