Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0327023
Nº Convencional: JTRP00036922
Relator: MARQUES DE CASTILHO
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
INABILITAÇÃO
Nº do Documento: RP200405250327023
Data do Acordão: 05/25/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFLITO COMPETÊNCIA.
Decisão: DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA.
Área Temática: .
Sumário: É da competência das varas a acção especial de inabilitação com valor superior à alçada do Tribunal da Relação, movida em conformidade com o disposto no artigo 944 do Código de Processo Civil, uma vez apresentada contestação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

Relatório
O Exmº Procurador junto deste Tribunal veio requerer a resolução do conflito de competência suscitado entre os Exmºs Magistrados Judiciais da 2ª Vara Mista e do 7° Juízo Cível da comarca de Vila Nova de Gaia uma vez que se atribuem mutuamente a competência, negando a própria, para os termos da Acção Especial de Inabilitação de que são Autores
B....., C..... e outros e
Requerido
D......
Mais refere que os despachos que originaram o presente conflito transitaram em julgado; os dois tribunais em conflito situam-se na área deste Distrito Judicial do Porto; o conflito acha-se suscitado na forma devida na conformidade do disposto no art. 117º nº 1 do Código Processo Civil como serão todas as outras disposições legais infra citadas de que se não faça menção especial e foi dado cumprimento ao disposto no art. 118°.
A Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer junto de fls. 38 a 42 no qual se manifestou no sentido de o conflito dever ser solucionado atribuindo-se a competência para os termos do referido processo à 2ª Vara Mista de Vila Nova de Gaia.
Foram colhidos os vistos legais dos Exmºs Juízes Adjuntos pelo que cumpre decidir.

THEMA DECIDENDUM
O que está em causa no presente conflito é saber a quem deve ser atribuída a competência para os termos da acção especial de Inabilitação com valor processual superior à alçada do Tribunal da Relação movida em conformidade com o disposto no artigo 944º e segs uma vez apresentada contestação.

DOS FACTOS E DO DIREITO
São os seguintes os factos a considerar como assentes e de relevância para a presente decisão:
Na comarca de Vila Nova de Gaia, em 10 de Novembro de 2001, foi distribuída acção especial de inabilitação, de valor igual à alçada do Tribunal da Relação mais um escudo (tal como preceituava o art. 312° do Código de Processo Civil, na redacção anterior à introduzida pelo DL 323/01, de 17/12) contra o requerido - fls. 5
A acção aludida foi distribuída ao 7° Juízo Cível.
O Réu após haver sido citado veio apresentar a sua contestação.
A 29/5/2003 foi proferido despacho, determinando que a acção prosseguisse sob a forma ordinária, por ter sido contestada - art. 952° nºs 1 e 2 do Código Processo Civil como serão todas as outras disposições legais infra citadas de que se não faça menção especial bem como que os autos fossem remetidos às Varas Mistas da mesma comarca, por serem as competentes para a ulterior tramitação - fls. 28.
Após distribuição da acção à 2ª Vara Mista da comarca de Gaia o Mmº Juiz proferiu despacho em 9//2003 a julgar o seu tribunal incompetente, porquanto, em seu entender, seriam originariamente competentes para preparar a acção os Juízos Cíveis de Gaia, só devendo os autos serem remetidos às Varas Mistas para o julgamento, se se verificar o condicionalismo previsto no nº 1 do art. 646°, do Código de Processo Civil, ou seja, se ambas as partes requererem a intervenção do tribunal colectivo.
Vejamos.
Os tribunais judiciais de 1ª instância são, em regra, os tribunais de comarca - art. 62°-1 da Lei 3/99 de 13/01, Lei Orgânica de Funcionamento dos Tribunais Judiciais - LOFTJ – podendo, quando o volume ou a natureza do serviço o justifiquem, existir na mesma comarca vários tribunais de acordo com o nº 2 do mesmo normativo.
No seu art. 64° a Lei 3/99 estatui que pode haver tribunais de 1ª instância de competência especializada e de competência específica: os primeiros, conhecem de matérias determinadas, independentemente da forma de processo aplicável e os segundos conhecem de matérias determinadas em função da forma de processo aplicável, bem como dos recursos de impugnação em sede contra-ordenacional.
Entre os tribunais de competência específica, contam-se, precisamente, as varas e os juízos, uns e outros, cíveis, criminais ou de competência mista - art. 96° LOFTJ.
Às Varas Cíveis compete preparar e julgar as acções declarativas cíveis de valor superior à alçada da Relação em que a lei preveja a intervenção do tribunal colectivo, preparar e julgar as acções executivas de valor superior à alçada da Relação e cujo título executivo não seja uma sentença, preparar e julgar os procedimentos cautelares que sejam dependência de acções da sua competência e exercer as demais competências conferidas por lei - art. 97° LOFTJ.
Por sua vez, aos Juízos Cíveis em face do disposto no artigo 99º da mesma Lei compete preparar e julgar as acções cíveis que não sejam da competência das Varas nem dos Juízos de Pequena Instância Cível.
As 1ª e 2ª Varas de Competência Mista de Vila Nova de Gaia foram criadas pelo art. 48° al. h), do Dec-Lei nº 186-A/99, de 31.05 o qual entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação - art. 75°.
Ora a competência dos diversos tribunais em função do valor é determinada pela lei de processo - art. 20° da LOFTJ, sendo o mesmo fixado na conformidade do estatuído no artigo 24º nº1 na redacção introduzida pelo Dec-Lei 323/01 de 17/12, actualmente de Euros 14 963,94 para os Tribunais da Relação e de Euros 3 740,98 para os Tribunais de 1ª instância, sendo anteriormente Esc. 3.000.000$00 desde 14/1/99, início da vigência da citada LOFTJ, para os primeiros Tribunais aludidos.
Os processos de interdição e de inabilitação, como o presente, são processos especiais, seguindo a forma declarativa ordinária, designadamente, quando as acções tenham sido contestadas art. 952° nº2.
O art. 646° na redacção introduzida pelo Dec-Lei 329-A/95 de 12/12, prescrevia que a discussão e julgamento das acções ordinárias incumbia ao tribunal colectivo, excepto se se tratasse de acção não contestada, de acção cujas provas tivessem sido gravadas ou reduzidas a escrito antes do início da audiência final ou de acção em que uma das partes tivesse requerido a gravação da prova.
O mesmo preceito, na revisão introduzida pelo Dec-Lei 183/2000 de 10/08 que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2001, mas em que se estipula que a nova redacção do art. 646° CPC só é aplicável aos processos em que ainda se não tenha iniciado o prazo para requerer a intervenção do tribunal colectivo, ou seja até à audiência preliminar ou, se esta se não realizar, no prazo previsto no art. 512° do mesmo código - cfr. arts. 7° nºs 6 e 8 passou a prever que a discussão e julgamento das acções ordinárias só será feita com intervenção do tribunal colectivo se ambas as partes assim o tiverem requerido e se não se verificar nenhuma das situações previstas no nº2 do mesmo preceito. Porém, o julgamento da matéria de facto e a prolação da sentença incumbem ao Juiz que deveria presidir ao tribunal colectivo, se a intervenção deste tivesse lugar.
Ora perante estes comandos normativos e verificado que para o caso vertente a acção de inabilitação em que se suscitou o conflito negativo de competência foi instaurada já depois de estarem instaladas as Varas Mistas de Gaia, sendo uma acção declarativa de valor superior à alçada do tribunal da Relação e em que a lei prevê a intervenção do tribunal colectivo consideramos que estão verificados os pressupostos legais previstos no art. 97° nº1 al. a) da LOFTJ isto é, para que a mencionada acção seja da competência da Vara Mista, quanto à preparação e julgamento da acção: valor excedente à alçada da Relação, como não poderia deixar de ser, dado que se trata de uma acção de estado, respeitante à capacidade de exercício do requerido [Vide Acórdão da Relação de Lisboa, de 2/7/91, proc. Nº 0045351, in www.dgsi.pt, citado no douto parecer do Exmº Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal] e possibilidade de o julgamento se realizar perante tribunal colectivo, devendo por último tomar-se em consideração o estatuído no artigo 463º nº 1 in fine “ … em tudo quanto não estiver prevenido numas e noutras, observar-se-á o que estiver estabelecido para o processo ordinário”.

DELIBERAÇÃO

Nestes termos, em face do que vem de ser exposto decide-se o presente conflito, declarando-se competente para os termos do processo em causa a 2ª Vara Mista do Tribunal da comarca de Vila Nova de Gaia.
Sem custas.

Porto, 25 de Maio de 2004
Augusto José Baptista Marques de Castilho
Maria Teresa Montenegro V C Teixeira Lopes
Emídio José da Costa