Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3585/18.1T8OAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
INCUMPRIMENTO
TEMPESTIVIDADE DO RECURSO
DECISÃO SOBRE MEIOS DE PROVA
RECURSO AUTÓNOMO
IMPUGNAÇÃO GENÉRICA
Nº do Documento: RP202002173585/18.1T8OAZ.P1
Data do Acordão: 02/17/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - O incumprimento dos ónus impostos pelo art.º 640.º CPC, “não tem por consequência a intempestividade do recurso no que ao segmento da matéria de direito diz respeito, nas situações em que o recurso tenha sido interposto após o decurso do prazo de 20 dias”, apenas implicando a rejeição da apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
II - Discordando o autor da decisão proferida em sede de audiência de julgamento, não lhe admitindo a junção de documentos, deveria ter dela interposto recurso de apelação autónomo e imediato, no prazo de dez dias (art.º 80.º/2, CPT). Como assim não procedeu, a decisão transitou em julgado, não podendo já ser impugnada com o presente recurso da sentença.
III - As conclusões de recurso, quando está em causa a impugnação da matéria de facto, devem conter, sob pena de rejeição do recurso, pelo menos uma síntese do que consta nas alegações da qual conste necessariamente a indicação dos concretos pontos de facto cuja alteração se pretende e o sentido e termos dessa alteração.
IV - O recorrente não cumpre o ónus de impugnação quando faz uma impugnação genérica sobre a matéria relativa à questão de saber se prestou ou não o trabalho suplementar, isto é, em bloco, não individualizando os concretos factos que impugna.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 3585/18.1T8OAZ.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I.RELATÓRIO
I.1 B… instaurou a presente acção declarativa com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra C…, Lda,, pedindo que julgada a acção procedente seja esta condenada no pagamento da quantia total de € 45.725,92, dividida da seguinte forma:
1) A QUANTIA DE 1.973,50€. A TITULO DE CRÉDITOS DECORRENTES DO ACIDENTE DE TRABALHO QUE O AUTOR FOI VÍTIMA;
2) A QUANTIA DE 25.337,48€, A TÍTULO DE TRABALHO SUPLEMENTAR;
3) A QUANTIA DE 12.868,24€ RESPEITANTE A DIFERENÇAS SALARIAIS;
4) A QUANTIA DE 1.545,48€ REFERENTE AOS PROPORCIONAIS FÉRIAS, SUBSIDIO DE FÉRIAS E SUBSIDIO DE NATAL;
5) A QUANTIA DE 1.124,00€ RESPEITANTE A FÉRIAS E SUBSIDIO DE FÉRIAS E SUBSIDIO DE NATAL; E
6) A QUANTIA DE 2.877,22€ A TITULO DE DIFERENÇAS NO PAGAMENTO DO SUBSIDIO DE ALIMENTAÇÃO.
QUANTIAS A QUE ACRESCEM JUROS DE MORA Á TAXA LEGAL.
Alegou, no essencial, que trabalhou como serralheiro para a ré, entre 1 de Fevereiro de 1995 e 11 de Fevereiro de 2017. Nesta última data foi vítima de um acidente de trabalho que deu origem a processo que correu termos no Juízo de Trabalho de Aveiro, no qual foi indemnizado pela Companhia de Seguros, mas nada lhe foi pago pela empregadora, sendo que a transferência da sua retribuição apenas incidia sobre o valor mensal de € 922,27, pelo que tem ainda direito a € 1.973,50.
Posteriormente, regressou à empresa em 13 de Setembro de 2017, mas denunciou o contrato com aviso prévio a partir do dia 27 de Novembro de 2017, mas a ré só lhe pagou a título de créditos laborais finais a quantia de € 309.
Praticou sempre o horário fixo das 8 às 12 e das 13 às 18 horas, pelo que, por força da entrada em vigor de normas legais que reduziram o horário de trabalho para 40 horas a partir de 1 de Dezembro de 1996, tem que se considerar ter efetuado trabalho suplementar de uma hora por dia, que nunca lhe foi pago, no montante total de € 25.337,48.
Acresce que a ré não lhe a remuneração base convencionada para a sua categoria profissional e, por conseguinte, é titular do valor de € 12.868,24 a título de diferenças salariais, acrescida da quantia de € 1.124 a título de férias e subsídio de férias e da quantia de € 1.545,48 a título de subsídio de Natal, tendo em conta ainda os proporcionais de subsídio de Natal do ano de 2017.
Por outro lado, a ré não lhe pagou o valor devido a título de subsídio de refeição existindo diferenças de € 2.877,26, tendo em conta apenas o período posterior a 2002, pois já não dispõe dos recibos anteriores.
Procedeu-se à realização da audiência de partes, não se tendo logrado obter a conciliação das partes.
Notificada para o efeito, a Ré apresentou a contestação alegando, em síntese, que o autor não especificou a que respeitavam os créditos decorrentes de acidente de trabalho, não tem direito a trabalho suplementar porque não o fazia na medida em que o seu horário era de 8 horas diárias, nem existe qualquer fundamentação para as diferenças remuneratórias, sendo certo que, para além das quantias inscritas nos recibos de retribuição sob as rubricas “vencimento” e “subsídio de alimentação”, recebia quantias a título de “gratificação para ata” e “prémio” que, atenta a sua regularidade e periodicidade, têm natureza retributiva e devem ser levados em conta para perfazer a quantia que seria eventualmente devida a título de retribuição base e subsídio de alimentação, não sendo devidas as quantias reclamadas.
O autor foi notificado para se pronunciar sobre a eventual cumulação ilegal de pedidos e, nessa sequência, veio solicitar que se considerasse não escrito o pedido formulado sob o número 1).
Findos os articulados, foi dispensada a realização de audiência preliminar, tendo sido proferido despacho saneador, homologada a desistência da instância relativamente ao pedido formulado sob o n.º 1, e delimitados os temas de prova.
Foi, ainda, fixado o valor da acção em € 45.725,92.
Procedeu-se à realizou-se da audiência de julgamento, com observância do formalismo legal.
I.2 Subsequentemente foi proferida sentença, fixando os factos e aplicando o direito, concluída com a decisão seguinte:
- «Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência, determino o seguinte:
Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de capital de € 3.208,78 a título de diferenças salariais nos termos indicados acrescida de juros de mora, sobre cada parcela salarial, desde a data do seu vencimento parcelar até integral pagamento;
Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de € 1.986,36 a título de férias e subsídio de férias vencidas em 1 de Janeiro de 2017 e proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio e Natal proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação do contrato, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data da cessação do contrato até integral pagamento; e
No mais, julgo improcedente a ação e, em consequência, absolvo a ré dos pedidos formulados.
Condeno autor e ré no pagamento das custas, na proporção do decaimento, sem prejuízo da isenção de que o autor beneficie.
Registe e notifique.
(..)».
I.3 Inconformado com a sentença, o autor interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes:
A) O presente recurso vem interposto da douta Sentença proferida em Primeira Instância, delimitando-se o âmbito do Recurso aos itens:
• A quantia de 25.337,48€ a título de Trabalho Suplementar.
• A quantia de 2.877,22€ a título de diferenças no subsídio de alimentação.
B) O presente recurso é de facto e de direito, incidindo também sobre a prova produzida em audiência de julgamento e gravada em suporte magnético.
C) Com o presente recurso o recorrente invoca junto do Venerando Tribunal “ad quem” o exercício do duplo grau de jurisdição e consequente reapreciação da prova produzida.
D) Com o presente recurso o recorrente não pretende a realização de um segundo julgamento, mas tão-somente a análise e reapreciação da prova nos termos do art. 662º n.º 2 do CPC.
E) O Principio do Inquisitório tem como objectivo superar insuficiências de alegação e de prova das partes.
F) In casu, esta intervenção correctiva aconteceu ao longo do processo, por isso se estranhou que o Mmo Juiz “a quo” não o tenha feito na situação. Acresce que,
G) O Mmo Juiz “a quo” no decurso de depoimento da testemunha D…, ordenou “Tout Court” a junção aos autos de um documento que esta testemunha era portadora. Vide Acta de Audiência de Julgamento de 13.12.2018, para onde se remete por uma questão de economia processual.
H) Com o devido respeito, que é muito, não pode o ora recorrente concordar que o Mmo. Juiz “a quo” tenha ordenado sem mais, a junção de um documento (cuja junção não foi previamente requerida pela parte e que quanto à mesma já tinha passado o prazo e a oportunidade de junção, referidas nos artigos 63º do CPT e 243º n.º 2 do CPC), que não era essencial para a boa decisão da causa e mesmo descoberta da verdade.
I) Ressalva-se que a testemunha trouxe o documento por sua iniciativa e não houve qualquer justificação para a sua junção. E,
J) Posteriormente não tenha tido igual comportamento com o autor/recorrente quando este alegou a verdade dos factos e justificou a junção tardia desses documentos. Além de que tais documentos eram fundamentais para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa.
K) Com o devido respeito, que é muito, o recorrente ficou expectante e convicto que a junção desses documentos fosse admitida ao abrigo do disposto no art. 423º n.º 3 CPC, mas fundamentalmente, em conformidade com o estatuído no art. 6º do CPC (P. do Dispositivo) aplicável ex vi aos presentes autos, por força do art. 1º do CPT. Nesta senda,
L) Na situação vertente o Tribunal “a quo” violou o disposto mormente nos art. 6º n.º 2 e 411º do CPC, e aplicável ex vi ao presente processo por força do art. 1º do CPT. Acresce que,
M) Com o CPC de 2013, assistiu-se a um enfraquecimento dos Princípios do Dispositivo e Auto Responsabilização das partes. No entanto,
N) Já desde a última reforma profunda do CPC anterior (ocorrida em 1995/1996) que tal rumo processual se pratica. A partir de então o Juiz assumiu um papel mais activo e interveniente a vários níveis, dirigido à correcção das deficiências e insuficiências reveladas na actividade processual das partes.
O) Não se quer com isto dizer, que as partes deixam de ter um papel activo e interventivo sobre o impulso processual que sobre elas impende.
P) O que deixou de existir foi uma conduta estanque em que as partes é que conduzem o processo a seu próprio risco. Elas é que têm de deduzir os meios de ataque e defesa que lhes correspondam (incluídas as provas). Sem prescindir,
Q) A este respeito se diz que o Autor/recorrente aquando da instauração da presente acção não tinha efectivamente os documentos juntos a 18.1.2019, na sua posse. Pois,
R) É consabido que se os tivesse, e os facultasse à sua mandatária, a construção da P.I. seria diferente do que foi. Pois a alegação do trabalho suplementar teria sido feita de uma forma mais consistente, cabal e baseada nos documentos em causa.
S) Cumpre no entanto ressalvar que a ré obrigava à entrega do livro/caderno quando completo. Não ficando o trabalhador com nenhum comprovativo do registo do seu trabalho.
T) Ressalva-se que, o autor/recorrente por diversas vezes interpelou a ré/recorrida para lhe facultar o duplicado do que registava, no entanto era-lhe sempre recusado. Sendo que,
U) O autor/recorrente só ficou com os registos que juntou em 18.1.2019 aquando da intervenção da ACT por queixa verbal sobre as irregularidades a este respeito cometidas pela ré/recorrida. E, foi esta entidade que alertou o autor/recorrente de que podia ficar com o comprovativo daquilo que registava. No entanto,
V) A ré ao longo dos anos em que o autor lá trabalhou sempre obrigou o autor a entregar tais registos, sem ficar com os respectivos comprovativos.
W) E por essa razão e pela distância temporal existente, aquando da instauração da presente acção, o autor estava plenamente convencido que só tinha os registos que juntou com a P.I.
X) Os documentos são meios de prova tendo como finalidade a demonstração da realidade dos factos. (art. 341º do CC). E, por essa razão devem ser juntos com o articulado onde esses factos são alegados. Todavia,
Y) A obtenção superveniente de um documento não supre, a falta de alegação oportuna do facto a provar pelo documento. Ac. Do STJ de 17.2.2000. Sem conceder,
Z) E, se é verdade que o autor/recorrente não juntou estes documentos com a P.I., não é menos verdade que ao abrigo do disposto nos arts. 411º e 423º n.º 3 ambos do CPC o Tribunal “a quo” podia e devia ter admitido tais documentos. Sendo que,
AA) Quando encontrou estes documentos, entendeu que os mesmos eram relevantes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, assim como para a justa composição do litígio e por isso os juntou.
BB) O art. 411º do CPC consagra o poder-dever do Juiz precisamente para colmatar falhas ou imprecisões das partes ou patrocínio, que sejam relevantes para justa composição do litígio e sorte da Lide.
CC) Não o tendo feito o Tribunal “a quo” requer-se nesta sede ao Tribunal “Ad quem” que o faça ao abrigo deste normativo legal. Sem prescindir,
DD) A Posição do Tribunal “a quo” levou a que não fosse feita justiça sobre esta questão, no entanto, entende-se que não constitui nulidade. Pelo que não foi pedida em sede própria.
EE) Constituindo assim, uma irregularidade que pode ser sanada pelo Tribunal “Ad Quem” o que aqui e agora se requer. Sem conceder,
FF) Ao Decidir desse modo o Mmo Juiz “a quo” fragilizou a prova do autor/recorrente no que concerne ao trabalho suplementar. Mesmo assim, havia prova suficiente e cabal para prova do trabalho suplementar, se mais não fosse, nos últimos cinco anos antes da cessação do contrato de trabalho. Vejamos:
GG) A causa de pedir de um crédito relativo à prestação de trabalho suplementar é constituída pela alegação do horário de trabalho, com indicação do início e do termo, do período normal de trabalho, os intervalos e a indicação das horas prestadas fora do horário de trabalho. Neste sentido vide Ac. Do TRL de 17.2.2016.
HH) Sendo que, se considera trabalho suplementar todo aquele que é praticado fora do horário de trabalho. Assim,
II) Resulta da prova gravada que o período normal de trabalho diário é das 8h às 12h e das 13h às 18h, de Segunda a Sexta-feira, tendo por isso só uma hora de almoço. Vide Excerto do depoimento da testemunha F… a este respeito (corpo do recurso) e para onde se remete por uma questão de economia processual.
JJ) É exigível o pagamento do trabalho suplementar cuja prestação tenha sido prévia, ou expressamente determinada, ou realizada de modo a não ser previsível a oposição do empregador. O que com o respeito que se impõe, aconteceu na situação retratada.
KK) A hora de trabalho suplementar diária foi prestada sempre com o conhecimento e consentimento da ré/recorrida.
LL) A este respeito depôs a testemunha F…, que prestou um depoimento isento e conhecedor dos factos. O depoimento desta testemunha revelou-se importante para aquilatar o modo e o porquê da prestação de uma hora diária de trabalho suplementar.
MM) Inversamente, e respigados os depoimentos das testemunhas D… e E…, constata-se que não é crível a versão trazida por estas testemunhas de que poderia por vezes existir um horário de trabalho com duas horas para almoço. Neste sede se invoca o que está dito e transcrito a este respeito no corpo do recurso.
NN) Não colhe assim, a versão trazida pela ré/recorrida que um dia completo de trabalho para os funcionários são 9h. É consabido, constituindo facto notório que um dia de trabalho são 8h, quer para os trabalhadores da recorrida, quer para os restantes trabalhadores. E, que um dia de trabalho não pode ser superior a 8h.
OO) Afigura-se seriamente ao recorrido que como até 2000, o período normal de trabalho era de 9h, e, até aí eram registadas as 9h. Sendo que, posteriormente, de forma ardilosa, a recorrida permitiu e incentivou que os seus trabalhadores continuassem a fazer a nona hora, alegando que a mesma era para o tempo de inverno. No entanto,
PP) Ficou inequivocamente provado que no tempo de inverno continuavam a fazer o mesmo horário de trabalho, não havendo desconto desta hora extra.
QQ) Muito menos ficou provada a tese da ré de que havia dois horários de trabalho, muito menos que a opção por um desses horários de trabalho era feita quase diariamente por acordo entre a ré e os trabalhadores que estavam na obra em função das características dessa mesma obra. Nesta senda,
RR) O autor/recorrente com o conhecimento da ré/recorrida e em seu beneficio prestou as horas de trabalho suplementar peticionadas nos presentes autos.
SS) O empregador não deve beneficiar sem contrapartida de um ganho ou proveito efectivo decorrente do trabalho suplementar prestado pelo trabalhador.
TT) Não é crível que a ré/recorrida não possua os documentos que foram solicitados pelo Tribunal (pelo menos alguns devia de ter, se mais não fosse os dos últimos cinco anos a que estava obrigada a guardar).
UU) Ainda no que respeita ao trabalho suplementar, a recorrida alega que não houve qualquer trabalho suplementar prestado pelo recorrente. No entanto, quer o seu legal representante, quer o seu director financeiro (a testemunha D…) afirmaram que havia trabalho “extra”.
VV) Como de resto resulta provado, remetendo-se nesta sede para o que está dito sobre esta matéria no corpo do recurso.
WW) Houve por isso erro notório na apreciação da prova, que aqui se invoca e requer. Não tendo o Tribunal “a quo” valorado convenientemente a prova produzida. E, assim,
XX) Vem o recorrente em sede recursal requer ao Tribunal “Ad Quem” que face à prova produzida valorize de forma justa e adequada a mesma e deitando mão dos normativos legais supra citados (mormente dos art.s 430º e 417º do CPC e 344º n.º 2 do CC), revogue no que respeita ao trabalho suplementar a Sentença recorrida.
YY) No que tange à não apresentação de documentos, refere-se que a recorrida estava a manter os documentos solicitados pelo menos os últimos cinco anos. A ré/recorrida estava bem ciente que com a recusa em fornecer os documentos, tornou praticamente impossível a prova do autor, essencialmente em anos e/ou meses de que o autor não tinha elementos (recibos). Adoptando assim um comportamento culposo. Ora,
ZZ) É evidente que a recusa da ré/recorrida não encaixa no disposto do n.º 3 do art. 417º do CPC. Assim sendo, nos termos e para os efeitos do art. 417º n.º 1 e principalmente do n.º 2, podia e devia o Mmo Juiz “a quo” apreciar livremente a recusa para efeitos probatórios. Isto sem prejuízo da inversão do ónus da prova a que alude o art. 344º n.º 2 do CPC. No entanto,
AAA) Não foi esse o entendimento plasmado na sentença em crise; que com o devido respeito se diz não valorou convenientemente a recusa da ré, em prejuízo do recorrido. Com o devido respeito, se diz que não se pode concordar com tal decisão. Desde logo porque, nos quadros que constam da douta Sentença “a quo” constata-se que há anos em que o Tribunal não pôde aquilatar a quantia que o autor/recorrente recebeu a título de subsídio de refeição. Assim sendo,
BBB) A decisão proferida sobre esta matéria ficou prejudicada pela ausência de elementos. Elementos esses que a ré/recorrida recusou-se injustificadamente a fornecer.
CCC) Cumpre referir que, foi ouvida sobre esta questão a testemunha D…, tendo este sobre esta matéria testemunhado de forma esquiva de que salienta ao minuto 5:45 do seu depoimento.
DDD) A ré/recorrida estava bem ciente que com a recusa em fornecer os documentos, tornou praticamente impossível a prova do autor, essencialmente em anos e/ou meses de que o autor não tinha elementos (recibos). Adoptando assim um comportamento culposo. Não suscitando dúvida em afirmar que o dever de boa-fé foi reiteradamente violado pela recorrida.
EEE) A Sentença recorrida violou nomeadamente os normativos legais Arts. 6º, 411º, 417º, 423º n.º 3, do CPC e 344º do CC.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO V.EXAS. DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, ASSIM, REVOGADA A DECISÃO RECORRIDA.
I.4 A Recorrida apresentou contra alegações, finalizando-as com as conclusões seguintes:
a) O A. não cumpriu o ónus previsto no art. 640º do CPC, o que implica que se considere que só dispunha de 20 dias para recorrer e que não respeitou tal prazo, pelo que o respetivo requerimento de recurso deverá ser indeferido (art. 641/2, alínea a, do CPC).
b) Sem conceder, o incumprimento do ónus previsto no art. 640º do CPC determinará sempre a rejeição da impugnação da decisão sobre a matéria de facto (art. 640º/1 do CPC), não podendo ser conhecidas as conclusões de recurso FF) a EEE).
c) O trânsito em julgado do despacho de 13.02.2019 tem por consequência a improcedência das conclusões de recurso E) a EE).
I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, nos termos do art.º 87.º3, do CPT, tendo-se pronunciado no sentido da improcedência do recurso.
I.6. Cumpriram-se os vistos legais e foi determinado que o processo fosse submetido à conferência para julgamento.
I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho], coloca-se para apreciação o seguinte:
i) Tempestividade do recurso;
ii) Impugnação da decisão proferida pelo tribunal a quo, em 13-02-2019, na audiência de julgamento;
iii) Saber se o tribunal a quo errou o julgamento na apreciação da matéria de facto;
iv) Saber se o Tribunal a quo errou o julgamento na aplicação do direito aos factos.
II. Tempestividade do recurso
A recorrida vem defender que o A. não cumpriu o ónus previsto no art.º 640º do CPC, o que implica que se considere que só dispunha de 20 dias para recorrer e que não respeitou tal prazo, pelo que o respetivo requerimento de recurso deverá ser indeferido.
Como nota prévia, importa assinalar que não se aplica ao caso a alteração introduzida ao art.º 80.º/1, do CPT, pela Lei n.º 107/2019, de 09 de Setembro, da qual resulta que o prazo para interposição do recurso de apelação passou a ser de 30 dias, ao invés dos 20 dias estabelecidos anteriormente. Com efeito, as alterações introduzidas em matéria de admissibilidade e de prazos de interposição de recurso apenas se aplicam aos recursos interpostos de decisões proferidas após a sua entrada em vigor (art.º 5.º/3), sendo que no caso a decisão foi proferida em 18-02-2019 (notificada a 14-03-2019) e o diploma entrou em vigor 30 dias após a sua publicação (art.º 9.º/1).
Assim, como refere a recorrida, na versão da norma aplicável (80.º/1), o prazo de interposição do recurso é de 20 dias, mas se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, o mesmo será acrescido de 10 dias.
Como elucida o AC. STJ de 25-03-2010 [Proc.º n.º 740/07.3TTALM.L1.S1, Conselheiro Mário Pereira, disponível em www.dgsi.pt], este alargamento do prazo quando o recurso tenha por objecto a reapreciação da prova gravada “encontra justificação no maior dispêndio de tempo de que o interessado carece, nessa eventualidade, para elaborar e apresentar a alegação, pois que a lei lhe impõe um especial ónus de alegação no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à sua fundamentação (…) consistente na indicação dos depoimentos que se consideram relevantes para a alteração das respostas aos quesitos, os locais precisos onde se encontram registados, de modo a que facilmente seja possível apurar a autoria dos depoimentos e o momento em que os mesmos se iniciaram e cessaram”. Todavia, o incumprimento dos ónus impostos pelo art.º 640.º CPC, “não tem por consequência a intempestividade do recurso no que ao segmento da matéria de direito diz respeito, nas situações em que o recurso tenha sido interposto após o decurso do prazo de 20 dias”, apenas implicando a rejeição da apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
No caso, o recorrente não só faz menção expressa de pretender impugnar a matéria de facto, como para alem disso produz alegações com esse propósito e procura sustentá-las, para além do mais, com invocação de prova testemunhal, identificando as testemunhas, transcrevendo extractos dos testemunhos e indicado os minutos da gravação.
Não assiste, pois, razão à recorrida. Poderá o recorrente não ter cumprido devidamente os ónus de impugnação, mas essa é questão diversa que adiante apreciaremos, nada obstando à admissibilidade do recurso por questões de tempestividade.
III. Impugnação da decisão proferida pelo tribunal a quo em 13-02-2019, na audiência de julgamento
Resulta das conclusões E a EE, que o recorrente pretende pôr em causa a decisão proferida pelo Tribunal a quo, não admitindo documentos que pretendeu juntar. Sustenta que, «ao abrigo do disposto nos arts. 411º e 423º n.º 3 ambos do CPC o Tribunal “a quo” podia e devia ter admitido tais documentos».
Alega o recorrente entender que aquela decisão «não constitui nulidade. Pelo que não foi pedida em sede própria», mas antes uma «irregularidade que pode ser sanada pelo Tribunal “Ad Quem” o que aqui e agora se requer”, pretendendo que este «Tribunal “Ad quem” (..) o faça ao abrigo deste normativo legal” [Conclusões CC, DD e EE].
Pese embora este percurso algo impreciso, no rigor das coisas conclui-se que o recorrente pretende ver revogada aquela decisão, para em substituição ser determinada a admissibilidade da junção dos documentos.
O despacho em crise, proferido em 13-02-2019, no início da audiência de julgamento, tem o conteúdo seguinte:
-«O autor veio apresentar um conjunto de documentos [mais de três centenas] para prova do trabalho suplementar alegando que a sua apresentação se justifica por força da existência de contradições entre depoimentos e que só agora encontrou os documentos pois não se recordava que os tinha na sua posse.
Nos termos do artigo 63.º, n.º 1, do CPT, as provas devem ser apresentadas com os articulados. Em complemento, mais especificamente quanto aos documentos, a mesma regra consta do n.º 1, do artigo 423.º, do CPC, sendo que, no entanto, confere dois prazos adicionais caso se verifiquem circunstâncias específicas. A primeira consta do n.º 2 e amplia o prazo até 20 dias antes da audiência, com a sanção de multa, exceto se o apresentante demonstrar que não pôde apresentar o documento anteriormente. A segunda, relevante para o presente caso, consta do n.º 3 e abrange os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao momento anteriormente referido ou que se tenham tornado necessários em virtude de ocorrência posterior.
No caso concreto, a necessidade surgiu com a petição inicial, sendo que o motivo invocado para que o autor não tenha anteriormente apresentado estes documentos, só a ele pode ser imputado pois os documentos estavam na sua posse e só a sua falta de diligência levou a que só neste momento o apresentasse.
Acresce que a junção dos documentos não se tornou necessária mercê da existência de divergências nos depoimentos das testemunhas pois a sua necessidade resulta da alegação do autor no sentido de que fez trabalho suplementar e o próprio autor, reconhecendo essa necessidade, juntou com a petição inicial alguns documentos semelhantes aos que agora apresenta – folhas 18/19.
Pelo exposto, não admito a apresentação dos documentos que constam a folhas 123 verso a 495 e, em consequência, determino a sua devolução ao autor, ficando cópia nos autos para documentar o incidente.
Mais condeno o autor nas custas do incidente, fixando a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique».
Defende a recorrida, que o trânsito em julgado do despacho de 13.02.2019 tem por consequência a improcedência das conclusões de recurso E) a EE). Como melhor se retira das contra-alegações, aquela conclusão estriba-se no entendimento seguinte:
- “(..) se o A. não concordava com o conteúdo deste despacho, poderia tê-lo impugnado judicialmente, através do recurso próprio para este efeito (art. 691/2, alínea i) do CPC, ex vi art. 79º-A, nº2, aln. i) do CPT), com subida imediata, a interpor no prazo de 10 dias (art. 80º/2 do CPT), com subida em separado (art. 83º- A/2 do CPT) e com efeito meramente devolutivo (art. 83º/1 do CPT).
O A. não recorreu deste despacho e o mesmo transitou em julgado.
Ora, uma vez que este despacho transitou em julgado, não pode agora o A., através do recurso que interpôs da sentença final, vir questionar a decisão que não admitiu a junção aos autos dos documentos de fls. 123 verso a 495».
Vejamos, então, se a decisão é, ou não, impugnável conjuntamente com o recurso da sentença.
Importa assinalar de novo, que também quanto a este ponto não se aplica a versão actual do art.º 79-A, do CPT, resultante das alterações introduzidas pela Lei n.º 107/2019, de 09 de Setembro, dado o artigo reger sobre a admissibilidade do recurso de apelação, por essa razão apenas tendo aplicabilidade aos recursos interpostos de decisões proferidas após a sua entrada em vigor (art.º 5.º/3, daquela Lei), sendo que no caso a decisão foi proferida em 18-02-2019 (notificada a 14-03-2019) e o diploma entrou em vigor 30 dias após a sua publicação (art.º 9.º/1).
Num breve parêntesis, para que melhor se compreenda, não é despiciendo referir que o actual art.º 79.º A, n.º 2, alínea d), prevê expressamente caber recuso imediato de apelação “Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova”.
Prosseguindo, se bem atentarmos no artigo 79.º A, do CPC, dele resulta uma clara distinção entre dois tipos de decisões: as que estão sujeitas a impugnação imediata, daquelas outras cuja impugnação é relegada para momento ulterior.
Como elucida Abrantes Geraldes [na obra Recursos no Processo do Trabalho, Almedina, Coimbra, 2010, p.33], com as alterações introduzidas ao regime recursivo em processo civil pelo Decreto-Lei n.º303/07, de 24 de Agosto, a lei passou a admitir dois regimes diversos: as decisões que ponham termo ao processo e as decisões tipificadas no n.º 2 do art.º 79.º A do CPT são passíveis de recurso, de tal modo que se este não for interposto dentro do prazo legal (20 ou 10 dias, nos termos do art.º 80.º n.ºs 1 e 2) formarão caso julgado material ou formal; as restantes decisões que sejam impugnáveis podem sê-lo juntamente com o recurso da decisão final (art.º 79.º n.º 3 do CPT) [pág. 33].
Como se sabe, o pretérito Código de Processo Civil foi revogado com a entrada em vigor do novo CPC, aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, a qual ocorreu a 1 de Setembro de 2013 (art.º 8.º/Lei 41/2013). Contudo, não tendo sido introduzidas alterações àquele princípio do regime recursivo do CPC, aquela afirmação mantem inteira validade.
Não suscita qualquer dúvida que a decisão em causa rejeitou um meio de prova.
Portanto, para que a decisão fosse imediatamente recorrível terá que enquadrar-se nas decisões tipificadas no n.º2, do art.º 79.º A. do CPT.
O n.º2 do art.º 79.º A, na parte para aqui relevante, dispõe o seguinte:
[2] Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
(..)
i) Nos casos previstos nas alíneas c), d), e), h), i), j) e l) do n.º2 do artigo 691.º do Código de Processo Civil e nos demais casos expressamente previstos na lei”.
O Código de Processo do Trabalho não regula – nem nunca regulou nas suas versões anteriores - exaustivamente o regime recursivo do processo laboral, daí resultando a necessidade de recorrer subsidiariamente ao regime recursivo do Código de Processo Civil em tudo o que não é especificamente regulado pela lei processual laboral.
Ao artigo 691.º do pretérito CPC, para o qual continuou a remeter o art.º 79.º A, do CPT, corresponde no novo CPC o artigo 644.º, com a epígrafe “Apelações Autónomas”.
Mas como é sabido, o legislador não cuidou de alterar imediatamente o CPT de modo a adequá-lo ao novo Código de Processo Civil, só o vindo a fazer recentemente, seis anos decorridos, através da Lei n.º 107/2019, de 09/09.
A presente acção foi instaurada após a entrada em vigor do CPC vigente, logo, é este diploma a lei adjectiva subsidiária aplicável aos casos omissos no Código do Processo do Trabalho, nos termos estabelecidos no art.º 1.º n.º2 deste diploma.
Suscita-se assim uma questão prévia, em concreto, a de saber se a remissão feita para o art.º 691.º do CPC entretanto revogado, deve ser entendida como dirigida ao correspondente artigo 644.º do actual CPC, entendimento subjacente no despacho do Tribunal a quo.
O artigo 79.º A foi introduzido com as alterações operadas ao Código de Processo do Trabalho através do Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de Outubro, as quais, como elucida o respectivo preâmbulo, visaram adequar a lei adjectiva às alterações introduzidas com a revisão do Código do Trabalho, pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, “e pela conformação de várias normas de processo do trabalho aos princípios orientadores da reforma processual civil, nomeadamente em matéria de recursos (..)”.
Em suma, o art.º 79.ºA teve também por objectivo harmonizar o regime de recursos laboral com a reforma dos recursos processuais civis efectuada pelo Decreto-lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto.
O actual art.º 644.º introduziu algumas alterações relativamente ao que se prescrevia no artigo 691.º do CPC, no que concerne ao elenco das decisões de que cabe recurso imediato de apelação.
Cingindo-nos ao que aqui releva, nos termos do artigo 691.º do pretérito CPC, cabia recurso de apelação autónomo do “[D]espacho de admissão ou rejeição de meios de prova” [n.º 2 al. i)]. A correspondente norma do art.º 644.º, em concreto a alínea d), do n.º2, continua a consagrar essa solução - mas vai mais além estendo-a também aos despachos que admitam ou rejeitem algum articulado -, ao dispor o seguinte: “Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova”.
Tem sido entendimento da jurisprudência, ao que cremos pacifico nos casos em que há uma correspondência de previsões, que a norma da al. i) do n.º2, do art.º 79.ºA, deve ser interpretada numa perspectiva actualista que não a esvazie de conteúdo, isto é, aceitando-se a remissão como feita para as alíneas do n.º2, do actual art.º 644.º.
No caso, este entendimento não suscita qualquer polémica, visto que a remição para o art.º 691.º, do pretérito CPC, levava já a que do “[D]espacho de admissão ou rejeição de meios de prova” [n.º 2 al. i)], coubesse apelação autónoma e imediata.
Assim, em linha com esse entendimento, considera-se que a remissão da alínea i) do n.º2, do art.º 79.º A do CPT, para a al. i), do n.º2, do artigo 691.º do pretérito CPC, deve ser interpretada em sentido actual, como sendo agora dirigida à previsão da alínea d), do n.º2, do art.º 644.º, do CPC vigente.
Por conseguinte, como defende a recorrida, discordando o autor daquela decisão que não lhe admitiu a junção de documentos, deveria ter dela interposto recurso de apelação autónomo e imediato, no prazo de dez dias (art.º 80.º/2, CPT).
Como assim não procedeu, a decisão transitou em julgado, não podendo já ser impugnada com o presente recurso da sentença.
Concluindo, quanto a esta questão, a que respeitam as conclusões E a EE, rejeita-se à apreciação do recurso. O despacho em crise, proferido em 13-02-2019
IV. FUNDAMENTAÇÃO
IV.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco factual seguinte:
A] De facto.
1. Factos provados:
1. Mediante contrato de trabalho verbal firmado em 01 de Fevereiro de 1995, a ré admitiu o autor ao seu serviço para, mediante retribuição, lhe prestar serviço sob a sua direcção e fiscalização, como Serralheiro.
2. O autor manteve-se, ininterruptamente ao serviço da ré até 11 de Fevereiro de 2017, data em foi vítima de um acidente de trabalho.
3. O autor regressou ao trabalho em 13.9.2017 e rescindiu o contrato de trabalho, sem justa causa, com observância do pré-aviso legalmente estabelecido de 60 dias, tendo a prestação de trabalho cessado em 27 de Novembro de 2017.
4. Por carta datada de 10 de Novembro de 2017, o autor através da sua mandatária, interpelou a ré para pagamento dos créditos vencidos.
5. Em resposta à carta supra referida a ré transferiu em 5/12/2017 a quantia de 309,00€.
6. No ano de 1995, a ré pagava ao autor. Pelo menos, a quantia de € 250,54 a título de retribuição base.
7. No ano de 1996, a ré pagava ao autor a quantia de € 267,70 a título de retribuição base.
8. No ano de 1997, a ré pagava ao autor a quantia de € 282,07 a título de retribuição base.
9. No ano de 1998, a ré pagava ao autor a quantia de € 317,20 a título de retribuição base.
10. No ano de 1999, a ré pagava ao autor a quantia de € 375,96 a título de retribuição base.
11. No ano de 2000, a ré pagava ao autor a quantia de € 377,59 a título de retribuição base.
12. No ano de 2001, a ré pagava ao autor a quantia de € 397,97 a título de retribuição base.
13. No ano de 2002, a ré pagava ao autor a quantia de € 417 a título de retribuição base e o valor diário de € 4 a título de subsídio de alimentação;
14. No ano de 2003, a ré pagava ao autor a quantia de € 427,80 a título de retribuição base.
15. No ano de 2004, a ré pagava ao autor a quantia de € 427,80 a título de retribuição base.
16. No ano de 2005, a ré pagava ao autor a quantia de € 427,80 a título de retribuição base e a quantias diária de € 5,47 a título de subsídio de alimentação.
17. No ano de 2007, a ré pagava ao autor a quantia diária de € 6,05 a título de subsídio de alimentação.
18. No ano de 2008, a ré pagava ao autor a quantia de € 518,50 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5 a título de subsídio de alimentação.
19. No ano de 2009, a ré pagava ao autor a quantia de € 539,50 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5 a título de subsídio de alimentação.
20. No ano de 2010, a ré pagava ao autor a quantia de € 545 a título de retribuição base e pelo menos quantia diária de € 5,13 a título de subsídio de alimentação.
21. No ano de 2011, a ré pagava ao autor a quantia de € 545 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5,13 a título de subsídio de alimentação.
22. No ano de 2012, a ré pagava ao autor a quantia de € 545 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5,65 a título de subsídio de alimentação.
23. No ano de 2013, a ré pagava ao autor a quantia de € 545 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5,65 a título de subsídio de alimentação.
24. No ano de 2014, a ré pagava ao autor a quantia de € 545 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5,65 a título de subsídio de alimentação.
25. No ano de 2015, a ré pagava ao autor a quantia de € 550 a título de retribuição base e pelo menos a quantia diária de € 5,70 a título de subsídio de alimentação.
26. No ano de 2016, a ré pagava ao autor a quantia de € 555 a título de retribuição base e a quantia diária de € 5,75 a título de subsídio de alimentação.
27. No ano de 2017, a ré pagava ao autor a quantia de € 559 a título de retribuição base e a quantia diária de € 5,75 até Julho e de € 5,81 a partir de Agosto a título de subsídio de alimentação.
28. Pelo menos desde 2002, a ré pagou ao autor quantias mensais a título de “Gratificação p/Acta” ou “Prémio de produção”.
2. Factos não provados:
1. Desde que entrou ao serviço da ré (1.2.1995) o autor praticou, diariamente o seguinte horário de trabalho fixo: Das 8h-12h e das 13h às 18h.
2. O horário de trabalho mencionado supra foi fixado pela Ré.
3. Antes de 2002, a ré pagou ao autor quantias mensais a título de “Gratificação p/Acta” ou “Prémio de produção”.
4. No ano de 2003, durante todo o ano, a ré pagou ao autor a quantia de € 924 a título de subsídio de alimentação.
5. No ano de 2004, durante todo o ano, a ré pagou ao autor a quantia de € 924 a título de subsídio de alimentação.
6. No ano de 2006, a ré pagava ao autor a quantia de € 427,80 a título de retribuição base e, durante todo o ano, pagou-lhe a quantia de € 924 a título de subsídio de alimentação.
7. No ano de 2007, a ré pagava ao autor a quantia de € 427,80 a título de retribuição base.
IV.2 IMPUGNAÇÃO da DECISÃO SOBRE a MATÉRIA DE FACTO
O recorrente insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto, pretendendo a reapreciação da mesma e a sua alteração, defendendo que há erro notório na apreciação da prova [Conclusão WW] e pedido que este Tribunal “valorize de forma justa e adequada a mesma e (..), revogue no que respeita ao trabalho suplementar a Sentença recorrida (Conclusão XX).
Por seu turno, a recorrida vem defender, que o recorrente não cumpre o ónus de impugnação previsto no art. 640º do CPC, determinando a rejeição da impugnação da decisão sobre a matéria de facto (art. 640º/1 do CPC), em consequência não podendo ser conhecidas as conclusões de recurso FF) a EEE).
Conforme decorre do n.º1 do art.º 662.º do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Nas palavras de Abrantes Geraldes, “(..) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância” [Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222].
Pretendendo a parte impugnar a decisão sobre a matéria de facto, deve observar os ónus de impugnação indicados no art.º 640.º do CPC, ou seja, é-lhe exigível a especificação obrigatória, sob pena de rejeição, dos pontos mencionados no n.º1 e n.º2, enunciando-os na motivação de recurso, nomeadamente os seguintes:
- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
- Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
A propósito do que se deve exigir nas conclusões de recurso quando está em causa a impugnação da matéria de facto, sendo estas não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações, mas atendendo sobretudo à sua função definidora do objeto do recurso e balizadora do âmbito do conhecimento do tribunal, é entendimento pacífico que as mesmas devem conter, sob pena de rejeição do recurso, pelo menos uma síntese do que consta nas alegações da qual conste necessariamente a indicação dos concretos pontos de facto cuja alteração se pretende e o sentido e termos dessa alteração [cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: de 23-02-2010, Proc.º 1718/07.2TVLSB.L1.S1, Conselheiro FONSECA RAMOS; de 04/03/2015, Proc.º 2180/09.0TTLSB.L1.S2, Conselheiro ANTÓNIO LEONES DANTAS; de 19/02/2015, Proc.º 299/05.6TBMGD.P2.S1, Conselheiro TOMÉ GOMES; de 12-05-2016, Proc.º 324/10.9TTALM.L1.S1, Conselheira ANA LUÍSA GERALDES; de 27/10/2016, Proc.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, Conselheiro RIBEIRO CARDOSO; e, de 03/11/2016, Proc.º 342/14.8TTLSB.L1.S1, Conselheiro GONÇALVES ROCHA (todos eles disponíveis em www.dgsi.pt)].
Para além disso, exige-se também que o recorrente fundamente “em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa” [cfr. Ac. STJ de 01-10-2015, [Proc.º n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1, Conselheira Ana Luísa Geraldes, disponível em www.dgsi.pt].
É também entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do STJ, que o recorrente não cumpre o ónus de especificação imposto no art.º 640º, nº 1, al b), do CPC, quando procede a uma mera indicação genérica da prova que, na sua perspetiva, justifica uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal de 1.ª Instância, em relação a um conjunto de factos, sem especificar quais as provas produzidas quanto a cada um dos factos que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, fazendo a apreciação crítica das mesmas. Nesse sentido, acompanhando o entendimento afirmado nos acórdãos do STJ de 20-12-2017 e 5-09-2018 [respectivamente, nos processos n.ºs 299/13.2TTVRL.C1.S2 e 15787/15.8T8PRT.P1.S2, disponíveis em www.dgsi.pt], no mais recente acórdão de 20-02-2019, daquela mesma instância [proc.º 1338/15.8T8PNF.P1.S2, Conselheiro Chambel Mourisco, disponível em www.dgsi.pt], consignou-se no respectivo sumário o seguinte:
- I. O artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil estabelece que se especifique os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e determina que essa concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, e quando gravados com a indicação exata das passagens da gravação em que se funda o recurso.
II - Não cumpre aquele ónus o apelante que nas alegações não especificou os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, relativamente a cada um dos factos concretos cuja decisão impugna, antes se limitando a proceder a uma indicação genérica e em bloco, para aquele conjunto de factos.
A este propósito, Abrantes Geraldes, após observar que a possibilidade de alteração da matéria de facto deixou de ter carácter excepcional, acabando “por ser assumida como uma função normal do Tribunal da Relação, verificados os requisitos que a lei consagra”, logo prossegue advertindo que “Nesta operação foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por abrir apenas a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente“ [Op. cit., p. 123/124].
Acresce dizer, que conforme o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido, quando o recorrente não cumpra o ónus imposto no art.º 640.º do Código de Processo Civil não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento, que está reservado para os recursos da matéria de direito [Cfr. acórdãos de 7-7-2016, processo n.º 220/13.8TTBCL.G1.S1, Conselheiro Gonçalves Rocha; e, de 27-10-2016, processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, Conselheiro Ribeiro Cardoso; (ambos disponíveis em www.dgsi.pt)].
Atentos estes princípios, como primeiro passo, impõe-se verificar se algo obsta à apreciação da impugnação.
IV.2.1 No que concerne às conclusões constata-se que o recorrente não cumpriu com o que se entende minimamente exigível, isto é, suficiente, dado não ter indicado quais os factos concretos que impugna, de entre os provados e não provados, oferecendo a resposta alternativa que propõe para cada um deles.
Com efeito, percorrendo as conclusões FF) a EEE), verifica-se que o recorrente, de permeio com alegações de direito e da afirmação da sua convicção quanto à prova sobre a matéria do trabalho suplementar em geral, refere-se antes à matéria controvertida em geral, genericamente reconduzida à questão da prestação do trabalho suplementar, sem que em momento algum indique quais os factos provados ou não provados que questiona e a resposta alternativa, ou quais os factos concretos que alegou e onde, que deveriam ter sido julgados provados e com que redação precisa.
De resto, para que fique claro, é pertinente referir que tal quadro não resulta de uma deficiente formulação das conclusões, isto é, do recorrente não ter sabido sintetizar nas conclusões o que usou como fundamento nas alegações, antes sendo a consequência necessária da deficiência das próprias alegações de recuso. Dito de outro modo, as conclusões não cumprem o ónus apontado pela simples razão que nas alegações também não se descortina a necessária indicação dos factos concretos cuja alteração se pretende e em que sentido. Ademais, note-se, as conclusões praticamente correspondem às alegações, no essencial apenas tendo sido retirados os extractos do testemunho invocado.
Em consonância com o entendimento jurisprudencial apontado, sublinha-se que a deficiência apontada é o bastante para importar a rejeição da apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Não obstante, diremos algo mais para evidenciar que existem outros aspectos que levam ao incumprimento dos ónus de impugnação apontados.
Pretendendo o recorrente impugnar a decisão sobre a matéria de facto, impunha-se-lhe que procurasse evidenciar que os factos concretos que deveriam ter sido considerado provados, ou não provados, elencando as razões pertinentes relativamente a cada um deles, devidamente sustentadas com os meios de prova, nomeadamente, do testemunho que invoca, na parte precisa em que eventualmente incidiu sobre cada um desses factos.
Não foi esse o método seguido pelo recorrente, antes fazendo a impugnação genérica sobre a matéria relativa à questão de saber se prestou ou não o trabalho suplementar, isto é, em bloco apenas insurgindo-se contra a valoração que o Tribunal a quo fez da prova, para concluir que “face à prova produzida que em relação ao Trabalho Suplementar existiram elementos probatórios idóneos e suficientes para que a ré/recorrida seja condenada a pagar o trabalho suplementar prestado pelo autor/recorrido».
Por conseguinte, no rigor das coisas, contrariamente ao que começa por dizer nas suas alegações e conclusões [cfr. conclusão D)], o que o recorrente pretendente é um segundo julgamento da causa quanto a essa matéria, procurando fazer prevalecer a sua convicção àquela que foi formada pelo Tribunal a quo.
Em conclusão, entende-se que não foram devidamente cumprido os ónus de impugnação, em conformidade com o disposto nas alíneas a), b) e c) do n.º1, do art.º 640.º CPC, implicando tal consideração a rejeição da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
IV.3 MOTIVAÇÃO de DIREITO
Como resulta das conclusões, bem assim da pretensão final, o recorrente impugna a sentença na vertente da aplicação do direito aos factos apenas no pressuposto de ver atendida a reapreciação da matéria de facto. No recurso não é colocada qualquer questão de eventual erro de julgamento na determinação, interpretação e aplicação do direito aos factos provados e considerados pelo Tribunal a quo para aquele efeito.
Assim, rejeitando-se a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, necessariamente fica prejudicada qualquer outra apreciação, significando isso que o recurso improcede e, logo, que a sentença recorrida deverá ser confirmada.

V. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação o seguinte:
i) Rejeitar o recurso na parte dirigida a impugnar a decisão proferida pelo tribunal a quo em 13-02-2019, na audiência de julgamento;
ii) Rejeitar a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
iii) Julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas do recurso a cargo do recorrente, atento o decaimento (art.º 527.º do CPC).

Porto, 17 de Fevereiro de 2020
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira