Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0325905
Nº Convencional: JTRP00036165
Relator: ARMINDO COSTA
Descritores: EXECUÇÃO
ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
ALIMENTOS
MAIORIDADE
TÍTULO EXECUTIVO
Nº do Documento: RP200312160325905
Data do Acordão: 12/16/2003
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática: .
Sumário: A sentença que fixou os alimentos devidos a menores vale como título executivo após a sua maioridade, competindo ao obrigado (pai ou mãe) requerer a cessação da obrigação através do incidente previsto no artigo 1412 n.2 do Código de Processo Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível da Relação do Porto:

Andreia..... e Francisca....., maiores, solteiras, residentes na Rua....., ....., instauraram contra o pai, Francisco....., casado, residente na Rua....., ....., a presente execução especial de alimentos, pelos montantes em dívida de 2 266 454$00 à primeira, e 2 475 734$00 à segunda.
Tendo por título a sentença de homologação proferida no processo tutelar cível de alteração do exercício do poder paternal, que fixou a prestação alimentar devida a cada uma das menores em 20 000$00, actualizada anualmente em 1 de Janeiro, segundo o coeficiente de inflação publicado pelo INE, em vigor no ano imediatamente anterior.
A Sra. Juíza indeferiu liminarmente a execução quanto às quantias posteriores à maioridade das exequentes, por insuficiência de título executivo.
As exequentes recorreram da decisão, e, admitido o recurso, como agravo, com subida diferida e efeito devolutivo, deduziram as alegações, que sintetizaram nas seguintes conclusões:
1.ª A maioridade não afecta automaticamente a cessação da obrigação dos alimentos fixados por sentença anterior.
2.ª O beneficiário dos alimentos, após a maioridade, é parte legítima, e pode requerer a execução da sentença que anteriormente fixou os alimentos a requerimento de um dos progenitores.
3.ª O douto despacho recorrido viola as disposições legais dos arts. 1880.° e 2083.° do Código Civil e 1412.° a 1121.° do Código de Processo Civil.
Terminam, pedindo que se revogue a decisão recorrida, e se ordene o prosseguimento da execução pelos alimentos vencidos após a maioridade das exequentes.
O executado respondeu às alegações, defendendo a improcedência do recurso.
A Sra. Juíza sustentou o agravo.
Colhidos os vistos dos Ex.mos Adjuntos, cumpre deliberar.

Pelo que consta dos autos, prova-se que:
1. A mãe das exequentes, Teresa....., deduziu contra o executado, por apenso ao processo de regulação do exercício do poder paternal n.º.. do -.º Juízo, -.ª Secção, do Tribunal de Família do....., o pedido de alteração dos alimentos.
2. Na audiência de julgamento, que teve lugar em 22 de Março de 1990, a requerente e o mandatário do requerido fizeram o seguinte acordo:
a) A pensão que o pai vem pagando às filhas é actualizada para 20 000$00 mensais para cada uma;
b) O pagamento inicia-se no próximo mês de Abril, por transferência bancária para a conta da mãe das menores no Banco......, Agência de....., até ao dia 5 do referido mês, e assim sucessivamente;
c) A pensão será actualizada anualmente, com início em 1 de Janeiro de 1991, segundo o coeficiente de inflação em vigor no ano imediatamente anterior, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística.
3. O acordo foi em seguida homologado pelo Sr. Juiz, tendo o requerido sido notificado para os efeitos do art‚ 300.º n.º 5 do Código de Processo Civil.
O objecto do recurso centra-se na questão da insuficiência ou não do título executivo.
Conforme dispõe o art. 45.º n.º 1 do Código de Processo Civil, é pelo título executivo que se determinam o fim e os limites da execução.
No caso, o título executivo é a sentença proferida no processo tutelar cível, pela qual o requerido foi condenado a prestar alimentos às filhas, ora exequentes.
A regulação do exercício do poder paternal, incluindo a fixação dos alimentos às então menores, foi consequência do divórcio dos pais, e em observância ao disposto no art. 1905.º do Código Civil.
O poder paternal cessa logo que o menor atinge a maioridade (art. 1877.º CC). Portanto, em princípio, os alimentos também cessam com a maioridade.
Todavia, o art. 1880.º do Código Civil diz que a obrigação de prestar alimentos manter-se-á para além da menoridade do filho, se não houver completado a sua formação profissional.
O Prof. Heinrich Horster, in Revista de Direito e de Estudos Sociais, IX, pág. 338, defende que este artigo constitui um prolongamento para além da menoridade dos deveres dos pais em relação aos filhos.
Na verdade, o preceito emprega o futuro do presente (manter-se-á) com o valor de imperativo, o que reforça o entendimento de que a obrigação não se extingue automaticamente pelo facto de o filho atingir a maioridade.
A redução do limite da maioridade dos 21 para os 18 anos, por um lado, e o alargamento do ensino obrigatório e proliferação cursos médios e superiores, por outro, fazem com que raramente os filhos completem a formação antes de atingir a maioridade.
Por isso, entendemos que - contrariamente à posição acolhida no Ac. STJ, de 03.01.23, Processo n.º 02B4379, e no Ac. desta Relação, de 95.02.07, Processo n.º 9421010, disponíveis na página da DGSI na Internet) a sentença que fixou os alimentos devidos às menores vale como título executivo após a sua maioridade, competindo ao obrigado requerer a cessação da obrigação através do incidente previsto no art. 1412.º n.º 2 do Código de Processo Civil.
De outro modo, o filho teria de propor uma nova acção cível para o efeito da fixação dos alimentos necessários ao prosseguimento da sua formação profissional, o que não parece consentâneo com a vontade expressa do legislador, de que a obrigação “manter-se-á”.
Além disso, o filho ver-se-ia privado dos alimentos até à questão ser decidida, com todo os prejuízos de ordem pessoal e patrimonial que daí resultariam para a sua formação profissional, que é, ao fim e ao cabo, a única razão de ser daquele artigo.
Por tudo isto, não vemos motivo para o indeferimento liminar parcial do requerimento executivo.
As conclusões das recorrentes têm, pois, fundamento.
Nestes termos, concede-se provimento ao agravo, e revoga-se a decisão na parte recorrida, devendo a execução prosseguir igualmente quanto à mesma.
Custas pelo recorrido.

Porto, 16 de Dezembro de 2003
Armindo Costa
Durval dos Anjos Morais
Alberto de Jesus Sobrinho (Vencido, pelas seguintes razões:
Efectivamente, a obrigação alimentar não cessa automaticamente com a maioridade.
Mas só ocorrendo o circunstancialismo aludido no artº 1880º.)