Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANA PAULA CARVALHO | ||
Descritores: | MENORES MODALIDADES DE CITAÇÃO CITAÇÃO MANDATÁRIO CITAÇÃO URGENTE CITAÇÃO PRÉVIA À DISTRIBUIÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP201202231183/11.0TJPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 02/23/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO. | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Legislação Nacional: | ARTº 233º, 234º, 245º, 278º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
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Sumário: | I - O art. 233 n° 3 do CPC, com referencia aos arts 245 n° 1, 2 e 3 e 246 do CPC, apenas disciplinam as modalidades de citação, concretamente, a promovida pelo mandatário. II - Estas normas não versam sobre a citação urgente e prévia à distribuição. III - Esta forma de citação é regulada no art. 478 do CPC e depende sempre de um despacho judicial que defere ou indefere essa pretensão, conforme resulta expressamente, ainda, do art. 234 n° 4 f) do CPC, só assim se acolhendo e interpretando o ordenamento jurídico de forma coerente e harmoniosa. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 1183/11.0tjprtp1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto Relatório B… intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo sumário contra C…, SA. Alega, no essencial, que em 15.6.2008 ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo por si conduzido e um veículo cujo risco de circulação se encontrava transferido para a R, por contrato de seguro titulado pela apólice nº ……... Em consequência do embate o A sofreu danos na sua esfera patrimonial para cujo ressarcimento pede a quantia de 6.707,06€, acrescida de juros de mora à taxa legal, a contar da citação até integral pagamento. No cabeçalho da petição inicial é efectuada a seguinte menção “Requerida a Citação Urgente, nos termos do art. 478 CPC”. Já no artigo 4º do mesmo articulado refere que “o mandatário aqui expressamente declara que na presente data de 15.6.2011 promoveu e foi realizada a citação da R pela Exma. Sra. Solicitadora de Execução”. No demais articulado não consta qualquer requerimento para a realização da citação urgente nem são invocados fundamentos para tal acto ser realizado. Na aludida certidão de citação, promovida pelo ilustre mandatário, consta, sob a epígrafe Objecto e Fundamento da Citação, nos termos dos arts. 245 e 246 do CPC e para efeitos do art. 498 nº 1 e 323 ambos do CPC, que a R fica citada para no prazo de 20 dias contestar, tendo, no mesmo prazo de oferecer as respectivas provas, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo autor, com data de 15.6.2011. Concluso o processo ao senhor juiz que presidia à distribuição, foi determinada a citação. A secretaria procedeu à citação da R para contestar no prazo de 30 dias, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo A. A citação concretizou-se em 17.6.2011, conforme consta do respectivo Aviso de Recepção. De seguida, foi proferido despacho a reconhecer que a citação prévia, afinal, não havia sido requerida, tendo o tribunal sido induzido em erro, determinando-se a remessa dos autos à distribuição. Na contestação a R invoca a nulidade da citação, a prescrição do invocado direito do autor e impugna a versão do acidente plasmada na petição inicial. Na resposta o A pugna pela validade da citação e, concomitantemente, pela inexistência de prescrição. Foi proferida decisão a julgar não operada qualquer citação judicial, pelo que, ocorrendo uma falta de citação antes de 17 de Junho de 2011, na procedência da excepção de prescrição, foi a acção julgada improcedente e a Ré absolvida do pedido. * Inconformado, o A apresenta o presente recurso, alegando, em síntese, que é válida a citação efectuada em 15.6.2011 e que, ainda que fosse inválida, consubstancia a intenção de o A exercer o seu direito, nos termos do art. 323 nº 1 CC. Apresenta as seguintes conclusões: a) Na presente acção veio o A. peticionar contra a R. o pagamento dos danos sofridos em virtude de responsabilidade civil por factos ilícitos decorrentes de acidente de viação provocado por veículo com responsabilidade transferida para a R.. b) Na sua Petição Inicial o A., mediante o seu mandatário, nos termos e para os efeitos do art. 233º, nº 3, 245º, nºs 1, 2 e 3 e 246º todos do Código de Processo Civil, declarou que na data de 15.06.2011 promoveu e foi realizada a citação da R. pela Ex.ma Sr.a Solicitadora de Execução D…, portadora da cédula profissional nº ….. c) O Meritíssimo Juiz a quo proferiu despacho que conheceu das excepções, decidindo por, sic, “não operada qualquer citação judicial por meio de acto intitulado de “Certidão de Citação”, documentado a fls. 27, ocorrendo neste processo uma falta de citação antes do dia 17 de Junho de 2011 (art. 195º, nº 1, al. a) do Código Processo Civil) data esta em que, efectivamente, a citação tem lugar (fls. 29).” d) E, consequentemente, julgou procedente a excepção de prescrição e a acção improcedente, absolvendo a R. do pedido. e) Venerandos Juízes Desembargadores, o mandatário promoveu a citação nos termos e para os efeitos do art. 233º, nº 3, 245º, nºs 1, 2 e 3 e 246º todos do Código de Processo Civil. f) Tal citação foi efectuada pela Ex.ma Sr.a Solicitadora de Execução D…, portadora da cédula profissional nº …., conforme documento junto aos autos. g) Nos termos do art. 245º, nº 1 Código Processo Civil, sic, “a citação efectuada nos termos do nº 3 do artigo 233.º segue o regime do artigo 239.º, com as necessárias adaptações.” h) Ora, por sua vez, estipula o art. 239º, nº 2 Código Processo Civil que, sic, “Os elementos a comunicar ao citando, nos termos do artigo 235.º, são especificados pelo próprio agente de execução, que elabora nota com essas indicações para ser entregue ao citando.” i) estipula o art. 235º, nº 1 Código Processo Civil que, sic, “O acto de citação implica a remessa ou entrega ao citando do duplicado da Petição Inicial e da cópia dos documentos que a acompanhem, comunicando-se-lhe que fica citado para a acção a que o duplicado se refere, e indicando-se o tribunal, juízo, vara e secção por onde corre o processo, se já tiver havido distribuição” (o sublinhado e negrito é nosso). j) Assim, desde logo a citação promovida por mandatário não se encontra dependente de prévio despacho judicial. k) A citação efectuada por agente de execução obedece ao vertido nos artigos 239º e 235º Código Processo Civil. l) Na verdade, o agente de execução é obrigado a entregar ao citando o duplicado da Petição Inicial e da cópia dos documentos que a acompanhem, o que foi feito; m) E poderá o agente de execução comunicar ao citado o tribunal, juízo, vara e secção por onde corre o processo, se já tiver havido distribuição. n) No presente caso ainda não tinha havido distribuição, pelo que o agente de execução não tinha até que fazer tal comunicação ao citado, nomeadamente a forma do processo alegada em 15º da contestação. o) Assim inexiste qualquer informação errada transmitida à R., porque tal é inócuo para a validade da citação. p) Contudo, uma vez que o agente de execução tinha já a indicação do tribunal e juízo da presente acção, comunicou-a ao citado na nota de citação, isto é, fez mais do que legalmente estava obrigado, tanto mais que ao citado foi entregue o duplicado integral da Petição Inicial entrada em juízo donde constam todos esses elementos. q) A indicação do prazo é uma mera irregularidade e daí não decorreu qualquer prejuízo para a defesa da R.. r) Na verdade, teve o A. o especial cuidado de, complementarmente à citação promovida por mandatário judicial, requerer igualmente a citação urgente da R. nos termos do art. 478º Código Processo Civil, com um único objectivo: face à ausência de distribuição aquando da citação promovida por mandatário judicial, que o mais rapidamente possível fosse a R. informada dos restantes elementos em falta para poder deduzir a sua defesa. s) Assim, foi a R. informada desses elementos (número do Juízo Cível, número da secção, número do processo e prazo correcto) com a citação urgente recebida pela R. em 17.06., isto é, dois dias apenas após a citação promovida pelo mandatário. t) Nenhuma nulidade da citação promovida pelo mandatário e realizada pela agente de execução se verifica, nem a sua arguição, sem prescindir e por mera cautela de patrocínio, deverá sequer ser atendida nos termos do art. 198º, nº 4 Código Processo Civil, por em nada puder o citado ser prejudicado, devendo-se ter por efectuada a citação da R. em 15.06.2011. u) Contudo, e sem prescindir, Venerandos Juízes Desembargadores, mesmo a entender-se que a citação da R. ocorreu em 17.06.2006, o que se não concede, encontra-se vertido no art. 323º, nº 1 Código Civil que, sic, “A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.” v) Assim, mesmo a considerar-se nula a citação de 15.06.2011, tal facto verificado nesse dia interrompe a prescrição nos termos e para os efeitos do art. 323º, nº 1 Código Civil, uma vez que se trata dum acto que exprime directamente a intenção do A. de exercer o seu direito de ser indemnizado no âmbito da responsabilidade civil contra a R. peticionada nos presentes autos. w) Consequentemente, Venerandos Juízes Desembargadores, não se verifica a prescrição extintiva do direito do A., pelo que os autos deveriam ter prosseguido os seus ulteriores termos para a audiência de discussão e julgamento. Assim, x) Deve ser a douta sentença recorrida revogada, substituindo-se por outra que declare improcedente a excepção de prescrição do direito do A., e, consequentemente, que ordene o prosseguimento dos autos para audiência de discussão e julgamento. y) Já que foram violados os artigos 195º, nº 1, al. a), 198º, nº 4, 233º, nº 3, 235º, 239º, 245º, nºs 1, 2 e 3 e 246º todos do Código Processo Civil, e ainda o artigo 323º, nº 1 Código Civil. A R apresentou contra alegações, pugnando pela manutenção da decisão e concluindo: I - O recurso interposto não merece – com o devido respeito – o menor provimento. II – Desde já se diga que, em face das conclusões apresentadas, o Autor/Apelante não pretende ver discutida a matéria de facto já dada por assente (e, nessa medida, aceita e concorda – e bem - com os seis factos dados como assentes pelo Tribunal a quo) e, bem assim, aceita que o prazo de prescrição aplicável é de três anos e que e mesmo conta-se a partir da data em que ocorreu o acidente e aquele tomou conhecimento dos danos, ou seja, a partir do dia 15 de Junho de 2008. III – No que ao recurso propriamente dito diz respeito, dúvidas não há de que ocorreu falta de citação antes de 17 de Junho e, em qualquer caso, sempre ocorreria nulidade de citação. IV - Com efeito, a citação precedida à distribuição só é admissível nos casos em que é requerida a citação urgente. V – Porém, nos termos do disposto na alínea f) do número 4 do artigo 234.º do CPC, a citação que deva proceder à distribuição depende de prévio despacho judicial. VI – Ora, a putativa citação foi efectuada sem distribuição e sem o necessário e obrigatório prévio despacho judicial. VII – Aliás, como reconhece o douta sentença em crise, a lei processual civil não concebe a “citação” como acto prévio à própria propositura da acção. VIII - Além disso, a Agente de Execução prestou informações erradas à aqui Apelada, com inegáveis prejuízos para a defesa da Ré, que, só por si, acarretariam a nulidade de tal acto, uma vez que identificou a acção como sendo “Sumária” e que prazo para contestar seria de 20 dias. IX – Em face do exposto, bem andou o Tribunal a quo ao considerar que ocorreu falta de citação antes do dia 17 de Junho de 2011, [nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 195.º CPC)], e, consequentemente, porque entre a data do acidente de viação (15.06.2008) e a data do facto interruptivo da prescrição (17.06.2011) decorreram mais de três anos, bem, decidiu pela prescrição do alegado direito do Autor/Apelante. X – Deste modo, não merece a Douta sentença do Tribunal a quo qualquer reparo, devendo, por isso, ser mantida. XI – Sem prejuízo, pretende o Autor/Apelante ver reconhecida a interrupção da prescrição, nos termos do disposto no número 1 do artigo 323 do Código Civil. XII – Acontece que, nos termos do artigo vindo de referir, só a citação ou notificação judicial é que têm efeito interruptivo da prescrição. XIII – Ora, sempre com o devido respeito por opinião contrária, o acto/notificação ocorrida em 15 de Junho de 2011 não é uma notificação judicial, nem a tal pode ser equiparada – tanto mais que precedeu a própria propositura da acção! XIV – Donde não se lhe pode atribuir o efeito interruptiva da prescrição e, assim sendo, só com a citação ocorrida em 17 de Junho de 2011 se poderia interromper a prescrição, não tivesse, a essa data, o direito prescrito. XV – Em suma, não carece, pois, de reparo a sentença do Tribunal a quo quando julgou prescrito o direito do Autor/Apelante. * Fundamentação Os factos considerados assentes, para além dos que constam do relatório, são aqueles que a decisão considerou: 1.º – Na acção vertente, a petição inicial deu entrada em 15 de Junho de 2011, juntando procuração, datada de 5 de Novembro de 2008, e documento intitulado “Orçamento”, datado de 10 de Novembro de 2008. 2.º – No artigo 4.º da petição inicial, consta: “Pelo que, e nos termos e para os efeitos do art. 233º, nº 3, 245º, nºs 1, 2 e 3 e 246º todos do Código de Processo Civil, o mandatário aqui expressamente declara que na presente data de 15.06.2011 promoveu e foi realizada a citação da R. pela Ex.ma Sr.a Solicitadora de Execução D…, portadora da cédula profissional nº …., a qual foi devidamente advertida dos seus deveres, sendo transmitidos à R. a cópia integral da presente Petição Inicial acompanhada de todos os seus documentos, tal como consta no presente processo entrado em juízo, conforme documento que protesta juntar posteriormente aos autos”. 3.º – Em 21 de Junho de 2011, o Autor deu entrada do requerimento de fls. 25 a 28, dando-se aqui por transcrito o documento de fls. 27, intitulado “Certidão de Citação”. 4.º – Conforme consta do aviso de recepção de fls. 29, em 17 de Junho de 2006, a Ré recebeu a comunicação cujo teor consta de fls. 21 e 22, intitulada “Citação por carta registada com AR”, que aqui se dá por transcrita, onde se encontra aposta a data de 15 de Junho de 2011. 5.º – No dia 15 de Junho de 2008, cerca das 09.05 horas, ocorreu um embate na Auto-estrada n.º .. (Via de Cintura Interna), sentido …/…, junto ao Km 1.4, envolvendo os veículos de matrícula ..-..-RP, ..-..-UD e ..-..-ZT. 6.º – No artigo 22.º da petição, o Autor funda a demanda neste facto, nos seguintes termos: “Desta forma, nos termos do art. 483º Código Civil, a condutora do veículo ..-..-UD provocou ilicitamente danos ao A”. * Direito Aplicável.3 Delimitado o objecto do recurso em conformidade com as doutas conclusões, nos termos dos arts. 685 nº A 1 e 2, 685 B nº 1 e 2 CPC e estabilizados os factos, atentemos nas normas jurídicas que os regem. As regras processuais civis traduzem meios para que qualquer cidadão aceda ao Direito e obtenha a tutela jurisdicional, constitucionalmente consagrada no art. 20 da CRP, emergindo e contemplando os princípios fundamentais da igualdade e do efectivo exercício do contraditório, plasmado no art. 13 da Lei Fundamental, e, nos limites estritos em que nos movemos, nos arts 3º e 3º A do CPC. A citação é o “acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender (…) trata-se do acto que em obediência ao principio do contraditório visa fechar o ciclo constitutivo da relação processual (.)” – cf. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, 266. E, desta forma, se encontra consignado no art. 228 nº 1 do CPC, congregando, afinal, todos aqueles princípios elementares e enformadores de um Estado de Direito. Assente esta necessidade estrutural de o cidadão conhecer a demanda, com prévia observância das regras definidas para esse efeito, em ordem a determinar os seus fundamentos e a salvaguardar o direito de defesa, voltemos ao caso concreto. Antes de mais, cumpre salientar que os termos da petição inicial são ambíguos e susceptíveis de induzir em erro, como, efectivamente, induziram, considerando o teor das decisões proferidas, prévias à distribuição. No cabeçalho da petição o A indicia que vai requerer a citação urgente, nos termos do art. 478 do CPC, mas esse requerimento nunca foi efectuado, impedindo que o tribunal pudesse exercer, sequer, a sua actividade jurisdicional, face à ausência elementar do principio do dispositivo que onerava o demandante com esse impulso. Pelo contrário, não obstante aquela afirmação, é logo referido que a citação foi já efectuada através de solicitador de execução, mencionando-se expressamente que o mandatário promoveu e foi realizada a citação da R. Por outro lado, salvo o devido respeito, o recorrente, escudando-se nas normas que regem os tramites da citação em geral, olvida que existe uma norma especifica que disciplina a citação urgente, que precede a distribuição, e que, com prévio requerimento do autor, pode ser tutelada, ou não, pela actividade jurisdicional, em função dos fundamentos alegados. A letra do art. 478 nº 1 do CPC é inequívoca e a este preceito apelou, inicialmente, o próprio autor, induzindo, reitera-se, o tribunal em erro. A letra das normas constitui um elemento fundamental para fixar o seu sentido e o seu alcance, conforme dispõe, de forma tabelar e insofismável, o art. 9º do CC, estabelecendo os princípios que devem orientar o intérprete neste exercício hermenêutico, evidenciando-se a letra da lei uma premissa estruturante, conforme o nº 2 deste preceito. Assim, o art. 233 nº 3 do CPC, com referencia aos arts 245 nº 1, 2 e 3 e 246 do CPC, apenas disciplinam as modalidades de citação, concretamente, a promovida pelo mandatário. Estas normas não versam sobre a citação urgente e prévia à distribuição. Esta forma de citação é regulada no art. 478 do CPC e depende sempre de um despacho judicial que defere ou indefere essa pretensão, conforme resulta expressamente, ainda, do art. 234 nº 4 f) do CPC, só assim se acolhendo e interpretando o ordenamento jurídico de forma coerente e harmoniosa. Como se salienta na decisão recorrida, e resulta do art.228 nº 1 do CPC, visando a citação dar conhecimento da propositura de uma acção, colide com este pressuposto, que se apresenta como premissa estruturante da ordem jurídica vigente, admitir-se a citação prévia á propositura da acção. E se, excepcionalmente, pode ser prévia à distribuição, deve obedecer aos tramites processuais estabelecidos para o efeito, devidamente sancionada pelo juiz, consentindo o mesmo ordenamento jurídico na prática deste acto anterior à distribuição, mas apenas nos termos especificamente previstos no art. 478 do CPC. Face à singeleza, harmonia e coerência expressa nas referidas normas, impõe-se apenas concluir que o recorrente, procedendo à citação, promovida por ilustre mandatário, antes da propositura da acção, praticou actos que as enunciadas normas processuais civis não acolhem, à sua revelia e contrariando princípios basilares e orientadores da conduta processual que deve pautar as partes na gestão formal dos actos. Esta infracção conduz a que o acto praticado não configure uma citação prévia, antes equivale a uma acção juridicamente inexistente e, por isso, inconsequente. Acresce que este acto enferma de irregularidades relevantes, nomeadamente, no que ao prazo para contestar respeita, circunstancia que, não fosse a sua inexistência jurídica, pela via processual, geraria, necessariamente, a sua invalidade substancial em função da preterição dos direitos fundamentais de defesa, consubstanciando um acto anómalo, invulgar e, por isso, também por esta via, juridicamente irrelevante para os efeitos pretendidos. * 2 A citação apenas se verificou em 17.6.2011.O acidente ocorreu em 15.6.2008 e a prescrição foi invocada pela R. Dispõe o art. 498 nº 1 CC que o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos a contar do momento em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete. E, nos termos do art. 306 nº 1 do CC, o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido, ou seja, quando o seu titular tiver conhecimento do facto jurídico relevante e susceptível de desencadear a tutela jurisdicional. Assim, esta norma consagra o sistema objectivo, começando a correr o prazo logo que o direito possa ser exercido, independentemente das circunstancias atinentes ao conhecimento do devedor, à dimensão do dano ou ao quantum reclamado, salvaguardadas outras vicissitudes geradoras das excepções positivadas nas normas. É esta a posição que melhor se adequa às finalidades intrínsecas da prescrição, incindíveis da segurança e estabilidade das relações jurídicas em função do decurso do tempo. O acidente ocorreu em 15 de Junho de 2008, pelo que decorreram mais de três anos, com referência à data da citação. E, salvo o devido respeito, não pode o recorrente valer-se de uma acto juridicamente inexistente para o reverter, agora, numa interpelação ao devedor, no sentido de não prescindir dos seus direitos. O acto a que se reporta o art. 323 nº 1 do CC, seja pela via da citação, seja pela via da notificação, é judicial, conforme também resulta, mais uma vez, expressamente desta norma. Como referem Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, I, 290, “decorre claramente deste preceito que não basta o exercício extra-judicial do direito para interromper a prescrição: é necessária a prática de actos judicias que, directa ou indirectamente, dêem a conhecer ao devedor a intenção de o credor exercer a sua pretensão”. In casu, não ocorreu qualquer acto judicial, fosse a citação, fosse a notificação. Da denominada certidão de citação a vontade expressa, ainda que de forma processualmente incorrecta, é a de citar, estabelecendo um prazo e uma cominação e não qualquer interpelação ou reivindicação de direitos que sempre se imporia pela via judicial, ainda que emergente de um acto preparatório (cf. ob. cit., 290). Apenas esta forma judicial assume a virtualidade de traduzir um acto interruptivo da prescrição, evidenciando a clareza expressa e inequívoca do preceito que disciplina esta forma de promover a interrupção da prescrição que não sanciona o modo ambíguo, disperso e impreciso que o recorrente pretende fazer valer, contrariando o rigor e a transparência das normas que regem condutas destinadas a fazer valer direitos. A interpretação plasmada nas doutas alegações contraria o regime legal especificamente previsto para a citação e para a interrupção da prescrição, assumindo-se como marginal a esse ordenamento, subjectivo e especulativo. Dirimida qualquer dúvida sobre a existência da reivindicada citação e, em preterição da mesma, de uma interpelação, não pode ser tutelada, em qualquer das suas vias, a pretensão do recorrente. *** DecisãoEm face do exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente e confirmar a decisão recorrida. Custas a cargo do recorrente. * Porto, 23 de Fevereiro de 2012Ana Paula Vasques de Carvalho Manuel José Caimoto Jácome Carlos Alberto Macedo Domingues |