Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1452/08.6PTPRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP00042799
Relator: MARIA DO CARMO SILVA DIAS
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
TRÂNSITO EM JULGADO
Nº do Documento: RP200907081452/08.6PTPRT-A.P1
Data do Acordão: 07/08/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 587 - FLS 194.
Área Temática: .
Sumário: Em processo penal, o pedido de apoio judiciário pode ser requerido até ao termo do prazo de recurso da decisão em primeira instância. Contudo, se tal pedido for requerido depois de proferida a sentença, mas antes do seu trânsito, só é legalmente admissível se for interposto recurso da mesma.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: (proc. nº 1452/08.6PTPRT-A.P1)
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Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:
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I- RELATÓRIO
No Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, nos autos de processo sumário nº 1452/08.6PTPRT do .º Juízo Criminal, foi proferida a seguinte decisão em 2/3/2009 (fls. 27 destes autos de recurso em separado, correspondente a fls. 86 do processo):
“Por se mostrar devidamente cumprida declaro extinta a pena aplicada ao arguido nos presentes autos.
Notifique e após trânsito comunique ao Registo Criminal.
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Resulta do teor de fls. 34 a 37 que o arguido requereu o benefício de apoio judiciário em 23/09/2008, ou seja, após a prolação da sentença condenatória proferida nestes autos, a qual foi lida em 18/09/2008.
Assim, tal como salienta a Digna Magistrada do Ministério Público porque resulta dos autos que o arguido com tal pedido de benefício de apoio judiciário não pretendia fazer valer os seus direitos em juízo, uma vez que transitou em julgado a sentença, mas apenas e somente eximir-se ao pagamento das custas em que foi condenado, não pode a decisão proferida pela Segurança Social proferir nestes autos qualquer efeito.
Pelo exposto, extraía certidão da sentença de fls. 21 a 26 com nota de trânsito em julgado e remeta à Segurança Social para os fins tidos por convenientes.
Remeta guia ao arguido para pagamento das custas da sua responsabilidade.
Notifique.
(…)”
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Não se conformando com essa decisão, o arguido B………., dela interpôs recurso (fls. 38 a 43 destes autos de recurso), formulando as seguintes conclusões:
“A) Interpõe-se o presente recurso do despacho de fls. 86 dos autos, datado de 02/03/2009, por se entender que se impõe a modificação da decisão do Tribunal a quo sobre a produção de efeitos no processo criminal da decisão de deferimento proferida pela Segurança Social, nos termos e com os fundamentos já expostos.
B) O requerimento de protecção jurídica foi entregue antes de ocorrer o trânsito em julgado da sentença, tal como estabelece a Lei nº 34/2004, de 29 de Julho.
C) A decisão de deferimento da Segurança Social datada de 28-10-2008, junta aos autos em 20-11-2008, deve produzir plenos efeitos nestes autos.
D) Tendo o apoio judiciário sido requerido antes do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos, e tendo o mesmo sido deferido, não pode o tribunal vedar o acesso a esse benefício só porque tem um diferente entendimento sobre as circunstâncias em que aquele podia ser requerido, ignorando que a competência para essa concessão pertence ao Instituto de Segurança Social, IP.
E) O pagamento das custas e demais encargos com o processo e os honorários do defensor oficioso, é da responsabilidade do Instituto da Segurança Social, IP e não do arguido.”
Termina pedindo o provimento do recurso e a modificação da decisão impugnada de modo a considerar-se que a decisão proferida pela Segurança Social em 28/10/2008 produz plenos efeitos no processo.
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Na 1ª instância, respondeu o Ministério Público (fls. 45 a 48 destes autos de recurso), concluindo pela improcedência do recurso.
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O Sr. Juiz a quo manteve a decisão sob recurso nos seus precisos termos (fls. 50 destes autos de recurso).
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Nesta Relação, a Srª. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer (fls. 57 destes autos de recurso), subscrevendo a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª instância, pugnando pelo não provimento do recurso.
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Foi cumprido o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos legais realizou-se a conferência.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
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II- FUNDAMENTAÇÃO
O recurso interposto pelo arguido, demarcado pelo teor das suas conclusões (art. 412 nº 1 do CPP), suscita a apreciação da seguinte questão:
- analisar se a decisão de concessão de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo, bem como do pagamento da compensação de defensor oficioso, proferida pelo Instituto de Segurança Social, IP, em 27/10/2008 (na sequência de requerimento apresentado pelo arguido em 23/9/2008, portanto, antes do trânsito em julgado da sentença proferida em 18/9/2008) deve produzir efeitos quanto a custas, demais encargos e honorários ao defensor oficioso em que foi condenado na sentença proferida em 18/9/2008 (na sua perspectiva a decisão de apoio judiciário, naquelas circunstâncias, abrange a condenação em custas anteriores ao pedido que formulou junto da Segurança Social).
Passemos então a apreciar a questão colocada no recurso em apreço.
Tendo em vista a decisão da questão suscitada, importa primeiro reter os seguintes elementos que resultam destes autos de recurso em separado:
1º - Julgado em processo sumário, com o nº 1452/08.6PTPRT, no .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, por sentença proferida em 18/9/2008, foi o arguido condenado pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo motorizado sem habilitação legal p. e p. no art. 3 nº 1 do DL nº 2/98, de 3/1, na pena de 50 dias de multa à taxa diária de € 6,00 (perfazendo a quantia total de € 300,00) e, bem assim, foi condenado nas custas do processo, sendo a taxa de justiça fixada em 2 UCs, acrescida de procuradoria fixada em 1/4 de 1 UC e de 1% a favor das Vítimas de Crimes Violentos (art. 13 do DL nº 423/91, de 30/10) e, ainda, nos honorários atribuídos ao Defensor Oficioso, em conformidade com a Tabela em vigor (fls. 3 a 9 destes autos de recurso).
2º - Em 23/9/2009 o arguido apresentou no Instituto de Segurança Social, IP (Centro Distrital do Porto) requerimento de protecção jurídica, pessoa singular (datado de 22/9/2009), pedindo que lhe fosse concedido apoio judiciário nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento da compensação de patrono e pagamento da compensação de defensor oficioso, tudo conforme consta de fls. 10 a 13 destes autos de recurso, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
3º - Por decisão proferida em 27/10/2008, o Instituto de Segurança Social, IP (Centro Distrital do Porto) concedeu ao arguido protecção jurídica na modalidade de concessão de apoio judiciário, com dispensa de taxa de justiça e demais encargos do processo, bem como do pagamento da compensação de defensor oficioso (fls. 15 a 22 destes autos de recurso, cujo teor aqui se dá por reproduzido).
4º - Essa decisão, por ofício datado de 28/10/2008, foi comunicada ao tribunal (processo a que se destinava, dando entrada em 3/11/2008) pelo próprio Instituto de Segurança Social, IP (Centro Distrital do Porto).
5º - Entretanto, a referida sentença transitou em julgado em 8/10/2008 (fls. 29 destes autos de recurso), tendo o arguido pago a pena de multa em que foi condenado.
6º - Em 3/12/2008 a secção respectiva liquidou as custas, demais encargos e reembolsos (honorários ao defensor), a cargo do arguido, cujo pagamento (no montante total de € 391,92) teria de ser efectuado até 22/12/2008 (fls. 23 destes autos de recurso).
7º - Porque o arguido não pagou as custas em dívida foi aberta vista em 20/2/2009, com a informação de que “o responsável pelas custas em dívida beneficia de apoio judiciário” (fls. 24 destes autos de recurso).
8º - O Ministério Público promoveu, por um lado, que se extraísse certidão da sentença, com nota de trânsito em julgado e se remetesse à S.S. para os fins tidos por convenientes, que se remetesse guia ao arguido para pagamento das custas da sua responsabilidade e, por outro lado, que se determinasse a extinção da pena imposta ao arguido, em virtude do seu cumprimento (fls. 24 e 25 destes autos de recurso, cujo teor aqui se dá por reproduzido).
9º - Em 2/3/2009 foi então proferida a decisão judicial, acima transcrita, sob recurso.
10º - Para além de ter sido dado conhecimento à Segurança Social, nos termos indicados na decisão sob recurso (fls. 29 e 30 destes autos de recurso), foi o arguido notificado da decisão proferida em 2/3/2009 e, bem assim, para proceder ao pagamento das custas da sua responsabilidade, no prazo de 10 dias, acrescido da dilação de 5 dias, no montante indicado na guia que lhe enviaram (montante total em dívida de € 391,92, pagável até 20/3/2009), tudo como melhor consta de fls. 30 e 31 destes autos de recurso.
11º - O defensor oficioso do arguido também foi notificado da decisão judicial proferida em 2/3/2009, o mesmo sucedendo com o Ministério Público (fls. 32 e 33 destes autos de recurso).
12º - Em 9/3/2009 foi então interposto o recurso ora em apreciação.
Vejamos então.
Dispõe o artigo 20 (acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva) da CRP:
1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
(…)
Para melhor concretizar e densificar esse princípio geral - enquadrado no âmbito dos “direitos e deveres fundamentais” - garantido a qualquer pessoa (princípio geral que deve ser perspectivado como direito fundamental, abrangendo o acesso à informação e à consulta jurídicas e ao patrocínio jurídico, traduzindo-se na garantia do efectivo acesso, de cada cidadão, à defesa jurisdicional dos seus direitos e interesses legalmente protegidos), o legislador ordinário através da Lei nº 34/2004, de 29/7 - que entretanto foi alterada e republicada com a Lei nº 47/2007, de 28/8 - veio regular o regime de acesso ao direito e aos tribunais.
Dispõe o nº 1 do artigo 1º (finalidades) da citada Lei nº 34/2004, na redacção da Lei nº 47/2007, de 28/8 que: “O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos.”
Para agilizar a protecção jurídica, em qualquer das suas modalidades (consulta jurídica e apoio judiciário - arts. 6, 14 a 16 da mesma Lei), o respectivo requerimento é apresentado em qualquer serviço de atendimento ao público dos serviços de segurança social (art. 22 nº 1 da mesma Lei).
Essa apresentação pode ser feita pessoalmente, por telecópia, por via postal ou por transmissão electrónica, como previsto no art. 22 nº 2 da citada Lei.
Isto significa que, o alegado pelo recorrente, quando sustenta que não teve possibilidades de apresentar o seu requerimento de protecção jurídica antes de 23/9/2008, não convence, nem justifica a sua pretensão.
Com efeito, tendo sido detido em 15/9/2008 e apresentado em tribunal em 16/9/2008, dia este em que alega ter-se dirigido à Segurança Social, sempre poderia logo ali ter preenchido e entregue o respectivo requerimento de protecção jurídica, sem prejuízo de posteriormente apresentar documentos comprovativos da alegada insuficiência económica.
Por outro lado, tendo sido julgado em 17/9/2008 e tendo sido lida a sentença em 18/9/2008, sempre poderia ter enviado aos serviços da Segurança Social, v.g. por via postal, antes da leitura da sentença, o mesmo requerimento (caso ainda o não tivesse entregue) acompanhado dos respectivos documentos.
Aliás, compulsando o teor do requerimento apresentado pelo arguido à Segurança Social, onde declarou, além do mais, estar desempregado (o que não corresponde ao que consta da sentença, nem ao que alega em termos de motivação de recurso, uma vez que refere que, na altura, “não podia faltar ao emprego onde tinha começado há poucos dias a trabalhar à experiência”), não se vê qual era a dificuldade na obtenção e apresentação dos documentos que deviam acompanhar aquele requerimento.
Daí que, ao contrário do que alega, o arguido/recorrente podia ter enviado aos serviços da Segurança Social o requerimento de protecção jurídica e respectiva documentação, v.g. por via postal, antes da data da leitura da sentença.
Resulta ainda do regime de acesso ao direito e aos tribunais, designadamente do art. 18 nº 2 da citada Lei, que o apoio judiciário “deve ser requerido antes da primeira intervenção processual, salvo se a situação de insuficiência económica for superveniente, caso em que deve ser requerido antes da primeira intervenção processual que ocorra após o conhecimento da situação de insuficiência económica” (prevendo no seu nº 3, no caso de se verificar insuficiência económica superveniente, a suspensão do prazo para pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo até à decisão definitiva do pedido de apoio judiciário, aplicando-se o disposto nos nºs 4 e 5 do artigo 24).
Isso significa que, por regra, o pedido de apoio judiciário tanto pode destinar-se à propositura de uma causa (independentemente da sua extensão nos termos assinalados nos nºs 4 a 6 do mesmo artigo 24), como pode ser suscitado em acção pendente, valendo sempre para futuro.
No que se refere ao processo penal, existem regras especiais (particularmente a nível da nomeação de defensor - cf. arts. 39, 41, 42 e 43 da mesma lei), estabelecendo, contudo, o nº 1 do art. 44 (disposições aplicáveis) do referido diploma legal o seguinte:
“Em tudo o que não esteja especialmente regulado no presente capítulo relativamente à concessão de protecção jurídica ao arguido em processo penal aplicam-se, com as necessárias adaptações, as disposições do capítulo anterior, com excepção do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 18, devendo o apoio judiciário ser requerido até ao termo do prazo de recurso da decisão em primeira instância.”
Decorre desta norma que, no processo penal (que tem particularidades próprias, que o distinguem designadamente do processo civil), o requerimento a solicitar apoio judiciário pode ser apresentado até ao termo do prazo do recurso da decisão em 1ª instância.
Ou seja: a lei está a acautelar a possibilidade de exercício do direito de recurso.
Portanto, a nível do processo penal, a excepção em relação à aplicação, com as necessárias adaptações, das disposições previstas no capítulo III da lei de acesso ao direito e aos tribunais, “cinge-se às que versam sobre a oportunidade de requerer apoio judiciário nas modalidades de assistência judiciária e de patrocínio judiciário.”[1]
Isto significa que, neste caso, a possibilidade de apresentar o pedido de apoio judiciário (sempre decidido pela entidade competente que, em casos como o destes autos, é o dirigente máximo dos serviços de segurança social da área de residência do requerente, o qual pode delegar ou subdelegar tais poderes de decisão – cf. art. 20 nº 1 e 3 da mesma lei) depois de proferida sentença mas antes do seu trânsito, visa assegurar ao arguido, em processo penal, o exercício do direito ao recurso (art. 401 nº 1-b) do CPP), que se inclui nas garantias de defesa reconhecidas constitucionalmente (art. 32 nº 1 da CRP).
Porém, como é lógico (até tendo presente as finalidades indicadas no art. 1 nº 1 da mesma lei), esta excepção (prevista no art. 44 nº 1) em relação ao regime regra previsto no art. 18, como diz Salvador da Costa[2], “só é legalmente admissível” se for “interposto recurso” da sentença.
É que nesse caso a concessão do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos - como resulta do próprio texto legal - tem como efeito a “dispensa” (e não “isenção”) do pagamento da taxa de justiça devida pela interposição de recurso (ver, à data em que foi proferida a sentença e em que decorria o prazo de recurso, o disposto nos arts. 86 nº 1 e 87 nº 1-b) do CCJ).
O que também mostra que o benefício de apoio judiciário nessa modalidade só produz efeitos (como é lógico) em relação a taxa de justiça, demais encargos, custas que fossem devidas após a formulação do respectivo requerimento de protecção de jurídica[3].
Obviamente que o legislador, ao prever tal regime de excepção, teve presente as normas do Código Processo Penal, designadamente, no âmbito do processo sumário, como sucede neste caso.
E, vistas as apontadas facilidades na entrega do respectivo requerimento de protecção jurídica, obviamente que não se pode concluir que existia qualquer dificuldade ou impossibilidade (mesmo prática) de, no âmbito do processo sumário (considerando este caso concreto), o arguido poder dirigir aos serviços da segurança social tal pedido.
Quando, em casos como o destes autos (em que o requerimento de protecção jurídica é apresentado após a leitura da sentença condenatória mas antes do seu trânsito), o arguido não interpõe recurso da sentença, “extingue-se, naturalmente, a instância do procedimento administrativo por inutilidade ou impossibilidade superveniente”[4].
Por isso, não faz sentido sustentar (como o faz o recorrente) que, com o despacho sob recurso, o juiz está a ignorar a competência que cabe aos serviços da segurança social e a vedar os efeitos do benefício de apoio judiciário concedido pela entidade competente.
É que o pedido de apoio judiciário concedido pela segurança social só produziria efeitos caso o processo tivesse avançado para a fase de recurso.
Assim não tendo sucedido (tendo inclusivamente o arguido pago a multa - sanção penal - em que foi condenado), compreende-se aquela comunicação feita à Segurança Social.
Com efeito, aquela decisão a conceder o apoio judiciário não podia produzir efeitos em relação à condenação anterior em custas (precisamente a condenação em custas proferida na sentença entretanto transitada em julgado).
Se assim não fosse, então o apoio judiciário traduzir-se-ia numa “isenção de custas” inadmissível por contrariar a vontade do legislador.
Não se pode confundir o apoio judiciário nas modalidades de “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, bem como de “pagamento da compensação de defensor oficioso” (art. 16 nº 1-a) e c) da citada Lei), com “isenção de custas”, nem essa equiparação está prevista nessa lei especial que regula o acesso ao direito e aos tribunais.
De resto, também não estando essa situação prevista nos arts. 2 e 3 do CCJ (considerando a data em que foi proferida a sentença aplicável) não pode proceder a pretensão do recorrente de, através do pedido de apoio judiciário que formulou, ficar isento das custas devidas por condenação anterior.
Com bem diz o Ministério Público na resposta ao recurso, a decisão proferida pelos serviços da Segurança Social quando concedeu o apoio judiciário ao arguido, apesar de definitiva, acaba por ser “ineficaz nestes autos”, por não produzir efeitos em relação a condenação anterior em custas, resultando até do trânsito em julgado da sentença condenatória que o mesmo apenas foi requerido com o único “propósito de se eximir ao seu pagamento”.
Esta interpretação teleológica que aqui se faz, tendo em atenção a própria ratio essendi das normas em questão e o seu efeito útil - o que exige uma compreensão racional do argumento histórico e mesmo do literal (apelando também ao artigo 9 do CC) - é a única que está de acordo com o princípio da legalidade, com “o fim almejado pela norma”, considerando o espírito do legislador e a unidade do sistema jurídico, mostrando-se, assim, “funcionalmente justificada”.
Por isso, se conclui que a pretensão do arguido não pode proceder.
Caso não venha a pagar as custas em que foi condenado por decisão anterior ao pedido de apoio judiciário que formulou, o procedimento a seguir será o previsto no 35 do Regulamento das Custas Processuais (visto o disposto na alínea c) do nº 3 do art. 27 - cuja epígrafe é “aplicação no tempo” - do DL nº 34/2008, de 26/2, alterado pela Lei nº 43/2008, de 27/8, pelo DL nº 181/2008, de 28/8 e pela Lei nº 64-A/2008, de 31/12), consoante forem ou não conhecidos bens penhoráveis ao devedor que se afigurem suficientes face ao valor da execução, sem prejuízo do que se dispõe na parte final do nº 4 desses mesmo dispositivo legal.
De qualquer modo, se assim o entender, o Ministério Público deverá averiguar em inquérito a eventual responsabilidade criminal do arguido por, no âmbito do requerimento de protecção jurídica que apresentou à Segurança Social em 23/9/2008, ter feito constar (além do mais) que estava desempregado (facto relevante para a concessão de apoio judiciário), ao contrário do que resulta da referida sentença proferida em 18/9/2008, transitada em julgado, onde se refere que o arguido é serralheiro, auferindo mensalmente montante não concretamente apurado.
Em conclusão: impõe-se negar provimento ao recurso, sendo certo que não foram violados os preceitos legais invocados pelo recorrente.
Não há, por isso, qualquer censura a fazer à decisão sob recurso.
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III- DISPOSITIVO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação, em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido B………. .
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Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs.
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(Processado em computador e revisto pela 1ª signatária - art. 94 nº 2 do CPP)
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Porto, 8/7/2009
Maria do Carmo Saraiva de Menezes da Silva Dias
Jaime Paulo Tavares Valério

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[1] Salvador da Costa, O Apoio Judiciário, 5ª edição actualizada e ampliada, Coimbra: Almedina, 2005, p. 248.
[2] Salvador da Costa, ob. cit., pp. 127, 248 e 249.
[3] Ibidem.
[4] Ibidem.