Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
490/10.3IDPRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA DOLORES DA SILVA E SOUSA
Descritores: MEDIDAS DE COACÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE
Nº do Documento: RP20120704490/10.3IDPRT-A.P1
Data do Acordão: 07/04/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: A nulidade prevista no art. 194 n.º 4 do CPP, a mesma tem de ser arguida no próprio acto a que o interessado assista e antes de esse acto ter terminado (ver artigos 120 n.º 3-a) e 141 n.º 6 do CPP), sob pena de ficar sanada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 490/10.3idprt-A.P1
Porto
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto.

I. RELATÓRIO
1. B…, nos autos acima referenciados, e ali melhor identificados, não se conformando com o despacho judicial de 28 de Março de 2012, que lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva, findo o primeiro interrogatório judicial, veio do mesmo interpor recurso, com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«Nestes termos e nos demais de direito que V.Ex.as suprirão, deve o despacho recorrido ser revogado porquanto:
Em consequência:
Venerandos Desembargadores,
Tendo por base o disposto no artigo 32º, nº 2 da Constituição da República, segundo o qual todo o Arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação e atendendo ao normativo penal vigente é forçoso sublinhar o carácter excepcional da medida de coacção mais gravosa prevista na lei: a prisão preventiva. Efectivamente, na senda da presunção de inocência se situam as disposições do artigo 27º e do artigo 28º da CRP e o Código de Processo Penal em vigor.
Conclusões:
1.A manutenção da prisão do Requerente atenta contra os direitos e sentimentos de Justiça, causa verdadeiro alarme social e afecta a credibilidade da Justiça.
2.Trata-se de um mero peão, cidadão anónimo não conotado com interesses económicos, grupos ou actividade de natureza empresarial.
3.Note-se que na semana em que foi sujeito a 1º. Interrogatório e cuja prisão foi determinada, foi publicitado estudo, em que se conclui que nas cadeias Portuguesas estão apenas presos duas pessoas por crimes desta natureza.
4.Foi aliás na sequência de buscas a diferentes laboratórios e farmácias que o mesmo foi publicitado (sendo que nem sequer foi presente ninguém a 1º. Interrogatório).
Sem prejuízo:
Não vislumbra a defesa, as razões de facto e de direito que justificaram tal medida sendo a nosso ver o despacho nulo por deficiente fundamentação. Inexistindo quanto a si elementos objectivos que permitam indiciá-lo por crimes de branqueamento e associação criminosa.
Vejamos:
O crime que legitimou o presente processo teve início com o facto de várias firmas nos autos identificadas, ao longo de vários anos, não procederem ao pagamento de impostos devidos.
O arguido nunca teve ligação formal ou material mesma nunca exerceu qualquer cargo é omisso por inexistente ao processado mais só conhece os arguidos há muito pouco tempo (alguns).
A sua formação escolar é básica, não tem conhecimentos técnicos nesta área, não tinha obrigação nem de facto nem de direito de pagar IVA IRS e IRC, relativamente a uma empresa da qual não é sacio, nunca teve qualquer cargo, nem sequer esteve na sede.
Constata-se da investigação que se limitou em período de tempo restrito (cerca de três meses a "guardar" mercadoria cuja aquisição tinha financiado o que não negou, constatando directamente e por terceiros que C… se preparava para não proceder ao pagamento tentou reter a mesma até ulterior pagamento, conduta justificável, tendo em conta o valor que havia emprestado e os tempos que correm em que as "insolvências" abundam diariamente.
Mais,
Entende a defesa que resulta que o propósito criminoso foi iniciado por terceiros e que o mesmo prosseguiria com ou sem o seu surgimento prova por demais evidente são as inúmeras empresas dadas a conhecer os valores e montantes devidos.
Ademais,
O recorrente aparece numa única empresa, não lhe sendo exigível outro dever de cuidado mormente nesta matéria, por absoluto desconhecimento.
Nunca poderá o recorrente ser co autor.
Quando muito mero cúmplice, mas circunscrito ao período temporal invocado e aos factos cometidos. A responsabilidade penal não é colectiva mas individualizada à culpa de cada um.
Mais,
Tratando-se de crime de natureza económica, o pagamento da quantia em falta obsta à punição, se constámos que o período em que o recorrente aparece ainda está em prazo para pagamento de IVA, pois só lhe poderá ser exigida responsabilidade no período de tempo indicado e não mais.
O despacho de que se recorre é igualmente nulo, no que se refere aos invocados perigos:
Na verdade,
lnexiste perigo de fuga:
Foi o arguido sem ser buscado que remeteu requerimento ao processo a disponibilizar-se para ser ouvido.
Foi este que compareceu pelos seus próprios meios.
Foi este que se voluntariou para comparência.
Sendo certo que não foi buscado nem objecto de busca.
Bastou-se a acusação por presumir perigo de fuga na sequência de telefonema efectuado pela mulher alertando-o para o processado.
Mas pergunta a defesa a postura do arguido após não contraria o por esta aconselhado é óbvio que sim.
Mais, conforme o por este referido a sua morada consta na sua carta de condução, no seu bilhete de identidade tem três filhos na escola, não era nem nunca foi sua intenção ausentar-se, sendo que nem sequer foi buscado.
O mesmo se diga quanto ao alegado perigo de continuação de actividade criminosa Como o poderia fazer se não tem os contactos, os fornecedores, os clientes, os conhecimentos etc.
E no que concerne ao perigo de perturbação do inquérito:
Consta a fls. 2394 aliás a requerer a especial complexidade as inúmeras contas bancárias apreendidas os documentos fiscais as guias de transporte a documentação apreendida, ora é elementar e inequívoca que nos presentes autos a prova é essencialmente documental e esta já ai se encontra a ser trabalhada analisada e escamoteada, o que tendo em conta a data de instauração do inquérito e noticia dos factos é fácil deduzir que em nada o arguido pode obstar à normal prossecução.
5.O requerente trabalha, tem esposa, disposta a apoiá-lo que em obediência aos princípios da proporcionalidade adequação sempre seria de não cominar ao mesmo medida privativa da liberdade ainda que com aplicação e caução em valor a fixar o que expressamente se requer.
6.O douto despacho apresenta-se-nos de uma forma genérica no que ao recorrente concerne, fundamentando-se numa parceria inexistente e num contrato de arrendamento de um armazém que tinha poucos dias.
7.A privação da sua liberdade - p. p. - traz sequelas e prejuízos irreparáveis na inserção social do arguido, nomeadamente porque a sua situação laboral ainda é precária e o mercado de trabalho atravessa uma crise que não facilitará a sua rápida inserção no activo.
8. Trata-se de um cidadão integrado. Pai de três filhos. Sem antecedentes desta natureza ou outros.
Foi ainda violado o principio da igualdade de tratamento verificando-se critérios diferentes,
Pois, constata o arguido que outros fortemente indiciados tiveram medida de coacção sobremaneira diferente da sua mormente a companheira do C…,
Pelo que a ter-se entendimento contrário sempre será de sujeitar o arguido à medida de permanência na habitação com recurso a mecanismos de vigilância electrónica pelo que requer que seja elaborado o competente relatório de aplicabilidade.
9. Aliás, estes vínculos - familiar e laboral - indiciam a ausência de qualquer intenção de fuga, tanto para mais que este fora notificado para comparecer à Constituição de arguido e compareceu pronta e atempadamente neste tribunal.
10. A ausência de indícios fortes da acusação coadjuvada com a previsão - hipotética -de uma condenação pelo mínimo (atento o facto de ser um delinquente primário e até mesmo a gravidade dos factos e a própria natureza do crime em questão) só por si justificam a excessividade da medida de coacção aplicada.
11. Face aos condicionalismos pessoais do arguido, à manifesta deficiência da acusação, à não verificação dos pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal deveria o Requerente, ter sido restituído à liberdade imediatamente.
DEVE SER APLICADA AO ARGUIDO MEDIDA DE COACÇÃO NÃO PRIVATIVA DE LIBERDADE, NO MAXIMO SER APLICADA A OBRIGAÇÃO DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO COM RECURSO A VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA.
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O Mº Pº junto do Tribunal recorrido (fls. 2899 a 2904) respondeu ao recurso pugnando pela manutenção do Despacho sob recurso.
O recurso foi admitido por despacho constante dos autos a fls. 2905.
Nesta Relação o Exmo. PGA não emitiu parecer.
Efectuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso, o qual foi bem admitido e no efeito adequado.
Foram colhidos os vistos e realizada a conferência, pelo que cumpre decidir.
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II- Fundamentação.
Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido - artigo 412.º, n.º 1, do CPP -, que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
1.-Questões a resolver
I. Nulidade do despacho sob recurso, por deficiente fundamentação.
II. Dos fortes indícios da prática pelo arguido dos crimes que lhe foram indiciariamente imputados.
III.- Dos perigos concretos de continuação da actividade criminosa e perigo de perturbação do inquérito
IV.- Para obstar aos perigos evidenciados averiguar se é adequada, suficiente e proporcional a medida coactiva de apresentação periódica, ainda que com caução, ou em último caso a medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica.
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2.- Despacho recorrido:
«Nos termos da prova e factos introduzidos a juízo por despacho do Mº. Pº. que antecede, cometeram os arguidos:
C…, D…, B…, E…, F…, G…, I…, H…, J…, K…, em co-autoria material, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo art. p. e p. pelo art. 104º e 104º-2-a)-3 do RGIT, alterado recentemente pela Lei nº 64-B/2011, de 30.12, de branqueamento, p. e p. pelo art. 368º-A-2 e de associação criminosa, p. e p. pelo art. 299º-2-3, ambos do CP;
E os arguidos:
L…, M…, N…, O…, P…, Q…, S…, como cúmplices, um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo art. p. e p. pelo art. 104º e 104º-2-a)-3 do RGIT, alterado recentemente pela Lei nº 64-B/2011, de 30.12 e de associação criminosa, p. e p. pelo art. 299º-2 do CP.
E as sociedades "T…, Lda." (NIPC ………), "U…, Lda." (NIPC ………), "V…, Lda." (NIPC ………), W… (NIF ………), "X…, Lda." (NIPC ………), "Y…, Lda." (NIPC ………), "Z…, Lda." (NIPC ………), "AB…, Lda." (NIPC ………), por força do disposto no art. 7º do RGIT incorreram na prática de um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelo art. p. e p. pelo art. 104º e 104º-2-a)-3 do mesmo Código.

Dos factos:
Dos autos resulta fortemente indiciado que o arguido C… é o mentor de uma organização que se dedica pelo menos desde 2006 até ao presente a efectuar, através de empresas nacionais-pessoas colectivas e singular-aquisições de pneus provenientes de Espanha, França, Bélgica, Holanda e Alemanha, operadores estes que declaram as transmissões intracomunitárias para Portugal, e depois na posse da mercadoria e através de uma rede montada para o efeito, vendem esses pneus a pessoas singulares e colectivas sem emitirem as respectivas facturas, ou fazendo-o exarando valores e quantidades não correspondentes à realidade, escapando assim estas vendas ao conhecimento da Administração Fiscal.
Este esquema está centrado na não declaração ao Estado Português das aquisições intracomunitárias de bens (AICB´s) pelas sociedades usadas nas transacções comerciais, bem como na não inclusão das vendas efectuadas nas respectivas declarações periódicas apresentadas.
É que as aquisições intracomunitárias de pneus efectuadas no território nacional, a título oneroso, pelos indivíduos que fazem parte desta organização em nome das empresas nacionais às empresas vendedoras de pneus de Espanha, França, Bélgica, Holanda e Alemanha estão sujeitas a IVA, conforme resulta do disposto no art. 2º-1-a) do RITI.
Estas aquisições de pneus são tributáveis em Portugal, país onde está situado o lugar da chegada da expedição dos pneus, conforme resulta do disposto no art. 8º-1 do RITI.
Nas aquisições intracomunitárias o imposto (IVA) é devido no momento em que os bens são colocados á disposição do adquirente e torna-se exigível no 15º mês seguinte àquele em que o imposto é devido, conforme resulta do disposto nos arts. 12º-1 e 13º-1-a) do RITI.
Para concretizar este plano o arguido C… exercia e exerce a gerência de facto de empresas nacionais e conta para isso com a ajuda de um conjunto de pessoas que fazem parte de uma organização, as quais desempenham funções específicas e essenciais nestas operações, tendo todos em vista adquirirem aos Fornecedores dos países atrás referidos pneus que depois vendem a pessoas singulares e colectivas nacionais, escapando estas aquisições e vendas ao conhecimento da Administração Fiscal.
Assim para além do arguido C… fazem parte desta organização os arguidos D…, B…, E…, F…, G…, I…, H…, J…, K…, L…, M…, N…, O…, P…, Q… e S….
O arguido C… acompanha de perto e no terreno todos os descarregamentos de pneus efectuados, controlando a quantidade de mercadoria recebida, conforme resulta do relato de diligência externa de fls. 210 do Volume I dos autos (Fotos nº/s 7, 9, 11, 13, 16, 21, 29, 32, 36, 41, 42, 45, 46) e Registo de Imagens dos dias 21.10.2011 (Fotograma 121), 31.10.2011 (Fotograma 168), 14.11.2011 (Fotogramas 324 a 326 e 332), 15.11.2011 (Fotograma 338), 30.11.2011 (Fotogramas 283, 284, 290), 19.12.2011 (Fotogramas 389 e 390), 21.12.2011 (Fotograma 414) e 26.12.2011 (Fotograma 447) e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
O braço direito do arguido C… é a sua esposa, D…, de nacionalidade brasileira, a qual trata das encomendas dos pneus e da parte financeira da operação, ou seja compete-lhe efectuar os pagamentos aos fornecedores de pneus intracomunitários, cabendo-lhe ainda recrutar cidadãos brasileiros que são os testas-de-ferro da maior parte das empresas nacionais utilizadas no esquema, conforme resulta da sessão nº 1323, da intercepção de comunicações efectuada ao cartão da AC… com o nº ………-Alvo 49720M (utilizado por G…) e da sessão nº 3345 da intercepção de comunicações efectuada ao cartão da AC… com o nº …….. - Alvo 49720M (utilizado por G…) e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Esta arguida assume um papel preponderante no seio da estrutura organizacional e está presente nas instalações/bases operacionais nos dias em que são feitos os descarregamentos, sendo receptora nas suas contas pessoais de avultadas somas monetárias oriundas de contas tituladas pela sociedade "X…", conforme resulta da sessão nº 1603, da intercepção de comunicações efectuada ao cartão da AC… com o nº ……… - Alvo 2H189M (utilizado por C…) e do Relato de Diligência Externa de fls. 210 e segs. do Volume I dos autos (fotos nº/s 41, 43, 47 e 48), e registo de imagens dos dias 20.10.2011 (Fotogramas 102 e 103), 21.10.2011 (Fotogramas 157 e 159), 28.11.2011 (Fotogramas 265), 28.11.2011 (Fotograma 265), 29.11.2011 (Fotogramas 272 a 275, 279 e 280) e 26.12.2011 (Fotograma 439) e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

Do arguido B…
Ao lado deste figura o primo de C…, o arguido B…, que participa e injecta dinheiro nas operações, permitindo ao primeiro efectuar encomendas conjuntas de pneus com este primo em grandes quantidades alcançando por isso preços mais baixos.
Este arguido é responsável pelo armazém (base operacional) sito na Rua …, nº …, …, para o qual são descarregados os pneus oriundos dos Fornecedores intracomunitários, tendo permitido a passagem das instalações (base operacional) sitas em …, …, Vila Nova de Gaia, para estas novas instalações que têm um portão de acesso que não permite visualizar as descargas e cargas de pneus.
As rendas das instalações sitas na Rua …, nº …, …, são pagas à vez pelo arguido C… e pelo primo B…, conforme resulta do conteúdo das intercepções de comunicações da sessão nº 5 ao cartão com o nº ………, Alvo 2M425 utilizado por este B… e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Assim o arguido C… e o primo têm uma parceria de negócios, utilizando inclusive os mesmos meios de transporte para fazer as distribuições dos pneus oriundos de fornecedores intracomunitários no mercado nacional.
O arguido B… à semelhança do primo C… controla os pagamentos efectuados pelos clientes e apressa até o recebimento do dinheiro para poder rapidamente fazer novas encomendas junto dos fornecedores intracomunitários.
Este arguido também faz depósitos nas diversas contas bancárias tituladas pelas empresas usadas na actividade ilícita e tem a trabalhar consigo o seu colaborador I…, o qual é responsável pela organização das operações, dos contactos com fornecedores e clientes e com as vendas dos pneus.
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Num patamar abaixo, em termos de hierarquia na estrutura da organização surge o arguido E…, irmão do arguido C…, que tem a seu cargo um dos armazéns (base operacional) de descarregamento de pneus oriundos de operadores intracomunitários, sito na Rua …, nº …, …, VNGaia, competindo-lhe também acompanhar o descarregamento dos camiões de pneus, conforme resulta do Registo de Imagens de 30.11.2011 e a sessão nº 274 e 276 das intercepções de comunicações respeitantes ao Alvo 2M716M – F… e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
O arguido E… substitui o irmão C…, quando este se encontra impossibilitado, nos descarregamentos dos camiões TIR, conforme resulta das imagens dos dias 7.11.2011 (Fotograma 218), 14.11.2011 (Fotograma 332), 25.11.2011 (Fotogramas 259 e 260), 15.12.2011 (Fotogramas 352 e 353), 19.12.2011 (Fotograma 386), 20.12.2011 (Fotograma 399) e sessões nº/s 419, 421, 422, 429, 437 do dia 1.12.2011, 563 do dia 2.12.2011, 2093, 2095 do dia 15.12.2011 do DVD nº 1 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ……… utilizado por F… e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
Numa posição inferior na estrutura da organização estão as funcionárias do arguido C…, as arguidas F… e G…, as quais são as responsáveis pela organização das operações, dos contactos com fornecedores e clientes e com as vendas dos pneus.
A arguida F… é a funcionária de confiança do arguido C… e trata da parte administrativa das aquisições e vendas dos pneus, ou seja, recebe as encomendas de clientes, controla os "stocks" dos pneus, efectua encomendas junto dos fornecedores intracomunitários e combina com aquele arguido as quantidades de pneus que é necessário encomendar, preços de custos e preços a praticar no mercado com as respectivas margens de lucro, conforme resulta da sessão nº 2131 do dia 15.12.2011 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ……… utilizado por F… e que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
Esta arguida juntamente com G… trata ainda das operações bancárias, organiza os carregamentos de pneus para distribuir aos clientes - dá conhecimento acerca do dia e hora de chegada dos camiões que descarregam os pneus; informa os funcionários das carrinhas e os clientes da chegada dos mesmos; vai para o terreno entregar a mercadoria; controla com o arguido C… a chegada dos pneus - , conforme resulta das sessões transcritas das intercepções de comunicações do seu cartão telefónico com o nº ……… e Relato de Diligência Externa de fls. 210 e segs. do Volume I dos autos (Foto nº 51), bem como do Registo de Imagens dos dias 17.10.2011 (Fotogramas 62 e 63), 20.10.2011 (Fotograma 97), 31.10.2010 (Fotograma 173), 25.11.2011 (Fotograma 262), 28.11.2011 (Fotograma 264), 29.11.2011 (Fotograma 282), 26.12.2010 (Fotogramas 442 e 443) que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Por seu turno a arguida G… surge no seio da organização como sócia-gerente da sociedade "Z…, Lda.".
Esta arguida desempenha juntamente com os arguidos H… e J… as funções de vendedora, competindo-lhes escoar o material que os arguidos C… e o primo deste, B…, compram aos fornecedores intracomunitários.
Para além desta função esta arguida tem a seu cargo as questões financeiras, tendo conhecimento de todas as contas bancárias envolvidas nestas operações.
Esta arguida tem um conhecimento razoável do tipo de pneus, características e preços que o arguido C… vende, conhece as margens/comissões praticadas, gere as encomendas a efectuar aos fornecedores intracomunitários, recebe dinheiro ou cheques dos clientes, sendo frequente indicar-lhes a identificação das contas bancárias para as quais devem efectuar o pagamento, por vezes usa as suas contas pessoais para fazer circular esses valores que passam novamente para as contas das empresas, conforme resulta das sessões nº/s 543 do dia 2.12.2011, 1778 do dia 12.12.2011 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº …….. utilizado por F… e sessão nº 127 do dia 29.11.2011 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ……… utilizado por F… que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Além disso esta arguida articula-se com a arguida D… e F… nas operações bancárias efectuadas junto dos bancos, principalmente quando é necessário efectuar os pagamentos aos fornecedores intracomunitários e tem na sua disponibilidade os cartões com os códigos de segurança para efectuar as transferências bancárias, conforme resulta das sessões nº/s 233, 234 do dia 30.11.2011, da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ……… utilizado por F… e das sessões nº/s 1769, 1776, 1781, 1811 do dia 12.12.2011 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ……… utilizado por F… e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Esta arguida dá ordens aos funcionários que andam na rua a distribuir pneus aos diversos clientes e está sempre em contacto com o arguido C… e quando ocorrem descarregamentos desloca-se aos locais onde afluem os camiões TIR, conforme resulta das sessões nº/s 539 e 540 do dia 02/12/2011, 563 do dia 02/12/2011, 564, 565, 567, 568 do dia 02/12/2011, da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F… e do Relato de Diligência Externa de 06/09/2011, inserto a fls. 210 e seguintes do volume 1 dos autos (Fotograma 42) e Registo de Imagens dos dias 21/10/2011 (Fotogramas 116 e 127), 07/11/2011 (Fotograma 209), 15/11/2011 (Fotogramas 338 e 339), 29/11/2011 (Fotograma 281), 30/11/2011 (Fotogramas 284 e 290), 02/12/20111 (Fotogramas 305, 307 e 308) e 26/12/2011 (Fotogramas 442 e 443) e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Com funções semelhantes a estas arguidas aparece na estrutura da organização o arguido I… que já foi referido anteriormente como funcionário de B…, primo do arguido C….
Este arguido trabalha nas instalações (base operacional) sitas na Rua …, nº …, ….
As suas funções consistem em efectuar as reservas de pneus do "stock" existente no armazém a pedido da arguida F…, controlar a quantidade de pneus que ali são descarregados, ajudar no carregamento das carrinhas que ai se deslocam, realizar depósitos nas contas bancárias que o arguido B… está a usar - "Z…, Lda." - e efectuar encomendas directamente a fornecedores intracomunitários, conforme resulta da sessão n.º 5340 do dia 30/12/2011 da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F…), das sessões n.º s 5107, 5180, do dia 29/12/2011, 563 do dia 02/12/2011, 564, 565, 567, 568 do dia 02/12/2011, da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F… e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Num patamar abaixo da organização estão situados os vendedores dos pneus, os arguidos H… e J…, cabendo ao primeiro as vendas na zona mais central do país e ao segundo as vendas na parte Sul do país, ou seja, Fátima, Lisboa, Alentejo
O arguido H… é colaborador de longa data do arguido C… e consta como funcionário da sociedade "T…, Lda." nos anos de 2001 e 2002 e da "Y…, Lda." entre os anos de 2006 a 2010.
Este arguido desempenha as funções de vendedor, gere a sua carteira de clientes, angaria novos clientes e visita regularmente empresas e oficinas, potenciais compradores dos pneus.
H… sempre que tem encomendas contacta a arguida F…, a qual procede ao seu registo, e procura assegurar o fornecimento atempado dos pneus nas instalações dos compradores, conforme resulta das sessões n.º s 113, 151 do dia 29/12/2011, 604 do dia 02/12/2011, 4349, 4354, 4358, 4376, 4399 do dia 26/12/2011, 5034, 5159 do dia 29/12/2011, 5340 do dia 30/12/2011, 6219, 6242 do dia 02/01/2011, da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F… e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
Nas suas várias deslocações utiliza a sua própria carrinha - "Peugeot …" com a matrícula ..-..-ZA - para carregar e entregar alguns pneus aos clientes e quando chegam os camiões costuma deslocar-se até ao local de descarga para ajudar a carregar os pneus para as diversas carrinhas, conforme resulta dos Registo de Imagens, nomeadamente, dos dias 20/10/2011 (Fotogramas 90.98, 99 e 100), 21/10/2011 (Fotograma 115) e 07/11/2011 (Fotograma 208).
H… recebe dinheiro dos clientes e depois entrega-o essencialmente aos arguidos C…, F… e G…, conforme resulta do Relato de Diligência Externa de fls. 210 e seguintes do Volume1 dos autos, foto n.º 30 e que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
O arguido J… ocupa uma posição na estrutura organizacional na estrutura piramidal equiparada ao arguido H…, ou seja, compete-lhe fazer escoar a mercadoria pelos diversos clientes, efectuar encomendas á arguida F…, a quem pergunta os melhores preços para pneus que lhes são solicitados e ainda receber dinheiro quando são efectuadas as entregas, dando conta disso, principalmente àquela, conforme resulta da análise da intercepção de comunicações do cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F… - sessão n.º 107 do dia 29/11/2011, 239 do dia 30/11/2011, 1247 do dia 05/12/2011, n.º 168 do dia 29/11/2011, 2106 do dia 15/12/2011 e que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Por seu turno o arguido K… é funcionário de há longa data do arguido C…, estando ao serviço deste pelo menos desde 2008 através da "Y…, Lda.", estando registado na segurança social como trabalhador desta sociedade.
Compete a este arguido ajudar nos descarregamentos dos camiões TIR que chegam às instalações (bases operacionais), proceder á entrega dos pneus aos clientes, efectuar pagamentos, articulando-se para o efeito com a arguida F…, conforme resulta das sessões nº/s sessões n.º s 152 e 157 do dia 29/12/2011, 274 e 276 do dia 30/11/2011, 563 do dia 02/12/2011, 2093, 2095 do dia 15/12/2011, 4349, 4354, 4358, 4376 do dia 26/12/2011 e 4438 do dia 26/12/2011, da intercepção de comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o n.º………, utilizado por F… que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais.
Para ajudar a carregar e a descarregar os pneus dos veículos esta organização conta com os préstimos de I… e AD…, funcionários do arguido C…, conforme resulta da intercepção de comunicações do cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por F… - sessões nºs 563, 564, 565, 567, 568 do dia 02/12/2011 e sessão n.º 4438 do dia 26/12/2011 e da sessão n.º 6242 do dia 02/01/2012.
Na base da pirâmide desta organização estão os cidadãos brasileiros recrutados pela arguida D…, os quais a troco de uma quantia monetária assumem a qualidade de gerentes das pessoas colectivas e da empresa singular, sem desempenharem de facto essas funções, conforme resulta da sessão n.º 132 do dia 03/02/2012 da intercepção de comunicações efectuada ao cartão telefónico com o n.º ………, utilizado por G… e que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
Dos arguidos L…, M…, N…, O…; P…, Q… e S…:
Estes cidadãos brasileiros são os arguidos L…, M…, N…, O…, P…, Q… e S….
Os arguidos P… e O… são irmãos da arguida D… e cunhados do arguido C…, conforme resulta das fichas de identificação de clientes da conta do AE… tituladas pela sociedade "V…" e que constam do Anexo Informação Bancária - Bancos Respostas Positivas de fls. 3, documentos esses que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
As empresas nacionais (pessoas colectivas e singular) utilizadas pelo arguido C… e pelos elementos da sua organização para efectuarem as aquisições intracomunitárias são a "T…, Lda." (NIPC ………), "U…, Lda." (NIPC ………), "V…, Lda." (NIPC ………), W… (NIF ………), "X…, Lda." (NIPC ………), "Y…, Lda." (NIPC ………), "Z…, Lda." (NIPC ………), "AB…, Lda." (NIPC ………).
As aquisições intracomunitárias de pneus efectuadas em nome das sociedades atrás referidas não se coadunam com a aparente inactividade das mesmas, nem com as declarações fiscais que para efeitos de IVA, IRC e IRS (apenas em relação á pessoa singular) por elas apresentadas á Administração Fiscal.

a) Concretizando, a sociedade "T…, Lda." (doravante designada por "T…") foi constituída por contrato de sociedade lavrado em 12.03.2001 no 2º Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, tendo por objecto social o comércio por grosso, importação e exportação, nomeadamente de panelas, bicicletas, pneus, jantes, peças de automóveis.
O capital social desta sociedade foi subscrito em partes iguais pelo arguido C… e por outros dois sócios (AF… e AG…), sendo todos gerentes desta sociedade.
Posteriormente, por escritura lavrada em 14.08.2003, no 1º Cartório Notarial do Porto, a arguida M…, de nacionalidade brasileira, que faz parte da base da estrutura da organização já referida, adquiriu a totalidade das quotas da sociedade, modificando-a para uma sociedade unipessoal por quotas com a designação "T…, Lda.", ficando a assumir a qualidade de gerente desta sociedade - esta testa-de-ferro - tendo os outros três sócios renunciado à gerência.
Esta sociedade não cumpre as suas obrigações declarativas desde o ano de 2003, não tendo apresentado qualquer declaração de rendimentos, declaração periódica de IVA e declaração anual de informação contabilística e fiscal.
Sucede que na aplicação informática VIES (Sistema de Troca de Informações sobre o IVA) em nome da "T1…" constam aquisições intracomunitárias de bens nos anos de 2006, 2007, 2008, 2010 e de 2011 aos Fornecedores de Espanha (AH…, ………; AI…, ………; AJ…, ………; AK…, ………), Bélgica (AL… ………) e França (AM…-………).
Estes Fornecedores declararam ter efectuado nestes períodos transmissões intracomunitárias de bens para a "T…" no montante global de €1.758.505,00 descriminados por período de IVA e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1248 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

-b)Por seu turno a sociedade "U… Lda." (doravante designada por "U…") foi constituída em 8.11.2007, consistindo o seu objecto social na comercialização, importação, exportação, agente de comércio por grosso de todos os tipos de artigos, equipamentos e acessórios para automóveis e veículos motorizados, produtos alimentares, bebidas, vestuário, acessórios, têxteis, calçado, marroquinaria, electrodomésticos, informáticos, de papelaria e escritório, bem como embalagens.
A sócia gerente desta sociedade é a arguida N…, de nacionalidade brasileira, a qual faz parte da base da organização - testa-de-ferro.
Esta sociedade não apresentou a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC dos exercícios de 2009 e de 2010, nem a declaração anual de informação contabilística e fiscal dos exercícios de 2009 e de 2010, sendo que as declarações fiscais apresentadas apontam para a sua inactividade (declarações periódicas de IVA sem qualquer base tributável, nas declarações Modelo 22 foi indicado um volume de negócios de €0,00 e de €0,01).
Em 30.12.2010 esta sociedade apresentou uma declaração de cessação de actividade para efeitos de IVA reportada a 30.11.2010.
Sucede que na aplicação informática VIES em nome da "U…" constam aquisições intracomunitárias de bens nos anos de 2008 e de 2009 no montante total de €414.172,00, declaradas pelo fornecedor belga AL…, ………, aquisições essas que estão descriminadas por período de IVA e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1254 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

c)A sociedade "V…, Lda.", doravante designada por "V…", foi constituída em 2006-05-09, consistindo o seu objecto social no comércio de peças e acessórios para veículos automóveis que compreende o comércio por grosso e a retalho de qualquer tipo de partes, peças e acessórios para veículos automóveis (pneus, amortecedores, calços de travões, ópticas, etc.).
O arguido O…, irmão da arguida D… e cunhado do arguido C… figura como único sócio gerente desta sociedade.
Em nome desta sociedade não constam declarações fiscais em falta (declarações de rendimentos Modelo 22 de IRC, declarações periódicas de IVA e declarações anuais de informação contabilística e fiscal), apontando estas para a sua inactividade (declarações periódicas de IVA sem qualquer base tributável e nas declarações Modelo 22 foi indicado um volume de negócios de €0,00 e €0,01).
Em 28.03.2011 esta sociedade apresentou uma declaração de cessação de actividade, para efeitos de IVA, reportada a 28.03.2011.
Sucede que na aplicação informática VIES em nome da "V…" constam aquisições intracomunitárias de bens nos anos de 2006, 2007, 2008, 2009 e de 2010 a Fornecedores de Espanha (AN… SA, ………; AO…, ………; AP…, ………; AQ…, ………; AS…, ………), Bélgica (AL…, ………; AT…, ………), Alemanha (AU…, ………, AV…, ………) e Holanda (AW…, ………; AX…, ………), os quais declararam terem efectuado transmissões intracomunitárias de bens para a "V…", no montante total de € 3.914.768,00.
Essas aquisições intracomunitárias de bens da "V1… estão descriminadas por período de IVA e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1260 e 1261 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

d)A sociedade "X…, Lda" (doravante designada por "X…") foi constituída em 31.10.2006, consistindo o seu objecto social na importação, exportação, representação, comercialização de pneus, peças e acessórios auto. Prestação de serviços de manutenção e reparação de veículos automóveis.
Em 31.07.2008 assume as funções de única sócia-gerente desta sociedade a arguida P…, a qual é irmã da arguida D… e cunhada do arguido C… e faz parte da base da organização - testa-de ferro.
Em nome da "X…" encontram-se em falta a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC dos exercícios de 2008 e de 2010 e a declaração anual de informação contabilística e fiscal dos exercícios de 2008, 2009 e de 2010.
Nas declarações periódicas de IVA, referentes aos períodos 0703T a 0806T, são indicadas bases tributáveis de montantes pouco significativos (total de 2007 ascende a €113.036,85; 1.º semestre de 2008 ascende a €39.584,80).
A partir da declaração periódica de IVA relativa ao 3.º trimestre de 2008, período em que a gerência transita para a cidadã brasileira P…, e até à declaração do 2.º trimestre de 2010, a "X…" indicou que não realizou operações activas nem passivas no período a que as declarações dizem respeito.
A "X…" nas declarações periódicas de IVA dos 3.º e 4.º trimestres de 2010 declarou aquisições intracomunitárias de bens e transmissões intracomunitárias no montante total de € 116.053,49 e de € 136.683,00, respectivamente.
Nas declarações periódicas de IVA referentes aos quatro trimestres de 2011, a "X…" indicou que não realizou operações activas nem passivas no período a que as declarações dizem respeito.
Sucede que a partir do 1.º trimestre de 2011, na aplicação informática VIES em nome da X1… constam aquisições intracomunitárias de bens a Fornecedores da Bélgica (AL…, ………), Holanda (AW…, ………; AZ…-………); Espanha (BB…, ………; BC…, ………; BD…, SA, ………; BE…, ………; BF…, ………; AJ…, ………) e de França BG…, …), os quais declararam terem efectuado transmissões intracomunitárias de bens para a "X1…" no ano de 2011, no montante total de €1.966.646,00, descriminado por período de IVA e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1265 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

e) A Sociedade “Z…, Lda. “ (doravante designada por "Z….") iniciou a sua actividade em 2011-01-31, constando como sócia gerente da mesma a arguida G…, a qual desempenha um papel essencial na estrutura da organização, tendo como função tratar das encomendas e vendas dos pneus, bem como dos dinheiros resultantes das mesmas e pagamentos aos fornecedores intracomunitários.
Em 2.01.2012 esta arguida renuncia às funções de gerente passando a desempenhar as mesmas as arguidas S…, passando o capital da sociedade para esta arguida e da sua compatriota/arguida Q…, as quais fazem parte da base da estrutura da organização -testas-de-ferro.
Esta sociedade tem associado o Código de Actividade Económica (CAE) ….. - "Comércio por grosso de peças e acessórios para veículos automóveis".
Nas doze declarações periódicas de IVA do ano de 2011 (períodos de 1101 a 1112) a "Z…" indicou que não realizou operações activas nem passivas no período a que as declarações dizem respeito.
Sucede que nos 2.º, 3.º e 4.º trimestres de 2011, fornecedores da Holanda (AW…, …; BH…, ….; BH…, … e de Espanha (AJ…, …) declararam terem efectuado transmissões intracomunitárias de bens para a "Z…", no montante total de €513.364,00, aquisições estas que estão descriminadas por trimestre e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1267 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

f) A sociedade "AB…, L d a ." (doravante designada por AB…) iniciou a sua actividade em 2012-01-02, com sede na Rua … n.º …, Apt. .., freguesia de …, concelho do Porto e tem associado o Código de Actividade Económica (CAE) ….. - "Comércio por grosso não especificado".
Desde o seu início de actividade, nas aplicações da Administração Tributária e Aduaneira constam como gerentes as arguidas (testas-de-ferro) L… e S…, as quais fazem parte da base da organização.

g) A sociedade "Y…, Lda." (doravante designada por Y…) iniciou a sua actividade em 2004-04-05, tendo nesta altura a denominação de "BI…, Lda." e sendo sócios da mesma para além de outros os arguidos C… e a mulher/arguida D…, tendo aquele renunciado às funções de gerente em 9.04.2010 e passando a constar como gerente BJ….
Em nome da sociedade Y… encontram-se em falta a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC dos exercícios de 2009 e de 2010, as declarações periódicas de IVA de 1012T e 1103T e a declaração anual de informação contabilística e fiscal dos exercícios de 2009 e de 2010.
Nas declarações periódicas de IVA de 1006T, 1009T, 1106T, 1109T e 1112T a Y… indicou que não realizou operações activas nem passivas no período a que as declarações dizem respeito.

h) A sociedade "BK…, Lda." (doravante designada por "BK…") iniciou a sua actividade em 2004-03-19 e cessou a sua actividade, para efeitos de IRC e IVA, reportada a 2007-03-02.
Desde o seu início de actividade consta como sócio-gerente desta sociedade o arguido C….
No que respeita aos exercícios de 2006 e de 2007 a "BK…" apresentou as declarações periódicas de IVA, mas não apresentou a declaração de informação contabilística e fiscal nem apresentou a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do exercício de 2007.
A "BK…" na sua declaração Modelo 22 de IRC do exercício de 2006 indicou um volume de negócios de €66.228,52.
i) A arguida L… faz parte da base da estrutura da organização (testa-de-ferro) tendo em 2006-06-12 apresentado uma declaração de início de actividade, e em 2007-08-07 apresentou uma declaração de alteração de actividade, alterando a sua actividade principal para "comércio por grosso de peças e acessórios para veículos automóveis" (CAE: …..) e passando a actividade "Outros prestadores de serviços" para actividade secundária, ficando enquadrada no regime normal trimestral em sede de IVA, a partir de 2007-08-01.
Em 2009-12-21 apresentou as declarações modelo 3 de IRS dos exercícios de 2006 e de 2007, indicando apenas rendimentos da categoria B (rendimentos profissionais) no montante de €5.758,00 e €4.485,00, respectivamente.
E nesse mesmo dia submeteu declarações periódicas de IVA para os 2.º, 3.º e 4.º trimestres de 2006 e 1.º e 2.º trimestres de 2007 (com um total de base tributável para o ano de 2006 de €5.758,00 e para o 1.º semestre de 2007 de €4.485,00), no entanto, nestes períodos L… encontrou-se enquadrada no regime especial de isenção em sede de IVA nos termos do artigo 53.º do Código do IVA.
Em 2010-03-30 apresentou a declaração modelo 3 de IRS do exercício de 2009 indicando apenas rendimentos de trabalho dependente, no montante de €1.350,00 pagos por BL…, contribuinte n.º ………, e indicando como "sujeito passivo A" BM…, contribuinte n.º ……….
Da consulta à informação do Instituto de Segurança Social (cf. Anexo Segurança Social, vol.1 a folhas 223) constata-se que o último registo de remunerações em nome de L… respeita a Abril de 2010 como trabalhadora por conta de outrem (BL…).
Sucede que na aplicação informática VIES em nome da L… constam aquisições intracomunitárias de bens, nos anos de 2007, 2008 e de 2009, num total de €640.611,00, valores esses declarados pelo fornecedor belga AL…, aquisições essas que estão descriminadas por período de IVA e por Estado Membro do Fornecedor na tabela de fls. 1275 que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
Os pneus adquiridos aos Fornecedores de Espanha, França, Bélgica, Holanda e Alemanha foram pagos com cheques ou em numerário e foram transportados para Portugal através de transportadoras Belgas, Francesas, Portuguesas e em alguns casos pelas sociedades "V…", "T…" e pelo BN….
Estes pneus foram depois descarregados em armazéns - bases operacionais - sitos na Rua …, nº …, …, Vila Nova de Gaia, Rua …, nº …, …, …, …, Vila Nova de Gaia, conforme resulta dos Relatos de Diligências Externas datado de 30.11.2011 de fls. 623 e segs, do Volume II; de 5.12.2011 de fls. 650 e segs. do Volume II; de 13.01.2012 de fls. 892 e segs, do Volume III; de 6.09.2011 de fls. 210 e segs. do Volume I, de 7.09.2011 de fls. 254 e segs. do Volume I, de 8.09.2011 de fls. 259 e segs. do Volume I, de 2.12.2011 de fls. 625 e segs do Volume II, de 19.12.2011 de fls. 625 e segs. do Volume II, de 20.12.2011 de fls.725 e segs. do Volume III; de 27.02.2012 de fls. 979 e segs. do Volume IV, de 3.02.2012 de fls. 1012 e segs. do Volume IV; de 16.02.2012 no Volume IV e dos Autos de Visionamento das imagens e contidas nos DVD´s e fotogramas indicados na prova e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
Posteriormente esses pneus foram ou estão ainda a ser vendidos pelos arguidos/ vendedores da organização a várias empresas e indivíduos nacionais.
Deste modo, o arguido C… e os indivíduos que fazem parte da organização lesaram e lesam a Administração Fiscal em sede de IVA, IRS e IRC.
Assim o arguido C… e os arguidos que fazem parte da sua organização não declaram á Administração Fiscal as aquisições intracomunitárias efectuadas num valor total de €9.208 066,00, ou apresentaram declarações fiscais com valores muito baixos ou mesmo sem valor, e não declaram também ao Estado as subsequentes transmissões desses bens, para desse modo não entregarem o imposto (IVA) ao Estado.
Assim, e aplicando-se a taxa de IVA em vigor segundo os períodos declarativos em investigação, revela-se que os arguidos obtiveram uma vantagem patrimonial ilícita e apenas em sede de IVA que se cifra em pelo menos €1.965 261,96, montante este reportado entre os anos de 2006 a 15 de Fevereiro de 2012, conforme resulta do quadro de fls. 1230 a 1322 que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais:

As empresas "T…, Lda", "U…", "V…", "X…" e "W…" estão enquadradas em sede de IVA no regime normal de periodicidade trimestral, o que significa que o prazo que os arguidos, na qualidade de gerentes de facto dessas empresas, tinham para entregarem as declarações periódicas de IVA referente ao último trimestre de 2011 terminou no dia 15.02.2012.
Por seu turno a empresa "Z…, Lda." está enquadrada no regime normal de periodicidade mensal, o que significa que o prazo que os arguidos tinham, na qualidade de gerente de facto desta empresa, para entregarem as declarações periódicas de IVA referentes ao mês de Dezembro de 2011 terminou no dia 10.02.2012.
Apurou-se ainda que este esquema serve de base para estabelecer um ciclo de transacções que legitimam todo o processo de "lavagem de dinheiro" pela ocultação da origem ilícita da vantagem patrimonial alcançada.
Assim no período compreendido entre 01/09/2011 a 20/10/2011, na conta titulada por empresa "X…, Lda.", identificada com o n.º ……….., da instituição de crédito BO…, aberta em 07/05/2010 no balcão …, regista-se saídas desta conta para uma conta da arguida D… da mesma instituição bancária no valor de €369.230,00.
A aplicação da vantagem ilícita não reside só no dinheiro veiculado entre contas bancárias, mas também na compra da residência dos arguidos C… e D… avaliada em cerca de €200.000,00, bem como na aquisição de vários veículos automóveis.
Os arguidos agiram em comunhão de esforços e de acordo com plano previamente traçado por todos no seu próprio interesse e no das sociedades que geriam, bem sabendo que as quantias de IVA no montante calculado até ao momento de €1.965 261,96 não lhes pertenciam e que se destinavam e eram devidos ao Estado, pelo que não os podiam utilizar em seu benefício pessoal nem em proveito das sociedades e não os podiam integram nos seus patrimónios nem no das sociedades.
Os arguidos apropriaram-se dessas quantias de IVA e agiram com o objectivo de se locupletarem com as mesmas, obtendo vantagens patrimoniais a que não tinham direito e com a intenção de causarem o correlativo prejuízo ao Estado, como de facto causaram, ao não entregarem á Administração Tributária tais montantes de IVA diminuíram as receitas tributárias e obterem um benefício indevido.
Deste modo os arguidos lesaram o erário da Fazenda Nacional no montante de €1.965 261,96, correspondente ao IVA que não entregaram nos cofres do Estado e de forma indirecta a generalidade dos contribuintes cumpridores e ofenderam o regular funcionamento do sistema fiscal e os interesses da ordem pública que o mesmo deve satisfazer impedindo ainda a realização da justiça fiscal.
Além do mais todos os arguidos sabiam que faziam parte de uma organização chefiada pelo arguido C…, a qual actua pelo menos desde 2006 e que obedece a uma estrutura, desempenhado cada um dos seus membros funções específicas dirigidas à prática de crimes.
Os arguidos C… e D… eram auxiliados pelos restantes membros da organização, e o arguido B…, ainda por si e com o auxílio do arguido I…, e transferiram as quantias resultantes das vendas dos pneus provenientes dos fornecedores intracomunitários para contas bancárias das sociedades por eles utilizadas nos esquemas e para as suas contas pessoais, as quais destinaram ao pagamento das rendas dos armazéns (bases operacionais) por eles utilizados, das viaturas utilizadas nas operações e na residência dos primeiros arguidos, dissimulando assim a origem ilícita de tais quantias.
Todos os arguidos agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Prova:

Do arguido C…:

Documentos: os dos autos, designadamente:
-Cópia do contrato da sociedade "T…, Lda." de fls.
52 e segs. do Anexo Informação Fiscal constante do Volume I e de fls. 96 e segs. do Volume I;
-Documento de fls. 43 do Anexo A, 1º Volume;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 30 e de fls. 84 e segs. do Anexo Informação Fiscal, Volume I referente á sociedade "Y…, Lda.";
-Cópia do contrato da sociedade "V…, Lda." de fls. 77 e segs. do Volume I;
-Ficha de identificação de cliente da conta "BO…", titulada pela "X…, Lda." de fls. 73 do Volume I do Anexo Bancos Respostas Positivas;
-Documento de fls. 252 do Anexo D, 2º Volume;
-Documento de fls. 46 do Anexo D, 1º Volume;
-Documento de fls. 149 vº e de fls. 214 do Anexo F, Volume I;
-Documento de fls. 7 do Anexo Informação Fiscal, Volume I, referente a "W…";
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 74 referente a "W…";
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial referente á sociedade "X..., Lda." de fls. 705 e segs. do Volume III;
-Ficha de identificação de cliente da conta "BO…" titulada pela sociedade "X…, Lda." de fls. 73 do Volume I do Anexo Bancos Respostas Positivas;
-Cópia do contrato da sociedade "U…, Lda." de fls. 107 e segs. do Volume I;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 61 referente á sociedade "U…, Lda.";
-Cópia do contrato de sociedade de fls. 900 a 908 referente á sociedade "Z…, Lda.";
-Certidão da Conservatória Comercial referente á sociedade "AB…, Lda." constante no Volume IV;
-Relato de Diligência Externa de fls. 210 do Volume I;
Autos de transcrição e escutas telefónicas:
-Sessão nº 1505 do dia 7.02.2012 do Alvo 2M189M;
-Sessões nº/s 770 e 810 do dia 26.01.2012 e Sessão nº 866 do dia 27.01.2012 do Alvo 2H189M;
-Sessão nº 139 DVD nº 1 do dia 29.11.2011, às 11:39:26;
-Sessão nº 1339 do dia 31.01.2012 e Sessão nº 1469 do dia 1.02.2012 do Alvo 2H7161IE;
-Sessão nº 1469 do dia 6.02.2012 e Sessão nº 1603 do dia 8.02.2012 do Alvo 2H189M;
-Sessão nº 297 do dia 19.01.2012 do Alvo 2M189M inserta no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I;
-Sessão nº 249 do dia 18.01.2012 inserta no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I, do Alvo 2M189M;
-Sessão nº 221 DVD nº 1, do dia 29.11.2011, às 21:00:07 do Alvo 2H716M; -Sessão nº 240 DVD nº 1, do dia 30.11.2011, às 10:21:02 do Alvo 2H716M; -Sessão nº 249 DVD nº 1, do dia 30.11.2011, às 10:52:21 do Alvo 2H716M;
-Sessões nº/s 8683 a 8688 e 8698 do dia 12.01.2012 insertas no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I do Alvo 2H716M;
-Sessões nº/s 535 do dia 23.01.2012 insertas no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I do Alvo 2M189M;
-Sessões nº/s 634 e 649 do dia 24.01.2012 insertas no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I do Alvo 2M189M;
-Sessões nº/s 699 e 701 do dia 25.01.2012 insertas no Anexo Intercepções de Comunicações, Volume I do Alvo 2M189M;
-Sessão nº 533 do dia 23.01.2012 inserta no Anexo Intercepções de Comunicações do Alvo 2M189M, Volume I;
-Sessão nº 9934 do dia 19.01.2012 inserta no Anexo Intercepções de Comunicações do Alvo 2H716M, Volume III;
-Sessões nº/s 10427, 10479, 10484, 10486 do dia 24.01.2012 insertas no Anexo Intercepções de Comunicações do Alvo 2H716M, Volume III;
FOTOGRAFIAS:
-Fotos nº/s 7, 9, 11, 13, 16, 21, 29, 32, 36, 41, 42, 45, 46;
FOTOGRAMAS:
-Dia 21.10.2011 - Fotograma 121;
-Dia 31.10.2011-fotograma 168;
-Dia 14.11.2011 - Fotogramas 324 a 326 e 332;
-Dia 15.11.2011 - Fotograma 338;
-Dia 30.11.2011 - Fotogramas 283, 284 e 290;
-Dia 19.12.2011 - Fotogramas 389 e 390;
-Dia 21.12.2011 - Fotograma 414;
-Dia 26.12.2011 - Fotograma 447;
REGISTO DE IMAGENS:
-Dia 21.10.2011.

Da arguida D…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Relato da Diligência Externa de fls. 210 e segs. do Volume I;
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 1323, da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão da "AC…" com o nº ……… - Alvo 49720M;
-Sessão nº 3345, da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão da "AC…" com o nº ……… - Alvo 49720M;
-Sessão nº 1603, da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão da "AC…" com o nº ……… - Alvo 2H189M;
Fotografias:
-Fotos nº/s 41, 43, 47 e 48;
Fotogramas:
-Dia 20.10.2011 - Fotogramas 102 e 103;
-Dia 21.10.2011 - Fotogramas 157 e 159;
-Dia 28.11.2011 - Fotograma 265;
-Dia 29.11.2011- Fotogramas 272 a 275, 279 e 280;
-Dia 26.12.2011- Fotograma 439;

Do arguido BP…: (pensamos que se trata de lapso e que a prova se refere ao recorrente B…, atento o que consta a fls. 2919)
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Relato da Diligência Externa de fls. 927 e 1012 do Volume IV;
Autos de transcrição de escutas telefónica s:
-Sessão nº 5 ao cartão com o nº ……… do Alvo 2M425M;
-Sessão nº 4411 do dia 26.12.2011 da Intercepção de Comunicações respeitante ao Alvo 2M716M;
-Sessão nº 6242 do dia 2.01.2012 da Intercepção de Comunicações respeitante ao Alvo 2M716M;
-Sessão nº 5340 do dia 30.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
- Sessões das escutas telefónicas referidas a fls. 1571 1 1580.
Registo de imagens dos dias 15.02.2012 a 23.02.2012 constantes do Anexo
Registo de Imagens Volume 3 "Base Operacional de …";

Do arguido E…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Anexo Informação Fiscal identificado com o nome do arguido E…;
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 274 e 276 das Intercepções de Comunicações respeitantes ao Alvo 2M716M;
-Sessões nº/s 419, 421, 422, 429, 437 do dia 1.12.2011 do DVD nº 1 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 563 do dia 2.12.2011 do DVD nº 1 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 2093 e 2095 do dia 15.12.2011 do DVD nº 1 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 10549 do dia 25.01.2012 inserta no Anexo Intercepção de Comunicações, Volume I do Alvo 2H716M;
-Sessão nº 8492 e 8503 do dia 11.01.2012 inserta no Anexo Intercepção de Comunicações, Volume I do Alvo 2H716M;
- Fotogramas:
-Dia 7.11.2011 - Fotograma 218;
-Dia 14.11.2011 - Fotograma 332;
-Dia 25.11.2011- Fotogramas 259 e 260;
-Dia 15.12.2011- Fotogramas 352 e 353;
-Dia 19.12.2011- Fotograma 386;
-Dia 20.12.2011- Fotograma 399;
Registo de imagens do dia 30.11.2011;
Registo de imagens dos dias 15.02.2012 a 23.02.2012 constantes do Anexo
Registo de Imagens, Volume 3 "Base Operacional de …"

Da arguida F…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Anexo identificado como Anexo Segurança Social;
-Documentos de fls. 96, 105 e 108 do Anexo F, Volume I;
-Relato de Diligência Externa de fls. 210 e segs. do Volume I
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 2131 do dia 15.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 9618 do dia 16.01.2012 inserta no Anexo Intercepção de Comunicações, Volume II do Alvo 2H716M;
Fotogramas:
-Dia 17.10.2011 - Fotogramas 62 e 63;
-Dia 20.10.2011 - Fotograma 97;
-Dia 31.10.2010 - Fotograma 173;
-Dia 25.11.2011 - Fotograma 262;
-Dia 28.11.2011 - Fotograma 264;
-Dia 29.11.2011 - Fotograma 282;
-Dia 26.12.2010 - Fotogramas 442 e 443;
Registo de imagens dos dias 17.10.2011

Da arguida G…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Relatório da Inspecção Tributária referente á "Z…, Lda.";
-Relato de Diligência Externa de fls. 210 e segs. do Volume I;
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 543 do dia 2.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 1778 do dia 12.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 127 do dia 29.11.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 539, 540, 563, 564, 565, 567 e 568 do dia 2.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 233 e 234 do dia 30.11.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 1769, 1776, 1781, 1811 do dia 12.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
Fotogramas:
-Dia 6.09.2011 - Fotograma 42;
-Dia 21.10.2011 - Fotogramas 116 e 127;
-Dia 7.11.2011 - Fotograma 209;
-Dia 15.11.2011 - Fotogramas 338 e 339;
-Dia 29.11.2011 - Fotograma 281;
-Dia 30.11.2011 - Fotogramas 284 e 290;
-Dia 2.12.2011 - Fotogramas 305, 307 e 308;
-Dia 26.12.2011 - Fotogramas 442 e 443;

Do arguido I…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Relato de Diligência Externa de fls. 927 e 1012 do Volume IV;
Escutas:
-Sessão nº 5340 do dia 30.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 5107 e 5180 do dia 29.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessões nº/s 563, 564, 565, 567 e 568 do dia 2.12.2011 da Intercepção de Comunicações efectuadas ao cartão telefónico com o nº ………;
Fotogramas:
-1 a 4, 7, 11, 12, 13, 14, 15, 19, 20 a 33, 36, 37 e 45;
Registo de imagens dos dias 15.02.2012 a 23.02.2012 que constam do Anexo Registo de Imagens volume 3 "Base Operacional de …;
Registo de imagens dos dias 15.02.2012 a 23.02.2012 que integram o Anexo
Registo de Imagens volume 3 Base Operacional de …;
Registo de Imagens dos dias 15.02.2012 a 23.02.2012 que constam do Anexo Registo de Imagens volume 3 "Base Operacional de …";

Da arguida L…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 29 e segs., 35, 36, 38, 72 e 74; -Anexo E, 1º Volume, Resposta da DSIFAE, ofício nº 856, de 25.03.2009;
-Anexo F, 1º Volume, resposta da DSIFAE, ofício nº 30, de 6.01.2011 de fls. 228;
-Anexo E, 1º Volume de fls. 13 e 31;
-Anexo F, 1º Volume, fls. 239 vº;
-Anexo da Segurança Social, Volume I, fls. 223;
-Anexo Informação Fiscal de L… de fls. 52;
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 1603 do dia 8.02.2012 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;
-Sessão nº 1323 do dia 3.02.2012 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;

Da arguida M…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 95 e segs. do Volume I;
- Anexo A, resposta da DSIFAE, ofício nº 2376, de 13.08.2008;
-Anexo F, reposta da DSCIFAE, ofício nº 29, de 6.01.2011,1º Volume de fls. 51;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 9 e 37; -Anexo da segurança Social, Volume I, fls. 227;

Da arguida N…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 107 e segs. do Volume III;
-Anexo C, 1º Volume, resposta da DSIFAE, ofício nº 854, de 25.03.2009;
-Anexo F, 1º Volume, resposta da DSIFAE, ofício nº 28, de 6.01.2011 de fls. 66;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 15 e 38;
-Anexo da Segurança Social, Volume I, fls. 225 e 226;

Do arguido O…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 77 e segs. do Volume I.
Anexo D, 1º e 2º Volumes;
Resposta do DCIFAE, ofício n.º 781, de 19.02.2009;
Relatória da Inspecção Tributária de fls. 21 e 39;
Anexo da segurança social, Volume I, de fls. 227;
Informação bancária – Bancos Respostas positivas referentes a sociedade “V…” de fls. 3.

Da arguida P…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 705 a 709 e de fls. 909 a 912;
-Anexo D, 1 e 2º Volumes;
-Resposta da DCIFAE, ofício nº 781, de 19.03.2009;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 26, 39;
-Anexo da Segurança Social, Volume I, fls. 227;
-Informação Bancária - Bancos Respostas Positivas referente á sociedade "V…" de fls. 3;

Da arguida Q…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 899 e segs. do Volume IV;
-Relatório da inspecção Tributária de fls. 28 e 40,
Autos de transcrição de escutas telefónicas:
-Sessão nº 1323 do dia 3.02.2012 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ………;

Da arguida S…:
Documentos: os dos autos, designadamente:
-Certidão da Conservatória do Registo Comercial de fls. 899 e segs. do Volume IV e Volume VI;
-Relatório da Inspecção Tributária de fls. 28 e 41;
Autos de transcrição de escutas telefónica s:
-Sessão nº 1323 do dia 3.02.2012 da Intercepção de Comunicações efectuada ao cartão telefónico com o nº ……….
*
Dada a natureza cautelar das medidas de coacção, até por uma questão de petição de princípio, só pode ser aplicada a que se mostre necessária, adequada, suficiente e exequível; o que também só o serão em função da gravidade do crime e da sanção previsivelmente a aplicar. São estas as circunstâncias que a legitimam, e que correspondem a exigências processuais e extra-processuais. Aquelas previstas nas alíneas a) e b) do art. 204° do CPP, de recolha da prova e exequibilidade da decisão, e estas, previstas na al. c) da citada disposição legal, de protecção da comunidade e da vítima - Odete Maria de Oliveira, Centro de Estudos Judiciários, Jornadas de Direito Processual Penal, pg. 186.
A "insuficiência"das demais medidas de coacção, como pressuposto da aplicação da prisão preventiva, não pode deixar de referir-se à garantia do desenvolvimento do processo penal concretamente em causa, de modo a não se desbaratarem os meios através dos quais se manifesta e executa a pretensão punitiva do Estado, enquanto expressão de uma necessidade básica da organização colectiva.
O princípio da «adequação" das medidas de coacção exprime a exigência de que exista uma correspondência entre os interesses cautelares a tutelar no caso concreto e a medida imposta ou a impor nesse caso».
O princípio da proporcionalidade, por sua vez, exprime a exigência, «estreitamente relacionada com a precedente, de que, em cada estado ou grau do procedimento, exista uma relação de proporcionalidade entre a medida aplicada ou a aplicar e a importância do facto imputado e a sanção que se julga que pode vir a ser imposta». Este princípio tem aqui o sentido de proibição de excesso, impedindo a desproporcionalidade entre, por um lado, o sacrifício que a medida de coacção implica e, por outro lado, a gravidade do crime e a natureza e medida da pena que previsivelmente, com base nele, virá a ser aplicada. Ac. RL in p://www.dgsi.pt/jtrI.
E são pressupostos para a sua aplicação quando verificadas as circunstâncias estabelecidas pelo art. 204° do CPP. Circunstâncias que se devem verificar em concreto (perigo de fuga, continuação da actividade criminosa e de perturbação da prova ou da tranquilidade pública). Haverá perigo de fuga sempre que, a partir de elementos objectivos, exista uma razoável probabilidade de que o arguido, em liberdade, se ausente para parte incerta com o propósito de se eximir à acção penal.
O perigo de perturbação do inquérito ou da instrução reporta-se às fontes probatórias que já se encontram nos autos ou que possam vir a ser obtidas e consiste no risco sério e actual de ocultação ou alteração das mesmas por parte do arguido. Para o efeito torna-se necessário identificar não só a situação mas também a prova relativamente à qual se possa sustentar que o arguido poderá comprometer o decurso normal da investigação, perturbando o processo formativo da prova. O perigo de continuação da actividade criminosa decorrerá de um juízo de prognose de perigosidade social do arguido, a efectuar a partir de circunstâncias anteriores ou contemporâneas à conduta que se encontra indiciada e sempre relacionada com esta.
O perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas encontra-se particularmente relacionado com o direito à liberdade e à segurança dos cidadãos que possam ser potenciais vítimas da conduta criminosa indiciada - Ac. TRP de 25-03-2010, Recurso n° 1 936/09.9JAPRT.
Assim, porquanto tudo ficou expresso, atenta a gravidade dos factos, à sua repercussão e danosidade social causado pela acção dos arguidos, à situação sócio económica dos mesmos, não só existe perigo concreto de continuação da actividade criminosa, como mesmo, de perturbação do inquérito na procura de alteração, senão mesmo ainda face à continuação da investigação, à ocultação das fontes probatórias.
Contra o arguido coteja seguramente o perigo de continuação da actividade criminosa face ao seu ramo profissional, ao lucro fácil que tal actividade ilícita proporciona, e para prover ao seu sustento e do seu agregado familiar, como ainda o perigo concreto de perturbação do decurso do inquérito, por ocultação, alteração, perturbando o processo formativo da prova (basta atentar na ordem de destruição de documentos dada aquando da intervenção policial nas buscas realizadas).
A prática dos factos pelos arguidos revela-se com dolo intenso por parte dos arguidos C…, D… e do ora arguido B…, pelo modo, tempo e meios empregues, revelando-se de extrema gravidade, sendo que, e como já referido anteriormente no despacho determinativo das medidas coactivas aplicadas aos arguidos, a favor da arguida D… coteja a circunstância de ser a esposa do arguido C… e ainda, noutro âmbito, ser mãe de dois menores, e quanto aos demais arguidos o mesmo se revelar de intensidade muito menor face á posição subalterna que os mesmos tinham, designadamente como empregados.
Assim, e na concordância com as doutas considerações aduzidas pela Digna Magistrada do M° P°, que aqui damos por inteiramente reproduzidas por razões de brevidade e com as quais concordamos, quer quanto à qualificação jurídica dos crimes indiciado, quer quanto à medida coactiva a aplicar, sem necessidade de outros considerandos, determino, atenta a sua conduta de actuar individualmente no seu interesse com a ajuda de terceiro e ainda enquanto parte da organização; que o arguido B…, tal como determinado ao arguido C…, aguarde os ulteriores termos do processo em prisão preventiva, por ser a única medida que se mostra adequada, necessária e proporcional à gravidade dos crimes fortemente indicados, à personalidade do arguido, ao perigo concreto da continuação da actividade criminosa, de perturbação do inquérito e ainda do alarme social - artºs 191º, 193º, 196º, 202º, nº 1, al. a), 204º, al. c), e 200º, nº 1, al. d), todos do CPP, bem como ainda a proibição de contactar com os demais arguidos e denunciados no processo e que lhe foram referidos.
Passe os competentes mandados de condução ao Estabelecimento Prisional do Porto, do arguido B….
Cumpra-se o disposto no art. 194º, nº 9 do C.P.P
Pague-se a despesa inerente ao almoço do arguido.
Notifique-se o arguido, nº 4 do art. 215º do CPP.»
*
Por se mostrar com interesse para a decisão do recurso, uma vez que o despacho sob escrutínio, para ela remete, deixa-se também transcrita a promoção da Digna Magistrada do MP ditada para a acta antes do despacho em causa.
«Seguidamente dada a palavra à Digna Magistrada do Mº. Pº., no uso dela disse:
Dos autos resultam fortemente indiciados os factos imputados ao arguido B… e que constam do despacho de fls. 2898 a 2919 que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
Posto isto, importa agora apurar quais as medidas de coacção a aplicar a este arguido.
Ora e da matéria probatória recolhida até ao momento forçosamente temos de concluir que se verifica o perigo da continuação da actividade criminosa, dado que para além desta actividade ilícita não é conhecida outra fonte de rendimento a este arguido compatível com os montantes envolvidos nestas operações, tendo o mesmo inclusivé no âmbito do interrogatório efectuado pela PJ ter referido que entregou ao primo/arguido C… a quantia de €43.000,00 (cfr. art. 204º-c) do CPP).
O perigo da continuação da actividade criminosa também é patente no elevado número de pneus apreendidos pela PJ no dia 6.03.2012, cerca de 2000, bem como nos inúmeros documentos apreendidos nesta data, os quais são comprovativos dos crimes em causa nos presentes autos.
Para além do mais existe o perigo para aquisição e conservação da prova, uma vez que resulta das escutas telefónicas que o arguido pediu à esposa para destruir provas documentais que estavam na residência do casal, conforme resulta do auto de transcrição das conversações resultantes da intercepção telefónica ao cartão nº ……… (Alvo 2M425M) constantes a fls. 2883 a 2885 (cfr. art. 204º-b) do CPP).
Face ao exposto, e uma vez que se verifica o perigo de continuação da actividade criminosa e o perigo para aquisição e conservação da prova, e dado que há fortes indícios que este arguido cometeu os crimes de fraude fiscal qualificada e branqueamento, puníveis com pena de prisão de máximo superior a 5 anos, e por se afigurar proporcional e adequado, promovo que ao arguido B… sejam aplicadas as seguintes medidas de coação:
a) Prisão Preventiva, ao abrigo do disposto nos arts. 191º, 193º, 202º-1-a) e 204º-a)-b)-c) do CPP;

b) Obrigação de não contactar com os arguidos C…, D…, E…, F…, G…, I…, H…, J…, K…, L…, S… e com os denunciados M.., N…, O…, P… e Q…, ao abrigo do disposto no art. 200º-1-d) do CPP.»
*
3. Apreciação do recurso.
I.Nulidade do despacho por deficiente fundamentação.
Sustenta o recorrente que não vislumbra as razões de facto e de direito que justificaram tal medida sendo a seu ver o despacho nulo por deficiente fundamentação.
Não fundamenta o recorrente esta sua asserção nem em termos de facto nem de direito, não diz quais as omissões ou os requisitos que o despacho sob escrutínio devia conter e não contém, nomeadamente em face do artigo 194º, n.º4, do C.P.P.
Sem embargo e, de forma breve, dir-se-á que o actual 97º, n.º5 do CPP, dispõe que os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.
O despacho de aplicação de uma medida de coacção ou de garantia patrimonial é um despacho judicial decisório e, por isso, deve ser fundamentado nos termos do inciso referido.
De acordo com o disposto no artigo 194º, n.º4 do CPP, o despacho que aplicar qualquer medida de coacção ou de garantia patrimonial, diferente do termo de identidade e residência, contém sob pena de nulidade:
a)- a descrição dos factos concretamente imputados ao arguido (indiciados ou fortemente indiciados), incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo (art. 194 nº 4-a) do CPP);
b)- A enunciação dos elementos de prova que permitiram descrever aqueles factos que imputou ao arguido, sempre que essa comunicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime (194 nº 4-b) do CPP);
c)- a qualificação jurídica dos factos imputados (art. 194 nº 4-c) do CPP);
d)- a referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida de coacção, incluindo os previstos nos artigos 193 (necessidade, proporcionalidade e adequação) e 204 (verificação de perigos concretos que justifiquem a aplicação da medida de coacção) do CPP (art. 194 nº 4-d) do CPP, não podendo esquecer, se for o caso, de verificar a inexistência de impedimentos - art. 192 nº 2 CPP - se há causas que excluam ou eximam a responsabilidade criminal do arguido).
E a consequência da falta de fundamentação do despacho que aplica medida de coacção, é no dizer do próprio artigo 194 nº 4 do CPP, cominada com nulidade.
Na conciliação dos artigos 119º e 120º do CPP se a nulidade em causa não estiver catalogada como insanável ou absoluta, a mesma está dependente de arguição, sendo por isso considerada como nulidade sanável ou relativa.
Ora, salvo os casos de nulidade da sentença que são susceptíveis de, por si só, serem fundamento de recurso (artigo 379º, n.º2 do CPP), desde que o recurso seja, no caso, admissível, todas as demais nulidades devem ser previamente suscitadas perante o tribunal que as cometeu.
No caso presente, atento o disposto no artigo 120º, n.º3, al. a) do CPP a invocada nulidade deveria ter sido arguida antes do acto terminado.
Quando tal não ocorra, ou na verificação das circunstâncias enumeradas no artigo 121º do CPP, teremos de considerar sanada a nulidade cometida.
É esse o entendimento jurisprudencialmente dominante – “existindo a nulidade prevista no art. 194 nº 4 do CPP, a mesma tem de ser arguida no próprio acto a que o interessado assista e antes desse acto ter terminado (ver artigos 120 nº 3-a) e 141 nº 6 do CPP), sob pena de ficar sanada” - vide Acs. da Relação do Porto de 09.06.2010, Rel. Jorge Raposo, de 25.03.2010, Rel. Joaquim Gomes e de 30.06.2009, Rel. Maria do Carmo Silva Dias, todos disponíveis no site da dgsi.
Decorre dos autos que o arguido recorrente não suscitou previamente perante o tribunal de 1ª instância a nulidade que agora invoca como um dos fundamentos do recurso.
E, não tendo sido arguida tal nulidade – estando o arguido, interessado e ora recorrente devidamente representado pela sua Ilustre Advogada – a mesma, a existir, ficou sanada.
Concluindo, não tendo a nulidade prevista no artigo 194º, n.º4 do CPP, sido arguida perante o tribunal que proferiu o despacho em causa, não pode o recorrente agora, em sede de recurso, vir arguir falta de fundamentação do despacho de aplicação da medida de prisão preventiva, ou o que é o mesmo a nulidade do despacho impugnado, e sobre a qual não há qualquer decisão da primeira instância, o que nos conduz à sua imediata rejeição, por manifesta falta de fundamento.
Mas, mesmo que assim não fosse, teríamos de concluir que, o despacho sob recurso, satisfaz as exigências legais de fundamentação de facto, enunciação de elementos de prova, qualificação jurídica dos factos e demais requisitos de aplicação da medida em causa, como resulta do despacho recorrido que anteriormente se transcreveu.
Improcede, portanto, a primeira questão colocada.
*
II.- Averiguar dos fortes indícios da prática pelo arguido dos crimes que lhe vêm imputados.
Com a entrada em vigor, em 15.09.2007, das alterações introduzidas pela lei 48/2007, de 29.08, a medida de coacção de prisão preventiva apenas pode ser aplicada, para além das situações previstas na alínea c) do n.º1 do artigo 202º e no n.º 2 do art. 203º, a crimes dolosos puníveis com pena de prisão de máximo superior a 5 anos (202º, n.º1 al. a)) e a crime doloso de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos (202º al. b)).
Nos termos do artigo 1º, al. m), também do C.P.P., as condutas de participação económica em negócio ou branqueamento e as condutas que integrarem crimes de associação criminosa integram-se no conceito de «criminalidade altamente organizada».
Foram indiciariamente imputados ao arguido os crimes de fraude fiscal qualificada (pena de prisão de um a cinco anos), p. e p. pelo art. p. e p. pelo art. 104º e 104º-2-a) do RGIT, alterado recentemente pela Lei nº 64-B/2011, de 30.12, de branqueamento, p. e p. pelo art. 368º-A, n.º2 (pena de prisão de dois a doze anos) e de associação criminosa (pena de prisão de um a cinco anos para os elementos indiferenciados; para as chefias ou direcções, pena de prisão de dois a oitos a anos.), p. e p. pelo art. 299º-2-3, ambos do C.P.
Mostra-se ainda necessário que se verifique a existência de fortes indícios da prática de qualquer um dos crimes abrangidos pelas citadas alíneas a) e b) do n.º1, do artigo 202º, isto é que “a suspeita sobre a autoria ou participação no crime tem uma base de sustentação segura”, pois não é admissível que se possa “arriscar uma medida tão gravosa (como a de prisão preventiva) em relação a alguém que pode estar inocente ou sobre o qual não haja indícios seguros de que com toda a probabilidade venha a ser condenado pelo crime imputado”- cfr. Simas Santos e Leal Henriques, Código de Processo penal Anotado, I Vol., anotação do artigo 202º do CPP.
“Indícios fortes” são as “razões” que sustentam e revelam uma convicção indubitável de que, de acordo com os elementos conhecidos no momento de prolação de uma decisão interlocutória, um facto se verifica. Este grau de convicção é o mesmo que levaria à condenação se os elementos conhecidos no final do processo fossem os mesmos do momento da decisão interlocutória. A diferença entre um e outro reside apenas na variação da base dos elementos conhecidos no momento da decisão interlocutória e no momento da sentença final. Por esta razão, o legislador só consagra o crivo dos indícios fortes para a aplicação das medidas cautelares mais graves, que implicam uma limitação de tal maneira intensa da liberdade que constituem, no plano fáctico, uma antecipação dos efeitos negativos da condenação pelos factos.”, cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Comentário do Código Processo Penal, pag. 337.
Indícios fortes são aqueles que fundamentam uma convicção sem dúvidas de que, face à prova conhecida e existente no momento, se o arguido fosse julgado naquela altura seria condenado.
Ora, parece-nos claro dos elementos de prova indicados no despacho recorrido que estes permitem concluir pela existência dos factos descritos no despacho em análise e que estes permitem se conclua pela forte indiciação da prática do crime de associação criminosa do arguido, aqui recorrente, com o arguido C…, D…, E…, G…, I…, H…, J…, K… e no âmbito das sociedades X…, Lda. Z…, Lda., AB…, Lda. no período de tempo que vai de, pelo menos, início do mês de Dezembro de 2011 até final de Março de 2012 (por deles resultar que com estas pessoas trabalhava directamente conhecendo o que faziam, aderindo aos seus projectos e propósitos de negócios que sabia serem ilícitos e desenvolvendo-os, e incentivando-os, numa interacção que para todos era vantajosa e de todos conhecida). Bem como permitem se conclua pela prática do crime de fraude fiscal, dada a consciência evidenciada pelo arguido de que as vendas de pneus que fazia e pretendia fazer deviam ser efectuadas sem IVA (o que decorre das transcrições das escutas telefónicas havidas entre o arguido B… e a sua colaboradora, BQ…, sua cunhada e BS…, que pretende ser seu colaborador, e sua mulher BT…, quando ela se propõe ir vender pneus com a BU….). Permitindo também se indicie fortemente o arguido B… pela prática do crime de branqueamento de capitais, dada a sua cautela em não fazer depósitos em dinheiro superiores a 10.000,00 ou 11.000,00€ e ainda os depósitos em dinheiro que este se propõe fazer nas contas das sociedades ora mencionadas para pagamento de carregamentos de pneus vindos de fornecedores intracomunitários- como resulta das transcrições de intersecções de chamadas de telemóvel.
Certo que, em relação ao prejuízo fortemente indiciado de quase dois milhões de euros, como sofrido pelo Estado português não pode nesta altura do processo ser todo também imputado ao arguido, dada a, por agora limitada no tempo (com o decorrer da investigação e a análise da vasta documentação apreendida, poderá ou não alargar-se o período de intervenção do arguido nesta organização), intervenção do arguido na associação de pessoas com vista à importação de pneus sem qualquer declaração ou participação ao Estado Português da realização da mesma, com o objectivo da sua venda não facturada. Todavia, o montante que lhe pode ser indiciariamente imputado resulta da actividade desenvolvida nesses quatro meses (Dezembro de 2011 a Março de 2012), ascende segundo o que já resulta dos autos a cerca de 600.000,00€.
Em face desta factualidade, nomeadamente as quantias de dinheiro depositadas pelo arguido nas contas bancárias das Sociedades referidas e aquelas que ele próprio aceita ter entregue ao arguido C…, a sua liderança, no sentido de pretender - por ser o homem do dinheiro (veja-se que resulta das transcrições de interceções de chamadas que os arguidos C… e D… (os iniciais “cabeças” do negócio) estão com problemas financeiros, pois pretendem vender um terreno no Brasil, para equilibrar essas dificuldades) - controlar toda a actividade desenvolvida pelo grupo (há várias transcrições de intercepções de telemóveis em que os arguidos C…, G… e F… ou fazem manobras de diversão ou se sentem amuados, por o arguido B… de todos desconfiar e tudo querer controlar) e até estabelecer-se paralelamente, o que resulta, não só das transcrições das intercepções efectuadas, mas também da própria mudança de instalações para acolhimento de pneus, da Rua …, nº …, …, para a Rua …, n.º …, …, Vila Nova de Gaia - com contrato de arrendamento em nome de uma sua cunhada BV… e como fiadores BW… e BX… - e das quantidades de pneus vendidos - em conversa celular com o pretenso colaborador BS… fala em vendas de pneus de 4 camiões por mês, seguras – e do número de pneus que foram apreendidos nas últimas instalações - confessadamente arrendadas pelo arguido B… através da interposição da sua cunhada, BZ… -, cerca de 2 mil pneus, tudo elementos conotados com os crimes em causa e para os quais não foram dadas explicações convincentes, nomeadamente para ser possuidor das quantias em dinheiro que depositou para aquisição de pneus e que diz ter emprestado ao arguido C…. Segundo as regras da experiência comum e da lógica, perante uma tal factualidade pode e deve concluir-se no sentido da existência de fortes indícios dos crimes indiciariamente imputados ao arguido, com as restrições, por ora, resultantes da prova e que deixamos enunciadas.
Conjugados os referidos elementos de facto com as regras da experiência (artigo 127º do CPP), é manifesto que o Tribunal a quo andou bem no seu entendimento de que tais elementos indiciam fortemente os crimes indiciariamente imputados ao arguido.
Em conclusão os elementos probatórios recolhidos nos autos e a que já fizemos referência contrariam frontalmente as declarações do arguido, nas explicações que dá no seu primeiro interrogatório.
Assim, a existência de factos que se traduzam em fortes indícios de o arguido ter praticado os crimes que lhe são imputados é uma realidade. E, no seguimento desta conclusão, nenhuma censura nos merece o juízo formulado pelo tribunal recorrido quanto à existência de forte indiciação dos factos imputados aos arguidos, no despacho recorrido.
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Questão III.- Analisar se estão verificados em concreto os perigos de continuação da actividade criminosa e de perturbação do decurso do inquérito previstos no artigo 204º do CPP.
De acordo com o disposto no artigo 191.º, n.º1, do C.P.P., as medidas de coacção visam dar resposta a necessidades processuais de natureza cautelar, que resultam da existência dos perigos ou de algum dos perigos enunciados nas três alíneas do artigo 204.º daquele mesmo diploma, a saber:
a) Fuga ou perigo de fuga;
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova;
c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.
Para a imposição da medida coactiva de prisão preventiva é necessário que ocorra, pelo menos (alternativamente), uma das circunstâncias previstas no artigo 204º do CPP.
No despacho sob recurso entendeu-se ocorrer, perigo de perturbação do decurso do inquérito nomeadamente, perigo para a aquisição e conservação da prova, e perigo de continuação de actividade criminosa, nos termos do artigo 204º als. b) e c).
Portanto, toda a argumentação do recorrente à volta do perigo de fuga é espúria nestes autos, já que o perigo de fuga não foi tido em conta pelo tribunal, para aplicação da medida coactiva.
E perante a materialidade provada, nomeadamente de não resultar que além da actividade ilícita desenvolvida o arguido B… desenvolva qualquer outra actividade lícita – a qual seria até inconciliável com a intensidade de trabalho e aplicação que envolve a actividade ilícita por ele desenvolvida, como decorre da várias transcrições de intersecções efectuadas -, não lhe sendo portanto reconhecida outra fonte de rendimentos, nomeadamente compatível com as quantias em dinheiro que mostra ter disponíveis para investir na actividade ilícita. É claro o perigo de continuação da actividade criminosa dados os altos rendimentos que retira de tal actividade ilícita e a ausência de outros rendimentos para se sustentar a si e à sua família. Como diz a Digna procuradora junto do tribunal a quo na sua douta Promoção, para que remete o Despacho sob recurso, «o perigo da continuação da actividade criminosa também é patente no elevado número de pneus apreendidos pela PJ no dia 6.03.2012, cerca de 2000…». O perigo de continuação da actividade criminosa resulta desde logo da natureza dos crimes indiciados, os quais estão associados à obtenção de meios económicos e de lucros fabulosos, por vendas de pneumáticos a preços com os quais os comerciantes cumpridores não podem concorrer.
Dado o elevado número de provas que foram recolhidas ao mesmo tempo que o arguido foi detido (buscas, apreensões) e outras que haviam sido reunidas, entretanto, o perigo para aquisição e conservação da prova mostra-se nesta altura naturalmente um pouco atenuado, existe, no entanto, pois, como evidenciado, resulta das escutas telefónicas que o arguido pediu à esposa para destruir provas documentais que estavam na residência do casal, conforme resulta do auto de transcrição das conversações resultantes da intercepção telefónica ao cartão nº ……… (Alvo 2M425M) constantes a fls. 2883 a 2885. É certo, também, por outro lado, que a fase de obtenção de prova pelos clientes dos arguidos, está ainda em fase embrionária, dada a grande quantidade de clientes e a sua dispersão pelo país [do Minho (Famalicão e Braga) ao Algarve (Castanheira de Pêra), passando por Fátima, Leiria e Alentejo)] e em relação a estes há um claro e concreto perigo de virem a ser confrontados pelos arguidos, para que destruam elementos bancários ou outros documentos comprovativos de compra de pneus aos arguidos, antes de lá chegar a investigação.
Verificam-se, por isso, os perigos enunciados, no despacho sob recurso.
Pelo exposto improcede a questão posta.
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Questão IV- averiguar se a medida de obrigação de apresentação periódica, ainda que cumulada com caução ou de permanência na habitação com vigilância electrónica é necessária, adequada e proporcional ao perigo de continuação da actividade criminosa, e, portanto deve substituir a medida de coacção de prisão preventiva.
Enquanto juridicamente excepcional a medida de prisão preventiva carece de uma justificação própria - ou como outros pensam, excepcional - a qual se exprime na exigência dos requisitos materiais da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.
No caso em apreço, não há dúvidas, a medida de prisão preventiva é proporcional à gravidade dos crimes fortemente indiciados, mormente os de associação criminosa e branqueamento de capitais, o que resulta das molduras penais respectivas.
Se tivermos em atenção as quantidades de pneus apreendidos, comprados e vendidos, o número de instalações de que dispuseram, as quantias monetárias envolvidas, o alto nível organizacional da associação de que fazem parte os arguidos, uns há mais tempo outros há menos, e, bem assim, as acentuadas exigências de prevenção geral que se fazem sentir, relativamente aos tipo de crime em causa, é previsível que aos arguidos venha ser aplicada prisão efectiva, consoante exigência do artigo 193º, n.º1 do CPP, do que decorre a proporcionalidade da medida de prisão preventiva às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas ao arguido, não obstante ser primário.
Impõe-se, agora, atacar o cerne da questão posta, o da possibilidade de aplicação ao arguido de uma medida coactiva menos gravosa, nomeadamente a aplicação da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica, ou a medida de apresentação periódica.
O princípio da necessidade vem a traduzir-se na impossibilidade de o fim visado pela concreta medida de coacção decretada não poder ser obtido por outro meio menos oneroso para os direitos do arguido.
Deste princípio decorrem as seguintes consequências:
a). Estabelecimento de uma escala de gravidade relativa das medidas de coacção, ordenadas da mais para a menos grave, em consequência das restrições dos direitos, impostas ao arguido. i. prisão preventiva; ii. obrigação de permanência na habitação; iii. proibição de permanência, de ausência e de contactos; iv. suspensão do exercício de funções, de profissão e de direitos; v. obrigação de apresentação periódica; vi. caução; vii. termo de identidade e residência.
b). subsidiariedade da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação em relação às outras medidas de coacção.
c). subsidiariedade da prisão preventiva em relação à obrigação de permanência na habitação.
d). preferência pela cumulação de duas ou mais medidas de coacção menos gravosas em detrimento da aplicação de uma medida mais gravosa. (Cfr. Paulo Pinto Albuquerque, Ob. Cit. Pag. 525 e Frederico Isasca, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, pag. 99 a 118, sob o tema A Prisão Preventiva e Restantes Medidas de Coacção.)
Ora, atentos estes princípios, nenhum reparo merece a decisão recorrida quando considera a prisão preventiva como medida coactiva necessária (única medida coactiva) para obviar aos perigos enunciados e, nomeadamente, ao perigo de continuação da actividade criminosa.
Com efeito, a medida coactiva avançada pelo recorrente, ou seja, a medida coactiva de obrigação de permanência na habitação mediante vigilância electrónica, prevista no artigo 201º, n.º1 do CPP, ainda que cumulável com a obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas, consoante o n.º 2 do mesmo artigo, é insuficiente para obviar ao assinalado perigo de continuação da actividade criminosa, dado que os conhecimentos que o arguido tem em termos de desenvolvimento de um tal negócio, como sejam os seus relacionamentos, com fornecedores e clientes, os meios usados para esse efeito, que são praticamente todos via Internet e telemóvel, a facilidade com que iniciam actividade de empresas e a cessam, e arranjam interpostas pessoas para figurarem em contratos, e mesmo para sócios gerentes de empresas que nada têm a não ser o nome e um endereço, este, muitas vezes fictício, a residência com acesso à internet seria um óptimo local para continuar a chefiar tal actividade, o resguardo da habitação (com os contactos apropriados, antigos ou arranjados já na habitação, pelos meios de comunicação disponíveis em qualquer habitação, como sejam os telefones, a internet, o email), é propício à continuação de tal actividade.
Assim, afigura-se-nos que no caso a medida de obrigação de permanência na habitação, não serve para obstar ao perigo de continuação da actividade criminosa em crimes como aqueles que se encontram fortemente indiciados nos autos.
Os factos pessoais que o recorrente alega, além de não comprovados, não têm qualquer peso no juízo de apreciação em debate, que nesta altura do processo se move apenas na averiguação das necessidades cautelares para o normal decorrer da lide. No entanto sempre se dirá que a alegação de que é um cidadão integrado. Pai de três filhos. Sem antecedentes desta natureza ou outros, em nada surpreende o tribunal já que os agentes da criminalidade aqui indiciada, normalmente não têm antecedentes criminais.
Ora, pelo exposto, a obrigação de permanência na habitação, como sucedâneo da prisão preventiva e com preferência sobre esta, não se mostra adequada e suficiente à realização das finalidades cautelares visadas - impedir a continuação da actividade criminosa - porque atentos os meios de que é possível dispor, hodiernamente, para o desenvolvimento de tal actividade, nada impede a continuação da actividade ilícita a partir de casa, com um mínimo de colaboradores no terreno (veja-se que a arguida F… pediu várias vezes ao arguido C… via SMS que a passasse para caixa, pois assim se ficasse retida em casa, por doença, poderia continuar a trabalhar e a ganhar, como resulta, a contrário, das transcrições de interceções de chamadas, sessões 2305, 2306 e 2307 do alvo 2H716M).
E se esta medida não garante as necessidades cautelares que o caso exige, a paragem da actividade criminosa, muito menos as garantirá qualquer outra medida menos gravosa, como a obrigação de apresentações periódicas, aliás afastada desde logo por não acautelar minimamente as exigências cautelares requeridas pelo caso, mesmo que cumulada com a uma caução, pois sendo o dinheiro obtido pelo arguido proveniente de actividade ilícita e de obtenção rápida e, por isso, fácil, logo se depreende que também o arguido não teria grande rebuço em perdê-lo.
Em suma, face à especial gravidade dos ilícitos fortemente indiciados e ao concreto perigo de continuação da actividade criminosa a medida de coacção de prisão preventiva é a única que se mostra adequada e proporcional, ao perigo demonstrado, e às exigências cautelares que o caso requer.
Em conclusão, a única medida de coacção que se revela suficiente, adequada e proporcional, sendo também necessária, é a medida de coacção de prisão preventiva, atento o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 191.º a 195.º, 202.º, n.º 1, al. a) e c) e 204.º, al. b) e c), todos do Código de Processo Penal.
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Impõe-se finalmente mais duas notas:
Faz o recorrente as seguintes afirmações: na semana em que foi sujeito a 1º interrogatório e cuja prisão foi determinada, foi publicitado estudo, em que se conclui que nas cadeias portuguesas estão apenas presos duas pessoas por crimes desta natureza. Foi aliás na sequência de buscas a diferentes laboratórios e farmácias que o mesmo foi publicitado (sendo que nem sequer foi presente ninguém a 1º. Interrogatório).
As afirmações do recorrente não estão fundamentadas. Mesmo que estivessem fundamentadas, quando uma pessoa tem um comportamento tipificado na lei como crime passível de ser punido com pena de prisão de máximo superior a cinco anos, e o patamar de gravidade atingido, faz caber tal comportamento dentro dos requisitos apertadíssimos para a sujeição de uma pessoa a prisão preventiva nada há que impeça a pessoa que teve esse comportamento de ficar em prisão preventiva e de vir posteriormente a sofrer uma pena de prisão efectiva. Em direito penal não é o “Hábito” que faz a pena ou a prisão preventiva.

Finalmente invocou ainda, o recorrente a violação do princípio da igualdade de tratamento.
Alegou que foi, ainda, violado o principio da igualdade de tratamento verificando-se critérios diferentes, pois, constata o arguido que outros fortemente indiciados tiveram medida de coacção sobremaneira diferente da sua, mormente, a companheira do C…, pelo que a ter-se entendimento contrário sempre será de sujeitar o arguido à medida de permanência na habitação com recurso a mecanismos de vigilância electrónica pelo que requer que seja elaborado o competente relatório de aplicabilidade.
Sobre esta invocada violação apenas diremos que o recorrente viu igualdade onde nós vemos diferença. A arguida D… é esposa do arguido C… e é mãe de dois menores. O seu marido, o arguido C…, encontra-se em prisão preventiva. O ora recorrente, embora pai de três filhos, não sabemos quantos menores, não tem a sua esposa presa preventivamente, e a sua actuação não se subalternizava à do seu cônjuge, como resultava com a da arguida D…, pelo que não vemos onde haja entre os dois igualdade de circunstâncias que tivessem dado origem à violação do princípio da igualdade de tratamento.
Em conformidade, improcede o recurso, pelo que se mantém a decisão recorrida que aplicou aos arguidos a medida de coacção de prisão preventiva.
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III. Decisão.
Nestes termos, acordam os juízes da segunda secção desta Relação do Porto em negar provimento ao recurso e confirmar o despacho recorrido.
Custa pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 (seis) Uc’s (artigo 513º, n.º1 do CPP e 8º, n.º 5 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa.)
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Porto, 04 de Julho de 2012.
Maria Dolores da Silva e Sousa
José João Teixeira Coelho Vieira