Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP00032969 | ||
| Relator: | COUTO PEREIRA | ||
| Descritores: | EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA URGÊNCIA CADUCIDADE ACÇÃO DECLARATIVA SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA | ||
| Nº do Documento: | RP200111260151254 | ||
| Data do Acordão: | 11/26/2001 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recorrido: | 5 J CIV V N FAMALICÃO | ||
| Processo no Tribunal Recorrido: | 432/01 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | AGRAVO. | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
| Área Temática: | DIR PROC CIV. | ||
| Legislação Nacional: | CPC95 ART279 N1. CEXP91 ART1 ART2 ART13 ART42 N1 N2 B ART15. | ||
| Sumário: | Tendo os expropriados proposto uma acção contra a entidade expropriante a pedir que se declare caduco o carácter urgente da expropriação, justifica-se a suspensão da instância do processo expropriativo dado o carácter prejudicial da decisão a tomar no âmbito da acção declarativa. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO A Câmara Municipal de ............. instaurou contra Maria .......; Maria Margarida ...........; e José ..........., o processo de Expropriação, distribuído ao .. Juízo Cível do Tribunal Judicial de ............, onde tomou o nº..../.., pedindo que, no prazo de 2 dias, a contar da entrada da petição em Juízo, e nos termos do artº.50º, nº.4 do Código das Expropriações, aprovado pelo DL. nº.438/91 de 9/11, ou de 10 dias, conforme o artº.51º, nº.5 da Lei 168/99, de 18/9, lhe seja adjudicada a posse, relativa ao direito ao arrendamento de uma loja com uma superfície coberta de 58 m2 e mais 10 m2 destinada a arrumos, sita no rés-do-chão, do nº... da Rua ................, que faz parte do prédio urbano que se encontra inscrito na matriz sob o artº...... e descrito na Conservatória do Registo Predial da ........... sob o nº....... Porém, os expropriados instauraram contra a expropriante a Providência Cautelar de Restituição Provisória de Posse, a qual foi deferida, por decisão de 11 de Janeiro de 2001, com o fundamento de que os requerentes tinham a posse da mesma e haviam sido esbulhados dela violentamente, tendo, posteriormente, estes instaurado a respectiva acção, onde pedem que se declare caduco o carácter urgente da expropriação em causa, condenando-se ainda a ré a abster-se de qualquer acto que ofenda a posse do local arrendado, até que seja extinto aquele direito pela forma judicial prevista no nº.5 do artº.51º, do C. E.. Foi proferido despacho no processo de expropriação, tendo o Mtº. Juiz “a quo”, decretado a suspensão da instância, dado o carácter prejudicial da decisão a tomar no âmbito da acção declarativa proposta pelos aqui, expropriados. Não se conformando com tal decisão, dela agravou a expropriante Câmara Municipal de ............ Apresentou alegações e concluiu: 1- O julgador não pode suspender a adjudicação da posse em processo de expropriação com base em que decorre acção para anulação da atribuição de carácter urgente. 2- A atribuição do carácter urgente à expropriação tem como finalidade conferir à entidade expropriante a possibilidade de tomar posse administrativa do bem ou direito a expropriar em data anterior à adjudicação judicial de tal posse. 3- Ademais, a adjudicação judicial da posse terá como consequência directa e necessária a declaração da inutilidade superveniente da lide relativamente àqueloutra acção de anulação da atribuição do carácter urgente à expropriação. 4- Foram violadas as normas constantes dos artºs.50º, nº.4 do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei nº.438/91 de 9 de Novembro (diploma aplicável à presente expropriação) ou artº.51º, nº.5 do actual Código das Expropriações aprovado pela Lei nº.168/99, de 18 de Setembro. Contra alegaram os expropriados concluindo: 1- Considerando a data de publicação da DUP invocada no processo de expropriação em causa, é aplicável ao processo o Código de Expropriações vigente, aprovado pela Lei 168/99 de 18/9 – como aliás a recorrente invocou ao longo da sua fase administrativa. 2- Aquela DUP, atribuiu à expropriação o carácter de urgência e, por isso o procedimento respectivo tem diversas especialidades, nomeadamente, quanto à constituição e funcionamento da arbitragem, que tem de decorrer perante o juiz da comarca do local dos bens, por força do disposto na al. e) nº.1 artº.42º do Cód. Exp.. 3- Apesar do carácter urgente declarado na DUP e não obstante defender a vigência dessa urgência, a recorrente não remeteu o processo ao tribunal antes daquela arbitragem e, “avocou” aquelas atribuições jurisdicionais, constituindo e pondo a funcionar a arbitragem, perante si própria. 4- Tal facto torna juridicamente inexistente a dita arbitragem e todos os actos dela dependentes – por ofensa do direito subjectivo à jurisdição (nº.1 e 4 do artº.200º CRP) e, violação do disposto em nº.1 artº.110º, nº.1 artº.111º e nºs.1 e 2 artº.202º da CRP.. 5- Ora, estando pendente acção declarativa instaurada pelos ora recorridos contra o Município, em que se pede a declaração daquela caducidade, aliás, já reconhecida provisoriamente, é óbvio que a decisão a proferir ali, determina o teor do despacho previsto no nº.5 do artº.51º do Cód. Exp.. 6- Ao Mº Juiz recorrido, restava assim, ou indeferir liminarmente o requerimento inicial, por considerar aquele vício de inexistência jurídica da arbitragem, ou proferir, como proferiu, até por economia processual, o despacho de suspensão ora em causa – o qual, assim, até se revela, para o infractor da lei menos lesivo do que aquele. Colhidos os vistos cumpre decidir: Factos assentes: Além dos constantes do relatório temos ainda os seguintes: 1-Que por despacho de 99/11/17 proferido pelo Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza , foi declarada a utilidade pública da expropriação, com carácter urgente, do direito ao arrendamento de parte do ............. 2-Conforme declaração nº.57/2000 (2ª série), publicada no Diário da República nº.56, II série, de 7 de Março de 2000. São as conclusões do recurso que, em princípio, delimitam o seu objecto –artigoºs.684º, nº.3 e 690º, nº.1, do Código de Processo Civil - e a questão que se coloca é a de saber se deve ou não ser suspenso o processo de expropriação até ser decidida a acção de caducidade proposta pelos expropriados. Dispõe o artº.62º, da Constituição da República que : Nº.1 “A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição”. Nº.2 “A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização”. Resulta ainda do artº.1º do Código das Expropriações que “Os bens imóveis e os direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública compreendida nas atribuições, fins ou objecto da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização ...”. Estatui o artº.2º, do C.E. que “Compete às entidades expropriantes e demais intervenientes no procedimento e no processo expropriativos prosseguir o interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos expropriados e demais interessados, observando, nomeadamente, os princípios da legalidade, justiça, igualdade, proporcionalidade, imparcialidade e boa fé”. Ora, segundo Maria Teresa de Melo Ribeiro, in O princípio da Imparcialidade da Administração, págs.226 e 227, do princípio da justiça, consagrado no artº.6º do C. Proc. Administrativo, resulta para a administração a obrigação de harmonizar a prossecução do interesse público com os direitos e interesses dos particulares, devendo, ainda a administração pautar a sua actividade, por certos critérios materiais ou de valor, constitucionalmente consagrados, como por exemplo nos artºs.1º e 2º da CRP.. Também, segundo Alves Correia, in As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, Coimbra 1982, pág.116, e no que respeita ao princípio da proporcionalidade, nos diz que deste princípio se podem extrair duas consequências: uma é a de que só é legítimo realizar uma expropriação quando esta se apresentar como necessária, ou seja, só quando não seja possível atingir o fim público com outras soluções que, sob os aspectos jurídico ou económico, possam substituir a expropriação; e a outra a de que recorrendo-se à expropriação, deve utilizar-se aquele meio que menor dano cause ao particular. Exige, pois, este princípio que a autoridade expropriante proceda a um balanço de custos-benefícios. Ora, no “iter” procedimental da expropriação, o único acto capaz de lesar os direitos e interesses legítimos dos particulares é o acto de declaração de utilidade pública - cfr. Ac. do STA. de 31/3/98, in Acs. Doutrinais do STA., ano XXXVII, pág.1287- e a que alude o artº.13º do C.E.. Refere-nos o artº.42º do C.E.: No seu nº.1 “Compete à entidade expropriante, ainda que seja de direito privado, promover, perante si, a constituição e o funcionamento da arbitragem”. Porém, o nº.2 deste mesmo artigo apresentam-nos várias excepções ao estatuído no nº1. Assim, “as funções da entidade expropriante referidas no número anterior passam a caber ao juiz de direito da comarca do local da situação do bem ou da sua maior extensão ...” e de entre as várias alíneas resulta da al. b) “se o procedimento de expropriação sofrer atrasos não imputáveis ao expropriado ou aos demais interessados que, no seu conjunto, ultrapassem 90 dias, contados nos termos do artº.279º, do Código Civil”. O processo expropriativo pode ainda ter carácter urgente, como resulta do artº.15º do C.E., mas, este carácter urgente, pode caducar se as obras a efectuar não tiverem início no prazo fixado no programa de trabalhos.... Esta atribuição de carácter urgente, apenas visa possibilitar a entrada de bens a expropriar na disponibilidade imediata do expropriante a fim de não atrasar a realização das obras de utilidade pública, pelo que este apenas se reflecte na realização de determinadas diligências que visam atingir aquele objectivo -cfr. Ac. do STJ. de 2/7/96, in BMJ., nº.459º, pág.437. Tecidas estas considerações, vejamos se existem ou não razões para a suspensão do processo expropriativo. Dispõe o nº.1, do artº.279º, do Código de Processo Civil que, o tribunal pode ordenar a suspensão da instância por dois motivos: um quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta; e outro quando o juiz concluir pela existência de motivo justificado. Ora, no que respeita à causa prejudicial, parece que esta deverá estar instaurada, no momento em que se ordena a suspensão, não relevando a circunstância de ainda não estar proposta no momento em que se instaurou a causa dependente -cfr. Ac. da RP. de 12/1/99, proferido no processo nº...../.. da 2ª. sec., disponível na Internet, no site da DGSI, sob o nº.RP............ E uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda -cfr. Alberto dos Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. III, pág.268. Verifica-se, ainda um nexo de dependência ou prejudicialidade, justificativa da suspensão da instância, quando a decisão ou julgamento de uma acção é atacada ou afectada pela decisão ou julgamento emitido noutra -Alberto dos Reis, citado no Ac do STJ. de 18/2/82, in BMJ. 314º, pág. 267. Para Rodrigues Bastos, in Notas ao C.P.Civil, vol. II, pág. 45, a decisão de uma causa depende da decisão de outra , quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para decisão de outro facto. Também o julgador não pode suspender a instância em qualquer processo, “ad libitum”, invocando a existência de uma causa prejudicial, mas deverá antes ter em conta e acautelar a possibilidade de decisões contraditórias, acautelar os interesses reais e legítimos das partes e o princípio da utilidade, traduzido em maiores vantagens do que inconvenientes, a que deve acrescentar o princípio da justiça e da legalidade, tendo em conta a consciência social dominante -cfr. Ac. da RP., de 28/6/99, proferido no processo nº..../.., da 5ª. sec., disponível na internet, no site da DGSI., sob o nº.RP.............. Ora, dos autos, apesar do carácter urgente declarado no anúncio e de este haver sido publicado em 7 de Março de 2000, alcança-se que a decisão arbitral, só em 19 de Janeiro de 2001, foi efectuada, isto em verdadeiro desrespeito pelo estatuído na al. b), nº.2, do artº.42º, do C.E., e, quando já havia sido instaurada providência cautelar de restituição provisória de posse contra a expropriante, a qual veio a ser decretada por decisão de 11/1/2001 e já havia sido proposta, em 7/11/2000 acção declarativa contra a expropriante, pedindo a caducidade do carácter urgente da expropriação. Desta forma, a agravante, apenas se deverá queixar de si mesma pela inércia que teve durante todo este tempo com o acto expropriativo, pois, se esperou um ano para remeter o processo ao Tribunal, bem poderá agora esperar alguns meses para que seja apreciada a questão prejudicial. Por isso, não vemos razões para alterar a decisão recorrida, dado que a razão de ser da suspensão por dependência de causa prejudicial é a economia processual e a coerência de decisões. Improcedem, pois, as conclusões da agravante. Assim: Decide-se negar provimento ao recurso e confirma-se a decisão recorrida. Sem custas, dada a isenção das mesmas pela agravante. Porto, 26 de Novembro de 2001 Bernardino Cenão Couto Pereira António Augusto Pinto dos Santos Carvalho José Ferreira de Sousa |