Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0345805
Nº Convencional: JTRP00036359
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: EXECUÇÃO
MULTA
COMPETÊNCIA
Nº do Documento: RP200402040345805
Data do Acordão: 02/04/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: .
Sumário: A execução por multa aplicada em execução por custas é da competência do tribunal que proferiu a decisão a executar.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
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I- Relatório.
No Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis, o Ministério Público, através de requerimento dirigido aos Juízos de competência especializada criminal, instaurou execução tendente a obter o pagamento coercivo pela executada Rogério..., Lda, com sede em ..., ..., Vale de Cambra, de multa a que fora condenada no âmbito de um outro processo de execução por custas que correu termos por um dos mesmos Juízos especializados de tal Tribunal (rectius Execução por Custas nº .../99.3 GDOAZ-A, do 2º Juízo Criminal).
Tendo os autos cabido em distribuição ao 1º desses Juízos, a Sr.a Juiz declarou esse Juízo incompetente, considerando (?) competente ou um dos Juízos de competência especializada cível ou o dito 2º Juízo de competência especializada criminal, em consequência do que absolveu a executada da instância.
O teor do despacho adrede proferido, é o seguinte:
“Veio o Ministério Público instaurar execução por multa contra Rogério..., Lda com base numa decisão proferida no âmbito de uma execução por custas n° .../99.3GDOAZ-A, que correu termos no 2° Juízo Criminal desta comarca, que o condenou em 1/2 Uc de multa ao abrigo do disposto no artigo 519° do CPC execução que instruiu com certidão da decisão e da liquidação e dirigiu aos juízos criminais.
Ora, antes de mais, importa, desde já, referir que dada a natureza de multa processual - a intervenientes processuais - que a sanção ora em apreço assume, logo ficará arredada a aplicação da disciplina própria das multas penais, cuja execução seguiria os seus termos por apenso ao processo em que teve lugar o aviso de pagamento (art. 117° do CCJ). Por outro lado, no caso em apreço, a multa é executada com base na certidão da liquidação que, para o efeito, foi entregue pela secção ao Ministério Público, a qual correrá autonomamente em relação ao processo donde emanou a certidão.
Também, por sua vez, a seguir a corrente da jurisprudência (que também não sufragamos) de que é competente para a presente execução o tribunal no qual foi proferida a decisão da condenação da multa (nos termos do disposto no artigo 100° da LOTJ), no caso vertente, a decisão que aplicou a multa em causa, foi proferida pela Exa Juiz titular do 2° Juízo Criminal desta comarca, no âmbito de um processo de execução que ali correu termos e, nessa medida, sempre se diria ser este o Juízo competente para a presente execução.
Em conformidade com o exposto, nos termos das normas conjugadas previstas nos artigos 117° do C.C.J ., 66°, 67° e 94° a 99° e 100°, a contrário da Lei Orgânica dos tribunais, 101°, 288, al. a) e 494°, al. a), todos do Código de Processo civil, julgo este Juízo criminal materialmente incompetente para a presente execução e, consequentemente, absolvo o executado da instância executiva. Notifique.”
Dessa decisão interpôs o Ministério Público recurso, cuja fundamentação rematou com as conclusões seguintes:
“ 1. Da análise do douto despacho recorrido resulta que, certamente por lapso, a Mmª Juiz a quo, apesar de concluir pela incompetência material do 1º Juízo criminal para a presente execução e, consequentemente, absolver o executado da instância executiva, não esclarece expressamente em nenhum ponto do despacho recorrido qual o tribunal que considera concretamente competente para tal, sendo que, no entanto, do teor global dos fundamentos expendidos e da análise das normas legais invocadas, resulta implícito que a Mmª Juiz considera que são competentes os Juízos de Competência Especializada Cível.
2. Salvo o devido respeito, não assiste razão à Mmª Juiz a quo, uma vez que a presente execução visa obter o pagamento coercivo de uma multa processual aplicada no âmbito de pela Mmª Juiz do 2° Juízo Criminal deste Tribunal, nos termos do art. 519° do C. Processo Civil.
3. Nos termos dos arts 118°, nº2 do C. de Custas Judiciais, a presente execução por multa deve ser instaurada com base em certidão de liquidação e é autónoma ao processo onde foi aplicada a multa - neste ponto estamos em concordância com a Mmª Juiz a quo.
4. Em face da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, entendemos que são os Juízos de Competência Especializada Criminal – e concretamente o 1 ° Juízo Criminal de Oliveira de Azeméis, porquanto o requerimento inicial deverá, após autuação e registo ser sujeito a distribuição - -materialmente competentes para a presente execução;
5. Com efeito, a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei n° 3/99, de 13.01, alterada pela Lei n° 101/99. de 26.07), no art. 103° estatui que '(...)Os tribunais de competência especializada e de competência específica são competentes para executar as respectivas decisões (...)".
6. Deste preceito resulta que os Juízos de competência especializada criminal têm competência para executar as suas decisões, que, como bem refere o acórdão da R. P. de 21 de Maio de 1997 (com as devidas adaptações atenta a reforme legislativa entretanto operada), "(....) todas elas, pois a lei não restringe nem limita a competência- para aquela execução a certas decisões ou a certo tipo de decisões. Não pode pretender-se que a competência executiva naqueles tribunais- de competência especializada- seja limitada às decisões proferidas «no âmbito da sua competência especializada», isto é, segundo cremos, às decisões proferidas no puro domínio da sua função em jurisdição criminal (...) Tal competência (...) não está legalmente atribuída a qualquer ou quaisquer outros tribunais(...)".
Terminou pedindo que, na procedência do recurso, o despacho recorrido seja revogado e substituído por outro que determine o normal prosseguimento dos autos.
A Mmª Juiz recorrida lavrou despacho de sustentação, nos termos do artigo 744º do Código de Processo Civil, e determinou a remessa dos autos a este Tribunal da Relação.
Aqui, o Ex.mo Procurador Geral-Adjunto emitiu parecer aderindo à procedência do recurso com base nas razões já expendidas na 1ª instância pelo Ministério Público.
Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II- Fundamentação.
Resulta do certificado nos autos que, no âmbito de uma execução por custas (referida nº .../99.3 GDOAZ, do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis), a ora executada, na qualidade de entidade de entidade patronal do aí executado foi notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 519º do Código de Processo Civil. Por violação do dever de colaboração processual aí cominado, foi-lhe imposta uma multa de ½ Uc. Apesar de liquidada, não foi ela paga voluntariamente, no prazo legal, donde que tenha dirigido o Ministério Público requerimento executivo aos Juízos Criminais tendente ao recebimento pelo Estado do quantitativo assim em dívida. Distribuído tal requerimento, foi ele averbado ao 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Oliveira de Azeméis. Lavrou, então, a Mmª Juiz o despacho ora recorrido.
Do exposto resulta que a questão decidenda é a de apurar se o 1º Juízo Criminal é ou não competente para o prosseguimento da execução instaurada.
É fora de dúvida que a quantia exequenda nestes autos se traduz numa multa, não paga, e aplicada a um interveniente acidental (a ora executada) da dita execução por custas.
Assim sendo, os termos da competente acção executiva efectuam-se com base em certidão da liquidação, que a secção entregará ao Ministério Público, autonomamente e não por apenso aos autos em que teve lugar a notificação para pagamento, como decorre do disposto nos artigos 118º e 117º, ambos nº 1, do Código das Custas Judiciais.
Havendo este acordo nos autos, inicia-se a controvérsia quando cumpre determinar se devia ou não o requerimento executivo ser distribuído e onde: afirmativamente, e nos ditos Juízos criminais, responde o Ministério Público; nunca ao 1º Juízo criminal em causa e quiçá, até, aos juízos de competência específica cíveis, contrapõe a Mmª Juiz recorrida.
A resposta inequívoca ao litígio assim colocado decorre do estatuído no artigo 103º da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, em cujos termos os tribunais de competência específica, com são os Juízos criminais, são competentes para executar as respectivas decisões. Seja, nos autos tendo a multa sido aplicada num Juízo criminal, deve ser no tribunal que proferiu a condenação da executada que se deve lograr obter a execução da decisão respectiva.
Isto em conformidade com o entendimento de que a dita competência executiva se há de referir, sem limitações, a todas as decisões proferidas nestas jurisdições específicas, que não tão somente às materialmente referentes a cada uma delas, sob pena de existirem decisões não exequíveis.
Mas, perante que Juízo concreto, então?
A resposta encontra-se vertida num recente Acórdão desta Relação que em situação ligeiramente distinta nos seus contornos fácticos, mas cuja resolução jurídica reclama o mesmo artigo 103º, concluiu dever ser o Juízo que aplicou a decisão que se pretende exequir, no caso o 2º Juízo Criminal de Oliveira de Azeméis, e independentemente de distribuição (cfr. Acórdão de 11 de Junho de 2003, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXVIII, Tomo III, página 223).
Justifica-se este regime pela conexão, que não processual arredada pelo apontado artigo 117º, nº 1 do CCJ, estabelecida entre tribunal decisor e tribunal executor da decisão reafirmada pelo normativo vindo de citar.
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III- Decisão.
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, embora com fundamentos distintos com os nela invocados.
Sem tributação.
Notifique.
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Porto, 4 de Fevereiro de 2004
Francisco José Brízida Martins
António Gama Ferreira Gomes
Rui Manuel de Brito Torres Vouga