Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0614833
Nº Convencional: JTRP00039602
Relator: MANUEL BRAZ
Descritores: CRIME
HOMICÍDIO
MEIO INSIDIOSO
FRIEZA DE ÂNIMO
Nº do Documento: RP200610180614833
Data do Acordão: 10/18/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Indicações Eventuais: LIVRO 459 - FLS 143.
Área Temática: .
Sumário: I - Nos termos do n.º 1 do art. 132º CP, o crime de homicídio é qualificado “se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade”, enumerando-se no n.º 2 as circunstâncias susceptíveis de revelar essa especial censurabilidade ou perversidade, prevendo-se, além de outras, a utilização de meio insidioso (al. h)) e a frieza de ânimo e reflexão sobre os meios empregados (al. i)).
II - Não se enquadra em qualquer das referidas circunstâncias qualificativas, a conduta do arguido que, olhando pela janela de um restaurante, vê a sua companheira e a vítima sentados a uma mesa a jantarem, entra no restaurante munido de uma caçadeira, aproxima-se da mesa onde aqueles se encontravam, profere em voz alta a frase “sou corno há 15 anos, mas isso hoje vai acabar” e disparou um tiro, a menos de 2 metros de distância, visando e atingindo a zona toráxica da vítima, causando-lhe dessa forma a morte.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

No .º juízo do Tribunal Judicial da comarca de Estarreja, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foi o arguido B………. submetido a julgamento e condenado, pela prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelo art. 132º, nºs 1 e 2, alíneas h) e i), do CP, na pena de 17 anos de prisão.

Do acórdão que assim decidiu interpôs recurso o arguido, sustentando, em síntese, na sua motivação:
-Na audiência de julgamento foi permitido ao advogado subscritor do pedido de indemnização civil fazer perguntas às testemunhas, o que, por não ter havido constituição de assistente, é ilegal e gerador de nulidade.
-É errada a decisão proferida sobre matéria de facto na parte em que considera assente que, desde a data em que o arguido teve conhecimento da relação amorosa da sua companheira com a vítima, passou a importuná-los e a observar os respectivos movimentos e hábitos;
-Como errada é na parte em que não teve como provado que
-o arguido, dirigindo-se à mesa onde jantava a vítima e porque ela estava de costas para si, lhe tocou com a extremidade do cano da espingarda de caça na cabeça com o intuito de chamar a sua atenção e fazê-lo voltar para si;
-a C………. se levantou de imediato da mesa;
-a vítima, ao sentir o toque na cabeça, se voltou para o arguido e se levantou;
-a C………. se levantou e se interpôs entre o arguido e a vítima;
-o arguido afastou a C………. com o braço esquerdo e, ao segurar a espingarda com a mão direita, disparou sem apontar;
-o arguido no dia 14 de Janeiro de 2005 disse à sua filha D…….. que se separara definitivamente da C……….;
-no dia seguinte ia com a C………. almoçar ao E……….;
-meteu na bagageira do automóvel a espingarda de caça e demais objectos destinados à caça que se encontravam na cave em local de difícil acesso;
-antes de entrar no restaurante onde se deu o homicídio, pelas 20 horas 56 minutos e 6 segundos, o arguido telefonou à vítima para o telefone 93…….;
-e, pelas 21 horas 2 minutos e 20 segundos, telefonou ao seu amigo F………. para o telefone 91…….;
-o arguido tem experiência de situações traumáticas;
-o arguido tem pesadelos recorrentes, com cenas traumáticas específicas e "flash backs diurnos";
-o arguido apresenta hiperactividade neurovegetativa, com aumento persistente da irritabilidade, do nervosismo, reacções de alarme e perturbações cardiovasculares;
-o arguido evita de forma persistente os estímulos que desencadeiam memórias traumáticas (fotos, filmes, notícias, conversas);
-o arguido sofre de perturbação pós-traumática do stress (classificação internacional das doenças 10-F.43.1) com origem na exposição ao combate e de curso crónico;
-o arguido apresenta uma perturbação obsessiva da personalidade, com traços paranóides obsessivos e narcisísticos (classificação internacional das doenças 10-F-60.5);
-a deformidade da mão direita apresentada pelo arguido dificulta todas as pegas e actos de preensão que exijam a normal mobilidade do terceiro e do quinto dedo da mão direita;
-manejar uma espingarda caçadeira com precisão para um destro exige que a sua mão direita não apresente as limitações referidas supra e de que o arguido é portador;
-o arguido tem horror à mentira;
-o arguido está profundamente arrependido daquilo que fez.
-Deviam ainda ser dados como provados outros factos não alegados na contestação, mas que resultaram da discussão da causa.
-O homicídio nunca poderá ser considerado qualificado.
-O crime cometido é o do homicídio simples do art. 131º.
-E apenas com dolo eventual.
-A pena deve ser reduzida.

O recurso foi admitido.
O MP em ambas as instâncias pronunciou-se no sentido do não provimento do recurso.
Cumprido o art. 417º, nº 2, do CPP, o arguido nada veio dizer.
Colhidos os vistos e realizada a audiência, cumpre decidir.

Foram dados como provados os seguintes factos (transcrição):
O arguido e C………. viviam um com o outro, como se de marido e mulher se tratasse, desde 1979, tendo desta relação nascido uma filha, M………. .
Em data não apurada do ano de 2004, o arguido teve conhecimento do relacionamento amoroso da referida C………. com G………. através daquela e, desde essa altura, passou a importuná-los e a observar os respectivos movimentos e hábitos.
Soube igualmente que o mencionado G………. era dono de um apartamento, sito na Rua ………., nº ., ………., na ………., comarca de Estarreja e que ali costumava dirigir-se na companhia da identificada C………..
No dia 14 de Janeiro de 2005, sexta-feira, suspeitando que a referida C………. se deslocara à ………. a fim de aí se encontrar com o mencionado G………., o arguido resolveu dirigir-se àquela localidade no ligeiro de passageiros, marca SAAB de cor ………., com a matrícula CN-..-.., sua pertença.
Antes de sair do Porto, o arguido passou pela sua residência, a fim de se munir da sua espingarda de caça de calibre 12, marca “H……….”, com o nº ……, de dois canos lisos e com o comprimento de 70,5 cm, de percussão central e culatra fixa, manifestada e registada em seu nome, bem como de uma cartucheira de caça, vários cartuchos de calibre 12, um punhal com o comprimento total de 25,5 cm, sendo 15,5 cm de lâmina, com punho em metal e osso, com os dizeres “………” e um canivete de cor cinzenta, com o comprimento total de 21 cm, sendo 10 cm de lâmina, com soqueira no punho, de cor preta.
Chegado à ………., passou junto da habitação de G………. , em cujo exterior viu a viatura pertença da citada C………. .
Resolveu então ir estacionar o mencionado ligeiro de passageiros, marca SAAB, com a matrícula CN-..-.., a cerca de 200 metros daquele local e, ao sair do seu interior, cerca das 20h00, constatou que a C………. e o G………. saíam da habitação deste, fazendo-se transportar no veículo desta.
O arguido apercebeu-se que os mesmos iam jantar na companhia um do outro, pelo que entrou de novo no seu ligeiro de passageiros e, após alguns momentos, percorreu várias ruas com o intuito de localizar aqueles, passando junto de três restaurantes que conhecia na ………. .
Ao chegar ao último desses restaurantes, denominado “I……….”, sito no ………., naquela localidade da ………., pertencente à sociedade “J………., Lda.”, o arguido viu pela janela de tal estabelecimento que a C………. e o G………. se encontravam sentados a uma mesa do respectivo salão de refeições.
Após constatar que aqueles ali se encontravam e sem que os mesmos se tivessem apercebido da sua presença naquele local, o arguido imobilizou o ligeiro de passageiros em que se fazia transportar no mencionado ………., em frente ao mencionado estabelecimento.
O arguido saiu do seu veículo, pegou então na referida espingarda de caça e carregou-a com dois cartuchos, de calibre 12.
Pegou ainda em quatro cartuchos do mesmo calibre, de 70 mm, de cor vermelha e de chumbo 6, e colocou-os no bolso esquerdo do colete tipo Kispo, que trajava na altura.
Já com a referida arma municiada e munido dos mencionados cartuchos, o arguido dirigiu-se para o referido restaurante “I……….”, cujo salão de refeições se encontrava repleto de clientes, a jantar.
Após entrar no referido estabelecimento, cerca das 21h00, levando a mencionada espingarda de caça ao alto e encostada ao corpo, o arguido percorreu em passo rápido o hall de entrada em direcção ao salão de refeições, desceu os degraus de acesso a este salão e, de imediato, abeirou-se da mesa onde continuavam sentados e a jantar a referida C………. e G………., situada à esquerda de quem entra no mencionado salão, aquela de frente e este de costas para a zona de acesso a tal salão.
Uma vez ali, dirigindo-se a estes, disse de viva voz "Sou corno há 15 anos, mas hoje isso vai acabar!".
O referido G………., surpreso com a presença do arguido, levantou-se de imediato da mesa e virou-se, ficando de frente para este, ao passo que a C………. gritou "B………. está quieto... não faças isso!".
Encontrando-se o G………. já levantado e de frente para si, e sem que este tivesse esboçado qualquer gesto, nem sequer o de afastar de si o cano da arma ou sequer procurar agarrá-lo, o arguido de imediato lhe apontou a referida arma de fogo à região torácica e, a menos de dois metros de distância, disparou um tiro sobre o mesmo, atingindo-a naquela zona corporal.
O referido G………. ainda se manteve em pé por breves instantes, levando uma das mãos à zona atingida e, após exclamar "Olha, matou-me!", caiu no pavimento e ali ficou sem mais se mover.
Nos instantes seguintes, a testemunha L………., empregado de mesa do referido estabelecimento, instintivamente, com receio de que o arguido voltasse a disparar, dirigiu-se ao mesmo pelas costas e agarrou a mencionada espingarda de caça, levantando o respectivo cano na direcção do tecto.
Nos primeiros momentos, o arguido resistiu, mas acabou por largar a referida arma de fogo e por ser manietado, com a ajuda de clientes que ali se encontravam.
Passado algum tempo, ainda no local, dirigindo-se às diversas pessoas que ali se encontravam, o arguido disse ainda "Fiz o que tinha de ser feito! Gostava de saber se algum dos cavalheiros aqui presentes, nas mesmas circunstâncias, não faria o mesmo?".
Em consequência directa e necessária do aludido disparo, o malogrado G………. sofreu ferida perfuro-contusa no tórax, com orifício elíptico na transição da região do mamilo esquerdo, apresentando em seu redor e no seu interior numerosos grãos de chumbo, hemotórax, fracturas esquirolosas, com presença de vários chumbos e numerosos fragmentos, dos arcos anteriores da 4ª, 5ª, 6ª e 7ª costelas esquerdas, rotura do saco pericárdico e perfuração do pericárdio, observando-se uma bucha de plástico aberta no seu interior, laceração e contusão cardíaca (esfacelo da face anterior do ventrículo esquerdo), laceração e contusão pulmonar (focos de contusão nos dois lobos do pulmão esquerdo com a presença de muitos bagos de chumbo).
A direcção do trajecto seguido pelo projéctil foi da frente para trás e ligeiramente da direita para a esquerda.
Tais lesões traumáticas torácicas, produzidas por projéctil de arma de fogo de caça, com um orifício de entrada na região do mamilo esquerdo, determinaram, também directa e necessariamente, a morte quase imediata de G………. .
Ao disparar contra aquele, o arguido sabia que utilizava um instrumento de natureza perfurante – arma de fogo de caça – idóneo a causar morte, e que a zona do corpo que procurou atingir alojava órgão vitais.
Ao fazê-lo, o arguido quis, como conseguiu, tirar a vida a G………., utilizando, para o efeito, um instrumento adequado a provocá-la e apontando-o, à distância mencionada, para aquela zona corporal, onde sabia estarem alojados órgãos essenciais à vida.
Para tal, muniu-se antecipadamente de uma arma de fogo, escolheu o momento, lugar e modo de levar a cabo os seus intentos, apanhando de surpresa a vítima, para logo de seguida, após lhe dirigir curtas palavras, disparar contra ela à distância mencionada, tirando-lhe a possibilidade de ocultação ou defesa e sem qualquer provocação por parte desta.
O arguido é titular de carta de caçador com o nº ……., emitida em 08.03.1996, bem como de licença trienal para uso e porte de arma de caça, emitida em 06.05.2003.
O arguido é guia turístico de profissão.
Em todas as circunstâncias supra descritas, o arguido agiu de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
A citada C………., instada pelo arguido, revelou todo o seu envolvimento com a vítima, dizendo-lhe quem ele era, onde se encontravam e até o telemóvel do mesmo, e afirmando-lhe, aquando destas confissões, que ia acabar tudo com o referido senhor.
O arguido e a citada C………. continuaram a sua relação entre ambos.
Em data não apurada de 2004 o arguido suspeitou que a C………. ainda andava com o tal senhor.
E não conseguindo determinar o paradeiro da C………., foi à ………. e colocou-se em frente do nº . da Rua ………. .
Não viu a C……….. e apareceu a GNR.
O arguido regressou ao Porto.
O arguido foi "comando" e "ranger", tendo frequentado os respectivos cursos, sabendo utilizar uma arma.
O arguido é um homem qualificado na arte da guerra e do combate pela sobrevivência, e foi sempre assim considerado pelos seus superiores.
Esteve na guerra em Angola e Moçambique durante quatro anos e esteve exposto a situações de combate.
Sofre de rigidez dos terceiro e quinto dedos da mão direita.
A espingarda caçadeira empunhada pelo arguido pesa cerca de 3,200 Kg.
O arguido não tem antecedentes criminais.
Esteve no teatro de guerra, tendo os seus serviços sido louvados.
Todos quantos conviveram com ele têm dele uma imagem positiva de seriedade, considerando-o um homem honrado.
O arguido é pessoa sem meios de fortuna, sempre tendo vivido do seu trabalho, como sucedia no momento em que ocorreram os factos relatados.

Foram dados como não provados outros factos, designadamente que (transcrição)
-a identificada C………. conheceu G………. na ………. de ………., no ano de 2001 ou 2002 e, desde essa altura, passou a ter contactos com este, vindo posteriormente a iniciar uma relação amorosa com o mesmo;
-o arguido, depois de se dirigir à mesa onde se encontrava a vítima, disse "vamos lá para fora, que quero falar convosco lá fora" e "filho da puta, vou matar-te a ti e a essa puta!", ao mesmo tempo que, com a extremidade do cano da mencionada espingarda de caça, bateu na cabeça do referido G………., sentado de costas para si;
-a C………. se levantou de imediato da mesa;
-a vítima ainda disse "C1………., foi no coração... ele matou-me!";
-estava o referido L………. a agarrar o arguido, quando este ainda dirigiu algumas palavras para o malogrado G………. que acabara de atingir e para a C………., dizendo “eu não sou corno, isto é uma questão de honra!”;
-no dia 27 de Dezembro de 2004 o arguido suspeitou que a C………. ainda andava com o tal senhor;
-o arguido deu conta à C………. da sua suspeita, tendo-lhe esta desmentido completamente que mantivesse ainda tal relação;
-como entretanto as relações entre ambos pioraram e os desaparecimentos misteriosos da C………. se tornaram desestabilizadores para o arguido, este, no dia 14 de Janeiro de 2005, disse à C………. que sabia que ela ainda andava com o G………. e por isso era melhor separarem-se definitivamente, pois o arguido não estava disposto viver com uma mulher que simultaneamente andava com outro homem;
-o arguido tomou a decisão de se separar da C………. e disse-o às suas filhas, D………. e M………. e começou a arrumar as suas coisas para sair de casa definitivamente;
-a C………., porém, insinuou que não queria separar-se, que gostava do arguido e que podiam continuar a viver juntos;
-ofereceu-se mesmo para o levar à aula de História de Arte, o que o arguido, intrigado mas esperançado, aceitou, permitindo que aquela o levasse à N………. em Matosinhos cerca das 14 horas, onde se encontraria com os restantes alunos da aula;
-durante o percurso, a C………. tentou a reaproximação ao arguido, sugerindo até que contactassem um conselheiro matrimonial;
-o arguido ficou esperançado na manutenção da relação com a C………., uma vez que tendo ele manifestado a intenção de se retirar de vez da relação, ela insistia em continuar;
-recebeu entretanto um telefonema da sua filha D………., a dizer-lhe que não poderia ir jantar com ele e como no dia seguinte ia com a C………. almoçar ao E………. (Viana do Castelo), pensou que o melhor era aproveitar a vontade de aproximação manifestada pela C………., convidá-la para jantar e irem ainda nessa noite dormir ao E……….;
-era sua intenção aproveitar a ida ao E………. para ir caçar tordos com os amigos;
-quando as suas companheiras da aula de História de Arte o deixaram em casa cerca das 17 horas, resolveu meter na bagageira do automóvel a espingarda e demais objectos destinados à caça, que se encontravam na cave e em local de difícil acesso;
-depois da aula e após as suas duas colegas da aula de História de Arte o terem levado a casa e de ter colocado no automóvel os utensílios destinados à caça, falou com a C………. pelo telefone, tendo-lhe esta dito que não iria jantar a casa, porque iria ajudar o seu pai a instalar um aparelho de fax no atelier, jantar com os pais e depois tencionava ir ao cinema;
-decidiu então ir ter com a C………., que pensava encontrar, ou no atelier, ou em casa dos pais dela;
-no atelier do pai da C………., não encontrou ninguém;
-passou depois por casa do pai da C……… e também não a viu lá, nem ao seu automóvel e, passando em seguida pelo restaurante onde a C………. costumava jantar com os pais, também não encontrou ninguém;
-se desenhou então no espírito do arguido que a C…….. o estava a enganar mais uma vez;
-a dúvida o torturou;
-o arguido se dirigiu ao restaurante, para obrigar a citada C………. e a vítima a sair de lá, e na rua fazer uma grande escandaleira e denunciar a podridão moral da C………. e do seu amante;
-em situação de grande confusão e desespero, pegou no telefone e telefonou à vítima, dizendo-lhe que estava em frente do restaurante a vê-lo a jantar com a sua mulher e que queria falar com eles fora do restaurante;
-a vítima atendeu o telefone, passou-o à C………. dizendo "É ele", comentaram qualquer coisa e desligaram o telefone, continuando a jantar como se não se tivesse passado nada;
-o arguido ficou perturbadíssimo, pensou que lhe ia dar um ataque cardíaco;
-foi então que se lembrou que tinha a caçadeira na bagageira;
-durante este trajecto colocou duas pastilhas de "Nitrominte" debaixo da língua;
-o G………., ao sentir o toque na cabeça, se voltou mais para o arguido e disse "queres ver este, queres ver este?";
-a C………. levantou-se e interpôs-se entre o arguido e o seu amante;
-nesse momento, a vítima levantou-se e o arguido afastou a C………. com o braço esquerdo e, ao segurar a espingarda apenas com a mão direita, disparou sem apontar, atingindo a vítima mortalmente;
-o arguido, nos momentos que antecederam o crime, estava muito perturbado e emocionalmente descontrolado;
-quando o arguido viu a C………. e o G………. juntos, lhes telefonou e eles não ligaram nenhuma, sentiu-se a pessoa mais desprezível do mundo e ficou dominado por violentíssima emoção que o descontrolou e levou a fazer o que fez, não conseguindo ainda hoje recordar-se inteiramente de tudo o que terá acontecido, mas sabe que conscientemente nunca pensou em matar nenhum deles;
-o arguido tem experiência de situações traumáticas;
-o arguido tem pesadelos recorrentes, com cenas traumáticas específicas e "flash backs diurnos";
-o arguido apresenta hiperactividade neurovegetativa, com aumento persistente da irritabilidade, do nervosismo, reacções de alarme e perturbações cardiovasculares;
-o arguido evita de forma persistente os estímulos que desencadeiam memórias traumáticas (fotos, filmes, notícias, conversas);
-o arguido sofre de perturbação pós-traumática do stress (classificação internacional das doenças 10-F.43.1) com origem na exposição ao combate e de curso crónico;
-o arguido apresenta uma perturbação obsessiva da personalidade, com traços paranóides obsessivos e narcisísticos (classificação internacional das doenças 10-F-60.5);
-a deformidade da mão direita apresentada pelo arguido dificulta todas as pegas e actos de preensão que exijam a normal mobilidade dos terceiro e quinto dedos da mão direita;
-manejar uma espingarda caçadeira com precisão para um destro exige que a sua mão direita não apresente as limitações referidas supra e de que o arguido é portador;
-o arguido é um cidadão íntegro e consciente dos seus deveres e obrigações e, se alguma vez tivesse pensado em matar a vítima, seria o primeiro a dizê-lo, pois o arguido nunca mente e tem horror à mentira;
-o arguido está profundamente arrependido daquilo que fez.

Fundamentação:

Sobre a alegada nulidade da audiência:
O recorrente começa por invocar a nulidade da audiência, nulidade essa que estaria em o advogado da requerente do pedido de indemnização civil, não tendo havido constituição de assistente, com permissão do tribunal, haver feito perguntas às testemunhas acerca da matéria criminal.
De acordo com os elementos que indica – cassete nº 11, lado B, rotação 230 – isso terá apenas acontecido com a testemunha P………. .
E, de facto, tratando-se de testemunha arrolada pela acusação e não também no requerimento de dedução do pedido de indemnização, ao mandatário da requerente, não estando esta constituída assistente, não deveria ter sido permitido o contra-interrogatório.
Mas, o desrespeito das regras de inquirição das testemunhas na audiência, não estando previsto como nulidade, só pode, como se diz no art. 118º, nºs 1 e 2, do CPP, constituir irregularidade.
Essa irregularidade teria de ser arguida perante o tribunal de 1ª instância e logo no acto, por nele se encontrar presente o interessado, nos termos do art. 123º, nº 1, do mesmo código.
Não tendo isso sido feito, o vício está sanado.
Aliás, a questão só poderia ser conhecida pela Relação no âmbito de recurso que se interpusesse da decisão que desatendesse a arguição da irregularidade.

Da matéria de facto:
Em segundo lugar, o recorrente impugna a decisão proferida sobre matéria de facto, dizendo que não se provou um dos factos dados como provados e que se provaram vários que não foram considerados provados.
Assim, desde logo, não deveria ser tido como assente que “desde a data em que o arguido teve conhecimento da relação amorosa da sua companheira com a vítima, passou a importuná-los e a observar os respectivos movimentos e hábitos”.
Não se vê em que é que este facto pode prejudicar a posição do arguido, pois não aparece de modo nenhum ligado aos factos que integram o crime pelo qual foi condenado. Apenas dele se pode concluir que o recorrente não se conformava com a infidelidade daquela que era sua companheira desde há cerca de 26 anos.
Não terá, assim, o recorrente interesse em agir neste ponto.
De qualquer modo, o tribunal recorrido teve fundamento para considerar o facto provado, não só porque um dos episódios em que ele se desenvolveu foi relatado na audiência pelas testemunhas Q………. e S………., elementos da GNR da Murtosa, em termos que permitem deduzir que outros da mesma natureza terá havido, mas também porque o próprio arguido confessou ter manifestado à companheira suspeitas de que ela continuava a relação amorosa com a vítima.

Vejamos agora os factos dados como não provados e que o recorrente pretende haverem-se provado.
O primeiro – o arguido tocou com a extremidade do cano da espingarda de caça na cabeça da vítima – deve, segundo o recorrente, ter-se como assente, na medida em que foi afirmado na audiência por si e pela testemunha T………. e ainda, na instrução, pela C………. .
Não tem razão.
Esta última testemunha prestou declarações apenas no inquérito (fls. 48), tendo recusado prestá-las na instrução e na audiência, ao abrigo do art. 134º, nº 1, alínea b), do CPP. E, porque em relação a essas declarações não se verifica a situação prevista nº 2 do art. 355º do mesmo código, não podem aqui ser tidas em conta, em face do nº 2 deste preceito. A testemunha T………. não foi peremptório na afirmação do facto. Melhor, bem vistas as coisas, nem o afirmou, pois o que disse foi que lhe pareceu ter havido o toque: “dá-me a sensação que toca com o cano da arma na cabeça do outro senhor”. E, como é óbvio, o tribunal não tinha que dar o facto como assente só porque o arguido o afirmou. Até porque as testemunhas U………. e V………., presentes no local, disseram não terem visto o alegado toque.
O segundo – a C………. levantou-se de imediato da mesa – só por si, não tem a mínima relevância, pois não interfere com o que a seguir aconteceu. O que poderá ter interesse é saber se, como pretende o recorrente, a C………. se interpôs entre o arguido e a vítima. Isso decidir-se-á mais à frente.
Como quer que seja, não merece censura a decisão do tribunal recorrido de dar como não provado que a C………. se levantou de imediato, na medida em que das declarações das testemunhas apontadas pelo recorrente fica a dúvida legítima sobre se, quando declararam que a C………. estava de pé, se referiam a momento anterior ou posterior ao disparo.
Em relação ao terceiro – a vítima, ao sentir o toque na cabeça, voltou-se para o arguido e levantou-se – só está em causa saber se foi quando sentiu o toque na cabeça que a vítima se voltou e se levantou, pois já consta dos factos provados que a vítima se voltou para o arguido e se levantou. E não pode ter-se como provado que a vítima se voltou e se levantou quando sentiu o toque na cabeça, porque já se decidiu não estar provado esse toque.
O quarto – a C………. interpôs-se entre o arguido e a vítima – deveria ter-se como provado, segundo o recorrente, em face dos depoimentos das testemunhas C………., V………., T………., L………., X………. e Z………. e ainda nas declarações do arguido.
Mas, a C………. não prestou declarações sobre os factos na audiência, e quaisquer outras declarações dela não valem aqui como prova, pelas razões já referidas. A V………., o T………., o L………. e a X………. apenas afirmaram que viram a C………. de pé; não falaram na sua interposição entre a vítima e o arguido. A V………. negou mesmo que tivesse havido a pretendida interposição. O Z………., na audiência, negou também a C………. se tenha interposto entre a vítima e o arguido. É certo que esta testemunha, ao ser ouvida no inquérito, afirmou que a senhora que estava com a vítima se colocou à frente do arguido. E estas declarações foram validamente lidas na audiência, não havendo, por isso, obstáculo à sua valoração como prova. Mas, para além das reservas que devem merecer as afirmações de uma testemunha que apresenta dos factos duas versões diferentes, houve quatro testemunhas que negaram o facto da interposição – a já referida V………., K………., Y………. e U………. . Havendo estes quatro depoimentos a negarem o facto e só um, a merecer reservas, a afirmá-lo, é razoável que o tribunal recorrido o tenha considerado não provado.
Sobre o quinto – o arguido afastou a C………. com o braço esquerdo e, ao segurar a espingarda com a mão direita, disparou sem apontar –, estando já decidido que não se provou que a C………. estava entre a vítima e o arguido, não se pode considerar assente que este a afastou para disparar. E quanto a disparar, sem apontar, nem a prova especificada pelo recorrente apoia a sua pretensão, pois a testemunha Z………., nas declarações prestadas no inquérito, disse que o arguido “levou a arma à cara e disparou”. A expressão “levar a arma à cara” só tem um sentido: o de apontar a arma.
Também quanto ao sexto – o arguido no dia 14 de Janeiro de 2005 disse à sua filha D………. que se separara definitivamente da C………. – nem a prova especificada pelo recorrente sustenta a sua pretensão de que este facto se provou. Com efeito, a testemunha D………. apenas diz que o arguido lhe disse que “se tinha zangado com a D. C………. e que se iam separar”. Afirmar que se iam separar não é a mesma coisa que afirmar que se haviam separado. O futuro anunciado podia não se verificar. Até porque, horas depois, ainda segundo a alegação do recorrente, este, falando novamente com a testemunha, lhe disse que “estava tudo bem” e que “se calhar iam para o E……….”.
Acresce que este facto é totalmente irrelevante, sendo que dele apenas se poderia concluir que havia problemas na relação entre o arguido e a C………., o que já ficou assente noutros pontos.
O sétimo – no dia seguinte ia com a C………. almoçar ao E………. – deveria dar-se como provado, nas palavras do recorrente, com base nos depoimentos das testemunhas D………., W………., AB………., AC………. e AD………. .
Mas, a primeira apenas repetiu o que o arguido lhe disse: “se calhar também vamos ao E……….”. A AC………. nada disse, de acordo com a argumentação do recorrente, sobre a ida deste ao E………. . O AD………. concluiu que iam ao E………. apenas porque havia matança de porco e, sempre que isso acontecia, eles eram convidados. Como é evidente, este facto não permite a conclusão que iam naquela vez ao E………. . Desde logo, podiam não ser convidados, apesar de o terem sido sempre até ali. As declarações das outras duas testemunhas, pela maneira como depuseram, não mereceram credibilidade ao tribunal, como se justifica na motivação da decisão de facto. E a credibilidade de um depoimento depende de dados que, como a postura, os gestos, o tom de voz, as hesitações, as contradições, os silêncios etc., escapam ao controlo do tribunal de recurso, por lhe faltar a imediação. Acresce que, de acordo com o que disse à filha D………., nem o arguido sabia se iam ao E………. . A expressão “se calhar também vamos ao E……….” pode muito bem querer significar que a sua vontade era de ir ao E………., mas não a da C………. .
Não merece, pois, censura a decisão de dar este facto como não provado.
Do oitavo – meteu na bagageira do automóvel a espingarda de caça e demais objectos destinados à caça que se encontravam na cave em local de difícil acesso – já foi dado como provado que o recorrente meteu na bagageira a arma de caça e os demais objectos ali encontrados. O que está, pois, em causa é saber se se provou que a espingarda e os outros objectos estavam na cave de sua casa em local de difícil acesso e se o arguido os foi buscar com o propósito de ir à caça. Diz que isto se provou com base nas suas declarações e nas das testemunhas que indicou para fundamentar a sua pretensão de ver considerado provado o facto anterior.
Mas, não localizou, nos suportes das gravações, as suas declarações sobre este ponto, como tinha de fazer, nos termos do art. 412º, nºs 3, alínea b), e 4, do CPP. De qualquer modo, as declarações do arguido, que nem tem a obrigação de dizer a verdade, são livremente apreciadas pelo tribunal, que pode ou não atribuir-lhes credibilidade, sem que o tribunal de recurso disponha de elementos que permitam sindicar esse juízo. E, daquelas testemunhas, nenhuma se pronuncia sobre se a espingarda e os demais objectos estavam em local de difícil acesso na cave da casa do recorrente. E o facto de assim proceder quando ia à caça não significa que desta vez tivesse colocado na bagageira a espingarda e os demais objectos com o propósito de ir à caça, até porque não se provou que fosse à caça, ao E………. .
Assim, também aqui nada há a censurar na decisão recorrida.
O nono - antes de entrar no restaurante onde se deu o homicídio, pelas 20 horas 56 minutos e 6 segundos, o arguido telefonou à vítima para o telefone 93……. – estaria provado em face do documento de fls. 352.
Mas, desse documento apenas resulta que no momento indicado pelo recorrente houve uma ligação com a duração de 9 segundos do telemóvel 93……. para o telemóvel 93……., nada ali se dizendo sobre quem fez essa chamada nem sobre quem a recebeu. Desse documento nem resulta que o telemóvel para o qual foi feita a ligação era da vítima.
O décimo – e, pelas 21 horas 2 minutos e 20 segundos, telefonou ao seu amigo F………. para o telefone 91……. – não tem a mínima relevância, nada tendo que ver com os factos nem se referindo a qualquer conduta ou qualidade do arguido que possa ser valorada em seu favor. Foi por ser inócuo que este facto nem foi apreciado pelo tribunal recorrido.
Pretende o recorrente que os factos décimo primeiro a décimo sexto – o arguido tem experiência de situações traumáticas; tem pesadelos recorrentes, com cenas traumáticas específicas e "flash backs diurnos"; apresenta hiperactividade neurovegetativa, com aumento persistente da irritabilidade, do nervosismo, reacções de alarme e perturbações cardiovasculares; evita de forma persistente os estímulos que desencadeiam memórias traumáticas (fotos, filmes, notícias, conversas); sofre de perturbação pós-traumática do stress (classificação internacional das doenças 10-F.43.1) com origem na exposição ao combate e de curso crónico; o arguido apresenta uma perturbação obsessiva da personalidade, com traços paranóides obsessivos e narcisísticos (classificação internacional das doenças 10-F-60.5) – devem ter-se como assentes com base na perícia realizada no Hospital AE………., cujo relatório se encontra a fls. 931 a 938.
Mas, essa perícia, se bem que afirme os factos em causa, não foi a única a que o recorrente foi submetido. Existe uma outra realizada por peritos do Instituto de Medicina Legal de Coimbra que nega esses factos. Entre uma e outra o tribunal recorrido optou por esta última, o que fez justificadamente: porque foi mais próxima dos factos, sem recurso a elementos exteriores, ao contrário daquela, que deles lançou mão sem questionar a sua fiabilidade, porque se louva nas tabelas nacionais, é mais pormenorizada e fundamentada e porque as suas conclusões coincidem com as que a postura do recorrente na audiência de julgamento permitiu ao próprio tribunal tirar, conclusões essas que – diz-se na motivação da decisão de facto – se harmonizam com as afirmações do seu ex-comandante dos tempos do serviço militar. Acresce que a perícia realizada no Instituto de Medicina Legal de Coimbra, além de representar o entendimento de dois peritos, envolveu a realização de vários testes de avaliação psicológica, ao contrário da outra, que foi realizada apenas por um perito e assenta as suas conclusões apenas em entrevistas ao arguido, a um amigo e à ex-mulher.
Não há, assim, fundamento para censurar neste ponto a decisão recorrida.
Sobre o décimo sétimo – a deformidade da mão direita apresentada pelo arguido dificulta todas as pegas e actos de preensão que exijam a normal mobilidade dos terceiro e quinto dedos da mão direita – o tribunal recorrido na motivação da decisão proferida sobre matéria de facto nada diz especificamente quanto a este facto, devendo entender-se que está abrangido na cláusula geral “as respostas negativas ficaram a dever-se a uma total ausência de prova, quer testemunhal, quer documental, quer qualquer outra que validamente...”.
Mas, o facto em questão está afirmado no relatório médico de fls. 631. Por isso, nada havendo a contrariar esse elemento de prova, o facto não pode deixar de ser considerado provado. Não se vê, porém, que tenha qualquer relevância para a decisão de direito.
O décimo oitavo – manejar uma espingarda caçadeira com precisão para um destro exige que a sua mão direita não apresente as limitações referidas supra e de que o arguido é portador – seria um facto notório.
Claramente não é. A deformidade dificulta a preensão, mas isso pode não impedir que, ainda que com alguma dificuldade, o recorrente seja preciso a manejar uma espingarda. E nenhuma prova especificou sobre esse impedimento, pois a sua argumentação não é no sentido de que o facto foi afirmado pelas duas testemunhas que indicou. Aliás, a pretensão do recorrente neste ponto está em flagrante contradição com a sua afirmada condição de caçador.
De qualquer modo, o facto seria sempre inócuo, visto que no caso não foi necessária qualquer capacidade de precisão, pois o arguido estava a menos de 2 metros da vítima quando disparou.
O décimo nono – o arguido tem horror à mentira – nem chega a ser um facto. Com a alegação de que tem horror à mentira, quererá o recorrente significar que não é mentiroso. E isso não passa de conclusão que poderá extrair-se de factos que, no caso, não estão presentes. De todo o modo, ao arguido não está imputado o facto de ser mentiroso, além de que sê-lo ou não é totalmente irrelevante para a decisão de direito; não tem nada a ver com os factos pelos quais responde. Trata-se de questão que apenas tem sentido invocar para defender a credibilidade das declarações do recorrente. E, como já vimos, o juízo sobre a credibilidade das declarações prestadas pelo arguido na audiência de julgamento não é sindicável pelo tribunal de recurso.
O vigésimo – o arguido está profundamente arrependido daquilo que fez – resultaria provado das suas próprias declarações e dos depoimentos das testemunhas F………., AF………., AC………., AG………., AD………. e Prof. AH………. .
Mas, o recorrente não diz concretamente quais as afirmações destas testemunhas que devem levar à conclusão de que o facto se provou. Limita-se a remeter para local das gravações onde há declarações sobre mais que um assunto. E tinha de fazer essa concretização, dizendo, ainda que genericamente, que tipo de afirmações impõe que se dê o facto como provado.
De qualquer modo, as referidas testemunhas mais não fazem que tirar a conclusão de que o arguido está arrependido só porque ele se disse arrependido, ou seja, as testemunhas fazem um julgamento das palavras do arguido, e isso só o tribunal pode fazer. As testemunhas não trouxeram ao tribunal elementos a que este não tivesse acesso directo. Aliás, nem todas as testemunhas indicadas disseram que o arguido estava arrependido. Não o fez a testemunha AG………. . O arguido disse-se arrependido, directamente e por interpostas pessoas, mas o tribunal, atenta a maneira como se comportou na audiência, nomeadamente, não assumindo na totalidade os seus actos, não teve essa afirmação como boa, e esse juízo, como já se viu, não é sindicável pelo tribunal de recurso, por lhe faltar o contacto vivo e directo com esse meio de prova.

Diz ainda o recorrente que deviam ter sido dados como provados outros factos que, embora não alegados na contestação, teriam resultado da discussão da causa, designadamente que
-tem carta de caçador;
-tem licença de uso e porte de arma de caça;
-quando vai para o E………. leva habitualmente a espingarda de caça;
-no Porto, a espingarda de caça era guardada numa arrecadação na cave do prédio em cujo sexto andar mora;
-essa arrecadação de 2x3 metros está cheia como um ovo;
-o arguido para retirar as suas coisas de caça demora cerca de 10 minutos;
-o arguido é obsessivamente arrumado;
-o auto de busca ao veículo está incompleto, pois dele não consta um bornal de caça;
-o arguido, algum tempo após os acontecimentos, e depois de a vítima ter sido levada para o hospital, perguntou a quem a acompanhou como é que ela estava;
-o arguido ao pretender entrar no restaurante enganou-se na porta;
-o arguido deu um passo atrás e saiu o tiro;
-o arguido, depois dos acontecimentos e enquanto esperavam, disse, referindo-se à C………, que ela é que devia ter levado o tiro.
Mas, os dois primeiros factos foram dados como provados, como acima se vê.
Não tem qualquer interesse saber onde estava arrumada a espingarda e em que condições, nem se também havia no automóvel um bornal de caça quando já se decidiu não estar provado que o recorrente meteu a espingarda na bagageira do automóvel para ir no dia seguinte “ao E………”.
Também não se vê onde está a relevância de se saber se o recorrente é obsessivamente arrumado e se enganou na porta do restaurante, e ele não o diz. Deve, contudo, notar-se que esse engano não foi afirmado pela testemunha cujas declarações invoca.
A alegação de que perguntou, depois, como estava a vítima e disse, referindo-se à C……….., que quem devia ter levado o tiro era ela tem a ver com a pretensão de que deveria considerar-se provado o arrependimento, questão já decidida. A pergunta que diz ter feito, sem mais, não tinha que ser interpretada como arrependimento, pois podia até, ao contrário, significar que o arguido queria saber se conseguira aquilo que se propusera: matar o G………. . E a outra declaração pode ser entendida como reafirmação da vontade homicida do recorrente.
Se com esta alegação se pretende significar que o tiro foi ocasional, é evidente a falta de razão do recorrente, pois a testemunha cujas declarações indica não deu qualquer indicação nesse sentido. Ao contrário, disse que o arguido pôs a espingarda em posição e disparou. O passo que diz ter sido dado a atrás por parte do arguido teve em vista a procura de uma melhor posição para disparar.
E nesse contexto, o acto de dar um passo atrás não tem relevância para a defesa. De qualquer modo, outras testemunhas não referiram esse passo atrás, pelo que nunca poderia esta Relação censurar a decisão de não incluir esse facto entre os provados.

Da matéria de direito:
Está em causa, em primeiro lugar, a qualificação jurídica dos factos. O tribunal recorrido considerou que integram um crime de homicídio qualificado, e o recorrente defende que o crime é de homicídio simples.
Diz ainda que o dolo é eventual.
Esta última pretensão é claramente infundada, uma vez que se provou que “o arguido quis, como conseguiu, tirar a vida ao G……….”. Isso é dolo directo, como se vê do art. 14º, nº 1, do CP: o arguido previu e teve como fim a realização do facto criminoso. Para tanto actuou adequadamente: visou uma zona do corpo da vítima onde sabia alojarem-se órgãos vitais, com um instrumento idóneo a causar a morte.
Sobre isto não pode haver dúvidas.

Vejamos então se o crime deve ou não ter-se como qualificado.
Nos termos do nº 1 do art. 132º, o crime de homicídio é qualificado se «a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade», enumerando-se no nº 2 circunstâncias susceptíveis de revelar essa especial censurabilidade ou perversidade.
A verificação de qualquer das circunstâncias exemplificadas no nº 2 constitui só um indício da existência da especial censurabilidade ou perversidade, podendo negar-se este maior grau de culpa, apesar da presença de uma das referidas circunstâncias, e concluir-se pela especial censurabilidade ou perversidade, ou seja, pela qualificação do homicídio, apesar de se negar a presença de qualquer das referidas circunstâncias.
Nas palavras de Teresa Serra, haverá especial censurablidade quando “as circunstâncias em que a morte foi causada são de tal modo graves que reflectem uma atitude profundamente distanciada do agente em relação a uma determinação normal de acordo com os valores”, podendo afirmar-se que a especial censurabilidade se refere “às componentes da culpa relativas ao facto”, fundando-se, pois, “naquelas circunstâncias que podem revelar um maior grau de culpa como consequência de um maior grau de ilicitude”. E especial perversidade quando se esteja perante “uma atitude profundamente rejeitável”, no sentido de “constituir indício de motivos e sentimentos que são absolutamente rejeitados pela sociedade”, estando aqui em causa “as componentes da culpa relativas ao agente” (Homicídio Qualificado, Almedina, 1998, páginas 63 e 64).
Também o Prof. Figueiredo Dias, depois de referir que, face ao seu funcionamento não automático e à sua não taxitividade, as circunstâncias enumeradas no nº 2 do art. 132º só podem ser compreendidas como elementos da culpa, conclui:
“Sendo, assim, o especial grau de culpa subjacente à «especial censurabilidade ou perversidade» que o agente manifesta em tais circunstâncias aquilo que motiva a agravação, esta tem afinal a ver com a maior desconformidade que a personalidade manifestada no facto possui, face à suposta e querida pela ordem jurídica, em relação à desconformidade, já de si grande, da personalidade subjacente à prática de um homicídio simples” (Colectânea de Jurisprudência, 1987, IV, página 52).”
Do que se trata é, pois, de uma censurablidade ou perversidade acrescida em relação à perversidade ou censurabilidade que já tem de estar presente no homicídio simples. É nessa diferença de grau, nessa especial maior culpa, que encontra fundamento a qualificação do homicídio.
Na decisão recorrida consideraram-se verificadas as circunstâncias descritas nas alíneas h) – utilização de meio insidioso – e i) – frieza de ânimo e reflexão sobre os meios empregados.
Falando a lei de «veneno ou qualquer outro meio insidioso», o significado de outro meio insidioso há-de ser encontrado sempre por referência ao veneno, isto é, outro meio insidioso tem de ser um meio análogo ao veneno, um meio traiçoeiro, tornando, por via da sua nula ou menor visibilidade, mais difícil a defesa da vítima. Como diz ainda o Prof. Figueiredo Dias. “insidioso” será todo o meio cuja forma de actuação sobre a vítima assuma características análogas às do veneno – do ponto de vista pois do seu carácter enganador, subreptício, dissimulado ou oculto” (Comentário Conimbricense do Código Penal, páginas 38 e 39).
No caso, o arguido, olhando pela janela do restaurante, viu a sua companheira e a vítima sentados a uma mesa a jantarem. Entrou então no restaurante, com a espingarda, que antes municiou, aproximou-se da mesa onde aqueles se encontravam, proferiu em voz alta a frase “sou corno há 15 anos, mas isso hoje vai acabar”, assim chamando a atenção da vítima, que, estando de costas, se levantou e se voltou para o arguido e, então, depois de a companheira gritar, dizendo “B………, está quieto, não faças isso!” disparou um tiro, visando a zona torácica da vítima, a menos de 2 metros de distância.
Houve surpresa da vítima, mas não a utilização de um qualquer meio de muito difícil detecção, na medida em que o arguido entrou no restaurante com a espingarda de caça nas mãos, havendo a possibilidade de ser visto e impedido por outras pessoas de avançar pelo restaurante. E apesar de surpreendida pela chegada ali do arguido, a vítima teve oportunidade e tempo de se levantar e voltar-se para aquele, apesar de não ter esboçado qualquer gesto de defesa, nomeadamente, como se diz na decisão proferida sobre matéria de facto, o de agarrar ou afastar de si o cano da espingarda.
O arguido não procurou uma qualquer forma encoberta ou traiçoeira de executar o facto, com vista a que a vítima não tivesse qualquer possibilidade de defesa. Usando uma espingarda de caça, mataria a vítima com a mesma eficácia, se a encontrasse na rua, de frente, a distância superior àquela a que se encontrava quando disparou.
Não se podendo falar aqui da utilização de um meio com características análogas às do veneno, não se está perante meio insidioso.
Agir com frieza de ânimo significa actuar com serenidade, com o espírito límpido de emoções. E agir com reflexão sobre os meios empregados significa actuar depois de escolher e preparar cuidadosamente o modo de praticar o facto.
O recorrente e a C………. viviam um com o outro como se de marido e mulher se tratasse, desde 1979, havendo dessa relação uma filha. Em data indeterminada de 2004, o arguido soube que a C………. tinha uma relação amorosa com G………., possuidor de um apartamento na ………., sendo ali que os dois últimos costumavam encontrar-se. Instada pelo arguido, a C………. acabou por confessar-lhe a existência da relação amorosa com o G………., prometendo então acabar com ela. A relação do arguido com a C………. manteve-se.
No dia dos factos, o arguido, encontrando-se no Porto, suspeitou que a C………. ainda mantinha a relação amorosa com o G………. e fora para a ………., a fim de aí se encontrar com ele. Então, muniu-se da sua espingarda caçadeira e dirigiu-se para essa localidade, com o propósito de matar o G………., se as suas suspeitas se confirmassem.
O arguido, compreensivelmente, não aceitava que a C………. se relacionasse amorosamente com outros homens: a relação entre ambos era análoga à dos cônjuges. O conhecimento do envolvimento da companheira com o G………. não o deixou indiferente, mas continuou a querer fazer vida em comum com ela, que prometeu acabar com esse envolvimento.
Assim, se o arguido queria continuar a viver com a C………., a carga daquela suspeita não podia deixar de em alguma medida lhe turvar o espírito, tirando-lhe serenidade, ao munir-se da espingarda caçadeira e dirigir-se para a ………., para matar o G………., se ali verificasse que este e a C………. ainda mantinham o relacionamento amoroso. E menos sereno ficou, necessariamente, quando os viu juntos a saírem do apartamento dele, facto que confirmava as suas suspeitas. É nesse estado de espírito que os persegue e vai encontrá-los no restaurante a jantar, onde então executa a agressão homicida.
Há, pois, circunstâncias que levam a concluir que o arguido quando formou a resolução criminosa estava sob alguma perturbação, que necessariamente aumentou quando viu confirmada a suspeita de que continuava a ser enganado. Vai desde logo nesse sentido a expressão com que se fez anunciar ao chegar junto da mesa onde se encontravam a vítima e a C……….: “sou corno, mas isso vai acabar hoje!”. Nessa frase se revela muito do estado de espírito do arguido, percebendo-se o ciúme, a dor da traição e o sentimento da honra ferida.
Essa diminuição da serenidade é suficiente para afastar a frieza de ânimo.
E também não há factos que permitam concluir que o arguido agiu com reflexão sobre os meios empregados. Até porque o conceito “reflexão” não prescinde da ideia de serenidade, que, no caso, como se viu, estava claramente abalada. O arguido queria simplesmente matar o homem que, relacionando-se amorosamente com a sua companheira, provocara a sua “desonra” e, para o efeito, limitou-se a escolher uma arma idónea de que dispunha – uma espingarda caçadeira – e a procurar tal homem no local onde pensava que estava na companhia aquela. Não fez qualquer preparação especial do crime, ao contrário do que se diz na decisão da matéria de facto, mas em jeito de conclusão, que os factos provados não autorizam. Desde logo, não escolheu o local, pois limitou-se a procurar a vítima, matando-a onde a encontrou. Nem sequer se provou que houve um grande intervalo entre o momento em que formou a resolução criminosa e a execução desta. Foi apenas o tempo de ir do Porto à ………. e de verificar qual o restaurante que escolhiam para jantarem.
Não se pode, pois, ter como presente qualquer dos exemplos-padrão considerados na 1ª instância.
Nem se está perante uma situação “valorativamente análoga”.
Só pode, assim, concluir-se que o homicídio não é qualificado, mas simples, com previsão no art. 131º.

Resta a questão da medida da pena.
De acordo com o art. 71º do CP, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, circunstâncias essas de que aí se faz uma enumeração exemplificativa e podem relevar pela via da culpa ou da prevenção.
À questão de saber de que modo e em que termos actuam a culpa e a prevenção responde o art. 40º, ao estabelecer, no nº 1, que «a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» e, no nº 2, que «em caso alguma a pena pode ultrapassar a medida da culpa».
Assim, a finalidade primária da pena é a de tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, de reinserção do agente na comunidade. À culpa cabe um papel limitador, constituindo a sua medida um tecto que não pode ser ultrapassado.
Estas regras vêm sendo explicitadas na obra do Prof. Figueiredo, podendo afirmar-se na esteira dos seus ensinamentos:
A pena tem como finalidade primordial a tutela necessária dos bens jurídico-penais no caso concreto, traduzida na necessidade de tutela da confiança e das expectativas comunitárias na manutenção da vigência da norma violada. Por outras palavras, a aplicação de uma pena visa acima de tudo o “restabelecimento da paz jurídica abalada pelo crime”. Uma tal finalidade identifica-se com a ideia da “prevenção geral positiva ou de integração” e dá “conteúdo ao princípio da necessidade da pena que o art. 18º, nº 2, da CRP consagra de forma paradigmática”.
Há um “medida óptima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias que a pena se deve propor alcançar”, mas que não fornece ao juiz um quantum exacto de pana, pois “abaixo desse ponto óptimo ideal outros existirão em que aquela tutela é ainda efectiva e consistente e onde portanto a pena concreta aplicada se pode ainda situar sem perca da sua função primordial”.
Dentro desta moldura de prevenção geral, ou seja, “entre o ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos (ou de defesa do ordenamento jurídico)” actuam considerações de prevenção especial, que, em última instância, determinam a medida da pena. A medida da “necessidade de socialização do agente é, em princípio, o critério decisivo das exigências de prevenção especial”, mas, se o agente não se “revelar carente de socialização”, tudo se resumirá, em termos de prevenção especial, em “conferir à pena uma função de suficiente advertência” (Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, 2004, páginas, 77, 78 e 79).
Noutra obra, sintetizando estes ensinamentos, o mesmo autor escreveu:
“(...) o modelo de determinação da medida da pena que melhor combina os critérios da culpa e da prevenção é “aquele que comete à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração) a função de fornecer uma «moldura de prevenção», cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto de pena, dentro da referida «moldura de prevenção», que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente” (Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, Abril – Dezembro 1993, páginas 186 e 187).

Ao crime de homicídio simples cabe em abstracto a pena de 8 a 16 anos de prisão.
O arguido tomou a resolução de matar pelo menos com uma hora de antecedência – o tempo necessário para se deslocar do Porto à ………. e localizar aí a vítima e a C……….. –, pelo que se deve concluir por uma vontade muito firme de praticar o crime. Mas, certo é também que o propósito criminoso se formou impulsionado pela suspeita de que a sua companheira de muitos anos lhe era infiel. Essa suspeita nascia do facto de o arguido não conseguir localizar na altura a C………. e esta lhe haver confessado tempos antes um relacionamento amoroso com a vítima, prometendo então pôr-lhe termo. Que essa promessa não estava a ser cumprida era a suspeita do arguido. E, porque o arguido continuava a querer fazer vida em comum com a C………. e não aceitava a infidelidade, essa suspeita, não despropositada, tirou-lhe necessariamente serenidade, como já vimos. Depois, quando executou o crime, já o arguido adquirira a certeza, pelo menos a sua certeza, fundada, de que a C………. continuava envolvida amorosamente com a vítima, o que, como também já se disse, só podia diminuir-lhe ainda mais a serenidade.
Assim, aquela vontade muito determinada de cometer o crime, que concretiza um dolo intenso, tem como contraponto esta menor serenidade do arguido, a qual lhe tornou mais difícil um comportamento em conformidade com o direito.
O grau de ilicitude do facto está um pouco acima da média, uma vez que, embora o instrumento utilizado se possa considerar comum neste tipo de crime, a vítima foi colocada em situação que praticamente não lhe permitiu esboçar qualquer tipo de defesa.
Os motivos do crime, enquanto causadores de um estado de afecto, que afectou a serenidade do arguido, já acima foram tidos em conta.
Podemos destes dados concluir que o grau de culpa, a medida da culpa, se situa um pouco acima do ponto intermédio da moldura penal.
As necessidades de prevenção geral são medianas, na medida em que a conduta do arguido foi isolada e teve uma motivação que a comunidade não aceita, mas a que empresta alguma compreensão.
As exigências de prevenção especial estão no mesmo plano, pois o arguido não tem antecedentes criminais e tem, no mais, adequado o seu comportamento aos valores, encontrando-se bem integrado socialmente.
Pode, assim, considerar-se que, na ausência de outras circunstâncias favoráveis ao arguido, para além dos motivos que estiveram na base da sua actuação, a medida óptima de satisfação das expectativas comunitárias se situará ao nível da medida da culpa, proporcional à gravidade do facto, mas, dada a ausência de particulares exigências de socialização, a pena pode (e por isso deve) ser fixada um pouco abaixo, no ponto intermédio da moldura penal, entendendo-se estar aí o mínimo de pena imprescindível à manutenção da confiança colectiva na validade da norma violada.
A pena justa é, pois, a de 12 anos de prisão.

Decisão:

Em face do exposto, acordam os juízes desta Relação, no provimento parcial do recurso, em alterar o acórdão recorrido do seguinte modo: o crime cometido é o de homicídio do art. 131º do CP e a pena em que o arguido fica condenado é a de 12 (doze) anos de prisão.
O recorrente vai condenado a pagar as custas, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCs.

Porto, 18 de Outubro de 2006
Manuel Joaquim Braz
Luís Dias André da Silva
Francisco Marcolino de Jesus
José Manuel Baião Papão