Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2425/21.9T8OAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
JUSTA CAUSA DE RESOLUÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP202307122425/21.9T8OAZ.P1
Data do Acordão: 07/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE; ALTERADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO SOCIAL
Área Temática: .
Sumário: I - Para o preenchimento da cláusula geral da resolução pelo trabalhador ínsita no nº 1 do art. 394º do CT não basta a verificação material de qualquer dos comportamentos descritos no nº 2, sendo ainda necessário que desse comportamento resultem efeitos suficientemente graves, em si ou nas suas consequências, que tornem inexigível ao trabalhador a continuação da sua atividade em benefício do empregador e devendo, para a sua apreciação, atender-se também “ ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e o seus companheiros”.
II - Porém, o (maior) rigor que se impõe na apreciação da justa causa invocada pelo empregador não pode ser o mesmo com que se aprecia a justa causa invocada pelo trabalhador, sendo certo que, naquele, se tutela a garantia do emprego, por um lado, e que, nesta, não tem o trabalhador, à semelhança do que ocorre com o empregador (que detém um leque variado de sanções disciplinares), outros meios de reação ao comportamento infrator do empregador, por outro.
III - Pese embora num contexto em que era a terceira vez em que os sapatos apresentavam defeitos (não se tendo, contudo, provado que tais defeitos fossem imputáveis a culpa das AA), consubstancia justa causa de resolução do contrato de trabalho o comportamento do empregador que, dirigindo-se às AA. e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam, lhes disse “Suas vacas”, tendo de seguida arremessado uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse “ “Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima”, com o que as AA. se sentiram ofendidas, diminuídas e humilhadas como trabalhadoras e sendo que também não abona no sentido da exigibilidade da continuidade dessa relação o facto de, embora em circunstâncias não apuradas, o encarregado da fábrica referir-se às AA. e a trabalhadores que já estavam na Ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferindo expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da Ré que era utilizada esse tipo de linguagem.
IV - A indemnização devida pela resolução do contrato de trabalho com justa causa, não consubstancia uma quantia certa, apenas sendo liquidada pelo tribunal na sentença, pelos que os juros só são devidos desde a data do trânsito em julgado da decisão que a liquida.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 2425/21.9T8OAZ.P1 e Proc. Apenso[1] 2424/21.0T8OAZ.P1

Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1343)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:


I. Relatório

A) Do Procº nº 2425/21.9T8OAZ.P1

AA propôs ação declarativa de condenação, com processo comum, contra a A..., Lda, pedindo a condenação da Ré no seguinte:
A – Decretar-se o contrato de trabalho que ligava Autora e Ré resolvido com justa causa, por ofensa à integridade moral, honra e dignidade do trabalhador, e ainda por assédio, praticada pelo empregador ou seu representante. nos termos do n.º 1 e alínea f) do n.º 2 do artigo 394º da Lei 7/2009, por iniciativa da Autora com efeitos a partir de 25/06/2021.
B – Por via dessa resolução e pela cessação do contrato ser a Ré condenada a pagar à Autora:
1 – A retribuição respeitante ao trabalho prestado no mês de Junho de 2021 no montante de €555,45;
2 – A retribuição correspondente aos seis dias de férias do ano de 2020, que a Autora não gozou, no montante de €256.22
3 – As férias vencidas e não pagas do ano de 2021 e o respectivo subsídio no montante de (€940,00 + €940,00) = €1 880,00;
4 - Os proporcionais de férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal ao tempo de serviço prestados neste ano, que ora se computam em €430,83 x 3= €1 292,49;
5 - A título de retribuição correspondente a crédito de horas para formação não proporcionada, a importância de € 650,40;
6 - A título de indemnização pela resolução do contrato com justa causa, à razão de quarenta e cinco dias de retribuição base por cada ano da antiguidade e sua proporção, o montante de €59 608,35;
7- Os juros moratórios, à taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento;
8- Deduzido do valor já pago de €1 024,81, no total de €63 218,25.
Para tanto alegou, em síntese, que na última semana de trabalho, o encarregado e o gerente da Ré lhe dirigiram linguagem grosseira, ofensiva e injuriosa, em várias situações, como já tinha vindo a acontecer anteriormente e, por força disso, resolveu o contrato de trabalho com justa causa, tendo direito à correspondente indemnização. Este comportamento foi feito com a intenção de humilhar a autora e provocou um estado de ansiedade e depressão à autora, que exigiu que esta tomasse medicação. Tem ainda direito ao crédito de horas de formação e aos créditos finais de férias não gozadas e respetivo subsídio, proporcionais do ano de cessação e retribuição do último mês de trabalho, deduzindo-se o valor já pago.

A Ré contestou alegando, em síntese, que os seus trabalhadores têm baixas habilitações académicas, usam linguagem livre e brejeira, sendo que na ocasião, por força de defeitos repetidos no trabalho, o sócio dirigiu-se à autora e aos companheiros e utilizou palavras duras, dizendo alguns palavrões, mas não se dirigiu à autora em concreto e não injuriou ninguém. A autora não tem direito à totalidade dos créditos invocados, designadamente de formação e houve um pagamento que deve ser considerado.

Foi fixado à ação o valor de €63.218,25 e proferido despacho saneador, com indicação do objeto do litígio e dos temas da prova.
E, realizada a audiência de discussão e julgamento [sessões de 04.02.2022, 18.02.2022, 18.03.2022 e de 29.04.2022, consignando-se na ata da sessão de 04.02.2022 que “a presente audiência de julgamento se encontra a ser realizada em simultâneo com o Processo: 2424/21.0T8OAZ, sendo que a gravação será realizada nesses autos”], foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:
Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência, declaro a licitude da resolução do contrato de trabalho celebrado entre as partes, por justa causa, da iniciativa da trabalhadora e, em consequência, condeno a ré a pagar à autora as seguintes quantias:
A quantia de €24.141,80 a título de indemnização;
A quantia de €1.785,98 a título de créditos laborais pedidos e não pagos;
A quantia de €627,80 a título de crédito de horas de formação profissional;
Os juros de mora sobre as quantias referidas, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Mais condeno autora e ré nas custas da ação, na proporção do decaimento.”

Inconformada, recorreu a Ré, tendo formulado as seguintes conclusões:

“I- Impugnação da matéria de facto
Os factos provados 6. e 7. foram incorretamente julgados.
De pgs. 12 resulta que na formação da convicção do julgador a quo os depoimentos atendidos foram os das duas AA., não coincidentes entre si, em detrimento do depoimento contrário, do sócio BB (inquirido no dia 29.4.2022, ficheiro 112401), que negou tivesse proferido as respetivas expressões (minuto 3:35 a 13:42).
As próprias AA. divergiram entre si, tendo a A. AA chegado ao ponto de dizer que as expressões, que ela referiu terem sido proferidas pelo sócio BB, não eram dirigidas à colega CC, mas eram coisas só com ela, como responsável pelo grupo (inquirida no dia
18.2.2022, ficheiro 093644, 13:16 a 14:10 - Relativamente à CC, ia ouvindo, mas as coisas eram comigo, dirigia-se a mim, eu era a responsável por eles).
Por outro lado, as expressões que a A. AA referiu terem sido ditas pelo sócio BB (minuto 21:15 a 22:30, «suas vacas, agora enfiem os sapatos pela cona acima, suas vacas do caralho, o caralho que vos foda, puta que vos pariu») não coincidem afinal com as que a testemunha CC referiu terem sido proferidas (inquirida no dia 4.2.2022, ficheiro 114438, 11:15 a 14:00 - «suas vacas do caralho, agora botai os sapatos pela cona acima, ide para a puta que vos pariu, suas filhas da puta, prantai-vos a andar»).
Na hesitação e na dúvida (pgs. 13) o julgador a quo devia ter resolvido a situação contra a parte onerada com o ónus da prova, pois a dita «lógica da situação» e o «tudo indica», se permitiam concluir por uma reação excessiva do patrão, já não autorizavam dar como provado o concreto uso das expressões que a A. e a testemunha CC lhe imputaram.
Do facto de ter ocorrido uma situação má, com palavrões e grosseria, não decorre necessariamente a prova dos impropérios que as AA. alegam terem sido proferidos, havendo nitidamente um conluio das AA. para saírem da situação de stress e do desgaste profissional em que se encontravam, pelos sucessivos problemas de defeitos, e que não aguentavam mais: Basta ver o conjunto de situações que alegavam e não se provaram, por elas próprias terem incorrido em contradições entre si, evidenciando que fantasiaram os factos, para se concluir que as AA. forçaram e concertaram a alegação.
A falta de credibilidade que as AA. mereceram ao julgador a quo, traduzida na falta de prova da maioria da matéria que tinham alegado (17 factos não provados), sugeria o mesmo
desfecho quanto aos factos 6. e 7. e portanto torna inexplicável a súbita adesão à descrição do evento, na concreta versão das AA., em dessintonia.
Salvo o devido respeito, o senhor juiz a quo errou na fixação dos factos provados 6 e 7, que deviam ter sido considerados não provados, como impunham as provas que por ele foram incorretamente apreciadas: Impunha-se, no caso, desvalorizar as declarações da parte
interessada e da testemunha também interessada e face à divergência entre elas existente e à
contradição com a versão do patrão e face à inexistência de outros elementos probatórios que corroborassem a versão da A., dar como não provada essa matéria.

II- De jure
Analisando a carta (de resolução do contrato de trabalho com justa causa – doc. 6 da p.i.) e a matéria de facto provada e a não provada, chega-se à conclusão de que grande parte – a maioria - da matéria invocada não foi provada.
10ª No dia 17.6.2022 da parte da tarde existiu uma situação desagradável, única até então, com o patrão BB, cuja ignição foi imputável à A. (e ao seu grupo de trabalho), decorrente da existência de defeitos, não corrigidos, sendo já a terceira vez que repetiam o trabalho (factos 23 e 24).
11ª Essa circunstância vinha de um processo de desgaste prolongado, de há vários meses, em que a R. se debatia com problemas de defeitos de qualidade e de rejeições, às dezenas por dia, por má aplicação de cola, o que influenciava a montagem das solas e o acabamento, gerando um descontentamento com o trabalho efetuado, não só da A., mas também do operador de montagem e da operadora de acabamento (facto 21).
12ª Isso levou a que o sócio BB ficasse irritado (facto 25) e se tivesse dirigido junto da A. e dos colegas para reclamar do mau trabalho, despejando a caixa de calçado defeituoso na bancada da aplicação da cola (facto 26).
13ª Ou seja, há uma situação justificativa, subjacente a um mau episódio, que certamente não teria acontecido, se não fosse isso.
14ª Também o facto de existir um desgaste acumulado de vários meses com defeitos, com pressão contínua, de parte a parte (ou seja, da A. e da R.), agravado por ela ser a responsável pela equipa, num clima generalizado de desmoralização e de perturbação em contexto de pandemia, potenciou na A. um significado, que, olhado isoladamente, o facto do dia 17.6.2022, certamente não teria.
15ª A sentença condenou a R. por um facto excecional, fortuito, de perda de estribeiras do patrão, hipervalorizado num percurso longo de mais de 30 anos de antiguidade na empresa,
justificado pelas demais circunstâncias do caso e que não teria acontecido se não fosse o problema criado por falhas funcionais da própria trabalhadora.
16ª Não houve intenção de injuriar ou ofender, mas de chamar à atenção, de forma errada, e mal educada, é certo, mas sem a gravidade atribuída pela sentença e o alcance de tornar insustentável e intolerável a manutenção da relação laboral, tanto mais que foi um caso único.
17ª Ponderado o caso, não devia ter-se considerado proporcional o uso desta medida (artº 394º do CT), pondo em causa um passado de 30 anos, toda uma vida de trabalho ganha e sustentada na empresa, por um episódio que durou menos do que um fósforo e em circunstâncias atendíveis e atenuantes. É excessivo, tanto mais que a A. era uma pessoa considerada, era responsável de equipa e tinha por isso um salário superior e um prémio de produtividade (facto 3).
18ª Face à inexistência de justa causa de resolução, bem procedeu a R. ao descontar os 2 meses da falta de aviso prévio, 1.880€, pelo que o valor pedido de créditos laborais não é devido, por compensação de créditos efetuada no recibo final, extrajudicialmente (artº 399º do CT).
19ª Subsidiariamente:
a. também a quantificação da indemnização, de 25 dias por ano, é excessiva, face às circunstâncias do caso, nomeadamente a própria culpa da trabalhadora, que grande parte dos factos invocados não se provaram, e depois a grande antiguidade. No limite, a ser atribuída, a indemnização deveria ser reduzida ao mínimo de 15 dias por ano (artº 396º, nº 1, do CT).
b. a sentença condenou em juros desde a citação, mas sobre a indemnização são devidos apenas a partir do trânsito em julgado.
Nestes termos,
- Deve o recurso merecer provimento, com as consequências legais.

A A. AA contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
“O nosso sistema jurídico está todo ele alicerçado na procura pela da verdade material, bem como no direito à prova.
As declarações de parte tornam-se fundamentais à descoberta da verdade material, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão, e neste domínio integram um verdadeiros testemunho de parte.
E, nestes casos, a prova deve ser valorada tal como uma verdadeira prova testemunhal, não podendo ser degradada antecipadamente com fundamento no facto de provir da parte.
As declarações de parte podem por si, estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente, assumindo um valor probatório autónomo. Pelo que:
- O julgador decidiu de acordo com as regras do ónus da prova
- A Ré não produziu qualquer prova, pelo que é completamente inapropriada e disparatada a alegação da existência de um conluio das AA, e que elas fantasiaram grande parte da factualidade.
- Ao contrário do que alega a Apelante as AA não mereceram qualquer falta de credibilidade por parte do Tribunal, e a falta de prova da grande parte da matéria alegada, ficou a dever-se à “indisponibilidade” das testemunhas arroladas, por estarem ainda sob as ordens e direcção da Apelante, e terem-se apresentado claramente amedrontadas, intimidadas e condicionadas.
- A indemnização fixada, levando em conta a conduta e culpa da Ré e as condições da Autora, sua trabalhadora, ainda ficou aquém de justa, pelo que o quantum indemnizatório fixado na Douta sentença, ainda peca por defeito.
- A douta sentença recorrida aplicou corretamente a Lei aos factos, não merecendo qualquer censura.
Termos em que, com o douto suprimento, deve improceder o recurso, mantendo-se a douta sentença recorrida.”

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da apensação, aos presentes autos. do Proc. 2424/21.0T8OAZ.P1. e, bem assim, aderindo integralmente ao parecer, na mesma data, emitido pelo Exmº Colega no citado processo, no sentido da improcedência do recurso, não tendo as partes respondido ao mesmo.

Na sequência de despacho da ora relatora, foi o mencionado Proc. 2424/21.0T8OAZ.P1 apenso aos presentes autos.
*

B) Do Proc. 2424/21.0T8OAZ.P1

CC propôs a presente ação declarativa comum emergente de contrato de trabalho contra a A..., Lda, pedindo a condenação da Ré no seguinte:
A – Decretar-se o contrato de trabalho que ligava Autora e Ré resolvido com justa causa, por ofensa à integridade moral, honra e dignidade do trabalhador, e ainda por assédio, praticada pelo empregador ou seu representante. nos termos do n.º 1 e alínea f) do n.º 2 do artigo 394º da Lei 7/2009, por iniciativa da Autora com efeitos a partir de 25/06/2021.
B – Por via dessa resolução e pela cessação do contrato ser a Ré condenada a pagar à Autora:
1 – A retribuição respeitante ao trabalho prestado no mês de Junho de 2021 no montante de €399,36;
2 – As férias vencidas e não pagas do ano de 2021 e o respetivo subsídio ou seja €1 330,00;
3 - Os proporcionais de férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal ao tempo de serviço prestados neste ano, que se computam em €914,37;
5 - A título de retribuição correspondente a crédito de horas para formação não proporcionada, a importância de €460,80;
6 - A título de indemnização pela resolução do contrato de trabalho com justa causa, à razão de quarenta e cinco dias de retribuição base por cada ano da antiguidade e sua proporção, o montante de €56 678,40 = (€30,72 x 45 x 41).
7- Os juros moratórios, á taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento;
8- Deduzido do valor já pago de €728,52, no total de €59 054,41.
Para tanto alegou, em síntese, que na última semana de trabalho, o encarregado e o gerente da ré lhe dirigiram linguagem grosseira, ofensiva e injuriosa, em várias situações, como já tinha vindo a acontecer anteriormente e, por força disso, resolveu o contrato de trabalho com justa causa, tendo direito à correspondente indemnização. Este comportamento foi feito com a intenção de humilhar a autora e de provocar-lhe um estado de ansiedade e depressão, que exigiu que esta tomasse medicação. Tem ainda direito ao crédito de horas de formação e aos créditos finais de férias não gozadas e respetivo subsídio, proporcionais do ano de cessação e retribuição do último mês de trabalho, deduzindo-se o valor já pago.

Contestou a Ré alegando, em síntese, que os seus trabalhadores têm baixas habilitações académicas, usam linguagem livre e brejeira, sendo que na ocasião, por força de defeitos repetidos no trabalho, o sócio da Ré dirigiu-se à autora e aos companheiros e utilizou palavras duras, dizendo alguns palavrões, mas não se dirigiu à autora em concreto e não injuriou ninguém. A autora não tem direito à totalidade dos créditos invocados, designadamente de formação e houve um pagamento que deve ser considerado.

Foi fixado à ação o valor de €59.054,41 e proferido despacho saneador, com indicação do objeto do litígio e dos temas da prova.
Realizada a audiência de discussão e julgamento [sessões de 04.02.2022, 18.02.2022, 18.03.2022 e de 29.04.2022, consignando-se na ata da sessão de 04.02.2022 que “a presente audiência de julgamento se encontra a ser realizada em simultâneo com o Processo: 2425/21.9T8OAZ, sendo que a gravação será realizada nos presentes autos”], foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:
“Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência, declaro a licitude da resolução do contrato de trabalho celebrado entre as partes, por justa causa, da iniciativa da trabalhadora e, em consequência, condeno a ré a pagar à autora as seguintes quantias:
A quantia de €22.620,91 a título de indemnização;
A quantia de €1.279,71 a título de créditos laborais pedidos e não pagos;
A quantia de €444,79 a título de crédito de horas de formação profissional;
Os juros de mora sobre as quantias referidas, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Mais condeno autora e ré nas custas da ação, na proporção do decaimento.”

Inconformada, a Ré recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
“I- Impugnação da matéria de facto
Os factos provados 6. e 7. foram incorretamente julgados.
De pgs. 12 resulta que na formação da convicção do julgador a quo os depoimentos atendidos foram os das duas AA., não coincidentes entre si, em detrimento do depoimento
contrário, do sócio BB (inquirido no dia 29.4.2022, ficheiro 112401), que negou tivesse proferido as respetivas expressões (minuto 3:35 a 13:42).
As próprias AA. divergiram entre si, tendo a testemunha AA chegado ao ponto de dizer que as expressões, que ela referiu terem sido proferidas pelo sócio BB, não eram dirigidas à A. CC, mas eram coisas só com ela, como responsável pelo grupo (inquirida no dia 18.2.2022, ficheiro 093644, 13:16 a 14:10 - Relativamente à CC, ia ouvindo, mas as coisas eram comigo, dirigia-se a mim, eu era a responsável por eles): Ou seja, a própria testemunha da A. aliviou a R. de qualquer responsabilidade ou tratamento negativo da A., dizendo que era a própria testemunha, AA, que estava em causa, e portanto a reação do patrão lhe era dirigida a ela, como responsável, e não à colega A., tanto mais que na mesa (equipa) havia outras pessoas e esses outros trabalhadores também participavam na realização do trabalho (mal feito) – facto 21.
Por outro lado, as expressões que a testemunha AA referiu terem sido ditas pelo sócio BB (minuto 21:15 a 22:30, «suas vacas, agora enfiem os sapatos pela cona acima, suas vacas do caralho, o caralho que vos foda, puta que vos pariu») não coincidem afinal com as que A. CC referiu terem sido proferidas (inquirida no dia 4.2.2022, ficheiro 114438, 11:15 a 14:00 - «suas vacas do caralho, agora botai os sapatos pela cona acima, ide para a puta que vos pariu, suas filhas da puta, prantai-vos a andar»).
Na hesitação e na dúvida (pgs. 13) o julgador a quo devia ter resolvido a situação contra a parte onerada com o ónus da prova, pois a dita «lógica da situação» e o «tudo indica», se permitiam concluir por uma reação excessiva do patrão, já não autorizavam dar como provado o concreto uso das expressões que a A. e a testemunha lhe imputaram.
Do facto de ter ocorrido uma situação má, com palavrões e grosseria, não decorre necessariamente a prova dos impropérios que as AA. alegam terem sido proferidos, havendo nitidamente um conluio das AA. para saírem da situação de stress e do desgaste profissional em que se encontravam, pelos sucessivos problemas de defeitos, e que não aguentavam mais: Basta ver o conjunto de situações que alegavam e não se provaram, por elas próprias terem incorrido em contradições entre si, evidenciando que fantasiaram os factos, para se concluir que as AA. forçaram e concertaram a alegação.
A falta de credibilidade que as AA. mereceram ao julgador a quo, traduzida na falta de prova da maioria da matéria que tinham alegado (16 factos não provados), sugeria o mesmo
desfecho quanto aos factos 6. e 7. e portanto torna inexplicável a súbita adesão à descrição do evento, na concreta versão das AA., em dessintonia.
Salvo o devido respeito, o senhor juiz a quo errou na fixação dos factos provados 6 e 7, que deviam ter sido considerados não provados, como impunham as provas que por ele foram incorretamente apreciadas: Impunha-se, no caso, desvalorizar as declarações da parte
interessada e da testemunha também interessada e face à divergência entre elas existente e à
contradição com a versão do patrão e face à inexistência de outros elementos probatórios que corroborassem a versão da A., dar como não provada essa matéria.
II- De jure
Analisando a carta (de resolução do contrato de trabalho com justa causa – doc. 6 da p.i.) e a matéria de facto provada e a não provada, chega-se à conclusão de que grande parte – a maioria - da matéria invocada não foi provada.
10ª No dia 17.6.2022 da parte da tarde existiu uma situação desagradável, única até então, com o patrão BB, cuja ignição foi imputável à A. (e ao seu grupo de trabalho), decorrente da existência de defeitos, não corrigidos, sendo já a terceira vez que repetiam o trabalho (factos 23 e 24).
11ª Essa circunstância vinha de um processo de desgaste prolongado, de há vários meses, em que a R. se debatia com problemas de defeitos de qualidade e de rejeições, às dezenas por dia, por má aplicação de cola, o que influenciava a montagem das solas e o acabamento, gerando um descontentamento com o trabalho efetuado, não só da A., mas também do operador de montagem e da operadora de acabamento (facto 21).
12ª Isso levou a que o sócio BB ficasse irritado (facto 25) e se tivesse dirigido junto da A. e dos colegas para reclamar do mau trabalho, despejando a caixa de calçado defeituoso na bancada da aplicação da cola (facto 26).
13ª Ou seja, há uma situação justificativa, subjacente a um mau episódio, que certamente não teria acontecido, se não fosse isso.
14ª Também o facto de existir um desgaste acumulado de vários meses com defeitos, com pressão contínua, de parte a parte (ou seja, da A. e da R.), num clima generalizado de desmoralização e de perturbação em contexto de pandemia, e de a A. andar em baixo há vários anos, diminuída, a tomar Xanax, como se fundamentou no ponto 4. da sentença (pgs, 14/15), potenciou na A. um significado, que, olhado isoladamente, o facto do dia 17.6.2022, certamente não teria.
15ª A sentença condenou a R. por um facto excecional, fortuito, de perda de estribeiras do patrão, hipervalorizado num percurso longo de mais de 40 anos de antiguidade na empresa,
justificado pelas demais circunstâncias do caso e que não teria acontecido se não fosse o problema criado por falhas funcionais da própria trabalhadora.
16ª Não houve intenção de injuriar ou ofender, mas de chamar à atenção, de forma errada, e mal educada, é certo, mas sem a gravidade atribuída pela sentença e o alcance de tornar insustentável e intolerável a manutenção da relação laboral, tanto mais que foi um caso único.
17ª Ponderado o caso, não devia ter-se considerado proporcional o uso desta medida (artº 394º do CT), pondo em causa um passado de 40 anos, toda uma vida de trabalho ganha e sustentada na empresa, por um episódio que durou menos do que um fósforo e em circunstâncias atendíveis e atenuantes. É excessivo.
18ª Face à inexistência de justa causa de resolução, bem procedeu a R. ao descontar os 2 meses da falta de aviso prévio, 1.330€, pelo que o valor pedido de créditos laborais não é devido, por compensação de créditos efetuada no recibo final, extrajudicialmente (artº 399º do CT).
19ª Subsidiariamente:
a. também a quantificação da indemnização, de 25 dias por ano, é excessiva, face às circunstâncias do caso, nomeadamente a própria culpa da trabalhadora, que grande parte dos factos invocados não se provaram, e depois a grande antiguidade. No limite, a ser atribuída, a indemnização deveria ser reduzida ao mínimo de 15 dias por ano (artº 396º, nº 1, do CT).
b. a sentença condenou em juros desde a citação, mas sobre a indemnização são devidos apenas a partir do trânsito em julgado.
Nestes termos,
- Deve o recurso merecer provimento, com as consequências legais.”

A A. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
“O nosso sistema jurídico está todo ele alicerçado na procura pela da verdade material, bem como no direito à prova.
As declarações de parte tornam-se fundamentais à descoberta da verdade material, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão, e neste domínio integram um verdadeiros testemunho de parte.
E, nestes casos, a prova deve ser valorada tal como uma verdadeira prova testemunhal, não podendo ser degradada antecipadamente com fundamento no facto de provir da parte.
As declarações de parte podem por si, estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente, assumindo um valor probatório autónomo. Pelo que;
- O julgador decidiu de acordo com as regras do ónus da prova.
- A Ré não produziu qualquer prova, pelo que é completamente inapropriada e disparatada a alegação da existência de um conluio das AA, e que elas fantasiaram grande parte da factualidade.
- Ao contrário do que alega a Apelante as AA não mereceram qualquer falta de credibilidade por parte do Tribunal, e a falta de prova da grande parte da matéria alegada, ficou a dever-se à “indisponibilidade” das testemunhas arroladas, por estarem ainda sob as ordens e direcção da Apelante, e terem-se apresentado claramente amedrontadas, intimidadas e condicionadas.
- A indemnização fixada, levando em conta a conduta e culpa da Ré e as condições da Autora, sua trabalhadora, ainda ficou aquém de justa, pois o quantum indemnizatório fixado na Douta sentença, ainda peca por defeito.
- A douta sentença recorrida aplicou corretamente a Lei aos factos, não merecendo qualquer reparo.
NESTES TERMOS,
e com o douto suprimento desse Venerando Tribunal, negando provimento ao recurso, e confirmando a decisão de Primeira Instância, (…)”

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, ao qual respondeu a Recorrente dele discordando e mantendo a alegação de recurso.

O Proc. ora em apreço veio a ser, como já referido, apenso ao Proc. 2425/21.9T8OAZ.P1, a partir do que passou a ser processado, apenas, este.

Colheram-se os vistos legais.
***

II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância

Na 1ª instância foi proferida a seguinte decisão sobre a matéria de facto:
A. No Proc. 2425/21.9T8OAZ.P1:
“1. Factos provados:
1. A Ré é uma sociedade fabril produtora de calçado.
2. A Autora foi admitida em 1 de Setembro de 1990, com ela estabelecendo um contrato sem prazo, através do qual se obrigou, mediante retribuição, a prestar os seus serviços nas suas instalações, sob as ordens, direcção, fiscalização e autoridade desta, integrando a sua organização fabril.
3. A Autora tinha um horário de trabalho de 40 horas, de segunda a sexta-feira, com intervalo para almoço, desempenhava as funções inerentes à categoria profissional de OPERADOR AUXILIAR DE MONTAGEM DE 2ª e auferia, uma retribuição fixa de €940,00, acrescida de subsídio de alimentação á razão de €4,27 /hora e uma variável líquida correspondente a prémio de produtividade entre € 30 e € 65 mensais.
4. A Autora e restante pessoal trabalham sob as ordens e direcção da gerência da Ré, designadamente do sócio BB e do Encarregado da fábrica DD.
5. Em circunstâncias não apuradas, o Encarregado da fábrica DD referiu-se à autora e a trabalhadores que já estavam na ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferia expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da ré que era utilizada esse tipo de linguagem.
6. Nesse mesmo dia 17 de Junho de 2021, pelas 15:30, o sócio gerente da Ré BB, dirigiu-se à Autora e à sua colega de bancada AA e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
- Suas vacas!
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
- Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima!
7. A autora, ao ouvir estas expressões, sentiu-se ofendida, diminuída e humilhada, como trabalhadora.
8. A autora participou este tipo de comportamento à AUTORIDADE PARA AS CONIÇÕES DO TRABALHO e participou criminalmente do Sócio gerente da empresa BB pelo crime de injúrias.
9 Em consequência destas condutas, a autora sofreu desgosto, angústia, stress e mal-estar psicológico.
10. Em 23 de Junho de 2021, a autora, através de carta registada com A/R, que a Ré recebeu em 24/06/2021, resolveu o contrato de trabalho que cessou no dia 25/06/2021.
11. A Autora trabalhou 13 dias no mês de julho de 2021.
12. A Ré nunca proporcionou qualquer formação à Autora.
13. No ano de cessação do contrato de trabalho, a autora não gozou férias e ficou com pelo menos 4 dias por gozar do ano anterior, por ter ficado com sars-cov-2 no período de férias.
14. Em 30 de Junho de 2021, a ré efectuou o pagamento de € 1.024,81.
15. A autora tem a 6ª classe.
16. A maioria dos operários da fábrica da ré tem baixa instrução, entre a antiga 4ª classe e o 6º ano.
17. A ré tinha 48 trabalhadores, sendo 20 na costura, que já funcionava em instalações na zona industrial de …, e 28 na montagem e no acabamento, que se encontravam nas instalações da sede, em Oliveira de Azeméis.
18. O ambiente na fábrica é descontraído, o pessoal conhece-se há muitos anos e trata-se por tu, sendo na maioria trabalhadores com muitos anos de antiguidade na empresa, que passam o dia juntos, inclusivamente no intervalo de almoço, no refeitório da empresa.
19. A autora tinha como função habitual forrar saltos e dar colas e que nesse período estava a dar cola, para posterior aplicação de solas (montagem) e acabamento por outros colegas de trabalho.
20. A ré transferiu a montagem e o acabamento também para a unidade de S. João da Madeira, em 1.9.2021, e que não estava prevista a transferência da autora, porque ia permanecer nas instalações de Oliveira de Azeméis, com mais 4 colegas, a quem ia preparar o trabalho de linha.
21. Havia vários meses que a ré se debatia com problemas de defeitos de qualidade e de rejeições, às dezenas por dia, por má aplicação de cola, o que influenciava a montagem das solas e o acabamento, gerando um descontentamento com o trabalho efetuado, não só da autora, mas também do operador de montagem e da operadora de acabamento.
22. A autora não reportou à ré nenhum comportamento anormal do encarregado, de modo a que pudesse ser tomada alguma medida necessária.
23. No dia em causa, 17 de junho, os sapatos apresentavam defeitos.
24. Era já a terceira vez que repetiam o trabalho.
25. O sócio da ré ficou irritado.
26. E dirigiu-se junto da autora e dos colegas para reclamar do mau trabalho, despejando a caixa de calçado defeituoso na bancada da aplicação da cola.
27. No final do mês de junho de 2021 foram pagos à autora as férias e o subsídio de férias vencidos em 1.1.2021, os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de natal de 2021, tudo no valor ilíquido de 3.992,77€, a que foi deduzido o aviso prévio não concedido e os descontos legais, bem como faltas para apurar o valor devido até ao último dia de trabalho, tendo a autora recebido efetivamente o valor líquido de €1.024,81, nos termos do recibo final junto com a contestação.

2. Factos não provados:
1. Na data de 15/06/2021 o sócio da ré pediu à autora para forrar saltos e a autora disse-lhe que tal era humanamente impossível, e não conseguiria fazer tudo sozinha, dar continuidade à linha de produção e executar tamanha tarefa.
E o Sócio gerente disse-lhe:
- Só não consegues se não quiseres!
- Se não conseguires, vai falar com o médico da EE que ele dá-te baixa!.
2. Nesse mesmo dia de 15 de Junho de 2021, ainda no período de trabalho da manhã, o Encarregado da Fábrica da Ré DD abordou a Autora na sua bancada de trabalho e perguntou-lhe:
- AA, consegues explicar-me isto nestas sandálias?
Ao que a Autora respondeu:
- Não! Deve ser defeito da pele.
O Sr. Encarregado Sr. DD disse-lhe então:
- Defeito o caralho! Se vocês coçassem era a cona em vez de estragar de propósito!...
3. No dia 16 de Junho de 2021 de manhã o Encarregado DD dirigiu-se à sua colega de bancada AA e disse, de forma a ser ouvido por todos os presentes:
- Sabes quantas pessoas vão para São João da Madeira dos antigos?
- Três! Imagina os que vão ficar aqui…
- Os que ficam são lixo!
- É tudo merda! Não prestam para nada.
4. O Encarregado e a Autora sabiam que esta, não estava escalonada para essa deslocalização e que iria permanecer na fábrica de Oliveira de Azeméis.
5. No dia 17 de Junho de 2021 pelas 11:00 horas, o mesmo Sr. DD, na presença de todos e dirigindo-se para a Autora e para a sua colega de bancada AA disse:
- São uns burros! Não sabem fazer nada! São lixo!
- Puta que as pariu! Não sabem fazer nada!
- Vão todas com o caralho!
- Aqui não mandamos ninguém embora!
- Quem quiser ir que vá, e vai sem nada!
- Vou mandar os velhos todos embora!
6. Estas expressões e outras, designadamente as seguintes:
- Até com os olhos estragam sapatos!.
- Se coçassem era a cona em vez de estragar os sapatos!
- Filhas da puta!
- Ide para a puta que vos pariu!
- Pago as multas que tiver que pagar, mas prefiro pagar ao ACT do que a vocês!
7. Foram inúmeras vezes usadas pelo Encarregado da fábrica DD e pelo sócio gerente BB, por mais de cinco anos, e algumas vezes mais de uma vez por dia, directamente para a Autora, com o propósito de a ofender ou vexar, e destinavam-se a desvalorizar sistemáticamente o seu trabalho e dos restantes trabalhadores que operam naquela bancada.
8. A quem dirigiram várias vezes as seguintes expressões:
- Suas burras!
- Vão para a cave contar ratos!
9. Esta última expressão é uma ameaça que corresponde a uma “tarefa”, que atribuem ao trabalhador que pretendem castigar ou pressionar, e que constituí em ir para o armazém de cave da fábrica, que é um sítio sujo escuro e isolado, contar e recontar formas, palmilhas, saltos antigos, que já não têm qualquer utilidade, com a finalidade de humilhar e castigar o executante.
10. Estas expressões e modo de tratamento destinavam-se a criar um clima de constante pressão e terror psicológico no local de trabalho entre o Sócio gerente BB e o Encarregado da fábrica e a autora, para a diminuir de forma persistente e sistemática o trabalho da Autora.
11. A quem responsabilizavam sempre que ocorria um defeito no trabalho, mesmo que não tivesse origem na sua bancada de trabalho,
12. Procurando atingir e pressionar a Autora, de forma a provocar-lhe insegurança e baixa autoestima.
13. Que a levaram, angustiada, a tomar medicamentos calmantes para conseguir ir trabalhar.
14. A autora suportou enquanto pode, debaixo de forte stress, com enorme dificuldade e desgosto, por serem emanadas pelo seu superior hierárquico e pelo sócio gerente da empresa e por necessitar do seu salário para viver condignamente.
15. A Autora foi inúmeras vezes responsabilizada, pessoalmente, por defeito ou trabalho mal-executado na sua bancada, mesmo que a tarefa ou trabalho tivesse sido efectuado por outro colega ou tivesse mesmo origem noutro sítio ou fase de produção, como uma forma constante de pressão para a levar a despedir-se por não aguentar o ambiente de trabalho.
16. O sócio gerente da Ré sempre os ameaçou de os despedir, e que prefere pagar ao ACT e ao Tribunal do que pagar-lhes (a eles trabalhadores) um cêntimo.
17. O sócio gerente da ré também se dirigiu à autora, muitas vezes, com a ameaça de despedimento, e dizendo os epítetos de burras, lixo, vacas, filhas da puta.
18. A linguagem na fábrica é livre e brejeira, própria do meio operariado e acompanha o nível de habilitações dos trabalhadores.
19. Todos os dias os trabalhadores diziam e dizem palavrões e utilizam (baixo) calão, seja para se queixarem ou reclamarem do trabalho, seja para comunicarem ou brincarem uns com os outros.
20. Naquele dia, o trabalho de dar cola foi novamente efetuado defeituosamente pela autora (deu cola a mais e fora do sítio, entrava na pele), pelo operador de montagem (homem das solas que colou a sola, bem sabendo que a cola estava mal aplicada) e pela operadora de acabamento (que escovou a obra mal feita) e fizeram seguir o calçado para a frente como se estivesse bem.”

B. No Proc. 2424/21.0T8OAZ.P1:

“1. Factos provados:
1. A Ré é uma sociedade fabril produtora de calçado.
2. A Autora foi admitida em 1 de Setembro de 1980, com ela estabelecendo um contrato sem prazo, através do qual se obrigou, mediante retribuição, a prestar os seus serviços nas suas instalações, sob as ordens, direcção, fiscalização e autoridade desta, integrando a sua organização fabril.
3. A Autora tinha um horário de trabalho de 40 horas, de segunda a sexta-feira, com intervalo para almoço, desempenhava as funções inerentes à categoria profissional de OPERADOR AUXILIAR DE MONTAGEM DE 2ª e auferia, uma retribuição fixa de €665,00, acrescida de subsídio de alimentação á razão de €4,27 /hora.
4. A Autora e restante pessoal trabalhavam sob as ordens e direcção da gerência da Ré, designadamente do sócio BB e do Encarregado da fábrica DD.
5. Em circunstâncias não apuradas, o Encarregado da fábrica DD referiu-se à autora e a trabalhadores que já estavam na ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferia expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da ré que era utilizada esse tipo de linguagem.
6. Nesse mesmo dia 17 de Junho de 2021, pelas 15:30, o sócio da Ré BB, dirigiu-se à Autora e à sua colega de bancada AA e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
- Suas vacas!
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
- Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima!
7. A autora, ao ouvir estas expressões, sentiu-se ofendida, diminuída e humilhada, como trabalhadora.
8. A autora participou este tipo de comportamento à AUTORIDADE PARA AS CONIÇÕES DO TRABALHO e participou criminalmente do Sócio gerente da empresa BB pelo crime de injúrias.
9 Em consequência destas condutas, a autora sofreu desgosto, angústia, stress e mal-estar psicológico.
10. Em 23 de Junho de 2021, a autora, através de carta registada com A/R, que a Ré recebeu em 24/06/2021, resolveu o contrato de trabalho que cessou no dia 25/06/2021.
11. A Autora trabalhou 13 dias no mês de julho de 2021.
12. A Ré nunca proporcionou qualquer formação à Autora.
13. No ano de cessação do contrato de trabalho, a autora não gozou férias.
14. Em 30 de Junho de 2021, a ré efectuou o pagamento de € 728,52.
15. A autora tem a 4ª classe.
16. A maioria dos operários da fábrica da ré tem baixa instrução, entre a antiga 4ª classe e o 6º ano.
17. A ré tinha 48 trabalhadores, sendo 20 na costura, que já funcionava em instalações na zona industrial de S. João da Madeira, e 28 na montagem e no acabamento, que se encontravam nas instalações da sede, em Oliveira de Azeméis.
18. O ambiente na fábrica é descontraído, o pessoal conhece-se há muitos anos e trata-se por tu, sendo na maioria trabalhadores com muitos anos de antiguidade na empresa, que passam o dia juntos, inclusivamente no intervalo de almoço, no refeitório da empresa.
19. A autora tinha como função habitual forrar saltos e dar colas e que nesse período estava a dar cola, para posterior aplicação de solas (montagem) e acabamento por outros colegas de trabalho.
20. A ré transferiu a montagem e o acabamento também para a unidade de S. João da Madeira, em 1.9.2021, e que não estava prevista a transferência da autora, porque ia permanecer nas instalações de Oliveira de Azeméis, com mais 4 colegas, a quem ia preparar o trabalho de linha.
21. Havia vários meses que a ré se debatia com problemas de defeitos de qualidade e de rejeições, às dezenas por dia, por má aplicação de cola, o que influenciava a montagem das solas e o acabamento, gerando um descontentamento com o trabalho efetuado, não só da autora, mas também do operador de montagem e da operadora de acabamento.
22. A autora não reportou à ré nenhum comportamento anormal do encarregado, de modo a que pudesse ser tomada alguma medida necessária.
23. No dia em causa, 17 de junho, os sapatos apresentavam defeitos.
24. Era já a terceira vez que repetiam o trabalho.
25. O sócio da ré ficou irritado.
26. E dirigiu-se junto da autora e dos colegas para reclamar do mau trabalho, despejando a caixa de calçado defeituoso na bancada da aplicação da cola.
27. No final do mês de junho de 2021 foram pagos à autora as férias e o subsídio de férias vencidos em 1.1.2021, os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de natal de 2021, tudo no valor ilíquido de 2.609,71€, a que foi deduzido o aviso prévio não concedido e os descontos legais, bem como faltas para apurar o valor devido até ao último dia de trabalho, tendo a autora recebido efetivamente o valor líquido de 728,52€, nos termos do recibo final que consta junto com a contestação.

2. Factos não provados:
1. Na data de 15/06/2021 a Autora, foi pedir cola ao Encarregado DD, por solicitação da AA disse-lhe: - Vá-me buscar cola se faz favor. O Encarregado respondeu: - Foda se .. é mal empregue a água que bebeis! - Sois indignas de estar cá dentro! Levam isto á ruina e estão a conseguir!
2. No dia 16 de Junho de 2021 de manhã o Encarregado DD dirigiu-se à sua colega de bancada AA e disse, de forma a ser ouvido por todos os presentes:
- Sabes quantas pessoas vão para São João da Madeira dos antigos?
- Três! Imagina os que vão ficar aqui…
- Os que ficam são lixo!
- É tudo merda! Não prestam para nada.
3. O Encarregado e a Autora sabiam que esta, não estava escalonada para essa deslocalização e que iria permanecer na fábrica de Oliveira de Azeméis.
4. No dia 17 de Junho de 2021 pelas 11:00 horas, o mesmo Sr. DD, na presença de todos e dirigindo-se para a Autora e para a sua colega de bancada AA disse:
- São uns burros! Não sabem fazer nada! São lixo!
- Puta que as pariu! Não sabem fazer nada!
- Vão todas com o caralho!
- Aqui não mandamos ninguém embora!
- Quem quiser ir que vá, e vai sem nada!
- Vou mandar os velhos todos embora!
5. Estas expressões e outras, designadamente as seguintes:
- Até com os olhos estragam sapatos!.
- Se coçassem era a cona em vez de estragar os sapatos!
- Filhas da puta!
- Ide para a puta que vos pariu!
- Pago as multas que tiver que pagar, mas prefiro pagar ao ACT do que a vocês!
6. Foram inúmeras vezes usadas pelo Encarregado da fábrica DD e pelo sócio gerente BB, por mais de cinco anos, e algumas vezes mais de uma vez por dia, directamente para a Autora, com o propósito de a ofender ou vexar, e destinavam-se a desvalorizar sistemáticamente o seu trabalho e dos restantes trabalhadores que operam naquela bancada.
7. A quem dirigiram várias vezes as seguintes expressões:
- Suas burras!
- Vão para a cave contar ratos!
8. Esta última expressão é uma ameaça que corresponde a uma “tarefa”, que atribuem ao trabalhador que pretendem castigar ou pressionar, e que constituí em ir para o armazém de cave da fábrica, que é um sítio sujo escuro e isolado, contar e recontar formas, palmilhas, saltos antigos, que já não têm qualquer utilidade, com a finalidade de humilhar e castigar o executante.
9. Estas expressões e modo de tratamento destinavam-se a criar um clima de constante pressão e terror psicológico no local de trabalho entre o Sócio gerente BB e o Encarregado da fábrica e a autora, para a diminuir de forma persistente e sistemática o trabalho da Autora.
10. A quem responsabilizavam sempre que ocorria um defeito no trabalho, mesmo que não tivesse origem na sua bancada de trabalho,
11. Procurando atingir e pressionar a Autora, de forma a provocar-lhe insegurança e baixa autoestima,
12. Que a levaram, angustiada, a tomar medicamentos calmantes para conseguir ir trabalhar.
13. A autora suportou enquanto pode, debaixo de forte stress, com enorme dificuldade e desgosto, por serem emanadas pelo seu superior hierárquico e pelo sócio gerente da empresa e por necessitar do seu salário para viver condignamente.
14. A Autora foi inúmeras vezes responsabilizada, pessoalmente, por defeito ou trabalho mal-executado na sua bancada, mesmo que a tarefa ou trabalho tivesse sido efectuado por outro colega ou tivesse mesmo origem noutro sítio ou fase de produção, como uma forma constante de pressão para a levar a despedir-se por não aguentar o ambiente de trabalho.
15. O sócio gerente da Ré sempre os ameaçou de os despedir, e que prefere pagar ao ACT e ao Tribunal do que pagar-lhes (a eles trabalhadores) um cêntimo.
16. O sócio gerente da ré também se dirigiu à autora, muitas vezes, com a ameaça de despedimento, e dizendo os epítetos de burras, lixo, vacas, filhas da puta.
17. A linguagem na fábrica é livre e brejeira, própria do meio operariado e acompanha o nível de habilitações dos trabalhadores.
18. Todos os dias os trabalhadores diziam e dizem palavrões e utilizam (baixo) calão, seja para se queixarem ou reclamarem do trabalho, seja para comunicarem ou brincarem uns com os outros.
19. Naquele dia, o trabalho de dar cola foi novamente efetuado defeituosamente pela autora (deu cola a mais e fora do sítio, entrava na pele), pelo operador de montagem (homem das solas que colou a sola, bem sabendo que a cola estava mal aplicada) e pela operadora de acabamento (que escovou a obra mal feita) e fizeram seguir o calçado para a frente como se estivesse bem.”
***
III. Objeto dos recursos

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, e pelo Recorrido em sede de ampliação do âmbito do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019).
Assim, as questões a apreciar, que são em ambos os recursos semelhantes e que serão apreciadas em conjunto, são as seguintes:
a. Impugnação da decisão da matéria de facto;
b. Inexistência de justa causa para a resolução do contrato de trabalho;
c. Na procedência da questão anterior, da compensação dos créditos laborais com a indemnização decorrente do incumprimento, pelas AA., do aviso prévio.
d. Subsidiariamente:
d.1. do montante da indemnização;
d.2. Dos juros de mora sobre a indemnização.
***
IV. Fundamentação

1. Da impugnação da decisão da matéria de facto

A Ré impugna os nºs 6 e 7 dos factos provados de ambos os processos, pretendendo que sejam dados como não provados, tendo dado cumprimento aos requisitos previstos no art. 640º, nºs 1, als. a), b) e c), e 2. al. a).

1.1. É o seguinte o teor dos nºs 6 e 7 dos factos provados de ambas as sentenças, que a Recorrente pretende que sejam dados como não provados:
“6. Nesse mesmo dia 17 de Junho de 2021, pelas 15:30, o sócio gerente da Ré BB, dirigiu-se à Autora e à sua colega de bancada AA e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
- Suas vacas!
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
- Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima!
7. A autora, ao ouvir estas expressões, sentiu-se ofendida, diminuída e humilhada, como trabalhadora.”
Para tanto, sustenta a impugnação nos depoimentos das AA. e de BB, dizendo, em síntese, que: o Mmº Juiz baseou-se nos depoimentos das AA; porém, estes não são coincidentes entre si quanto às palavras que terão sido ditas por BB e, por outro lado, este, embora admitindo ter dito uns palavrões genéricos (“foda-se, caralho, acordem”), negou todavia que tivesse proferido as afirmações referidas na matéria de facto provada, e que aqueles não foram personalizados, nem dirigidos a nenhuma das AA, tanto mais que estava em causa todos um grupo de colagem (nº 21); a A. AA referiu que as expressões foram dirigidas a si, não à A. CC, que eram coisas só com ela, como responsável pelo grupo; impunha-se desvalorizar as declarações de parte das AA. por serem parte interessada, bem como face às mencionadas divergências entre elas e à contradição com a verão de BB, sendo que a dúvida, e que parece ressaltar da fundamentação da decisão da matéria de facto aduzida pela 1ª instância, deveria ter sido resolvida contra a parte onerada com o ónus da prova, no caso, contra as AA.
As AA. discordam e aludem aos depoimentos de FF, GG, HH, II e DD.

1.2. A fundamentação da decisão da matéria de facto constante das sentenças recorridas é, no essencial, semelhante, pelo que transcreveremos a que consta do Proc. 2425/21 (A. AA):
“1. A prática, pelo encarregado da ré e pelo seu gerente, dos factos alegados pela autora:
A autora afirmou que no dia 15 de junho de 2021, de manhã, teve uma conversa com o patrão, que queria que forrasse saltos para França e disse-lhe que não conseguia, dada a quantidade e nesse dia à tarde, o encarregado [DD] veio com calçado com defeito e perguntou-lhe o que era aquilo, dizendo ainda que não prestavam para nada, eram mobília velha, eram lixo, burras, putas que as pariu e deviam ir todas para o caralho. Entendeu que se dirigiu a todas na bacada, porque são todas trabalhadoras com 20/30 anos de casa. No dia seguinte [16/6 – com as perguntas do seu advogado, já disse que teria sido em 15/6], perto da hora de almoço [11h], o encarregado aproximou-se da bancada com umas sandálias com defeitos, perguntou se conseguia explicar o que se passava, disse-lhe que não sabia, que devia ser defeito da pele, então ele disse: defeito o caralho, se voçês coçassem era a cona, assim o patrão vai longe com vocês. Na parte da tarde, a autora refere que perguntou ao encarregado se arranjava alguém para ajudar com a forra dos saltos e ele disse que não queria saber, que falasse com o patrão, depois disse que o patrão tinha dito para arranjar alguém, mas não tinha ninguém, que ali ninguém prestava para isso. Depois, no dia 17 de junho, por volta da hora de almoço [com as perguntas do seu advogado, já disse que teria sido em 16/6], voltou a falar das sandálias, dizendo que só estragavam, que dos velhos, da mobília, só três iam para São João da Madeira, para ver o lixo que ali ficava, tendo-se considerado lixo, porque ficava ali a trabalhar e não ia para São João da Madeira. Na parte da tarde, pelas 15h15m, o patrão, BB, que considerava como se fosse o patrão, veio à sua bancada e atirou as sandálias para cima da mesa e disse: “suas vacas, enfiem os sapatos pela cona acima, suas vacas do caralho” e virou costas. Perguntou-lhe que era aquilo e ele respondeu: “o que é isso o caralho que vos foda, ponham-se a andar daqui para fora” e foi embora. Acrescentou que com o patrão não, mas que anteriormente, situações deste género, já aconteciam com o encarregado, desde que este veio para a fábrica há 6 ou 7 anos.
A testemunha CC afirmou que, no dia 16 de junho de 2021, de tarde, pediu cola ao encarregado, DD, e ele respondeu-lhe: “Ide para a puta que os pariu, suas filhas da puta, mal empregue a água que bebéis, estais a levar a firma à ruina”.
Noutras situações o DD dizia que ia fazer a vida negra aos velhos que lá andavam, haviam de ir embora. Não sabe se foi nesse dia ou no dia anterior que ele pegou com a AA, por volta das 11 horas, atirou os sapatos para cima da mesa e disse: “em vez de pentear sapatos, deviam esgravatar a cona”. No dia 17 de junho, pelas 15 horas e qualquer coisa, estava a trabalhar na bancada junto com a AA e o patrão, o senhor BB, chegou com uma tarifa de sapatos, atirou a caixa para cima da bancada e disse: “suas vacas do caralho, agora botai os sapatos pela cona acima”. A AA disse-lhe: “Oh BB”; e ele respondeu: “ide para a puta que as pariu, suas filhas da puta, plantai-vos a andar. Acrescentou que este tipo de linguagem era usado noutros dias, não sabendo especificar, mas desde que aquele encarregado foi para lá trabalhar, ele dizia que ia não sabiam fazer nada, eram lixo, eram uma merda, que não serviam para nada e se fosse ao BB fechava a fábrica, que andavam a esgravatar a cona e que iam para a cave contar ratos.
As testemunhas JJ, HH e II já não trabalhavam na empresa na data dos factos relatados pela autora, mas todas descreveram situações semelhantes, mais concretamente que o encarregado DD tratava os trabalhadores de forma mal educada, humilava-os, dizendo coisas como “filhos da puta”, “ide-vos foder”, “ide para o caralho” e referiram o ir para a cave como um castigo, sendo que apenas a testemunha HH disse que uma vez o patrão, BB, também a tratou mal e que o encarregado não dizia diretamente, era como se fosse uma piada.
Para além destas testemunhas, a autora e a testemunha AA colocavam outras duas pessoas na bancada em condições que permitiam perfeitamente a compreensão do que foi dito pelo “patrão”: a testemunha GG e a testemunha FF. Esta última, num primeiro momento, disse que nem estava no local, mas depois, em acareação, já aceitou que podia estar no local, mas não ouviu nada. Por sua vez, a testemunha GG confirmou que estava na bancada, o BB pousou os sapatos na bancada, começou a mandar vir, mas não percebeu o que ele disse, porque os sapatos cairam e baixou-se para os apanhar. Confirmou que o ambiente de trabalho tinha dias, quando havia asneira, corriam mal, o encarregado dizia asneiras, como foda-se e outras.
Embora sem referência ao contexto concreto, as testemunhas KK e LL referiram que, pelo menos o encarregado, quando havia problemas, dizia palavrões, referindo que não era por maldade, para ofender, mas referiram igualmente que não se referem às expressões alegadas, pois com essas ficavam ofendidos.
Por fim, a testemunha BB, referido por todos como o “patrão”, confirmou que naqueles últimos dias existiam constantes defeitos, já era a terceira vez que que a obra ficava com defeito, o encarregado disse-lhe que já não sabia o que havia de fazer, então foi à produção, o que era raro, meteu um conjunto de sapatos numa caixa, dirigiu-se à bancada onde a autora trabalhava e perdeu as estribeiras, pousou a caixa na bancada, uns sapatos cairam para o chão e disse uns palavrões, que já nem recorda, mas que não foram dirigidos a ninguém específico, foram algo como «foda-se, caralho, acordem, estejam atentas», não foram as palavras que são alegadas, porque não dirigiu a ninguém. Admitiu que foi um excesso, mas justificou com o momento de trabalho e com os defeitos constantes, dando a entender que ainda hoje não sabe se elas estavam a estragar os sapatos de propósito. Por seu lado, a testemunha DD, encarregado da ré, que atualmente já terá sido despedido, afirmou que no dia 17 houve uma altercação não normal, ouviu que o patrão estava na bancada da autora a dizer algo, aconteceu alguma coisa, mas com a distância não conseguia ouvir. Da sua parte, negou ter proferido as expressões que lhe são imputadas, admitindo apenas que terá dito que só tinha ali lixo, ao telefone, sem se dirigir a ninguém em concreto, falando sobre quem fez aquilo aos sapatos; e podia dizer coisas como “puta que pariu”, mas não era dirigido a ninguém, era quando o trabalho corria mal. Para além disso, explicou que mandava trabalhadores para a cave, fazer inventário, quando não tinham trabalho, não sendo qualquer castigo e o patrão dizia que não mandava ninguém embora.
Compulsados os depoimentos da autora e das testemunhas, consideramos o seguinte:
A prova essencial sobre o que se passou assenta no depoimento da autora e da testemunha CC, que, sendo testemunha nos presentes autos, é autora num processo em tudo semelhante, no qual a aqui autora é ali testemunha. No entanto, devendo salvaguardar-se alguma reserva, porque estamos perante pessoas interessadas no desfecho global dos processos, não podemos deixar de considerar que estes dois depoimentos são depoimentos com alguma coerência interna, prestados de forma simples e genuína, pelo que nos aspetos em que possamos considerar que são depoimentos coincidentes, no modo, tempo e lugar, devemos atribuir-lhes credibilidade, sem exigir, no entanto, uma rigorosa coincidência das palavras proferidas, porque isso indiciaria alguma preparação do depoimento, que, em nosso entendimento, não ocorreu e quem depõe tem a natural tendência de usar termos seus, com idêntico significado [coçar, esgravatar…]. Em nosso entendimento, do cotejo destes dois depoimentos, podemos considerar provado o episódio descrito como tendo ocorrido em 17 de junho de 2021, da parte da tarde, que envolveu a pessoa que todos viam como o patrão, a testemunha BB e que o encarregado se referia aos trabalhadores como “lixo”, pois o próprio admitiu que terá dito algo do género a falar ao telefone e que se referia aos trabalhadores mais antigos como lixo, dizendo que eram uma merda, usando ainda expressões como “puta que os pariu” ou “foda-se”, em circunstâncias não apuradas, mas sempre relacionadas com momentos de tensão no trabalho, na medida em que a autora e a testemunha referida o confirmam de forma uniforme e encontram corroboração . No mais, verificamos que, ou não existe coerência interna do depoimento da autora e da referida testemunha, descrevendo situações em que são ditas coisas diferentes das alegadas, ou em dias e horas diferentes das alegadas e sem a circuntanciação necessária para se poder afirmar que tais eventos ocorreram, como, quando e onde. Quanto ao evento de 17 de junho, não temos dúvidas que o depoimento da autora e da referida testemunha é praticamente coincidente, está corretamente circunstanciado no tempo, modo e lugar e é corroborado com outros elementos probatórios. Desde logo, quatro testemunhas [BB, DD, GG e FF] admitem que alguma coisa se passou e duas delas descrevem o “arremesso” da caixa com sapatos para a bancada em termos que levou à queda de sapatos ao chão. Para além disso, o próprio BB admitiu ter perdido as estribeiras e ter dito palavrões, mas não eram dirigidos a ninguém e não foram aqueles palavrões, apesar de também não saber exatamente o que disse. Tendo em conta a lógica da situação – constantes defeitos –, o movimento agressivo de atirar a caixa de sapatos para a bancada, fazendo-os cair ao chão, a ideia do referido BB de que ainda hoje não sabe se estavam a fazer de propósito, a atuação em descontrolo, de forma excessiva como o próprio admitiu, levam-nos a considerar que tudo indica que as declarações da autora e da testemunha têm um fundo de realidade e que aquele evento se passou como o descreveram.
(…)”.

1.3. Procedeu-se à audição integral das declarações de parte das AA., bem como dos depoimentos das testemunhas FF e de GG, trabalhadores da Ré e testemunhas comuns às AA e Ré, e de DD (então encarregado da Ré, que foi despedido por factos, segundo disse, não relacionados com os dos autos) e BB (então, mas não já atualmente, sócio, não gerente, da Ré, mas sendo o responsável por esta à exceção da parte administrativa, mais referindo ser arguido em processo crime na sequência de queixas apresentadas pelas AA.), estes inquiridos por iniciativa oficiosa da 1ª instância. Procedeu-se também à audição da acareação entre as AA., FF e GG. Quanto aos depoimentos das testemunhas HH e II procedeu-se à leitura dos excertos transcritos pela Recorrida, sendo que estas testemunhas já não trabalhavam na Ré à data dos factos ocorridos no dia 17.06.2021.

A A. AA, em síntese, afirmou que BB atirou os sapatos que tinham defeito para cima da mesma e disse “suas vacas, agora enfiem os sapatos pela cona acima, vacas do caralho”, que, depois, virou costas, tendo ela A. dito “oh BB, o que é isso”, tendo ele dito que “isso é o caralho, para a puta que pariu, ponham-se a andar daqui para fora”; que no local (bancada) se encontravam ela, a A. CC, GG e FF; que ela, A. AA, era a responsável daquele grupo e que as palavras lhe eram dirigidas a si (“Relativamente à CC, ia ouvindo, mas as coisas eram comigo, dirigia-se a mim, eu era a responsável por eles)”; a seguir a isso, a CC disse que amanhã já não vinha trabalhar, que, ela A. AA, disse que se ia já embora, ao que aquela referiu para não se ir embora, para acabarem esse dia de trabalho (pois faltava pouco, terminava às 17h00), que depois “vemos o que fazer”, que acabou o dia com muito esforço, que ficou muito desgastada, que isso a afetou muito e que não foi mais trabalhar.
A A. CC afirmou que BB chegou com uma caixa com cinco pares de sapatos, que atirou a caixa e disse: “suas vacas do caralho. Agora botais os sapatos pela cona acima”, que a AA disse “oh BB” e este disse “ide para a puta que os pariu, suas filhas da puta, prantai-vos a andar”; que, na bancada, se encontravam ela (A. CC), a AA, o FF e a GG; que o referido BB “se virou foi para mim e para a AA”; que, a seguir, a AA queria ir logo embora, que ela. CC, disse-lhe para ficarem às 17h00 e que “amanhã já não venho mais”; que se sentiu humilhada; apesar dos problemas nos outros setores, “sobrava sempre para a nossa mesa”; que depois de se vir embora, deixou de precisar de tomar medicação por não ter que ir para o trabalho.
BB, referindo o contexto em que o episódio ocorreu (era a terceira vez que os sapatos eram devolvidos com defeito), disse que colocou dezenas de pares de sapatos numa caixa, que foi ao posto de trabalho onde estavam as duas AA. (recordando-se que a CC estava, mas não se recordando que estivesse a AA, embora admita que sim), pousou os sapatos o que fez um bocado de barulho, que se exaltou, “seguramente uns praguejos”, que utilizou uns palavrões “vulgares”, como “foda-se, caralho, estejam atentas, acordem”, que não se recorda das palavras exatas, mas que não disse o que consta do nº 6 dos factos provados e que o que disse não foi direcionado às AA, “foi um falar mais alto, genérico, para as pessoas ouvirem e acordarem daquele marasmo, mas nada personalizado”.
GG referiu prestar trabalho em vários locais, onde fosse necessário, mas confirmando que no dia em questão (17/06), estava na bancada e que estavam também as AA. e o FF; que o BB “chegou lá com os sapatos, pôs na bancada, começou a mandar vir”, mas que “não percebi os palavrões que ele disse, se disse palavrões, eu não percebi”, que ficou tão nervosa que o sapato que tinha em mãos caiu, que se baixou para o apanhar, que “foi tão rápido, ele virou costas, não deu para perceber nada”, voltando a repetir que ficou muito nervosa, que “não percebi o que ele disse”; perguntada por que razão ficou tão nervosa, se tinha receio do “patrão”, referiu que ficou nervosa porque “sou assim, sou nervosa, não matei ninguém, nem roubei ninguém, não estou contra elas, cada um faz a sua vida”, que “queria estar fora disto”; já a pergunta do ilustre mandatário da Ré sobre a quem é que o BB se dirigiu, referiu que “foi às duas, à CC e à AA”, que a si acha que não pois que não foi ela que fez o trabalho que estava em causa, “não foi nada comigo”.
FF (que as AA. e a testemunha GG disseram estar na bancada), negou que estivesse na bancada, que não ouviu o que o BB teria dito porque não estava lá, que não ouviu, nem presenciou nada, que depois “ouviu falar qualquer coisa”, “mas que isso não lhe interessa nada”, que a “empresa nunca lhe meteu medo”; confrontado com a existência de declarações em sentido contrário e que alguém estaria a mentir, continuou dizendo que “eu não” e perguntado se viu atirar uma caixa referiu que “não vi nada, nem ouvi nada”.
Posteriormente, realizada a acareação (em sessão posterior), a mencionada testemunha, FF, ora referiu que se as colegas diziam que ele estava na bancada, que pode ter estado, mas que não tem a certeza, ora disse que ouviu o BB colocar os sapatos na mesa, mas que “não ouvi o que ele disse, não sou obrigado a ouvir. Nós temos que trabalhar”; mais disse que ele, FF, e a GG estavam de um lado da bancada e a as AA. do outro; por fim, já em dia posterior ao episódio em causa, ora disse que ninguém comentou nada, ora disse que se comentou, mas que não sabe o que foi comentado.
Por fim, DD, referiu que estava no outro extremo da linha, não tendo visto ou ouvido nada, embora se tivesse apercebido de alguma agitação; que, depois, lhe disseram que “se passou uma coisa grave” e, perguntado sobre quem lhe disse, respondeu que “há aqui gente que ouviu, o Sr. FF”; que este lhe disse que tinha uma carta para ir a tribunal, que era testemunha das AA, ao que DD lhe disse “então diz que não ouviste nada”, que ele, FF lhe retorquiu “mas é que eu vi e ouvi tudo”, ao que a testemunha lhe respondeu “então faz o que quiseres”; e perguntado sobre o que é que o FF lhe disse ter visto e ouvido, e admitindo que este lhe contou o que viu ou ouviu e que não foi um “diz que disse”, recusou-se todavia a responder uma vez que não sabia se o que lhe foi dito corresponderia ou não à verdade; e, tendo sido insistido que o que lhe estava a ser perguntado não era se correspondia ou não à verdade mas, apenas o que o FF lhe disse, a testemunha recusou-se a responder, recusa que ficou consignada na ata de julgamento. Mais disse que era impossível, a quem estivesse na bancada, não ouvir o que o BB terá dito.
Os depoimentos das AA. afiguraram-se-nos espontâneos, sinceros, convictos e convincentes e sem contradições de relevo, sendo que a contradição apontada pela Recorrente não tem relevância significativa e suscetível de os por em causa. Com efeito, no essencial, eles são semelhantes, sendo que o que seria de estranhar é se fossem absolutamente coincidentes quanto à sequência das afirmações e a uma ou outra palavra, tendo as testemunhas deposto, retrospetivamente, de acordo com o que retiveram em memória e em palavras suas, mas no essencial coincidentes, não consubstanciando contradição suscetível de por em causa a bondade dos depoimentos.
Por outro lado, o depoimento de BB não abala a nossa convicção quanto à veracidade do acontecimento, dado como provado no nº 6, relatado pelas AA., testemunha aquela que, embora não confirmando ter dito as expressões constantes do nº 6 dos factos provados e que o que disse não foi direcionado às AA., corroborou no entanto ter utilizado “palavrões”. E não nos convence que tivesse pousado os sapatos na bancada onde estavam as AA. porque era o espaço livre que tinha e que tivesse dito os “palavrões” em geral e não direcionados ou personalizados em relação às AA. A bancada era onde as AA. estavam a trabalhar, as mesmas estavam presentes e tinham trabalhado nos sapatos que apresentava defeito, afigurando-se-nos evidente que se dirigia às AA.
Acresce que não foi feita outra contraprova de que o afirmado pelas AA. não correspondesse à verdade. Com efeito, as pessoas que o podiam ter feito por terem presenciado o ocorrido – testemunhas FF e GG - tiveram um depoimento manifestamente parcial e hostil em relação às AA, não querendo comprometer a Ré, não esclarecendo o tribunal sobre o ocorrido porque não o quiseram fazer e não porque não tivessem ouvido o que foi dito. E, a testemunha DD, embora incompreensivelmente se haja recusado a dizer o que lhe foi dito por FF, corrobora, sem margem para dúvidas, que aquelas duas testemunhas (FF e GG) ouviram perfeitamente o que foi dito, que era impossível não ouvirem. Toda a referida postura das testemunhas FF e GG não só não fazem qualquer contraprova da veracidade do alegado pelas AA., como até abona no sentido da veracidade das declarações das mesmas, cabendo perguntar por que razão tiveram, as testemunhas FF e GG, tal postura se o que teria sido proferido por BB teria sido, apenas, alguns “palavrões” (ainda que “foda-se” e “caralho”) e nada mais do que isso.
Quanto ao facto de as afirmações terem sido direcionadas não apenas à A. AA, mas também à A. CC, é certo que a A. AA referiu que lhe foram dirigidas a si porque era a responsável. Isto mais não é, contudo, do que uma conclusão da A., que esta retira da circunstância de ser a responsável. Não obstante, que as afirmações de BB foram dirigidas também à A. CC foi corroborado não apenas por esta, mas também pela testemunha GG, a instâncias do ilustre mandatário da Ré. E decorre também das próprias afirmações, que foram feitas no plural, do facto de ambas as AA. terem trabalhado nos sapatos que ficaram defeituosos e estarem as duas presentes na bancada. Aliás, a fazer fé nas declarações de BB, de que não se teria apercebido ou de que não se recordava de que a A. AA estivesse presente, mas apenas a A. CC, corroboraria que eram dirigidas também a esta.
Resta dizer que não se vê razão para descredibilizar o depoimento das AA. só porque, sendo autoras, têm um interesse no desfecho da causa.
Com efeito:
No Acórdão desta Relação de 13.03.2017, Proc. nº 407/15.9T8AVR.P1[2], referiu-se o seguinte:
“Desde já se afirma que a impugnação da decisão sobre a matéria de facto não tem propriamente a ver com o teor das declarações/depoimentos das testemunhas mas antes com a indevida valorização das declarações prestadas pelo Autor em audiência de discussão e julgamento e que se mostram espelhadas na fundamentação da decisão quanto à matéria de facto.
Consideramos oportuno aqui transcrever as considerações feitas pelo Juiz de Direito Luís Filipe Pires de Sousa [em as «Malquistas declarações de parte»] defendendo este Magistrado: (…) “(i) as declarações de parte integram um testemunho de parte; (ii) a degradação antecipada do valor probatório das declarações de parte não tem fundamento legal bastante, evidenciando um retrocesso para raciocínios típicos e obsoletos de prova legal; (iii) os critérios de valoração das declarações de parte coincidem essencialmente com os parâmetros de valoração da prova testemunhal, havendo apenas que hierarquizá-los diversamente. Em última instância, nada obsta a que as declarações de parte constituam o único arrimo para dar certo facto como provado desde que as mesmas logrem alcançar o standard de prova exigível para o concreto litígio em apreciação”.
Igualmente o Conselheiro António Abrantes Geraldes refere, acerca da declarações de parte, “admite-se a prestação de declarações de parte, por sua própria iniciativa, opção que encontra especial justificação nos casos em que, por não ser admissível a confissão de factos (designadamente quanto estejam em causa direitos indisponíveis), está vedada prestação de depoimento com tal objectivo especifico” (…) “admite-se, assim, que a parte enfrente o juiz que aprecia a causa, possibilitando que na formação da convicção este pondere o teor das declarações emitidas, ainda que sem natureza confessória, passo essencial para que se reduza o recurso, frequentemente abusivo ou desviante a depoimentos de testemunhas que não tiveram conhecimento directo, e atenuando o relevo excessivo que pelas partes ou pelos tribunais vem sendo atribuído aos depoimentos testemunhais” (…) – Revista Julgar, nº16, Temas da nova Reforma do Processo Civil, páginas 75/76.
Nos termos do artigo 466º, nº1 do CPC “As partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo”, sendo que “O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão” [nº3 do mesmo artigo].
Perante as declarações de parte o Juiz valoriza, ou não, as mesmas, em conjugação com os demais elementos de prova, nomeadamente recorrendo às regras da experiência e às presunções judiciais, assim formando a sua livre convicção, nada impedindo que essa mesma convicção seja favorável ao próprio declarante/parte.
(…)
E, no mesmo sentido, se pronunciou o referido coletivo no Acórdão de 06.04.2017, proferido no Proc. nº 2367/15.7T8MTS.P1[3], bem como o Acórdão desta Relação de 07.11.2016[4], www.dgsi.pt., em cujo sumário de refere que: “I - Em face do disposto no art.º 466.º do NCPC, actualmente é inequívoco que as declarações de parte sobre factos que lhe sejam favoráveis devem ser apreciadas pelo tribunal, sendo valoradas segundo o princípio da livre apreciação da prova, nomeadamente, a prova testemunhal, consagrado nos artigos 396.º do Código Civil e 607.º n.º 5, do CPC. II - Não merece qualquer censura a decisão recorrida ao ter entendido valorar as declarações feitas pelo autor ao prestar o depoimento de parte requerido pela Ré, relativamente a factos que lhe são favoráveis, conjugando-as com outros meios de prova. (…)”.
Assim também no Acórdão desta Relação de 07.11.2022, Proc. 2481/21.0T8VFR.P1[5], em que se refere o seguinte:
“(…)
Na verdade, afirmar, perentória e inequivocamente, que as declarações das partes não poderem fundar, de per si e só por si, um facto constitutivo do direito do depoente, sem qualquer outra explicação, violaria a liberdade valorativa que decorre do citado nº 3 do artigo 466º do Código de Processo Civil.
Nessa medida, não existe na nossa ordem jurídica nenhum preceito legal que determine ser insuficiente a prova sobre determinado facto (seja ele favorável ou desfavorável à parte) que resulte unicamente do depoimento de parte não confessório ou das declarações de parte, nada obstando a que a convicção do tribunal se forme até exclusivamente neles[6].
Ponto é que, não obstante ser a parte (com manifesto interesse num determinado desfecho do processo), o seu depoimento ou declarações sejam credíveis [tendo o julgador na apreciação crítica do depoimento/declarações em consideração que se trata da parte (tal como acontece com as testemunhas: as mesmas podem ter proximidade à parte ou interesse na causa, o que o julgador tem presente na apreciação crítica dos depoimentos, sendo por essa razão que o legislador consagra o interrogatório preliminar a cargo do juiz – os designados costumes – no nº 1 do art.º 513º do Código de Processo Civil)].
Às declarações de parte aplica-se o regime do depoimento de parte, com as necessárias adaptações – art.º 466º, nº 2 do Código de Processo Civil –, e, como se escreveu no acórdão do TRL de 29/04/2014[7], serão livremente apreciadas pelo tribunal na parte em que não constituam confissão (art.º 466º, nº 3 do Código de Processo Civil), e revelam especial utilidade para a decisão quando versem sobre factos que ocorreram entre as partes, sem a presença de terceiros intervenientes. Tais declarações devem ser encaradas como qualquer outro momento de recolha de prova, à qual assistem os advogados das partes com plena liberdade ao nível do exercício do contraditório, não se justificando um tratamento diverso, designadamente daquele que têm os depoimentos de parte oficiosamente determinados pelo Tribunal já em sede de julgamento. Nele se escreveu ainda que o novo meio de prova por declarações de parte instituído no Código de Processo Civil de 2013 veio responder a uma corrente que se vinha densificando no sentido de considerar e valorizar o depoimento de parte ainda que sem carácter confessório e de livre apreciação pelo tribunal, desde que este viesse a revelar um efeito útil para a descoberta da verdade.
Ou seja, o legislador colocou as declarações de parte a par de outros meios de prova (como a prova testemunhal), o que quer dizer que não é de afastar ab initio a possibilidade de valoração das declarações de parte, mesmo que não existem outros meios de prova a corroborar as mesmas [a exigir-se sempre, em abstrato, a confirmação por outros meios de prova estar-se-iam a negar as declarações de parte como meio de prova, sujeito à livre apreciação do tribunal, como consagrado pelo legislador, desvirtuando-se o espírito do legislador ao prever a prestação dessas declarações], impondo-se sim que seja observada uma especial cautela na sua apreciação por ser, por natureza, um depoimento interessado.
Note-se que na prática muitas testemunhas não são isentas, estando em inúmeras situações próximas de alguma das partes[8].
Em conclusão, afastamo-nos do acórdão do TRP de 20/11/2014 citado pela Recorrente[9], e diz-se o seguinte: nada obsta a que a convicção do tribunal se baseie nas declarações da parte, e até apenas nelas; ponto é que estas sejam prestadas de forma séria e credível e o tribunal de forma clara explicite as razões do seu convencimento, isto é, que em face das circunstâncias concretas em que são prestadas, sem esquecer o natural interesse que tenham no desfecho do processo, mereçam credibilidade ao tribunal.
Ou, como se disse no acórdão do TRG de 02/05/2016[10], a credibilidade das declarações da parte tem de ser apreciada em concreto, numa perspetiva crítica, com vista à descoberta da verdade material, bem podendo suceder que as respetivas declarações, em concreto, possam merecer muita, pouca ou, mesmo, nenhuma credibilidade.”
Com efeito e como decorre dos acórdãos acima citados, é atualmente adquirido que as declarações de parte são um meio de prova válido, estando sujeitos, tal como a prova testemunhal, à livre convicção do julgador, tudo se reconduzindo à avaliação e ponderação que haja de ser feita, sem prejuízo porém dessa avaliação dever ser feita com a necessária cautela.
Ora, por tudo quanto ficou exposto, não se vê razão que, no caso, determine a descredibilização dos depoimentos das AA, não se podendo, novamente, deixar de realçar a total falta de imparcialidade e comprometimento com a posição da Ré por parte das testemunhas FF e GG, ilustrativo de que, nem sempre, a prova testemunhal é a “prova rainha”.
Por fim, é de dizer que, é certo, como argumenta a Recorrente, que, em caso de dúvida sobre a realidade de um facto, deve a dúvida deve ser resolvida contra a parte a quem o facto aproveita (art. 414º do CPC), sendo que o factos constantes dos nºs 6 aproveitam às AA. Contudo o que, no caso, ocorre é que não se está perante uma situação de dúvida mas, pelo que se expôs, perante a convicção da verificação do facto.
Assim, é de manter o nº 6 dos factos provados, apenas se entendendo ser de eliminar o as palavras “Nesse mesmo” que constam do seu início.
Com efeito, tal pressupõe que “esse mesmo dia” tivesse sido referenciado em algum ponto anterior dos factos provados e vinha na sequência dos “acontecimentos” anteriores relatados na p.i. que teriam ocorrido nesse dia, em momento anterior, a que se reporta o nº 4 dos factos não provados e sendo que, no nº 5 dos factos provados, também não se diz que tivessem ocorrido nesse dia 17 de junho.
Assim, elimina-se o segmento, do nº 6 dos factos provados, em que se refere “Nesse mesmo”, ponto esse que passará a ter a seguinte redação:
6. No dia 17 de Junho de 2021, pelas 15:30, o sócio gerente da Ré BB, dirigiu-se à Autora e à sua colega de bancada AA e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
- Suas vacas!
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
- Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima!

Por fim, quanto ao nº 7 dos factos provados em ambos os Processos, que a Recorrente pretende que seja dado como não provado, consta o seguinte: “7. A autora, ao ouvir estas expressões, sentiu-se ofendida, diminuída e humilhada, como trabalhadora.”
Tal ponto era uma consequência lógica e necessária da alteração, para não provado, do nº 6 dos factos provados, sendo que a Recorrente, para além disso, não aduz qualquer outra fundamentação no sentido de o mesmo ser dado como não provado.
Ora, assim sendo, é o mesmo de manter.
De todo o modo, sempre se dirá que o mesmo é de manter tendo em conta as declarações das AA., que, no essencial, o corroboram e tendo, findo o dia de trabalho, decidido não mais voltar a trabalhar na Ré, para além de que as afirmações mencionadas no nº 6 dos factos provados se mostram idóneas à produção dos sentimentos referidos no nº 7.

2. Da (inexistência) de justa causa de resolução do contrato de trabalho

Na sentença recorrida considerou-se não se verificar o alegado assédio moral, o que não foi impugnado pelas AA., mormente em sede de ampliação do âmbito do recurso (art. 636º do CPC), que não deduziram e que, assim e nessa parte, transitou em julgado.
Mas entendeu a sentença recorrida que, não obstante, o comportamento da Ré referido no nº 6 dos factos provados (em ambas as sentenças) consubstancia justa causa de resolução do contrato de trabalho pelas AA.
Do assim decidido discorda a Recorrente, invocando em síntese o circunstancialismo descrito nos nºs 21, 12, 24, 25 e 26 dos factos provados e que, se não fosse ele, o comportamento imputado no nº 6 dos factos provados não teria ocorrido, existindo um desgaste acumulado de vários meses com defeitos, agravado pelo clima generalizado de desmoralização e perturbação no contexto da pandemia, tratando-se de um facto excecional, fortuito, de perda de estribeiras pelo patrão, hipervalorizado num percurso longo de mais de 30 e 40 anos (quanto às AA. AA e CC, respetivamente) de antiguidade na empresa, justificado pelas demais circunstâncias do caso e que não teria acontecido se não fosse o problema criado por falhas funcionais da própria trabalhadora, não tendo havido intenção de injuriar ou ofender, mas de chamar à atenção, embora de forma errada e mal educada, mas não tornando insustentável e intolerável a manutenção da relação laboral, não se mostrando a resolução do contrato de trabalho proporcional.

2.1. Na sentença recorrida referiu-se o seguinte:
“(…)
Está provada a seguinte matéria:
No dia 17 de junho de 2021, da parte da tarde, em que o sócio da ré e a pessoa que é identificada pelas pessoas como o patrão, se dirige à autora [e não só], num contexto de defeitos persistentes e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
- Suas vacas!
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
- Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima!
Acresce que a autora, ao ouvir estas expressões, sentiu-se ofendida, diminuída e humilhada, como trabalhadora.
Para além disso, resultou ainda provado que em circunstâncias não apuradas, o Encarregado da fábrica DD referiu-se à autora e a trabalhadores que já estavam na ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferia expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da ré que era utilizada esse tipo de linguagem.
Em nosso entendimento, esta factualidade devidamente circunstanciada podia configurar uma situação de assédio moral no trabalho, pois revela que a autora, juntamente com pelo menos uma colega de trabalho, recebiam um tratamento humilhante que não é justificado nem pelo contexto de pressão laboral resultante de defeitos persistentes, quer pela pouca escolaridade dos trabalhadores. Mas não podemos deixar de ter em conta que todo o circunstancialismo imputado ao encarregado carece de circunstanciação suficiente para ancorarmos nesses comportamentos a integração do conceito de assédio moral no trabalho.
Na realidade, ficamos apenas com a situação de 17 de junho de 2021, pois é a única situação que podemos, com certeza, que aconteceu em determinadas circunstâncias de tempo, modo e lugar. Por isso, considerando-se que os factos provados são insuficientes para integrar o conceito de assédio moral no trabalho, não temos dúvidas que constituem uma flagrante e grosseira violação do dever de urbanidade e respeito que todo o empregador deve ter para com os seus trabalhadores, e vice versa. Por outro lado, um tratamento desta natureza torna intolerável para a autora, como trabalhadora, mulher, mãe e pessoa humana, a manutenção da relação contratual, pois ninguém deve ser obrigado a suportar um tratamento desta natureza [“vacas”; “metam os sapatos pela cona acima”] nem num ambiente de trabalho, nem num ambiente familiar, nem num mero círculo de amigos.
Em suma, consideramos que esta factualidade assume suficiente gravidade para justificar a resolução do contrato de trabalho, conferindo à autora o direito a uma indemnização.”

2.2. Dispõe o CT/2009, sobre a justa causa de resolução do contrato de trabalho, que:
Artigo 394º [11]
Justa causa de resolução
1 – Ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato.
2 – Constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador:
a) Falta culposa de pagamento pontual da retribuição;
b) Violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, designadamente a prática de assédio praticada pela entidade empregadora ou por outros trabalhadores;
c) Aplicação de sanção abusiva;
d) Falta culposa de condições de segurança e saúde no trabalho;
e) Lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador;
f) Ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, punível por lei, incluindo a prática de assédio denunciada ao serviço com competência inspetiva na área laboral, praticada pelo empregador ou seu representante.
3 - Constituem ainda justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador:
a) Necessidade de cumprimento de obrigação legal incompatível com a continuação do contrato;
b) Alteração substancial e duradoura das condições de trabalho no exercício lícito de poderes do empregador;
c) Falta não culposa de pagamento pontual da retribuição.
d) Transmissão para o adquirente da posição do empregador no respetivo contrato de trabalho, em consequência da transmissão da empresa, nos termos dos n.os 1 ou 2 do artigo 285.º, com o fundamento previsto no n.º 1 do artigo 286.º-A.
4 - A justa causa é apreciada nos termos do n.º 3 do artigo 351.º, com as necessárias adaptações.
5 - Considera-se culposa a falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongue por período de 60 dias, ou quando o empregador, a pedido do trabalhador, declare por escrito a previsão de não pagamento da retribuição em falta, até ao termo daquele prazo.
Artigo 395º
Procedimento para resolução de contrato de trabalho pelo trabalhador
1. O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos.
(…)
Artigo
Artigo 396º
Indemnização devida ao trabalhador
1. Em caso de resolução do contrato com fundamento no facto previsto no nº 2 do artigo 394º, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
2 - No caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente.
3 - O valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do n.º 1 sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado.
(…)”

Verificando-se, tanto na situação do nº 2, como do nº 3, do art. 394º, justa causa de resolução do contrato de trabalho, o trabalhador poderá proceder à imediata resolução do contrato, sem necessidade da concessão do aviso prévio a que se reporta o art. 400º do CT/2009.
Só que as situações previstas no nº 2 reportam-se aos casos em que a justa causa provém de comportamento culposo do empregador, consagrando o que se designa de justa causa subjetiva para a resolução do contrato de trabalho, enquanto que o nº 3, se reporta às situações em que não provêm de comportamento culposo do empregador, consagrando o que se designa de justa causa objetiva para essa resolução.
E, nos termos do citado art. 396º, nº1, apenas a primeira das situações conferirá o direito ao pagamento da indemnização nela prevista.
Como se tem entendido, para que ocorra justa causa para resolução do contrato de trabalho, seja a subjetiva, seja a objetiva, não basta a verificação da existência de alguma das situações previstas (a título exemplificativo) no nº 2 do art. 394º ou no nº 3 do mesmo. Embora com as devidas adaptações, a justa causa para a resolução deverá, grosso modo, reconduzir-se à impossibilidade/inexigibilidade de o trabalhador manter a relação laboral e ser apreciada nos termos do nº 3 do artigo 351º [12], preceito que dispõe que «Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e o seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.» . Para o preenchimento valorativo da cláusula geral da resolução pelo trabalhador ínsita no nº 1 do art. 394º do Código do Trabalho, não basta pois a verificação material de qualquer dos comportamentos descritos no nº 2 ou no nº 3, sendo ainda necessário que desse comportamento resultem efeitos suficientemente graves, em si ou nas suas consequências, que tornem inexigível ao trabalhador a continuação da sua atividade em benefício do empregador.
A verificação de justa causa subjetiva pressupõe, deste modo e como refere Ricardo Nascimento, Da Cessação do Contrato de Trabalho, em Especial Por Iniciativa do Trabalhador, Coimbra Editora, págs.185/186, a ocorrência dos seguintes requisitos:
a) um de natureza objetiva - o facto material integrador de algum dos comportamentos referidos nas alíneas do n.º 2 do art. 394º do Código de Trabalho (ou outro igualmente violador dos direitos e garantias do trabalhador);
b) outro de carácter subjetivo - a existência de nexo de imputação desse comportamento, por ação ou omissão, a culpa exclusiva da entidade patronal;
c) outro de natureza causal - que o comportamento da entidade patronal gere uma situação de imediata impossibilidade[13] de subsistência da relação laboral, tornando inexigível, em concreto e de acordo com as regras de boa fé, que o trabalhador permaneça ligado à empresa por mais tempo.
(Na verificação da justa causa objetiva não é exigido o elemento subjetivo, ou seja, não é exigido que ela provenha de um comportamento culposo do empregador)
Mas, na apreciação da inexigibilidade do trabalhador manter a relação laboral como requisito da justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho, nunca poderá ser esquecido que, enquanto o empregador dispõe de sanções intermédias para censurar um determinado comportamento, o trabalhador lesado nos seus direitos não tem modos de reação alternativos à resolução (ou executa o contrato ou resolve-o). Neste contexto, o (maior) rigor que se impõe na apreciação da justa causa invocada pelo empregador não pode ser o mesmo com que se aprecia a justa causa invocada pelo trabalhador, sendo certo que, naquele, se tutela a garantia do emprego, por um lado, e que, nesta, não tem o trabalhador, à semelhança do que ocorre com o empregador (que detém um leque variado de sanções disciplinares), outros meios de reação ao comportamento infrator do empregador.
Como refere Júlio Manuel Vieira Gomes [Direito do Trabalho, I, 1044], «… poder-se-á pensar que a noção de justa causa deveria ser aqui simétrica à do n.º1 do artigo 396.º (Código do Trabalho 2003); no entanto, é duvidoso que assim seja já que, enquanto que o empregador dispõe de outras sanções disciplinares e deve recorrer aos meios ou sanções conservatórias, a não ser em casos extremos em que se justifica o recurso ao despedimento, de tal possibilidade não beneficia, obviamente, o trabalhador que pode, quando muito, advertir o empregador para que este, por exemplo, deixe de violar direitos contratualmente acordados ou lançar mão em certos casos da auto-tutela (designadamente, da excepção de não cumprimento do contrato). Contudo, se a violação desses direitos, por exemplo, persistir, o trabalhador pouco mais poderá fazer do que optar entre tolerar a violação ou resolver o contrato. Além disso, e em segundo lugar, ao decidir da justeza e da oportunidade de um despedimento disciplinar promovido pelo empregador tem-se em conta, não apenas factores individuais – como o grau de culpa, em concreto, daquele trabalhador ou o seu processo disciplinar – mas também as consequências do comportamento do trabalhador na organização em que normalmente está inserido, a perturbação da “paz da empresa”, e inclusive, até certo ponto, considerações de igualdade ou proporcionalidade de tratamento.
Daí que, para nós, seja defensável que, nesta situação, o limiar da gravidade do incumprimento do empregador possa situar-se abaixo do limiar do incumprimento do trabalhador que justifica do despedimento».
Também João Leal Amado [“Salários em Atraso – Rescisão e Suspensão do Contrato, Comentário ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 02 de Maio de 1991, RMP, n.º 51, 1992, 161], salienta que a conceção bilateral e recíproca de justa causa foi completamente aniquilada pela CRP, a qual, acentuando a estabilidade do emprego no que toca ao despedimento e a liberdade de trabalho no que toca à rescisão, tornou nítido que os valores em presença diferem profundamente, consoante o contrato cesse por iniciativa de uma ou de outra das partes.
Ou seja, ínsita na justa causa da resolução por iniciativa do trabalhador está também uma ideia de inexigibilidade da continuação da relação; todavia, tal inexigibilidade não se deve aferir exatamente pelos mesmos critérios e com o mesmo rigor da inexigibilidade presente na justa causa para despedimento [vide AC TRP de 20.04.2009 e do STJ de 25.03.2009, ambos in www.dgsi.pt].
Importa também dizer que a relação laboral acarreta deveres não apenas para o trabalhador, mas também para o empregador, os quais constam dos artigos 126.º e 127.º, do Código do Trabalho, donde resulta a obrigação de atuação de acordo com a boa-fé e a colaboração “na promoção humana, profissional e social do trabalhador” mas, mais concretamente, no que aqui diz respeito, «o empregador deve, nomeadamente: a) Respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade, afastando quaisquer atos que possam afetar a dignidade do trabalhador, que sejam discriminatórios, lesivos, intimidatórios, hostis ou humilhantes para o trabalhador, nomeadamente o assédio; […] c) Proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral».
Importa também ter presente que, nos termos do art. 15º do CT/2009, “O empregador, incluindo pessoas singulares que o representam, e o trabalhador gozam do direito à respectiva integridade física e moral”, direito este com consagração no art. 25º, nº 1, da CRP e no art. 70º, nº 1, do Cód. Civil.
Refere Maria Regina Redinha, Da protecção da personalidade no Código do Trabalho, in Para Jorge Leite, Escritos jurídico-Laborais, Coimbra Editora, págs. 820/821, que:
«III. O objecto da protecção da personalidade é aqui a integridade física, entendida como integridade físico-psíquica, “o direito a não ser lesado na integridade físico-psíquica, tal como se possuiria se não se verificasse a lesão” (…), e a integridade moral. A integridade moral, por seu turno, é um bem da personalidade humana mais próximo da honra e dignidade da pessoa do que da existência incólume do ser físico e psíquico.
Com esta protecção relaciona-se o dever do empregador proporcionar ao trabalhador boas condições, tanto do ponto de vista físico como moral – art. 127º, nº 1, al. c), e o dever de prevenção de riscos, doenças e acidentes de trabalho – art. 127º, nº 1, al. g)”.
Em síntese, no contrato de trabalho, o empregador está investido de um poder de “autoridade” que lhe advém do poder diretivo e conformativo da prestação laboral, devendo este, contudo, ser exercido dentro dos limites decorrentes dos referidos princípios e normas legais, mormente com observância dos deveres de respeito e urbanidade, e com respeito pela dignidade do trabalhador e pela sua integridade física e moral, das garantias legais do mesmo e dos deveres que sobre ele, empregador, impendem.

2.3. Revertendo ao caso em apreço, relativo às duas AA, provou-se que:
- A Ré é uma sociedade fabril produtora de calçado (nºs 1).
- As AA. AA e CC forma admitidas ao serviço da Ré aos, respetivamente, 01.09.1990 e 01.09.1980 (nºs 2);
- As AA, e restante pessoal trabalham sob as ordens e direção da gerência da Ré, designadamente do sócio BB e do Encarregado da fábrica DD (nºs 4).
- Em circunstâncias não apuradas, o Encarregado da fábrica DD referiu-se às AA. e a trabalhadores que já estavam na ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferia expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da ré que era utilizada esse tipo de linguagem. (nºs 5)
- No dia 17 de Junho de 2021, pelas 15:30, o sócio da Ré BB, dirigiu-se às AA. e em voz alta, na presença dos que ali se encontravam disse-lhes:
“ Suas vacas”
De seguida arremessou uma caixa com sapatos que exibia para cima da bancada onde elas trabalhavam e disse:
“Suas vacas! Agora metam os sapatos pela cona acima” (nºs 6)
- As AA., ao ouvirem estas expressões, sentiram-se ofendidas, diminuídas e humilhadas, como trabalhadoras (nºs 7).
- Em consequência destas condutas, as AA sofreram desgosto, angústia, stress e mal-estar psicológico (nºs 9).
- A A. AA tem a 6ª classe e a A. CC tem a 4ª classe (nºs 15).
- A maioria dos operários da fábrica da ré tem baixa instrução, entre a antiga 4ª classe e o 6º ano (nºs 16).
- A ré tinha 48 trabalhadores, sendo 20 na costura, que já funcionava em instalações na zona industrial de S. João da Madeira, e 28 na montagem e no acabamento, que se encontravam nas instalações da sede, em Oliveira de Azeméis. (nºs 17)
- O ambiente na fábrica é descontraído, o pessoal conhece-se há muitos anos e trata-se por tu, sendo na maioria trabalhadores com muitos anos de antiguidade na empresa, que passam o dia juntos, inclusivamente no intervalo de almoço, no refeitório da empresa. (nºs 18)
- As AA tinham como função habitual forrar saltos e dar colas e que nesse período estava a dar cola, para posterior aplicação de solas (montagem) e acabamento por outros colegas de trabalho. (nºs 19)
- Havia vários meses que a ré se debatia com problemas de defeitos de qualidade e de rejeições, às dezenas por dia, por má aplicação de cola, o que influenciava a montagem das solas e o acabamento, gerando um descontentamento com o trabalho efetuado, não só das AA, mas também do operador de montagem e da operadora de acabamento. (nºs 21)
- As AA não reportaram à ré nenhum comportamento anormal do encarregado, de modo a que pudesse ser tomada alguma medida necessária. (nºs 22)
- No dia em causa, 17 de junho, os sapatos apresentavam defeitos. (nºs 23)
- Era já a terceira vez que repetiam o trabalho. (nºs 24)
- O sócio da ré ficou irritado. (nºs 25)
-E dirigiu-se junto das AA e dos colegas para reclamar do mau trabalho, despejando a caixa de calçado defeituoso na bancada da aplicação da cola. (nºs 26)
Ainda que compreensível a irritação do sócio da Ré uma vez que, em relação aos sapatos referidos na matéria de facto, era a terceira vez que apresentavam defeitos, é todavia totalmente inaceitável o modo e termos em que aquele se dirigiu às AA., comportamento esse violador das mais elementares regras de respeito e urbanidade a que o empregador está adstrito. Ainda que irritado, tinha o sócio BB ao seu dispor muitas outras forma de o expressar e/ou de atuar, que não a que adotou, sendo as frases proferidas totalmente inaceitáveis seja em que contexto profissional for, frases essas de natureza objetivamente ofensivas e humilhantes e com as quais as AA. se sentiram humilhadas. Não temos a menor dúvida de que, se ao contrário fosse, isto é, se fosse o trabalhador dirigir à entidade empregadora afirmações de natureza semelhante, que o faria incorrer em responsabilidade disciplinar, sendo que, se não fosse o despedimento, sempre teria o empregador sanção disciplinar alternativa para repor o reequilíbrio da relação contratual.
Ora, e como já se disse, no que toca à justa causa de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador, não pode a justa causa, e a inexigibilidade da continuidade dessa relação, serem apreciadas com o mesmo grau de rigor do que é exigido na justa causa de despedimento, sendo que não tem o trabalhador, e não tinham as AA., outra forma de reagir senão através da resolução. E, perante a gravidade das afirmações proferidas, não era às AA. exigível que mantivessem a relação laboral, passando uma “esponja” pelas mesmas, sendo também de salientar que é ao trabalhador conferido um prazo curto para resolver o contrato de trabalho. E é também de referir que se, na apreciação da justa causa, se deverá atender, como se deve, “ ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e o seus companheiros”, tal não abona no sentido da exigibilidade de as AA. manterem a relação laboral, sendo certo que também ficou provado que, embora em circunstâncias não apuradas, o encarregado da fábrica DD referiu-se às AA. e a trabalhadores que já estavam na Ré há vários anos, como “velhos”, dizendo que eram lixo e proferia expressões como “puta que os pariu” e “foda-se” em momentos em que estava sob pressão com o trabalho, havendo conhecimento do sócio da Ré que era utilizada esse tipo de linguagem.
Ou seja, e em conclusão, afigura-se-nos que ocorre justa causa de resolução do contrato de trabalho pelas AA., assim improcedendo, nesta parte, as conclusões do recurso.
E, assim sendo e em consequência, improcede também a conclusão 18ª do recurso, na qual se refere que “18ª Face à inexistência de justa causa de resolução, bem procedeu a R. ao descontar os 2 meses da falta de aviso prévio, 1.880€, pelo que o valor pedido de créditos laborais não é devido, por compensação de créditos efetuada no recibo final, extrajudicialmente (artº 399º do CT)”.

3. Do montante da indemnização

Nas sentenças recorridas fixou-se à A. AA a indemnização de €24.141,80 e à A. CC a indemnização de €22.620,91 , tendo em conta 25 dias de remuneração de base por cada ano de antiguidade e calculada a fração proporcionalmente (a remuneração de base da A. AA era de €940 e a sua antiguidade de 30 anos 9 meses e 25 dias e a remuneração de base da A. CC era de 40 anos 9 meses e 25 dias), tendo, para tanto, sido referido o seguinte no Processo da A. AA:
“Tendo em conta o montante salarial [abaixo da média nacional], a gravidade da conduta, o contexto de pressão laboral em que o “patrão” estava, com dificuldades de produção e constantes defeitos, o que atenua a culpa, a antiguidade da autora [que devia impor um tratamento ainda mais respeituoso por parte da empregadora], mas também implica a necessidade de olhar para um montante global da indemnização e o circunstancialismo que rodeia a situação [existência de prova de outras palavras que podemos caracterizar como grosseiras dirigidas pelo encarregado à autora, com algum conhecimento da ré, ainda que sem a devida circunstanciação], consideramos adequado fixar a indemnização no patamar médio de 25 dias por ano [ou fração de ano] de antiguidade. Por fim, consideramos que, como está em causa uma cessação do contrato de trabalho por justa causa subjetiva, salvo casos excecionais, a trabalhadora não deve receber menos do que receberia se o contrato terminasse com base numa situação de justa causa objetiva, pois a culpa da contraparte deve ser considerada e, no caso, a compensação prevista no artigo 366.º, do Código do Trabalho, traduz-se em €20.836,67” e, no processo da A. CC, teceram-se considerações semelhantes (apenas variando o valor da compensação prevista no art. 366º nela referido, de €21.390,83).
Do assim decidido discorda a Recorrente, alegando que “face às circunstâncias do caso, nomeadamente a própria culpa da trabalhadora, que grande parte dos factos invocados não se provaram, e depois a grande antiguidade. No limite, a ser atribuída, a indemnização deveria ser reduzida ao mínimo de 15 dias por ano (artº 396º, nº 1, do CT)”.
O critério do valor da retribuição aponta no sentido inverso ao da sua grandeza, pelo que, no caso, o modesto valor da retribuição das AA apontaria no sentido da fixação da indemnização acima do seu valor médio de 30 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade que situaríamos em montante não inferior a 35 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade. No que concerne ao grau de ilicitude, afigura-se-nos que o mesmo, embora bastante grave, é ainda assim menos grave do que o inicialmente apontado pelas AA., quer porque o assédio laboral foi tido por não verificado pela 1ª instância, quer porque parte dos comportamentos imputados não se provaram, quer porque o comportamento da Ré foi também fruto dos defeitos, pela terceira vez, apresentados pelos sapatos conquanto deva ser tido em conta não se ter provado que tal tivesse resultado de causa imputável às AA.
Neste confronto, e tendo ainda em conta a compensação que seria devida por causa lícita e objetiva de despedimento por facto não imputável ao trabalhador, sendo que, no caso, a justa causa para resolução do contrato de trabalho decorre de facto culposamente imputável à Ré, afigura-se-nos adequada e proporcional a indemnização fixada pela 1ª instância.
Assim e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso.

4. Dos juros de mora

Nas sentenças recorridas condenou-se a Ré a pagar às AA., sobre a indemnização de antiguidade, juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação, do que discorda a Recorrente, alegando que, sobre a indemnização, os juros são devidos apenas a partir do trânsito em julgado da sentença.
Assiste razão à Recorrente.
A indemnização devida pela resolução do contrato de trabalho com justa causa, não consubstancia uma quantia certa, apenas sendo liquidada pelo tribunal na sentença, pelos que os juros só são devidos desde a data do trânsito em julgado da decisão que a liquida – art. 806º, nº 3, do Cód. Civil. Neste mesmo sentido, cfr. Acórdão do STJ de 25.06.2008, Proc. 08S1033, in www.dgsi.pt.
***
V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se, na procedência parcial dos recursos interpostos pela Ré, em julgá-los improcedentes, confirmando-se as sentenças recorridas proferidas nos processos 2425/21.9T8OAZ.P1 e seu Apenso, Proc. 2424/21.0T8OAZ.P1, à exceção dos segmentos condenatórios delas constantes relativos à condenação em juros de mora sobre a indemnização devida às Autoras por resolução do contrato de trabalho com justa causa, que são substituídos, no presente acórdão, pela condenação no pagamento dos mencionados juros de mora, porém apenas desde a data do trânsito em julgado do presente acórdão.

Custas pela Recorrente e pelas Recorridas na proporção dos respetivos decaimentos.


Porto, 12.07.2023
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
______________
[1] Processo cuja apensação foi determinada pela ora relatora ao Proc. 2425.21.9T8OAZ.P1.
[2] Relatado pela Exmª Desembargadora Fernanda Soares e em que a ora relatora interveio como segunda adjunta, acórdão não publicado, ao que se supõe.
[3] Não publicado, ao que se supõe.
[4] Relatado pelo Exmº Sr. Desembargador Jerónimo Freitas.
[5] Relator, António Luís Carvalhão e em que a ora relatora e 1º adjunto intervieram, respetivamente, como 1º e 2º adjuntos, acórdão, ao que supomos, não publicado.
[6] “O que, de resto, acontece mesmo em processo penal, onde vigoram outros princípios, como seja o da presunção da inocência (cfr. por exemplo acórdão do TRC de 17/05/2017, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 430/15.3PAPNI.C1).”
[7] “Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 211/12.6TVLSB.L1-7.”
[8] “Porque aquilo que uma testemunha afirma pode ou não estar de acordo com a realidade, diz Alberto Augusto Vicente Ruço (in “Prova e Formação da Convicção do Juiz2, Almedina/Colectânea de Jurisprudência, pág. 267) que quando o juiz dispõe apenas de prova testemunhal, tem mais dificuldades em discernir os factos afirmados que efetivamente correspondem à realidade.”
[9] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1878/11.8TBPFR.P2.
[10] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 2745/15.1T8VNF-A.G1.
[11] Com as alterações introduzidas pelas Leis 14/2018, de 19.03, e 93/2019, de 04.09.
[12] Cfr., designadamente, Acórdãos do STJ de 05.02.2009, Proc. 08S2311 e de 18.04.2007, Proc. 06S4282., ambos in www.dgsi.pt; e Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª Edição, Principia, pág.540.
[13] Essa impossibilidade prática, por não se tratar de impossibilidade física ou legal, remete-nos, necessariamente, para o campo da inexigibilidade, a determinar através do balanço, em concreto, dos interesses em presença.