Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0617060
Nº Convencional: JTRP00040073
Relator: PAULO VALÉRIO
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RP200702210617060
Data do Acordão: 02/21/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: REJEITADO O RECURSO.
Indicações Eventuais: LIVRO 475 - FLS 17.
Área Temática: .
Sumário: Da decisão do tribunal de 1ª instância que decida a impugnação da decisão administrativa sobre o pedido de apoio judiciário, não cabe recurso para o Tribunal da Relação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO (Tribunal da Relação)
Recurso n.º 7060/06
Processo n.º …./06.8TDPRT-A
Em conferência na 1.ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto
1- No Tribunal de Instrução Criminal do Porto, ..º juízo, no processo acima referido, veio o arguido B………. deduzir o pedido de apoio judiciário, na modalidade de isenção de pagamento de taxa de justiça e custas e nomeação de defensor, o que foi indeferido por despacho da Segurança Social, cuja cópia está a fls 9 e sgs, com o fundamento de que o requerente, apesar de para tal notificado, não juntou toda a documentação necessária à apreciação da sua situação económica.
Interposto recurso para o tribunal judicial, este, por despacho de fls 79-80, julgou o mesmo improcedente, concordando com os fundamentos invocados na decisão administrativa

2- Inconformado, recorreu este requerente, tendo concluído a sua motivação pela forma seguinte:
O art.° 101.º do Código de Procedimento Administrativo, no seu n.° 2, exige que se alinhem de forma clara os fundamentos, de facto e de direito, em que se ancora o projecto de indeferimento da petição em apreço, e só assim o interessado poderá alegar com rigor e eficácia, responder com objectividade à autoridade administrativa, mormente dando a prova indispensável a sanar qualquer dúvida subsistente, logo tal fundamentação é essencial;
Essa falta foi expressamente invocada na impugnação judicial submetida ao juízo do tribunal a quo, que sobre ela se não pronunciou, violação da lei cominada com nulidade, segundo o disposto no art. 379.°, n.° 1, alínea c) do CódProcPenal, sendo que interpretação diferente das sobreditas normas violará os imperativos dos art. 202.°, n.°s 1 e 2, 203.° e 268.°, n.° 1, 3, 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa,
O recorrente entregou todos os documentos que lhe foram solicitados dentro do que é possível e que os seus rendimentos e de seu agregado familiar estão claramente expressos em sede de declaração fiscal de rendimentos dada ao processo administrativo a qual se presume verdadeira segundo as regras do n.° 2 do art.° 74.° da Lei Geral Tributária, tanto mais que não podem ser exigidos documentos sobre factos inexistentes, que não se pode presumir que existam, tampouco quanto a documentos que a própria lei dispensa, por esvaziamento legal em face da inaplicabilidade dos Código de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o Decreto-Lei r.° 394-B/94, de 26 de Dezembro, e Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC, Decreto-Lei n.° 442-B188, de 30 de Novembro, cuja entrada em vigor é contemporânea e posterior, respectivamente, à data da fiscalmente certificada cessação de actividade da sociedade "C……….. Lda”;
A própria Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho prevê, no n.° 2 do art.° 20.°, em caso de séria e impossibilitante dúvida uma forma alternativa de apurar a situação de insuficiência económica alegada pelo recorrente e sobrestar a qualquer dificuldade, o que não foi feito pela autoridade administrativa, tampouco o Tribunal a quo o ordenou fazendo regredir o processo administrativo;
Pelo que carece a douta decisão recorrida de revogação e substituição por outra que reconheça a invocada nulidade por omissão de pronúncia com as necessárias consequências emergentes da lei ou reavalie, segundo o princípio da simplicidade dos actos, a prova apresentada ao longo de todo o processado e o direito aplicado

3- Nesta Relação, o Exmo PGA conclui pela inadmissibilidade do recurso à luz da lei em vigor

4- Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a conferência

5- A primeira questão suscitada nos presentes autos, que é prévia ao conhecimento das questões invocadas no recurso, traduz-se em saber se o despacho da 1:ª instância é, ou não, recorrível, à luz da actual lei da protecção judiciária, questão que aliás foi suscitada no despacho do tribunal recorrido que admitiu, com dúvidas, o presente recurso.
Do disposto no art. 26.º da LPJ (Lei de Protecção Judiciária, Lei n.º 34/2004, de 29-7) resulta que «1 - A decisão final sobre o pedido de protecção jurídica é notificada ao requerente e, se o pedido envolver a designação de patrono, também à Ordem dos Advogados. 2 - A decisão sobre o pedido de protecção jurídica (...), sendo susceptível de impugnação judicial nos termos dos artigos 27.º e 28.º». E depois dispõe o art 28.º dessa lei: «1 - É competente para conhecer e decidir a impugnação o tribunal da comarca em que está sediado o serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica ou, caso o pedido tenha sido formulado na pendência da acção, o tribunal em que esta se encontra pendente (...) 4 - Recebida a impugnação, esta é distribuída, quando for caso disso, e imediatamente conclusa ao juiz, que, por meio de despacho concisamente fundamentado, decide, concedendo ou recusando o provimento, por extemporaneidade ou manifesta inviabilidade».
Comentando este último artigo, escreve Salvador da Costa (O Apoio Judiciário, Edição Actualizada e Ampliada, 5.ª ed.), que «Como foi eliminado o segmento normativo que constava da lei anterior relativo à competência do tribunal de 1ª instância para decidir a impugnação em última instância, é configurável a conclusão no sentido de que ficou aberta a possibilidade de recurso para a Relação da sentença que decidiu a impugnação, nos termos gerais... Todavia, tendo em atenção a natureza da matéria em causa, a expressão da lei, a brevidade legalmente prevista para o procedimento em causa e o respectivo antecedente histórico, pensamos não haver recurso para o tribunal de segunda instância da decisão proferida pelo tribunal de primeira instância em impugnação da decisão administrativa.»
E neste mesmo sentido se pronunciaram as decisões deste Tribunal da Relação, citadas no parecer do MP na 1.ª instância, datadas de 02/04/2006 e 13/07/2006, (publicadas em www.dgsi.pt) e da Relação de Coimbra, de 24-5-2006 (www.dgsi.pt).
Como bem refere aquele autor, a Lei de Apoio Judiciário n.º 30-E/2000, de 20-12, estatuía no seu art. 29.º-1 que, havendo recurso da decisão administrativa, era «competente para conhecer e decidir o recurso em última instância o tribunal da comarca (...), o que sempre foi entendido como significando que o tribunal de comarca decidia definitivamente do pedido de apoio judiciário, portanto não havendo recurso para a segunda instância judicial.
Sendo as decisões judiciais impugnáveis por meio de recurso, está no entanto a sua admissibilidade condicionada em função de limites objectivos, designadamente pela natureza dos interesses envolvidos, da menor relevância das causas ou da repercussão económica para a parte vencida (art.º 678º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil), e a garantia do acesso ao direito e aos tribunais (art. 20.º-1 da CRP) não implica a generalização do duplo grau de jurisdição, dispondo o legislador ordinário de ampla liberdade de conformação no estabelecimento de requisitos de admissibilidade dos recursos, como tem decidido o Tribunal Constitucional, que, distinguindo o duplo grau de jurisdição do duplo grau de recurso, diz que aquele (o duplo grau de jurisdição) traduz-se na existência de um único recurso, enquanto o duplo grau de recurso implica a consagração de dois recursos, o que se traduz na intervenção de três instâncias decisórias. Para concluir que o direito ao recurso postula meramente o duplo grau de jurisdição (cfr Acs TC n.º 49/2003, DR, 2.ª série, de 16 de Abril de 2003, pp. 5929 e 5930; Ac n.º 390/2004, DR, 2.ª série, de 7 de Julho de 2004, pp. 10 215-10 221).
E, na verdade, nos casos de menos importância e em que se impõe uma decisão mais rápida, a tutela dos direitos e interesses em jogo está plenamente assegurada com a consagração de um único recurso para uma entidade judicial.
Depois, como refere o AcRC, de 24-5-2006, já citado, seria estranho que não permitindo a lei anterior o recurso para a Relação, o legislador da Lei n.º 34/2004 tivesse o propósito de retomar o modelo da impugnação para a Relação. Se fosse essa a intenção, decerto não deixaria de o dizer. Porque, como bem refere o Sr PGA no seu doto parecer de fls 107, «A Lei n° 34/2004 (...), apesar de ter eliminado a expressão "última instância", (...) não introduziu alterações na estrutura básica de impugnação de decisão e dos fundamentos da decisão, em sentido positivo ou negativo, sobre o pedido de protecção jurídica e, por isso, não se pode concluir que, por via dela, passou a ser admitido recurso da decisão, que recaiu sobre a impugnação, para a Relação (...)»

6- Pelos fundamentos expostos:
I- Rejeita-se o recurso, por inadmissível.

II- Custas pelo recorrente, com 3 Ucs de taxa de justiça
-
-
-
-
Porto, 21 de Fevereiro de 2007
Jaime Paulo Tavares Valério
Luís Augusto Teixeira
Joaquim Arménio Correia Gomes