Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0625685
Nº Convencional: JTRP00039867
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: INTERRUPÇÃO DA INSTÂNCIA
DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
Nº do Documento: RP200612120625685
Data do Acordão: 12/12/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: LIVRO 235 - FLS. 4.
Área Temática: .
Sumário: A deserção da instância tem lugar sem necessidade de despacho que o declare, a partir do momento em que sobre a data da ocorrência da interrupção da instância tiver decorrido o prazo estabelecido no art. 291.º do CPC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 5685/06-2
Agravo
….ª Vara Cível do Porto, …..ª secção – proc. ……../1993-B
Recorrente – B…………., SA
Recorridos – C…………..
D……………., SA
Relator – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. Lemos Jorge
Desemb. Antas de Barros

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – Nos presentes autos de execução para pagamento de quantia certa que B…………., SA intentou contra E……………., SA e C…………. e onde é interveniente acidental o Banco D…………, SA, foi proferido a fls 345 dos autos, despacho a julgar a presente instância executiva deserta.
Inconformada com tal decisão veio a exequente, seguradora, dele recorrer, como resulta de fls 349, o que foi admitido como agravo, a subir imediatamente e em separado.
A recorrente juntou aos autos as suas alegações onde termina pedindo a revogação de tal despacho e a sua substituição por outro que mande prosseguir os autos ou, caso assim se não entenda, se declare nulo o despacho que julgou a instância deserta e se declare interrompida a instância.
Nessas alegações formula a recorrente as seguintes conclusões:
1ª Nos presentes autos verifica-se que em 27 de Maio de 1996 foi proferido despacho com o seguinte teor; Aguardem os autos no arquivo, nos termos do artº 285º do CPC.
2ª Ora tal despacho nunca foi notificado à ora recorrente/exequente. Nem qualquer outro que implique a notificação de interrupção da instância, o que impossibilitou a exequente de controlar concretamente o processo executivo.
3ª A falta de notificação constitui nulidade que fere (de nulidade) todo o processado posterior.
4ª A deserção da instância pressupõe uma declaração prévia da interrupção e sua notificação para que o exequente possa acautelar os seus interesses, o que não ocorreu, e não seja vítima de delongas da justiça.
5ª A interrupção da instãncia supõe um despacho judicial, na medida em que nela está suposto um juízo sobre a diligência das partes na prossecução do processo e sobre a duração da paragem, atentas ainda as consequências da mesma resultantes em sede da subsistência de direitos sujeitos a caducidade e prescrição (artº 332º nº2 do C.Civil).
6ª Impõe-se uma aferição judicial sobre os motivos da paragem do processo e, designadamente, se esta é imputável, ou não, a negligência das partes para que a mera paragem objectiva da tramitação processual não imputável a qualquer das partes não se transforme automaticamente em interrupção da instância e os direitos que pelo processo se pretendem fazer valer não se extingam...”.
7ª A notificação omitida da interrupção da instância tem uma função informativa [E corrente classificar as notificações em convocatórias (ou para comparência) e informativas (para comunicação ou conhecimento), consoante visem chamar o destinatário a intervir em certo acto (diligência ou audiência) ou dar-lhe conhecimento da prática dum acto ou da ocorrência de determinado facto, e nesse caso, era obrigatória”.
8ª O douto despacho em apreço ao declarar a deserção da instância violou o disposto nos artºs 285º e 291º do CPCivil.
9ª E houve violação do disposto no artº 259º do CPCivil que constitui nulidade prevista no artº 201º que aqui expressamente se invoca.
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O Banco, interveniente acidental contra-alegou pugnando pelo não provimento do agravo em apreço.
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O Mmº Juiz “ a quo” manteve o seu despacho.

II – Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Com interesse para a decisão do presente agravo encontram-se assentes nos autos os seguintes factos :
B………….., SA, com sede no Porto, intentou, em 19.01.1993, a presente execução para pagamento de quantia certa contra E………….., SA, com sede no Porto e contra C………….., para haver deles o pagamento da quantia de 141.102.470$00/703.817,50 €, acrescida de juros vincendos.
A 1ª co-executada foi oportunamente declarada em estado de falência e contra ela foi extinta a presente instância executiva.
Em 24.01.1996 a exequente faz entrar no processo requerimento (fls 73) pelo qual informa que “... apesar das diligências efectuadas e em face da insuficiência manifesta dos bens já penhorados e vendidos no presente processo para o pagamento da quantia exequenda, não é possível à Requerente nomear à penhora quaisquer outros bens no presente processo”.
Perante tal requerimento foi proferido em 29.01.1996, o seguinte despacho:”Face ao teor de fls. 80, à conta”.
De seguida a execução foi contada e da respectiva liquidação resulta que a exequente mantinha-se credora pela quantia de 204.225615$00 e que havia em saldo a seu favor e a ser-lhe entregue, quando solicitado, a quantia de 123.700$00.
De tal conta foi a exequente notificada por correio registado de 18.03.1996.
E na sequência de tal notificação veio a exequente em 25.03.1996 requerer o levantamento do respectivo precatório-cheque, o que foi deferido e lhe foi entregue em 7.05.1996.
Finalmente, em 27.05.1996 foi proferido o seguinte despacho: “Aguardem os autos no arquivo, nos termos do artº 285º do CPC”.
Em 29.11.2004, a exequente veio requerer a penhora do crédito do executado C………… sobre o Banco D……………, com sede em Lisboa, relativo ao montante a receber por via de um incidente de liquidação deduzido pelo executado e a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, …ª Vara Cível, ….ª secção, Proc. Nº …../97 – Acção Ordinária, suficiente para pagamento da quantia exequenda e custas.
Tal penhora de créditos foi efectuada e na sequência da mesma veio o Banco D…………. aos autos (interveniente acidental) veio em 19.01.2005, dizer que tal crédito não existia e que o título dado à execução nestes autos havia sido reconhecido como abusivamente preenchido na decisão proferida no incidente de liquidação pendente na ….ª Vara Cível do Porto, …ª secção, proc. …../97.
Mais tarde e depois de ter sido notificado para requerer o que lhe aprouvesse, veio o referido interveniente acidental, por requerimento de 11.04.2005, pedir que fosse decretada a extinção do direito cartular exequendo, por prescrição, ou em alternativa, e caso assim se não entendesse, ser decretada a anulação do direito cartular, titulado e dado à execução pelo valor nele preenchido, porquanto o valor que deveria ter sido preenchido e dado à execução era de 67.945.219$00, em conformidade com a sentença da ..ª Vara Cível do Porto.
Sobre tal requerimento do Banco D……….. recaiu o despacho de 29.04.2005, no qual se declarou a ilegitimidade processual do interveniente acidental para arguir a prescrição cartular e lhe indeferiu o demais peticionado, ordenando o prosseguimento da execução.
Inconformado com tal decisão, dele recorreu de agravo o Banco D…………., e por Acórdão deste Tribunal de 14.03.2006, foi concedido provimento parcial ao agravo, tendo-se revogado o despacho recorrido enquanto fez prosseguir a execução, para que na 1ª instância se conhecesse da questão da deserção da instância e do que, sendo caso disso, daí decorresse.
A questão da deserção da instância executiva foi levantada pelo recorrente Banco D…………. em sede de conclusões das alegações de tal agravo e foi tomada em consideração em tal Acórdão pela natureza oficiosa do seu conhecimento.
De seguida e baixados os autos à 1ª instância, em 2.05.2006, foi proferido despacho, onde se decidiu que:” Na esteira do Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto” .... “Julgo como deserta a presente instância executiva (vd.o artº 291º do CPCivil), uma vez que este normativo concatenado com o que nos autos promana de fls. 81 e ss (pela inércia da exequente em promover os termos dos autos no prazo aí assinalado)”.
É desta decisão que julgou deserta a presente instância executiva que versa o presente agravo, interposto pela exequente.

III - - O âmbito do recurso é definido pelas conclusões da recorrente, cfr. artºs 684º nº 3 e 690º nº 1, ambos do C.P.Civil, pelo que são questões a apreciar nos autos:
1ª. O despacho que ordena que os autos aguardem o decurso do prazo a que se alude no artº 285º do CPCivil, na sequência da contagem do processo por a exequente se ter declarado incapaz de nomear quaisquer outros bens à penhora, tinha de ser notificado à exequente?
2ª. Em caso afirmativo, quais as consequências da omissão de tal notificação?
3ª. A interrupção da instância tem de ser declarada por despacho judicial ?
4ª. A deserção da instância pressupõe a existência prévia de tal despacho a julgar a instância interrompida?
5ª. Qual a consequência de não ter sido proferido despacho a julgar a instância interrompida e ter sido essa mesma instância julgada deserta?
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Vejamos a 1ª questão.
Como é sabido, um dos ónus que a lei impõe às partes é o de promover o regular andamento do processo, por decorrência do princípio do dispositivo, isto sem prejuízo de incumbir ao juiz, mas sem pôr em causa o impulso das partes, nos casos especialmente previstos na lei, de providenciar pelo andamento célere da causa.
Porque não é assim admissível que, por negligência das partes, os processos possam ficar sem movimentação ou andamento por tempo excessivo, ou até indefinidamente, a lei prevê mecanismos para obviar a tais situações. Nesses casos, prevê a lei os institutos da interrupção da instância e o da deserção da instância.
A interrupção da instância está prevista no artº 285º do CPCivil, nos seguintes termos: “A instância interrompe-se quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente da qual dependa o seu andamento”.
E no seguimento dispõe-se no artº 286º do CPCivil que essa interrupção cessa, se o autor (ou o exequente, já que se trata de uma disposição geral do processo) requerer algum acto do processo ou do incidente de que dependa o andamento dele, sem prejuízo do disposto na lei quanto à caducidade dos direitos.
Actualmente, a interrupção da instância ocorre, passado um ano e um dia sobre a omissão da prática de acto de que dependa o respectivo andamento.
Enquanto que a deserção se verifica, ao contrário do que acontecia no Código de Processo Civil de 1939, automaticamente, ou seja, sem necessidade de despacho ou decisão judicial, passados dois anos sobre a sua interrupção, (em lugar dos cinco previstos antes da Reforma de 1995/96 do CPCivil).
Quanto à deserção dispõe o artº 291º nº1 do CPCivil que se considera deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida por mais de dois anos.
Ora, no caso dos autos, está assente que em 24.01.1996, a exequente, dirigiu à execução um requerimento, pelo qual dizia que “... apesar das diligências efectuadas e em face da insuficiência manifesta dos bens já penhorados e vendidos no presente processo para o pagamento da quantia exequenda, não é possível à Requerente nomear à penhora quaisquer outros bens no presente processo”. Na sequência, o juiz do processo ordenou que os autos fossem contados, o que se verificou de seguida, tendo no final da elaboração da conta, a exequente sido dela notificada, por correio registado de 18.03.1996, e dela bem ficou ciente, já que como da respectiva liquidação constava, tinha ela a haver dos autos, quando requeresse, precatório-cheque no valor de 123.700$00, e cujo levantamento veio requerer em 25.03.1996, o qual lhe foi entregue em 7.05.1996.
Finalmente, em 27.05.1996, o juiz do processo proferiu o seguinte despacho: “Aguardem os autos no arquivo, nos termos do artº 285º do CPC”.
Insurge-se agora a exequente porque não foi, e segundo ela deveria ter sido, notificada da prolação de tal despacho.
Desde já se deixa consignado que não assiste qualquer razão, neste ponto, à recorrente.
Na verdade, o referido despacho tinha como único destinatário o funcionário judicial que tramitava os autos. Trata-se assim de um despacho de mero expediente, tal como resulta da noção inserta no nº 4 do artº 156º do CPCivil, “destinado a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes”.
Tal despacho em nada interferiu com a situação das partes, designadamente com a situação processual da exequente, já que esta, desde a data em que foi notificada da conta elaborada nos autos, e ainda de que era credora do executado, pela quantia de 204.225.615$00, estava incursa no ónus de impulsionar os autos, com vista à cobrança de tal crédito e, segundo a lei (cfr. artº 285º do CPCivil), tinha a contar de tal data (notificação da dita conta), um ano para o fazer, caso contrário, a instância seria julgada interrompida.
Destarte, é negativa a resposta à 1ª questão em apreço, ficando prejudicada o conhecimento da 2ª questão, improcedendo as respectivas conclusões da recorrente.
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Passemos à 3ª questão, ou seja, a de saber se a interrupção da instância tem de ser declarada por despacho judicial.
Na verdade, embora a lei não refira expressamente que a interrupção tenha de ser objecto de pronúncia judicial, é entendimento geral da nossa Jurisprudência que deve haver prolação de despacho que a declare.
No artigo 285º do CPCivil, não se refere expressamente que se torna necessária a prolação de um despacho judicial para que se tenha por verificada a interrupção da instância. Mas é igualmente certo que também não se diz que se considera interrompida a instância independentemente de qualquer decisão judicial, ao contrário do que acontece relativamente à deserção da instância (na actual e na anterior redacção do artº 291ºdo CPCivil).
Nem sempre foi esse o entendimento. Na verdade, não era essa opinião do Prof. Alberto dos Reis, in “Comentário ao CPCivil”, Vol.III, já que para tal mestre, o único efeito verdadeiro e real da interrupção da instância era o de “soltar o prazo da prescrição que estava detido em consequência da citação do réu ou da caducidade que estava detido em consequências do registo de entrada da petição na secretaria”
Na anterior redacção do preceito correspondente no Código de 1939 (cfr. artº 290º) prescrevia-se na 2ª alínea que “Interrompida a instância, cessa o efeito que o nº 2 do artº 552º do CCivil assinalava à citação judicial, somando-se o tempo que decorreu até à citação com o que decorra a partir do momento da interrupção da instância e voltando a correr, nos mesmos termos, o prazo fixado para a propositura da acção”.
Tal alínea foi suprimida em 1967, por conter matéria de direito substantivo, a qual foi introduzida e está hoje regulada nos artºs 327º nº2 e 232º nº2, ambos do CCivil.
Sendo certo que se passou a entender, a partir de então, que não se podia dispensar o despacho judicial que declarasse a instância interrompida e como tal apta a desencadear os efeitos extintivos pelo simples decurso do prazo de, então, dois anos.
Também à luz do CPCivil de 1939, a deserção da instância tinha de se operar por despacho judicial, onde era feita a apreciação dos pressupostos para a sua verificação, que não passavam apenas pelo reconhecimento do decurso do tempo (seis anos e um dia desde a paragem dos autos) como da negligência da parte a que caberia o ónus de o movimentar.
Actualmente e como resulta expresso do artº 291º nº1 do CPCivil, a deserção da instância, verifica-se, independentemente, de qualquer despacho judicial.
Na nossa Jurisprudência, o que existe, de momento, são duas “correntes”, não quanto à existência ou necessidade do despacho que julga a instância interrompida, mas quanto à natureza desse despacho.
Ou seja, enquanto para uns, ele tem antes natureza declarativa, por forma a contar-se o prazo desde que se mostre perfeito o tempo de paragem necessário para a interrupção em consequência da falta de impulso das partes, designadamente do autor ou do exequente, para outros, ele assume natureza constitutiva, por forma a que só a partir dele ou da sua notificação dever correr o prazo próprio de deserção.
Na verdade, há quem entenda que a interrupção, enquanto efeito da inércia das partes não deve ficar dependente da maior ou menor celeridade da tramitação processual a que haja lugar, não nascendo ela do despacho que a declare, mas antes valendo desde que se perfez o tempo necessário de paragem do processo, sendo esta a posição dos Acs do STJ de 12.01.1999, in BMJ 483-168, de 30.01.2002 e 5.01.2004, in www.djsi.pt.
Contrariamente, outros há, como o Ac. da Rel. Évora de 17.11.1998, in CJ Ano de 1998, Tomo V, pág 236, que defendem que é a partir da apreciação feita no despacho e com a prolação deste ou da sua notificação às partes e não apenas com a verificação da situação interruptiva reportada á data do preenchimento do prazo respectivo que se projectam para o futuro os seus efeitos extintivos.
Nós entendemos como a 1ª das citadas “correntes” jurisprudenciais que o despacho que julga a instância interrompida, nos termos do artº 285º do CPCivil, visa apenas constatar, sendo esse o caso, a situação de inércia das partes enquanto causal do facto objectivo do decurso do prazo determinante da interrupção.
E perfilhando assim aquela que vem constituindo jurisprudência dominante, entende-se que o despacho relativo à interrupção da instância tem natureza declarativa, operando-se esta desde o momento em que se perfez o prazo (de um ano e um dia) de inércia das partes para tanto legalmente previsto.
Em consequência, a deserção tem lugar, sem necessidade de despacho que o declare, a partir do momento em que sobre a data da ocorrência da interrupção da instância tiver decorrido o prazo estabelecido no artº 291º do CPCivil (vide Ac. S.T.J. de 12.01.1999, in BMJ 483-167.
Para além disso, a declaração de interrupção da instância tem efeitos não só processuais (cfr. artº 291º nº 1 do CPCivil), mas também efeitos no plano substantivo (cfr. v.g. artº 332º nº 2 do CCivil).
Ora no caso dos presentes autos, o prazo para a interrupção da instância, conta-se a partir da data em que a exequente foi notificada da conta elaborada nos autos e consequentemente de que devia dar o devido impulso à execução.
Destarte, tendo sido a exequente notificada de tal conta, por correio registado de 18.03.1996, deveria ter-se apreciado da interrupção da instância, decorrido um ano e um dia sobre a data de tal notificação, ou seja, em finais de Março de 1997.
Consequentemente, a omissão de despacho judicial nesse sentido não evita o decurso do prazo e consequente interrupção/(e posterior deserção) da instância
Pelo que se responde à 3ª questão em análise de forma afirmativa e nos termos acima consignados, procedendo as respectivas conclusões da recorrente.
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No que respeita à 4ª questão em apreço neste recurso, ou seja, entendendo nós que é necessária a prolação de despacho judicial a averiguar e a declarar a instância interrompida, por força do disposto no artº 285º do CPCivil, “quid juris” se ele não for proferido.
Na verdade, como ressalta dos presentes autos, tal despacho a apreciar a inércia das partes no impulso processual da execução, e a julgar a instância executiva interrompida por força do disposto no artº 285º do CPCivil, não foi proferido.
Prescreve-se no nº 1 do artº 291ºdo CPCivil que: “Considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida a instância durante dois anos”.
Daí decorre que a instância é declarada deserta, decorridos dois anos desde a interrupção da instância.
Quanto à interrupção da instância entendendo nós, tal como a maioria da nossa Jurisprudência, que o despacho que a tenha por verificada tem função meramente declarativa, não nascendo a interrupção com esse despacho e como a instância, ou seja, relação processual, se pode extinguir por causas várias, sendo uma delas a deserção (cfr. artºs 287º al.c) e 291º, ambos do CPCivil), a deserção da instância opera, assim, por força do direito, ou “ope legis”, e não “ope judicis”, neste sentido Acs STJ de 17.06.2004 e de 15.06.2004, ambos in www.dgsi.pt.
Este despacho sendo necessário, ao ser proferido, retrotrai os seus efeitos à data em que se completou um ano e um dia sobre a data em que a exequente foi notificada da conta elaborada nos autos.
Será, pois, passados 2 anos sobre a interrupção da instância e 3 sobre a paragem do processo por negligência da parte que se extingue a instância por deserção, cfr. Lebre de Freitas, in “CPCivil, Anotado”, vol 1º, pág.520, independentemente de qualquer decisão judicial nesse sentido, cfr. Ac. do STJ. de 29.04.2003, in www.dgsi.pt.
Destarte, a interrupção da instância tem lugar, não quando é proferido o despacho (a declará-la), mas logo que termina o prazo de um ano previsto no respectivo normativo legal, cfr.artº 285º do CPCivil.
Pelo que a omissão, tal como sucedeu nos autos, do despacho a declarar interrompida a instância não evita o decurso do prazo dessa interrupção, tal é o ensinamento que se pode extrair do Ac. do STJ de 12.01.1999, acima já citado.
Donde a resposta à 4ª questão é negativa, improcedendo consequentemente as respectivas conclusões da recorrente.
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Passemos à 5ª e última questão que urge resolver neste recurso.
Efectivamente nos autos verifica-se que não foi proferido qualquer despacho a julgar a presente instância executiva interrompida, mas foi proferido despacho a julgar tal instância deserta (?).
Ora, no caso dos autos, em consequência do que acima ficou dito, a interrupção da instância, não obstante não ter sido declarada, verificou-se decorrido um ano e um dia sobre a data em que a exequente foi notificada da conta elaborada nos autos, ou seja, em finais de Março de 1997.
À interrupção da instância seguiu-se o decurso do prazo para a sua deserção. Ora, é mais que óbvio, face ao explanado, que à data do requerimento da exequente a requerer a penhora do alegado crédito do executado C………. sobre o Banco D…………, já (há muito) a presente instância se encontrava deserta.
A deserção da instância, cfr. artº 291º nº1 do CPCivil, não está dependente de despacho judicial a declará-la, antes se verifica de forma automática pelo decurso do prazo de dois anos de interrupção.
O início do prazo de deserção da instância teve lugar logo que a instância ficou interrompida, mesmo sem que tal tivesse sido declarado por despacho judicial, como sucedeu
Efectivamente, o que emerge da lei é, não que o prazo (de dois anos) da deserção começa a correr com o despacho a declarar a interrupção da instância, mas sim, com o decurso de dois anos sobre a data em que a instância ficou interrompida. E, como vimos, esta interrupção ocorreu, mesmo sem despacho a declará-la, mas com o decurso do prazo de um ano referido no artº 285º CPCivil.
Do exposto resulta que, tendo ocorrido a deserção da instância logo que decorreram dois anos sobre a data em esta ficou interrompida (finais de Março de 1997), independentemente, portanto, da existência ou não de despacho a declará-la, quando a agravante veio requerer a prossecução da execução, com o pedido de penhora do supra referido crédito, já há muito que tinha decorrido o prazo para a deserção da instância no presente processo executivo.
E decorrido esse prazo, uma vez que, como já referimos, a deserção da instância não está dependente de despacho judicial a declará-la, verificada estava a deserção da instância executiva, ocorrida em finais de Março de 1999.
Pelo que se a simples interrupção da instância não obstava a que a exequente apresentasse o aludido requerimento, já o mesmo não pode entender-se estando a instância extinta por deserção, cfr. artºs 291º e 287º al. c), ambos do CPCivil.
Do exposto resulta, portanto, que, tendo havido extinção da instância executiva, por deserção, em finais de Março de 1999, sendo a deserção é uma daquelas “causa anómalas ou anormais de extinção da execução atinentes a vicissitudes que ocorrem na própria instância executiva ou nela se reflectem”, como afirma J. P. Remédio Marques, in “Curso de Processo Executivo Comum à face do Código Revisto”, SPB Editores, 1998, pág. 381, e no mesmo sentido, Castro Mendes, in “Acção Executiva”, da AAFDL, pág. 209, não podia legitimamente, a exequente vir impulsionar os autos, indicando bens à penhora no processo em que tal deserção teve lugar.
Pelo que foi um acto inútil, e não permitido por lei, o aceitar-se aquele requerimento da exequente e fazer prosseguir os autos até ao momento em que a eles se pôs termo pela prolação do despacho recorrido.
Assim, responde-se à 5ª e última questão em apreço, que não obstante não ter sido proferido nos autos despacho a declarar a instância interrompida, tal interrupção verificou-se e decorridos dois anos sobre a sua ocorrência, a presente instância executiva ficou deserta, o que terá ocorrido em finais de Março de 1999.

IV – Por tudo o que fica exposto, nega-se provimento ao recurso em apreço.
Custas pela recorrente.

Porto, 12 de Dezembro de 2006
Anabela Dias da Silva
Albino de Lemos Jorge
António Luís Caldas Antas de Barros