Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
225/04.0TBARC.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: INÊS MOURA
Descritores: CUSTAS DE PARTE
DISPENSA PRÉVIA DO PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RP20151001225/04.0TBARC.P2
Data do Acordão: 10/01/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O art.º 25.º n.º 1 do RCP estabelece o prazo de cinco dias após o trânsito em julgado da sentença, para o envio da nota discriminativa e justificativa das custas de parte que, entre outras despesas, incluem as que se referem aos valores de taxa de justiça que tenham sido efectivamente pagos pela parte vencedora, de acordo com o disposto no art.º 26.º n.º 3 al. a) do mesmo diploma.
II - Nos casos de dispensa prévia do pagamento da taxa de justiça, a omissão da secretaria, no cumprimento do disposto no art.º 15.º n.º 2 do RCP, que vai determinar que à data do trânsito em julgado da decisão ainda não tenha sido paga pelas partes qualquer quantia a título de taxa de justiça, não pode prejudicar a parte, impedindo-a de reclamar, a título de custas de parte, a quantia que venha a despender no pagamento da taxa de justiça, o que poderá fazer após o seu pagamento.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 225/04.0TBARC.P2- Apelação 1ª

Relator: Inês Moura
1º Adjunto: Teles de Menezes
2º Adjunto: Mário Fernandes

Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do C.P.C.)
1. O art.º 25.º n.º 1 do RCP estabelece o prazo de cinco dias após o trânsito em julgado da sentença, para o envio da nota discriminativa e justificativa das custas de parte que, entre outras despesas, incluem as que se referem aos valores de taxa de justiça que tenham sido efectivamente pagos pela parte vencedora, de acordo com o disposto no art.º 26.º n.º 3 al. a) do mesmo diploma.
2. Nos casos de dispensa prévia do pagamento da taxa de justiça, a omissão da secretaria, no cumprimento do disposto no art.º 15.º n.º 2 do RCP, que vai determinar que à data do trânsito em julgado da decisão ainda não tenha sido paga pelas partes qualquer quantia a título de taxa de justiça, não pode prejudicar a parte, impedindo-a de reclamar, a título de custas de parte, a quantia que venha a despender no pagamento da taxa de justiça, o que poderá fazer após o seu pagamento.

Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública em que é Expropriante a E.P.- Estradadas de Portugal, S.A. e Expropriados B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, e habilitados de I…, procedeu-se à expropriação da parcela de terreno melhor identificada nos autos, tendo sido fixado, por decisão arbitral, o valor da indemnização em €466.265,00.
Não se conformando com tal decisão, veio a Expropriante interpor recurso da mesma concluindo que o valor da indemnização deverá ser o de €53.925,63.
Igualmente não se conformando com a decisão arbitral, vieram os expropriados C…, D…, E…, F…, G… e H…, interpor recurso concluindo, no seu entender, que a justa indemnização é de €1.727.749,00, e aos ora recorrentes caberá o valor global de €1.295.811,70.
O tribunal de 1ª instância veio a fixar o valor da justa indemnização a pagar pela Expropriante aos Expropriados em €340.436,60 valor esse a actualizar de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, desde a data da declaração de utilidade pública, nos termos do art.º 24º do Código das Expropriações.
Desta decisão veio a ser interposto recurso para o Tribunal da Relação do Porto, tendo sido confirmada a sentença que fixou a justa indemnização devida em € 340.436,60.
Notificado do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, veio a 13/10/2014 a Expropriante juntar aos autos nota discriminativa das custas de parte, com referência à despesa suportada com a realização da perícia, requerendo o seu pagamento, o que foi feito.
Foi elaborada a conta de custas a 09/02/2015 de que foi enviada notificação às partes nessa data e que veio a ser reformada a 26/03/2015.
A 30/03/2015 a Expropriante veio apresentar nova nota discriminativa das custas de parte com referência à taxa de justiça paga; notificados os Expropriados, os mesmos vieram reclamar, pugnando pelo indeferimento do requerido.
Por despacho de 27/04/2015 foi considerada extemporânea a apresentação das custas de parte pela Expropriante, por ter sido remetida já ultrapassados cinco dias do trânsito em julgado da sentença.
Não se conformando com tal decisão, vem a Expropriante interpor recurso da mesma, apresentando, para o efeito as seguintes conclusões:
1- A aqui recorrente apresentou nota de custas de parte em 2014 e o valor foi pago
2- Incluiu as custas de parte que lhe eram devidas, àquela data, tendo em consideração todos os pagamentos efetuados.
3- Não foi cumprido nem o n.º 2 do artigo 15.º do RCP nem a secção de processos procedeu à notificação a que alude o n.º 9 do artigo 14.º do RCP, pelo que não pôde a aqui apelante incluir na nota de custas de parte um valor que não tinha pago.
4- O fundamento do indeferimento foi a intempestividade em relação à data do trânsito em julgado do Ac do Venerando Tribunal da Relação, sendo que se a secção de processos só pediu o pagamento das custas à aqui recorrente em 2015, não podia de todo ter pedido o seu reembolso em 2014.
5- Pretende-se condenar a aqui recorrente pela omissão de um ato que não poderia nunca ter praticado.
6- Os fundamentos invocados não podem merecer acolhimento.
7- Não foi violado o artigo 25.º nem o artigo 26.º do RCP, pelo que a nota discriminativa não deveria ter sido indeferida.
Não foram apresentadas respostas ao recurso.
II. Questões a decidir
Tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do C.P.C.- salvo questões de conhecimento oficioso- artº 608 n.º 2 in fine:
- da tempestividade da nota discriminativa das custas de parte apresentada pela Expropriante
III. Fundamentos de Facto
Os factos provados com interesse para a decisão da causa são os que constam do relatório elaborado.
IV. Razões de Direito
- da tempestividade da nota discriminativa das custas de parte apresentada pela Expropriante
O art.º 529.º do C.P.C., aprovado pela Lei n.º 41/2013 de 26 de Junho e com a mesma redacção que o art.º 447.º do anterior C.P.C., diz-nos, no seu n.º 1, que: “As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.” Acrescenta o n.º 4 deste artigo que: “As custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.”
Sobre as custas de parte rege ainda o art.º 533.º do C.P.C., que tem inteira correspondência no anterior art.º 447.º- D e os art.º 25.º e 26.º do Regulamento das Custas Processuais que se reportam respectivamente, à nota justificativa das custas de parte e ao seu regime.
Não obstante estarmos perante um processo anterior a estes diplomas legais, estas normas têm inteira aplicação ao caso em presença, por força do regime de direito transitório que decorre da Lei n.º 7/2012 de 13 de Fevereiro que vem alterar o Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto Lei n.º 34/2008 de 26 de Fevereiro.
O art.º 8.º da Lei n.º 7/2012, sob a epígrafe “Aplicação no tempo”, vem dispor sobre o regime de direito transitório em matéria de custas.
Como regra, o n.º 1 do art.º 8.º do Regulamento das Custas Processuais, na redação que lhe é dada pela Lei 7/2012 de 13 de Fevereiro, estabelece que o Regulamento é aplicável a todos os processos iniciados após a sua entrada em vigor, ressalvando os processos pendentes nessa data; nos números seguintes, contudo, são consagradas diversas excepções a essa regra. Desde logo, com referência às custas de parte, estabelece o n.º 12 do art.º 8.º que: “São aplicáveis a todos os processos pendentes as normas do Regulamento das Custas Processuais, na redação que lhe é dada pela presente lei, respeitante às custas de parte, incluindo as relativas aos honorários dos mandatários, salvo se a respectiva nota discriminativa e justificativa tiver sido remetida à parte responsável em data anterior à entrada em vigor da presente lei.”
Daqui decorre então a aplicação a este processo, das normas do Regulamento das Custas Processuais que se referem às custas de parte, designadamente os já mencionados art.º 25.º e 26.º, não obstante estarmos perante processo iniciado antes da entrada em vigor deste diploma.
O art.º 25.º do RCP respeita à nota justificativa das custas de parte e dispõe, no seu n.º 1: “Até cinco dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respectiva nota discriminativa e justificativa.” O n.º 2 deste artigo individualiza nas suas diversas alíneas os elementos que devem constar da nota justificativa, contemplando a al. b) a indicação em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de taxa de justiça.
As taxas de justiça pagas são despesas que se compreendem nas custas de parte, conforme decorre dos art.º 533.º n.º 2 al. b) do C.P.C. e 26.º n.º 3 al. a) do Regulamento, só podendo ser reclamadas pela parte vencedora as quantias que já tiverem sido por ela pagas a título de taxa de justiça, sendo certo que, de acordo com o previsto nos art.º 6.º e 7.º do Regulamento, actualmente, o pagamento da taxa de justiça surge associado ao impulso processual, sendo estabelecida, em regra, a obrigatoriedade do seu pagamento prévio à prática do acto.
Conforme se referiu, o art.º 25.º n.º 1 do Regulamento estabelece o prazo temporal de cinco dias após o trânsito em julgado da decisão, para o envio da nota justificativa. Tal não comporta qualquer distorção, em face do novo regime, uma vez que, nesse momento a parte já terá efectuado o pagamento da taxa de justiça devida, estando por isso em condições de reclamar o seu pagamento da parte vencida, o que fará através do envio da nota justificativa, naquele prazo.
Os processos de expropriação encontravam-se dispensados do pagamento prévio de taxa de justiça pelo art.º 29.º n.º 3 al. d) do anterior C.C.J. De acordo com o regime transitório previsto no art.º 8.º n.º 9 da já mencionada Lei 7/2102 de 13 de Fevereiro, as partes que beneficiavam de dispensa de pagamento prévio da taxa de justiça, a mesma mantém-se, mesmo que solução diferente seja adoptada pelo Regulamento das Custas Processuais, ocorrendo o pagamento a final.
Em razão dessa dispensa tem aplicação o disposto no art.º 15 n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais que refere: “As partes dispensadas do pagamento prévio de taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que susceptível de recurso, para efectuar o seu pagamento no prazo de 10 dias.”
A dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça não desobriga a parte da obrigação de a vir liquidar, como contrapartida pela utilização dos serviços de justiça, correspondendo apenas a um adiamento do seu pagamento. Diz-nos Salvador da Costa, in. Regulamento das Custas Processuais anotado, pág. 273, em anotação a este art.º 15.º que: “…deste artigo apenas resulta o adiamento da oportunidade de pagamento da taxa de justiça, que deverá ser paga, na sequência da prolação da decisão final, por quem operou o impulso processual.
Acontece que, no caso em presença, não foi cumprido o art.º 15.º n.º 2 do RCP, uma vez que o contador, atendendo aos montantes depositados nos autos, não efectuou as notificações previstas na norma mencionada, desobrigando as partes de procederem ao depósito das quantias devidas a título de taxa de justiça, optando por fazer a conta directa a final.
Esta conduta determinou porém, que, à data do trânsito em julgado da decisão, ainda não tivesse sido paga qualquer quantia a título de taxa de justiça pelas partes. Por esta razão, a Recorrente estava impedida de, no prazo legal de cinco dias previsto no art.º 25.º n.º 1 do RCP, apresentar nota justificativa das custas de parte a reclamar o pagamento de qualquer quantia relativa à liquidação de taxa de justiça, por ainda não ter procedido ao seu efectivo pagamento.
A circunstância de não ter sido efectuada a notificação prevista no art.º 15 n.º 2 do RCJ, por decisão do Sr. funcionário, em inobservância do comando legal, veio a interferir com a possibilidade da Recorrente dar cumprimento ao disposto no art.º 25.º n.º 1, ou seja, enviar a nota justificativa das custas de parte à parte vencida nos cinco dias após o trânsito em julgado da decisão, por nela não poder integrar as quantias pagas a título de taxa de justiça, que nessa data não estavam efectivamente pagas, quando podiam/deviam estar se tivesse sido observado pela secretaria o disposto naquela norma.
Não podendo a Recorrente exigir o pagamento das custas de parte, quanto a quantias que não tenham sido efectivamente pagas a título de taxa de justiça, já se vê que a mesma não pode estar impedida de as reclamar, após a realização do seu pagamento, se a inobservância do prazo de cinco dias após o trânsito em julgado da sentença, previsto na lei, resulta de omissão ou erro da secretaria e não de facto que lhe seja imputável. Aliás, de acordo com o disposto no art.º 157.º n.º 6 do C.P.C. os erros ou omissões dos actos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes.
Assim, ocorrendo o pagamento da taxa de justiça em momento posterior ao trânsito em julgado da sentença, por causa não imputável à parte, deve ser admitida a apresentação da nota justificativa das custas de parte, que reclame o pagamento de tal despesa, nos cinco dias posteriores ao seu pagamento. Neste sentido, decidiu também o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26/05/2015, no Proc. n.º 2417/13.1T3SNT-A.L1-5, in. www.dgsi.pt: que expressa: “Contudo, o erro da secretaria ao não proceder a tal notificação em simultâneo com a "... a decisão que decida a causa principal...", não extingue a obrigação imposta por esse preceito legal, sendo certo que também não pode prejudicar a parte (nº6, do art.157, do CPC), o que no caso será conseguido com a permissão de apresentação da nota justificativa das custas departe após o pagamento da quantia exigida.”
Conclui-se por isso, que a omissão pela secretaria da notificação para pagamento da taxa de justiça, com a decisão proferida, nos termos previstos no art.º 15.º n.º 2 do RCJ, que impede o cumprimento pela parte do disposto no art.º 25.º n.º 1 do RCP com inclusão da taxa de justiça, não pode impedir a parte de reclamar mais tarde, o pagamento da quantia que liquidou a esse título, podendo apresentar a nota justificativa das custas de parte com a inclusão de tal despesa, após o seu efectivo pagamento.
Impõe-se assim a revogação da decisão recorrida que indeferiu, por extemporânea, a apresentação da nota justificativa das custas de parte pela Recorrente, com a inclusão dos valores pagos a título de taxa de justiça, considerando-se a mesma apresentada em tempo, devendo os autos prosseguir os seus termos, nesse pressuposto.
IV. Decisão:
Em face do exposto, julga-se procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida, considerando-se tempestiva a nota justificativa das custas de parte apresentada e determinando-se o prosseguimento dos autos.
Sem custas.
Notifique.

Porto, 1 de Outubro de 2015
Inês Moura
Teles de Menezes
Mário Fernandes