Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00035814 | ||
Relator: | OLIVEIRA VASCONCELOS | ||
Descritores: | ALIMENTOS | ||
Nº do Documento: | RP200404220432181 | ||
Data do Acordão: | 04/22/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO. | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | Apesar de desconhecido o paradeiro do devedor de alimentos e a sua situação económica, deve ser fixado judicialmente o montante de alimentos a atribuir ao alimentando. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Em 02.11.15, no Tribunal de família e Menores do ............., B............, residente na Rua ............., ................, ............, intentou contra C.............., com última residência conhecida na Rua ............, .........., .............., ............, a presente acção para regulação do poder paternal do filho menor da requerente e requerido, D.............. Teve lugar a conferência a que alude o art. 175° da O.T.M., não se tendo obtido acordo. Foi ordenada a realização de inquérito acerca da situação sócio económica da requerente e do menor, o qual se encontra a fls. 78 a 82 dos autos, não se tendo conseguido tal inquérito relativamente ao requerido, por se desconhecer o seu paradeiro. Em 04.01.21, foi proferida sentença em que se determinou que o menor ficasse à guarda da mãe, se regulou o regime de visitas do pai e não se fixou alimentos a prestar por este. Inconformada, a requerente deduziu a presente apelação, apresentando as respectivas alegações e conclusões. O Ministério Público contra alegou, pugnando pela alteração da sentença recorrida nos termos defendidos pela requerente. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. As questões Tendo em conta que - o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil; - nos recursos se apreciam questões e não razões; - os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido - a única questão proposta para resolução consiste em saber se deviam ser fixados alimentos a pagar pelo pai do menor e qual o seu montante. Os factos São os seguintes os factos que foram dados como provados: - A requerente e requerido não contraíram entre si casamento. - O menor é filho da requerente e requerido, tendo nascido em 20.03.1998, e sempre residiu com a sua mãe. - A requerente e requerido mantiveram entre si uma relação afectiva durante cerca de 5 anos, nunca tendo vivido juntos. - A requerente, na companhia do menor e de mais três filhos seus, também menores, reside em casa arrendada, num andar de tipo social, T3, dotada de equipamento básicos, dispondo o menor de cama própria no quarto do irmão. - A requerente exerce a profissão de auxiliar , num lar de idosos "Centro Social Paroquial de ..............", auferindo o salário mensal líquido de 350 Euros. - A requerente aufere ainda a título de Rendimento Mínimo Garantido a quantia mensal de cerca de 125,60 Euros e cerca de 130 Euros por mês a título de Prestação familiar dos menores e cerca de 100 Euros de prestação alimentar do menor Nuno. - A título de despesas, a requerida suporta cerca de 12,77 Euros mensais em renda de casa, água e electricidade cerca de 55 Euros/mês e cerca de 75 Euros em transportes (Passes Sociais ). - Suporta igualmente a requerente as despesas do agregado em alimentação, vestuário e saúde. - A requerente recebe apoio económico da sua mãe. - O menor D............ frequenta o Infantário do Centro Social de ............., desde bebé, encontrando-se bem integrado. - O menor apresenta-se bem cuidado. - A requerente é mãe preocupada em zelar e cuidar do menor, existindo entre ambos uma forte relação afectiva. - O requerido desde finais de 2002 jamais visitou o menor ou estabeleceu qualquer contacto para o efeito. - O requerido nunca contribuiu com alimentos para o menor. Os factos, o direito e o recurso Vejamos, então, como resolver a questão. Na sentença recorrida, apesar de se reconhecer que o menor necessitava de alimentos por parte do requerido, entendeu-se não se fixar o seu montante por se desconhecer a sua situação económica, uma vez que se desconhece o seu paradeiro. A apelante, invocando o regime estabelecido na Lei 75/98, de 19.11, entende que essa fixação é obrigatória, independentemente da possibilidade efectiva da prestação pelo devedor, tendo por base o salário mínimo nacional. Cremos que tem razão. Conforme se retira do preâmbulo do Decreto-lei 164/99, de 13.05, que regulamentou a garantia de alimentos devidos a menores prevista na Lei 75/98, de 19.11, do direito das crianças à protecção, como função da sociedade e do Estado, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, estabelecido no art.69º da Constituição, impondo ao Estado o dever de assegurar a garantia da dignidade da criança, resulta o direito a alimentos, pressuposto necessário dos demais e decorrência, ele mesmo, do direito à vida. A evolução das condições socio-económicas, as mudanças de índole cultural, e a alteração dos padrões de comportamento de trabalho, tem determinado mutações profundas a nível das estruturas familiares e um enfraquecimento no cumprimento dos deveres inerentes ao poder paternal, nomeadamente no que se refere à prestação de alimentos. De entre os factores que relevam para o não cumprimento da obrigação de alimentos, assume frequência significativa a ausência do devedor. Conclui-se, pois, que uma das razões pelas quais foi instituído o regime de o Estado, através do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores, assegurar o pagamento das prestações de alimentos atribuídas a menores, foi precisamente o facto de o devedor de alimentos estar ausente e, por isso, os não pagar. Ora se é assim em relação à prestação de alimentos a assumir por aquele Fundo, não se compreenderia que a mesma ausência fosse motivo para não se fixar judicialmente alimentos. Com o consequente impedimento de intervenção daquele Fundo, uma vez que ela depende de o devedor ser judicialmente obrigado a prestar alimentos – cfr. art.1º da Lei 75/98, de 19.11. Ou seja, a protecção social devida a menores pelas razões acima aduzidas ficaria dependente de se conhecer o paradeiro do devedor e a sua situação económica, o que manifestamente era contrário à filosofia que esteve na base do regime da Lei 75/98. Além de que patentemente violaria o principio da igualdade perante a lei de todos os cidadãos estabelecido no art.13º da Constituição, pois dois menores em idêntica situação de carência de alimentos e protecção social seriam tratados de forma diferente consoante se averiguasse ou não a situação do devedor de alimentos. Sendo até do conhecimento geral que quando se desconhece o paradeiro dele, em regra isso representa uma situação de abandono do menor por parte do devedor, o que necessariamente tem que levar a uma maior protecção social e não a uma ausência dela. Há, pois, que fixar o montante de alimentos que o requerido deve prestar ao menor, tendo em conta que os mesmos compreendem tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação do menor – art.2003º do Código Civil. E que os mesmos devem ser proporcionados aos meios do alimentante e às necessidades do alimentando, no momento da prestação – art.2004º, n.º1, do mesmo diploma. Quanto aos meios do alimentante, há que presumir que, pelo menos, o mesmo auferiria o salário mínimo nacional, salário este que, aliás, também é pressuposto e requisito para a intervenção do Fundo acima referido – cfr. art.3º, n.º1, al. b) do citado Decreto-lei 64/99. Quanto às necessidades do menor, elas estão patentes na matéria de facto acima transcrita. Tendo em conta todos estes factores, entendemos ser de fixar em 100 € o montante da prestação mensal a pagar pelo requerido C............ ao menor seu filho. Alimentos estes que são devidos desde a data da proposição da presente acção. A decisão Nesta conformidade, acorda-se em julgar procedente a presente apelação e assim, em fixar em 100 € (cem euros) o montante dos alimentos que o requerido deve pagar mensalmente ao menor e desde a propositura desta acção, pagamento este a efectuar no primeiro dia do mês a que disser respeito. Custas pelo apelado . Porto, 22 de Abril de 2004 Fernando Manuel de Oliveira Vasconcelos José Viriato Rodrigues Bernardo João Luís Marques Bernardo |