Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1247/16.6T8LOU.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA CECÍLIA AGANTE
Descritores: EMPREITADA
CADUCIDADE
RECONHECIMENTO DO DEFEITO
OBRAS
Nº do Documento: RP201806131247/16.6T8LOU.P1
Data do Acordão: 06/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º834, FLS.146-163)
Área Temática: .
Sumário: I - Como no contrato de subempreitada estão em causa direitos disponíveis, o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido é impeditivo da caducidade.
II - A mera admissão da existência dos defeitos denunciados pelo empreiteiro não equivale ao reconhecimento, pelo subempreiteiro, dos defeitos da obra com o efeito impeditivo do decurso de um prazo de caducidade para a instauração da ação destinada ao reembolso dos custos da eliminação dos defeitos.
III - Tendo o subempreiteiro transmitido ao empreiteiro que os defeitos advinham de um produto que aplicou, que os comunicou ao seu fornecedor e que aguardava que o mesmo se responsabilizasse, a um declaratário médio antes faz intuir que não está disponível para suprir tais vícios.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1247/17.6T8LOU
Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este
Juízo Local Cível de Lousada
Acórdão
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório
1. B…, L.da, com sede na Av. …, .., …, Lousada, intentou a presente ação declarativa de condenação contra C…, L.da, com sede na Rua …, .., Valongo, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia de €6.250,00, acrescido de €163,01 de juros vencidos e dos juros vincendos até efetivo e integral pagamento. Alegou, em síntese, que aquela quantia corresponde ao crédito que lhe foi cedido pela sociedade B1…, S.A., referente a trabalhos de reparação de defeitos advenientes de uma execução defeituosa de trabalhos de construção civil no âmbito de um contrato de empreitada celebrado entre a B1…, S.A. e a Ré, os quais acabaram por serem por si cumpridos.

2. Citada, a Ré contestou, arguindo a incompetência do tribunal em razão do território e opondo não ter sido cumprido pela cedente do crédito o regime de denúncia dos defeitos compreendido nos artigos 1221°, 1222° e 1223° do Código Civil (CC). Arguiu também a exceção do não cumprimento do contrato, aduzindo que a cedente do crédito não efetuou o pagamento integral do preço, retendo o valor de €2.000,00, e a simulação da cedência para dificultar a sua defesa, bem como a caducidade do seu direito em causa, pelo decurso dos prazos de denúncia e de interposição de ação judicial.

3. Respondendo, a Autora pugnou pela competência do tribunal e pela observância do preceituado nos preceitos invocados pela Ré, designadamente devido à existência de cláusula contratual no acordo firmado entre a Ré e cedente B1…, S.A. no sentido da reparação dos defeitos pela cedente em caso de não eliminação desses defeitos pela Ré, assim enjeitando as exceções de não cumprimento do contrato e de caducidade do direito em causa, até porque a Ré admitiu a existência desses defeitos.

4. Realizada a audiência prévia, foi saneado o processo com declaração de improcedência da exceção de incompetência relativa e foram fixados os temas da prova.
Realizada a audiência final, foi prolatada sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a Ré do pedido.

5. Irresignada, a Autora recorreu e concluiu a sua alegação do seguinte modo:
“ I. A Autora/Apelante propôs a presente ação judicial contra a Ré/Apelada, peticionando a condenação desta ao pagamento da quantia de 6.250,00€, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos calculados à taxa legal.
II. Alegou a Apelante ser-lhe devida aquela quantia, por se referir a um crédito sobre a Apelada, que lhe foi cedido pela sociedade comercial designada B1…, S.A. (doravante «B1…, S.A.,»), e que esta não satisfez voluntariamente.
III. Advogou, ainda, a Apelante que o referido crédito teve origem na adjudicação à mesma dos trabalhos de reparação de defeitos advenientes da aplicação de produto defeituoso pela Apelada, no âmbito da execução de empreitada que lhe fora contratada pela cedente B1…, S.A., servindo assim a cedência do crédito como modo de pagamento de tais labores.
IV. Pela sentença de que ora se recorre, em suma, o Douto Tribunal a quo, por aplicação ao caso do disposto no artigo 1225.º do Código Civil, concluiu que «Analisado o caso em apreço, equivalendo a assunção pelo empreiteiro dos defeitos à sua denúncia (cfr. art..º 1220.º, n.º 2, do CC), e tendo esta assunção ocorrido em 30 de junho de 2013, há muito que caducou o direito à ação visando obter a reparação dos defeitos ou, in casu, qualquer indemnização»,
V. Tendo considerado, por isso, também caducado o direito de crédito cedido à Autora, aqui Apelante.
VI.E só por isso julgado improcedente a presente ação e absolvido a Apelada do pedido.
VII. Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, não pode a Apelante conformar-se com tal decisão.
VIII.Por um lado, e como melhor se explicará em LVI e seguintes destas Conclusões, por entender que, em face dos factos considerados provados pelo Douto Tribunal a quo, e salvo o devido respeito, se verificou errada aplicação do Direito aos factos,
IX. Na medida em que se deve entender, salvo o devido respeito, que o exercício do direito objeto do presente litígio apenas está sujeito ao prazo ordinário de prescrição de vinte anos.
X. Por outro lado, porquanto, ainda que se entendesse pela aplicação do prazo de caducidade previsto no artigo 1225.º, n.º 2 do C.C. in casus, – o que não se consente e apenas se admite por mera hipótese de raciocínio – no entender da Apelante, sempre improcederia a exceção de caducidade invocada pela Ré/Apelada,
XI. Por se entender que, da prova produzida, tanto documental, como testemunhal, resultam claramente demonstrados factos que – erradamente e salvo o devido respeito, que é muito – não foram considerados como Provados na douta sentença de que se recorre, e que, se tivessem sido, conduziriam, necessariamente, o Douto Tribunal a quo a concluir que o direito de crédito objeto da presente ação não se encontra caducado.
XII. É que, no entender da Apelante, é absolutamente evidente, perante as provas produzidas, que a Apelada reconheceu não só a existência dos defeitos [como consignou o Douto Tribunal a quo, na sua Sentença], como o direito da cedente B1…, S.A. à eliminação dos mesmos, como melhor se deixará exposto em LXIII e seguintes destas Conclusões,
XIII. Sendo que, tal reconhecimento, nos termos do disposto no artigo 331.º, n.º 2, do C.C. tem efeito impeditivo da caducidade.
XIV. DOS FACTOS: A Autora/Apelante alegou no n.° 37 da Petição Inicial que apresentou, que os defeitos foram, várias vezes, reconhecidos e assumidos pela Ré/ Apelada,
XV. Concretizou, em 15 e 47 da Resposta por si apresentada através de requerimento com a referência N.º 26197612 (doravante designada por «Resposta»), que a Ré reconheceu os defeitos denunciados e assumiu como sendo a sua reparação da responsabilidade de uma empresa por si subcontratada para fornecer material para a obra em causa,
XVI. E alegou, no n.º 38 da sua Petição Inicial e nos n.ºs 16 e 48 da Resposta, em suma, que a Ré/Apelada garantiu, inclusivamente por escrito, que iria resolver o problema.
XVII. Contudo, a este respeito, apesar da prova produzia, veio o Douto Tribunal a quo, na sua Sentença, considerar como provados apenas os seguintes factos: «24. A existência de fungos na pintura exterior da obra resultantes da tinta aplicada pela ré foi comunicada pela empreiteira à aqui Ré, em 9 de maio de 2013; 25. E esta admitiu a sua existência e a necessidade do seu arranjo em 20 de junho de 2013. 26. Por carta datada de 27 de julho de 2016, a cedente esclareceu à Autora, que os defeitos de pintura a que se referiu no passado se tratam de “machas escuras”/“pintas negras” verificadas em alguns locais do edifico objeto da subempreitada, resultantes da existência de fungos na tinta adquirida e aplicada pela aqui ré, nesses locais.»
XVIII. Acontece que, salvo melhor opinião, a redação dada pelo Tribunal a quo aos factos estabelecidos de 24 a 26 restringe-os a um âmbito mais estreito do que aquele que, na verdade, a Apelante logrou provar.
XIX. Ora, da apreciação conjugada dos Documentos n.ºs 6, 7 e 8 juntos pela Autora/Apelante com a sua Resposta e das declarações proferidas em sede de audiência de julgamento, no dia 23-10-2017, entre as 12:27:33 e as 12:40:47, pela testemunha D…, encarregado geral, funcionário da Ré/Apelada e que foi arrolada pela mesma, resulta imperioso considerar como Provados, para além dos factos assentes pelo Douto Tribunal com os números 24. a 26., pelo menos, mais dez (10) factos, alegados pela Apelante em sede de 1.ª Instância, essenciais para o julgamento da presente demanda, e que abaixo identificamos com os números 28 a 37 [para dar seguimento ao elenco consignado pelo Douto Tribunal a quo na sua Sentença].
XX. Cabe salientar, antes de mais, que os Documentos n.ºs 6, 7 e 8 supra referidos – que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais – não foram objeto de qualquer tipo de impugnação por parte da Ré/Apelada, assim como não o foi o teor das declarações deles constantes.
XXI. Apreciando, agora, o que resulta, a este respeito, do depoimento prestado pela testemunha D…, em sede de audiência de julgamento no dia 23-10-2017, entre as 12:27:33 e as 12:40:47, verificamos que explicou esta testemunha:
1. Do minuto 3:49 ao minuto 4:24, quando instada pelo Ilustre Mandatário da Ré/Apelada sobre se se recordava do que aconteceu: “Passado uns anos de nós termos ido executar a obra, nós fomos contactados…disseram que apareceram uns pontos negros nas fachadas...nós fomos à obra ver o que se passava…pronto e não vimos nada de especial…o nosso trabalho estava feito mas realmente parecia que tinha umas pequenas…umas pequenas manchas. E nós fizemos ver isso ao nosso fornecedor de materiais para pronto para analisar o que é que se passava lá para resolver a situação das manchas que tinha na fachada. [sublinhado nosso],
2. Entre os minutos 05:43 a 05:51, quando instada pelo Ilustre Mandatário da Ré/Apelada sobre se esta tentou, dentro do possível, ver o que é que se passava com as tais patologias e tentar resolve-las: “Sim sim fizemos de tudo junto do nosso fornecedor na altura para resolver o assunto.”,
3. Do minuto 06:43 ao minuto 07:05, e referindo-se à resposta do seu fornecedor da tinta quando se deslocou ao local para verificar o que se passava, “A resposta deles foi que provavelmente o acabamento final do produto teria uma falta de portanto um repelente qualquer ou vamos dizer um antifundos que faltava, estava fraco, portanto o material estava fraco nesse sentido, então o que originou essa situação dos fungos foi precisamente a falta desse material no acabamento final [sublinhado nosso],
4. Do minuto 07:07 ao minuto 07:14, quando instada pelo Ilustre Mandatário da Ré sobre se «isso» tinha a ver com a execução da obra, que «Não, absolutamente nenhum; sim do produto; não da nossa execução; a nossa execução estava perfeitamente normal.» [sublinhado nosso],
5. Do minuto 08:35 ao minuto 08:36, quando questionada pela Mandatária da Autora/Apelante sobre quem é que aplicou essa tinta: «Foi a C…»,
6. Ao minuto 08:39 respondeu assertivamente «Sim!», quando lhe foi perguntado pela Mandatária signatária se foi a Ré/ Apelada que adquiriu essa Tinta.
7. Entre os minutos 09:28 a 09:30 que: «Nós fizemos de tudo para resolver o problema»,
8. Do minuto 09:41 ao 09:46 que «Nós não fizemos nada porque estávamos à espera que o nosso fornecedor concluísse o processo», quando questionada pela Mandatária signatária se acabaram por fazer alguma intervenção lá na obra para resolver o problema das manchas,
9. Do minuto 09:50 ao minuto 09:52, quando questionada pela Mandatária signatária sobre se o referido fornecedor deu alguma resposta à Apelada, que «Nunca mais nos disse nada.», e,
10. Entre os minutos 09:54 a 10:00, quando questionada pela Mandatária signatária se a Apelada, consequentemente, nunca mais disse nada à B1…, que «estávamos a, continuávamos a aguardar a situação que o nosso fornecedor se responsabilizasse pelo material».
XXII. Destarte, da apreciação conjugada do teor do referido Documento n.º 7 e das declarações supra transcritas identificadas com os números 1, 3, 4, 5 e 6 (proferidas pela testemunha D…, acima melhor identificada), resulta perfeitamente demonstrado, sendo imperioso considerar como Provado:
XXIII. Que os defeitos consistentes na existência de machas pretas na pintura das fachadas se ficaram a dever a problemas verificados na tinta adquirida pela Ré/Apelada e aplicada por esta na obra em apreço,
XXIV. Da apreciação conjugada das declarações supra transcritas identificadas com os números 1, 3, 4, 5 e 6 (proferidas pela testemunha D…, acima melhor identificada), resulta, também, forçoso assentar como Facto Provado:
XXV. Que a Ré/Apelada sabia que os defeitos consistentes na existência de machas pretas na pintura das fachadas se ficaram a dever a problemas verificados na tinta adquirida pela Ré/Apelada e aplicada por esta na obra em apreço, desde que «fez ver» o defeito ao seu fornecedor de tinta, e
XXVI.Por outro lado, da apreciação conjugada do teor dos Documentos n.º 6, 7 e 8 e das declarações supra transcritas por nós identificadas com os números 1, 2, 7, 8, 9 e 10 (proferidas pela testemunha D…, acima melhor identificada), resulta perfeitamente demonstrado, sendo imperioso considerar como Provado:
XXVII. Que a Ré/Apelada atribuía/reconhecia a responsabilidade pela eliminação dos defeitos nas fachadas à sua fornecedora da tinta que aquela aplicou nas fachadas da obra em apreço;
XXVIII. Que a Ré/Apelada praticou vários atos com o objetivo de a sua fornecedora de tinta defeituosa reparar os defeitos;
XXIX. Que a Ré/Apelada intimou a sua fornecedora de tinta defeituosa para que reparasse os defeitos;
XXX. Da apreciação do teor do referido Documento n.º 7 resulta, também perfeitamente demonstrado, sendo imperioso considerar como Provado:
XXXI. Que a Ré/Apelada assumiu, por escrito, que esses defeitos se deviam, então, única a exclusivamente a defeito do produto que a firma E… forneceu à Ré/Apelada para a realização da obra;
XXXII. Que a Ré/Apelada consignou, por escrito, considerar fundamentada a insatisfação expressada pela cedente B1…,
S.A., relativamente à qualidade dos produtos/serviços que aquela lhe havia fornecido;
XXXIII. Que a Ré/Apelada transmitiu à B1…, S.A., por escrito, ser sua política, nesse particular, a clareza e retidão no tratamento das queixas dos seus clientes e que sendo a queixa em causa fundamentada e por si verificada se impunha compensar a cedente B1…, S.A. pelas dificuldades que se vinham levantando, conforme vinha relatando;
XXXIV. Que a Ré/Apelada transmitiu à B1…, S.A., por escrito, que resultava imperioso resolver definitivamente os problemas até então existentes;
XXXV. Da apreciação teor do Documento n.º 8 resulta forçoso assentar como Facto Provado:
37. Que a cedente B1…, S.A. e a Ré/Apelada acordaram em que ficasse retida a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) pela B1…, S.A., até se resolver a situação com a E….
XXXVI. Encontrando-se perfeitamente demonstrados, como se deitou exposto, por prova documental junta aos autos e/ou por prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento, e dada a sua relevância para apreciar do reconhecimento, pela Apelada, do direito da cedente B1…, S.A. à eliminação dos defeitos, devem os factos supra elencados dos números 28 a 37 ser, então, considerados e fixados como Provados. Mais:
XXXVII. Entende, ainda, a Apelante, com o devido respeito, que o Tribunal da 1.ª Instância omitiu, também, do elenco dos factos considerados Provados dois outros, alegados quer nos n.ºs 36 e 39 da Petição Inicial, quer nos n.ºs 13, 14 e 18 da Resposta.
XXXVIII. Na verdade, da apreciação conjugada do teor do supra aludido Documento n.º 6, e do conteúdo das missivas remetidas pela cedente B1…, S.A. à Apelada, uma com a referência 046/ADM/DM e datada de 28/07/2016, e outra com a referência 047/ADM/DM e datada de 03/08/2016, juntas aos autos, pela Apelante, mediante requerimento com a referência n.º 27088590, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, extrai-se, de forma indubitável, a insistência das interpelações dirigidas pela cedente B1…, S.A. à Ré/Apelada para que resolvesse o problema relativo aos defeitos, eliminando-os ou diligenciando pela sua reparação por parte da sua subcontratada.
XXXIX. Assim, resulta perfeitamente demonstrado, devendo considerar-se como Facto Provado: 38. Que a cedente B1…, S.A., na sequência da denúncia dos defeitos, solicitou, antes de mais, pelo menos desde 09-05-2013, as devidas reparações, à Ré/Apelada, isto é a eliminação dos defeitos, repetindo essa solicitação, pelo menos, em julho e agosto de 2016, tendo lhe conferido prazos razoáveis para proceder à eliminação dos defeitos, por si.
XL. Estamos perante matéria que, pela sua essencialidade para o julgamento do presente litígio, foi incluída pelo Douto Tribunal a quo, no elenco de temas de prova (sob o n.º 6 desse elenco), e que, porque inegavelmente demonstrada pela prova produzida, não pode deixar de se considerar matéria factual considerada como Provada.
XLI. Do mesmo modo, resulta, também, perfeitamente demonstrado, devendo considerar-se como Facto Provado:
39. Que a Ré/Apelada não eliminou os defeitos denunciados e reconhecidos,
O que resulta, de forma indubitável, das declarações proferidas em sede de audiência de julgamento no dia 23-10-2017, entre as 12:27:33 e as 12:40:47, pela testemunha D…, funcionário da Ré/Apelada e que foi arrolada pela mesma, que acima se deixaram transcritas, supra, sob os números 8, 9, 10 no subtítulo a) das Alegações e em XXXI das presentes Conclusões.
XLII. Acresce ainda que, pela Sentença de que ora se recorre, considerou o Douto Tribunal a quo, como Não Provado um único facto: «Que o valor dos trabalhos efetuados pela autora para a cedente para correção do descrito em 24. se cifrava em 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros)».
XLIII. Entende a Apelante, contudo, e salvo o devido respeito, que é muito, que aquele Douto Tribunal peca, no âmbito dos factos que considerou como Não Provados, quer por excesso, que por defeito. Vejamos:
1. Por excesso: Alegou a Autora/Apelante, na Petição Inicial que apresentou, que os trabalhos por si efetuados, de reparação da pintura das fachadas da obra em apreço, eliminando fungos nela existentes e implementando as necessárias medidas de prevenção do seu reaparecimento futuro se quantificam na quantia de oito mil, duzentos e cinquenta euros.
2. Para prova de tal alegação, a Autora/Apelante juntou os seguintes documentos que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais:
3. A fatura por si emitida à cedente B1…, S.A. quantia de 8.250,00€ e de que consta a descrição «Reparação da Pintura das Fachadas do “LAR DE IDOSOS F…» (cfr. Documento N.º 1 junto com a Petição Inicial);
4. O Auto de Medição dos trabalhos em apreço (cfr. Documento N.º 1 junto com a Petição Inicial), referente ao mês de setembro de 2016, e em que se encontram descritos – com indicação da respetiva quantidade (em horas, unidades ou verba global), preços unitários e totais das somas – os trabalhos de reparação executados.
5. Uma missiva por si remetida à cedente B1…, S.A., mediante a qual esta – devedora do montante titulado pela referida fatura – aceitou os trabalhos executados pela Apelante e a fatura por esta enviada (cfr. Documento N.º 2 junto com a Petição Inicial);
6. Consta, ainda, dos autos uma missiva datada de 28-07-2016, com a referência interna 046/ADM/DM, remetida pela cedente B1…, S.A. à Apelada (junta aos autos pela Autora/Apelante com o requerimento com a referência n.º 27088590 e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais), interpelando-a para eliminar os defeitos, e que em a cedente B1…, S.A. transmite à Apelada que “(…)procedeu à avaliação da reparação necessária, que estima em € 8.250,00€ (…)”, o que constitui mais uma evidência de que os referidos trabalhos se cifravam na quantia alegada (8.250,00€);
7. Também as missivas remetidas pela Apelante à Apelada (cfr. Documentos N.º 4 e 5 junto com a Petição Inicial que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais), interpelando-a para o pagamento do crédito que lhe fora cedido, explicam a origem do crédito reclamado e quantificam os trabalhos de reparação dos defeitos na quantia de 8.250,00€.
8. A Apelada, em momento algum questionou ou impugnou o conteúdo de qualquer desses documentos, a sua veracidade ou a autenticidade das assinaturas neles apostas.
9. Além disso, nenhuma resposta da Apelada a estas missivas consta dos Autos e nenhuma evidência de devolução destas missivas pela Apelada consta também dos Autos.
10. A Apelada alegou, apenas, no n.º 93. da sua Contestação, que não aceitou o crédito ora reclamado e que devolveu a fatura, tendo-o feito de forma absolutamente genérica e sem quaisquer outras concretizações, e não tendo logrado, nem mesmo, procurado, provar tais factos – quer pela junção de quaisquer documentos quer por depoimento de testemunhas – advinha-se, por não existir qualquer prova de tal alegação.
11. Além disso, a lista dos trabalhos de reparação executados pela Apelante constante do Auto de Medição acima referido (cfr. Documento N.º 1) foi corroborada pelo depoimento das testemunhas G…, encarregado geral da Apelante, e H… ambas arroladas pela Autora/Apelante. Vejamos:
12. G… foi inquirido em sede de audiência de julgamento, no dia 23-10-2017, das 10:59:26 às 11:11:52, e explicou, do minuto 03:06 ao minuto 03:29 que «Teve que se montar andaime e meios mecânicos para aceder à totalidade da fachada porque era um edifício alto, fez-se limpeza prévia da fachada com jato de água e uma substância para remover os ácaros, neste caso os fungos, e depois procedeu-se ao esquema de pintura; numa primeira fase um primário de aderência e depois a pintura final.».
13. A mesma testemunha afirmou, do minuto 04:02 ao minuto 04:17: «Coordenei a equipa que andou lá, pontualmente visitava a ver se os trabalhos estavam a ser bem feitos e quem andou lá foi…tinha um manobrador para manobrar a máquina elevatória que lá esteve, um oficial e um servente.»
14. Resulta, pois, demonstrado, por este depoimento, se duvidas houvesse, que foram efetivamente utilizados o andaime e a plataforma elevatória na execução dos aludidos trabalhos, que foi efetuada a limpeza da fachada, com jato de água («máquina de pressão», alegada no Auto) e uma substância para remover os ácaros (substância de limpeza alegada no Auto) e depois foi efetuada a pintura, demonstrando-se a utilização de um primário e de tinta, e que, para o efeito, foi contratada a mão-de-obra de um manobrador, de um oficial e de um servente.
15. H… foi inquirido em sede de audiência de julgamento, no dia 23-10-2017, das 11:12:27 às 11:25:45 e contou, do minuto 01: 28 ao minuto 01:32 que a referida intervenção ocorreu “entre agosto e setembro do ano passado” [referindo-se ao ano de 2017], o que, a ser entendido como «desde agosto até setembro» corrobora as 28 unidades de transporte de mão-de-obra contantes do Auto, correspondentes a 28 diais de trabalhos.
16. A mesma testemunha, do minuto 01:54 ao minuto 02:06 reitera também: “lavamos aquilo tudo com uma máquina de pressão…fui eu que andei lá a lavar…eu e mais o meu colega que está ali, demos uma mão de isolante, no prédio todo, no edifício todo e depois pintamos” e afirma entre os minutos 03:30 e 03:35 referindo-se à obra de reparação dos defeitos ora em causa, que “andava eu, o Sr. J… que está ali fora e um D…, que era o servente”[sublinhado nosso].
17. Destas afirmações resulta, não só, mais uma prova de que foi utilizada na reparação dos defeitos uma máquina de pressão, mas também de que foi utlizado, na pintura, um primário (“isolante”) e Tinta, como de que os trabalhos envolveram mão-de-obra de três pessoas, para execução de limpeza e pintura – tudo conforme consta do Auto de Medição (cfr. Documento N.º 1 junto com a Petição Inicial).
18. Resulta ainda desse depoimento, que tais trabalhos foram efetuados «no prédio todo, no edifício todo», o que revela o âmbito e extensão desses trabalhos.
19. Destarte, tendo a Autora/Apelante logrado produzir prova da sua alegação, e não tendo a Ré/Apelada logrado retirar valor probatório à mesma ou apresentado qualquer contraprova, afigura-se mais do que forçoso dar por assente o teor dos documentos supramencionados,
XLIIV. E bem assim, considerar como Provado o facto que o Doutro Tribunal a quo – salvo o devido respeito, erradamente – que considerou Não Provado, isto é:
40. Que o valor dos trabalhos efetuados pela autora para a cedente para correção do descrito em 24. se cifrava em 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros).
XLV. Por omissão: Entende, ademais, a Apelante que o Douto Tribunal a quo deixou também de considerar como Não Provados alguns factos alegados nos autos pela Apelada e que a esta não logrou, de todo, provar, podendo essa ausência de prova vir a revelar-se fundamental para a sustentar a posição da Apelante, caso seja dada procedência ao presente Recurso de Apelação.
XLVI. Deveriam, então, no entender da Apelada, ficar a constar como Factos considerados Não Provados os seguintes:
A. Que a cedente B1…. S.A. não exigiu a eliminação dos defeitos em 1.º lugar (como alega a Apelada em 21 da Contestação);
B. Que a cedente B1…, S.A. deveria ter pago a quantia de 2.000,00€ em 06.08.2012 (como alega a Apelada de 39 a 41, 117, 118 e 167 da Contestação);
C. Que a Ré/Apelada não aceitou o crédito ora em apreço;
D. Que Ré/Apelada devolveu a fatura FT …./…..;
E. Que, com negócio em apreço nos presentes autos tenha existido, da parte da Apelante, intuito ou propósito de enganar terceiros (como alega a Ré/Apelada em 103 e 104 da sua Contestação);
F. Que a Ré/Apelada tenha executado os trabalhos que lhe foram adjudicados pela cedente B1…, S.A. de acordo com a legis artis (como alega a Ré/Apelada em 115 da sua Contestação);
G. Que a cedente B1…, S.A. nunca concretizou os defeitos que denunciou (como alega a Ré/Apelada em 120 e 127 da sua Contestação);
XLVII. DO DIREITO: Como já se deixou dito, e por e salvo o devido respeito, que é muito, entende a Apelante que, em face dos factos considerados provados pelo Douto Tribunal a quo, a sentença de que ora se recorre padece de uma errada aplicação do Direito aos factos.
XLVIII. A Apelante entende, então, que, como ensina CURA MARIANO, o exercício do direito a pedir a indemnização em dinheiro pelo custo dos trabalhos de eliminação dos defeitos ou reconstrução realizados pelo dono da obra (ou pelo empreiteiro, na relação que estabelece com subempreiteiro, como, in casus) ou terceiro contratado por este, como reação a um incumprimento definitivo do empreiteiro destas prestações, apenas está sujeito ao prazo de prescrição ordinário, e não ao prazo de caducidade previsto no artigo 1225.º, n.º2 do Código Civil.
XLVIX. De facto, «(…) os prazos de caducidade do art.° 1225.°. do C.C., tal como os estabelecidos nos art.° 1220.° e 1224.°. do mesmo diploma, apenas respeitam ao exercício dos direitos atribuídos nos art.° 122l.° a 1223.°, do CC »,
L. Sendo que «Esta indemnização [pelo custo dos trabalhos de eliminação dos defeitos como reação a um incumprimento definitivo, pelo empreiteiro, da obrigação de eliminar os defeitos, decorrente do artigo 1121.º, n.º 1 do C.C.] (…) não se enquadra nas previstas no art.º 1223.º do C.C., as quais são cumulativas ou residuais relativamente ao exercício do direito de eliminação, da redução do preço e da resolução do contrato de empreitada e destinam-se a compensar os prejuízos não ressarcidos pelo exercício desses direitos e não resultantes do incumprimento das obrigações de eliminação ou reconstrução.».
LI. Nas palavras de CURA MARIANO, «Como este direito de indemnização resulta da aplicação das regras gerais do direito das obrigações (ar.° 798°. do C.C.), e não das regras especiais previstas para a realização de obra com defeitos, no âmbito do contrato de empreitada, não se aplicam os prazos de caducidade apenas previstos para o exercício dos direitos conferidos por esse regime especial.» [negrito e sublinhado nossos].
LII. «Aliás, resultando este direito de indemnização do incumprimento definitivo de um dos direitos cujo exercício está sujeito aos referidos prazos de caducidade, seria absurdo que também ele estivesse sujeito aos mesmos prazos. Se o dono da obra tivesse evitado o decurso dos prazos de caducidade previstos no art.º 1224.°do C.C. [e 1225.º, n.º 2] para o exercício do direito de exigir a eliminação dos defeitos ou da realização de nova obra, no limite, era-lhe já impossível accionar este direito de indemnização nos mesmos prazos. E mesmo que não tivesse exercido aqueles direitos em data próxima do termo dos prazos de caducidade, dificilmente conseguiria exercer o direito de indemnização pelo incumprimento das respectivas prestações, atento o tempo que decorre até que esse incumprimento se possa considerar definitivo.
LIII. Na verdade, na redação original do artigo 1225., n.º2 do C.C. de 1966, o legislador «utilizou a expressão infeliz que “a indemnização devia ser pedida no ano seguinte à denúncia”»,
LIV. Não podendo entender-se essa estipulação restrita a um qualquer pedido de indemnização, fosse qual fosse, e não aplicável aos direitos especiais previstos nos artigos 1221.º e 1222.º do Código Civil.
LV. É que, «Tendo-se visado estabelecer um regime mais severo» em relação ao empreiteiro, nas empreitadas de imóveis de longa duração «não há qualquer razão que justifique que o exercício do direito de indemnização possa beneficiar de um
regime mais favorável que os restantes direitos do dono da obra, ou que, neste artigo, se tenha acolhido um direito de indemnização com uma relação alternativa relativamente aos restantes direitos e não meramente residual», como o é (meramente residual) o direito previsto no artigo 1223.º do C.C.
LVI. No sentido de que o pedido de indemnização em causa está sujeito ao prazo ordinário de prescrição e não ao prazo especial de caducidade previsto no artigo 1225.º, n.º 2 do C.C. decidiu também, designadamente, o Tribunal da Relação de Coimbra, em Acórdãos proferidos a 2.06.2009, no Processo n.º 2443/07.0TJCBR.C1, a 22.03.2011, no Processo n.º 2443/07.0TJCBR.C1 e a 29-11-2011, no Processo n.º 157240/09.1YIPRT.C1, todos disponíveis em http://www.dgsi.pt.
LVII. Pelo que se acabou de expor, deve entender-se, salvo o devido respeito, que o direito da cedente B1…, S.A. [direito esse que se transmitiu à Apelante por virtude da cessão do crédito] a exigir judicialmente uma indemnização em dinheiro pelo custo dos trabalhos de eliminação dos defeitos realizados por terceiro contratado por aquela – a aqui Apelada –, por força do incumprimento definitivo, pela Apelada, da sua obrigação contratual e legal de reparar os defeitos, se encontra sujeito ao prazo ordinário de prescrição legalmente previsto, de 20 anos após a denúncia dos defeitos (cfr. artigo 309.º do Código Civil), e que se encontra ainda em curso.
LVII. Por outro lado, ainda que se entendesse pela aplicação do prazo de caducidade previsto no artigo 1225.º, n.º 2 do C.C. in casus, – o que não se consente e apenas se admite por mera hipótese de raciocínio – no entender da Apelante, sempre improcederia a exceção de caducidade invocada pela Ré/Apelada,
LVIII. Por entender a Apelante ser absolutamente evidente, perante as provas produzidas, que a Apelada reconheceu não só a existência dos defeitos, como o direito da cedente B1…, S.A. à eliminação dos mesmos.
LVIX. Ora, tal reconhecimento, nos termos do disposto no artigo 331.º, n.º 2, do C.C. – estando em causa direitos disponíveis e, se se considerasse aplicável o prazo de caducidade previsto no artigo 1225.º, n.º2 do C.C. –, tem efeito impeditivo da caducidade.
LX. De facto, entende a Apelante que, da conjugação dos factos considerados comos Provados pelo Douto Tribunal a quo,
LXI.Com os factos supra elencados sob os números 28 a 37 no subtítulo a) das Alegações e em XXII a XXVI destas Conclusões, que, como já se deixou dito que, face à prova produzida, tanto documental, como testemunhal, resultam claramente demonstrados e que – erradamente e salvo o devido respeito, que é muito – não foram considerados como Provados na douta sentença de que se recorre,
LXII. Outra conclusão não se pode aceitar do que a afirmação daquele reconhecimento.
LXIV. Na verdade, não poderá existir reconhecimento mais expresso do que aquele que emerge do conteúdo do Documento junto sob o N.º 7.
LXV. Entende a Apelante não ser possível afirmar [como se afirma] (1) Que os defeitos foram denunciados pela cedente B1… S.A. à Ré/Apelada, (2) Que a Apelada «admitiu a sua existência», (3) Que a Apelada admitiu que os defeitos se referiam a manchas negras na pintura por si executada, (4) Que a Apelada admitiu que os defeitos se deviam única e exclusivamente à tinta por si adquirida e aplicada na obra em apreço, (5) Que a Apelada «admitiu a necessidade do seu arranjo», (6) Que a Apelada admitiu tudo isso por escrito,
LXI. E não concluir por um reconhecimento expresso e indubitável, por parte da Apelada, da sua responsabilidade pela reparação dos defeitos.
LXVII. Pretender-se-á equacionar uma realidade em que a Apelada apesar de reconhecer a existência dos defeitos, assumir com assertividade a necessidade de reparação dos mesmos, assumir que se estes deviam a tinta por si adquirida e por aplicada na obra, – tudo isto de forma expressa, até escrita, clara e sem deixar margem para dúvidas – não reconheceu de forma suficientemente séria e indubitável a sua responsabilidade na eliminação dos mesmos?
LXVIII. Não é plena e pacificamente aceite, pelo homem médio, mas mais ainda pelo comerciante médio, que todo o subcontratante responde por defeitos/danos causados ao contratante por responsabilidade do subcontratado? Cremos não existir qualquer dúvida de que a resposta a esta questão é afirmativa.
LXIX. Afigura-se-nos, pois, plenamente incredível que uma empresa de construção civil que exerce a sua atividade no mercado há pelo menos oito anos [como decorre do depoimento da testemunha D…, que prestou declarações em sede de audiência de julgamento no dia 23-10-2017, entre as 12:27:33 e as 12:40:47, que, quando questionado pelo Meritíssimo Juiz sobre se “trabalha na da Ré/Apelada há muito tempo” respondeu, entre o minuto 00:58 a 01:00: «sim, cerca de oito anos»], assuma a existência de um defeito em obra por si executada, assuma que o defeito decorre diretamente de produto por si aplicado em obra, transmita assertivamente à entidade que a contratou que o defeito tem que ser eliminado e não queria com isso transmitir a um qualquer declaratário médio que se responsabiliza por essa eliminação.
LXX. Na verdade, «A interpretação das declarações negociais vale em regra com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante; a menos que o declaratário conheça a vontade real do declarante, caso em que é de acordo com ela que vale a declaração emitida (art.º 238/1 e 2, Código Civil).»
LXXI. Não se consegue compreender como é que do Documento n.º 8, junto aos autos pela Apelante, mediante o qual a Apelada sugere, por escrito, que a cedente B1…, S.A. retenha uma parte do preço a pagar à Apelada enquanto «não se resolver o problema com a E…», não resulta a necessária a conclusão pela plena assunção da responsabilidade pela Apelada.
LXXIII. Querer-se-á defender que a Apelada sugeriu que a cedente B1…, S.A. retivesse um valor que àquela era devido sem que para isso tivesse motivo suficientemente válido e diretamente imputável à credora do preço? Não cremos.
LXXIV. E rejeitamos veementemente que o «reconhecimento, com capacidade impeditiva da caducidade dos direitos, é apenas aquele que produz o mesmo resultado que se alcançaria com a prática tempestiva do acto a que a lei ou uma convenção atribuem efeito impeditivo»,
LXXV. À luz do que ensina CURA MARIANO «não concordamos com essa exigência, uma vez que estamos perante caducidades necessariamente estabelecidas em matéria não excluída da disponibilidade das partes, como sucede relativamente aos direitos do dono da obra [no caso do empreiteiro sobre o subempreiteiro] aqui em análise. Nestas hipóteses, a caducidade visa apenas assegurar ao empreiteiro que a situação de incerteza sobre a existência do respectivo direito não se prolongue por um período de tempo dilatado. Se é ele quem, de forma inequívoca, reconhece a existência do direito no decurso do prazo de caducidade, mesmo que não pratique os actos equivalentes à sua realização (v.g. eliminação dos defeitos, entrega de nova obra), não há razão nenhuma para manter a protecção a uma situação de incerteza que já não se verifica pelo reconhecimento efectuado.»
LXXV. Parece-nos, pois, que este é precisamente o caso que se dá na presente demanda.
LXXVI. Não se pode aceitar que se desproteja o credor que confiou ver o seu crédito satisfeito (i.e., a obrigação de eliminação de defeitos cumprida) porque o devedor criou na esfera daquele a expectativa séria de que era sua intenção cumprir, para se assegurar a proteção desse devedor com o argumento de que este não tinha consciência da expectativa que estava a criar na esfera do credor, não conseguiu alcançar a extensão das suas assunções, nem com elas pretendeu assumir quaisquer responsabilidades.
LXXVII. Conclusão contrária, salvo o devido respeito, não se alinha nem pode alinhar-se com os princípios da Boa-fé e da Justiça.
LXXVIII. Pode ler-se em Acórdão do STJ proferido, por unanimidade, a 01-10-2015, no Âmbito do Processo N.º 279/10.0TBSTR.E1.S1 e tendo como Relator ABRANTES GERALDES «o legislador não deixou de salvaguardar algumas situações em que a própria contraparte reconhece perante o interessado (in casu, o dono da obra) o direito de que este se arroga, mais concretamente o de obter a reparação dos defeitos detectados dentro do prazo de garantia legal ou contratualmente fixado (art. 331º do CC). Tal reconhecimento do direito, com efeitos impeditivos da caducidade, pode ser expresso ou tácito, desde que nesta última eventualidade decorra de factos que inequivocamente o exprimam.» [sublinhado nosso].
LXXVIX. A atuação prolongada e pacífica da Ré/Apelada que se traduziu no reconhecimento da existência das anomalias e na prática de atos demonstrativos de que se empenhava na sua resolução, de que «fez tudo para resolver a situação», exigindo essa reparação à sua subcontratada, prestando contas à cedente B1…, S.A. de que se encontrava a diligenciar esforçadamente para a resolução dos problemas [reparação dos defeitos] – como se pode confirmar pelo teor do Documento N.º 6 – é absolutamente reveladora de um reconhecimento tácito das suas responsabilidades, de tal modo que deixa de fazer sentido estenderem-se-lhe as preocupações de segurança e certeza jurídica subjacentes aos prazos de caducidade.
LXXX. Para CURA MARIANO, perante um reconhecimento inequívoco, ainda que, porventura, não seguido de uma realização equivalente, “não há razão nenhuma para manter a protecção a uma situação de incerteza que já não se verifica pelo reconhecimento efectuado”.
LXXXI. Destarte, é mister concluir que entendesse que o prazo em causa é de caducidade e não de prescrição, a operância dessa caducidade foi impedida pelo reconhecimento, pela Apelada, do direito da cedente B1…l, S.A. à eliminação dos defeitos.
LXXXII. E «o impedimento da caducidade não determina a contagem de um novo prazo de caducidade, mas sim a aplicação das regras da prescrição, pelo que também com este enquadramento legal se conclui indubitavelmente que ainda se encontra em curso o prazo ordinário de prescrição (20 anos) para a B1…, S.A. exigir a indemnização ora em demanda, direito esse que se transmitiu à aqui Apelante, por via da cessão de créditos.
LXXXIII. Sem prescindir, ainda que assim não se entendesse – o que não se consente e apenas equaciona por diligência de patrocínio – sempre improcederia a exceção de caducidade invocada, uma vez que a cedente B1…, S.A. exerceu atempadamente os direitos que a lei lhe confere – e cuja caducidade ora se discute.
LXXXIV. E, nos termos do disposto no artigo 331.°, n.° 1 do Código Civil, o exercício atempado dos direitos do dono da obra, ou do empreiteiro face ao subempreiteiro, impede a sua caducidade.
LXXXV. É que, «Em nenhum lado a lei exige que o acto impeditivo da caducidade deva ser a propositura de acção judicial».
LXXXVI. «Podendo os direitos do dono da obra serem exercidos extrajudicialmente, a simples declaração de redução do preço ou de resolução do contrato, ou mesmo a interpelação extra judicial do empreiteiro para a eliminação tios defeitos, realização de nova obra ou pagamento de indemnização, impedem a caducidade destes direitos
LXXXVII. No caso de que ora nos ocupamos, a empreiteira – B1…, S.A. – denunciou os defeitos em maio de 2013, como se considerou provado, e interpelou a subempreiteira, Ré/Apelada, para cumprir a sua obrigação de eliminar os defeitos – como acima se deixou explicado e demonstrado e conforme resulta da prova produzida.
LXXXVIII. A cedente B1…, S.A. insistiu nessas interpelações junto da Ré/Apelada, confiou nas suas declarações de que iria resolver o problema, aguardou para que o cumprisse, conferiu novos prazos, razoáveis, para que a Apelada cumprisse a sua obrigação, para além do que exigia o contrato livremente celebrado entre as partes (cfr. cláusula 5.ª b) e c) do Contrato de Subempreitada, junto aos autos sob o Doc. N.º 2 e artigos 29, 30, 35, 36 e 39 da Petição Inicial).
LXXXIX. A B1…, S.A. efetivamente exerceu o seu direito a pedir à Ré/Apelada que cumprisse a sua obrigação no prazo de um ano a contar da denúncia dos defeitos, como previa o contrato (cumprindo também por essa via, o disposto no n.º 2 do artigo 1225.º do C.C.).
LXXXX.«Quando se recorre a estes direitos, porque não obteve resultados o exercício do direito de eliminação de defeitos (…) devido ao (…) incumprimento dessas obrigações, as finalidades do estabelecimento dos prazos de caducidade já foram postas em causa com a primeira interpelação. Para estas hipóteses o exercício dos primeiros direitos pelo dono da obra é suficiente para impedir a caducidade relativamente aos direitos subsidiários.»
LXXXXI. Em face do exposto, necessariamente se conclui que não caducou o direito da B1…, S.A., e consequentemente da Autora/Apelante, na qualidade de cessionária, exigir a indemnização ora em discussão.
LXXXXII. Porque assim é, face aos factos considerados Provados pelo Douto Tribunal a quo, constantes da sua Sentença,
1. Acrescidos dos factos identificados em a) destas Alegações com os números 28 a 40, que a Apelante, por via da presente Apelação, requer, após fundamentação, que sejam considerados como Provados, –,
2. Sem se desconsiderarem os factos cuja prova, como se deixou dito e fundamentado, não se logrou, de todo, obter na presente ação (elencados de A. a G. em LV. destas Conclusões –,
3. Por tudo quanto foi alegado pela Autora/Apelante em sede de 1.ª Instância, quer através da Petição Inicial apresentada, quer através da supra aludida Resposta, o que desde já se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais,
LXXXXIII. Conclui-se que o crédito reclamado existe e é exigível.
LXXXXIV. Por isso, e porque a cessão [subjacente aos presentes autos] do crédito ora reclamado é legítima, válida e eficaz [como resulta da douta Sentença de que ora se recorre], deve a ação ser julgada procedente”.

6. Não consta dos autos a resposta da Recorrida
II. Objeto do recurso
Sendo a temática recursiva delimitada pelas conclusões da alegação do recorrente [artigos 635º e 639º do Código de Processo Civil (CPC)], cabe apreciar:
1. A impugnação da matéria de facto;
2. A cessão de créditos;
3. A subempreitada;
4. A caducidade do direito da demandante a tutela judiciária.
III. Fundamentação
1. A impugnação da decisão sobre a matéria de facto
Pretende a Recorrente que seja dado como provado o facto dado por indemonstrado, cujo teor é o seguinte: “O valor dos trabalhos efetuados pela autora para a cedente para correção do descrito em 24. se cifrava em 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros)”. Trabalhos esses relativos à reparação dos fungos existentes na pintura exterior da obra resultantes da tinta aplicada pela Ré no âmbito da subempreitada que esta outorgou com a empreiteira.
Auditada a prova produzida, verificamos que as testemunhas inquiridas nada declararam sobre o concreto valor da reparação daquelas desconformidades. G…, funcionário da Autora desde há 6 anos, com funções de encarregado geral, disse conhecer a Ré por ser subempreiteira da Autora. Instado sobre a obra em causa, referiu que interveio na correção de anomalias, tendo sido feita a pintura geral para eliminar fungos em todos os panos e alguma descoloração da tinta. Mais esclareceu que os trabalhos originários foram executados pela Ré e a sua correção exigiu a montagem de andaimes, limpeza prévia com jacto de água e produto de remoção e depois a pintura. Disse: “Limitei-me a coordenar a equipa, mas andou lá pessoal da Autora: um manobrador, um oficial e um servente”. Esclareceu que havia um compromisso para com o dono da obra; como o subempreiteiro não reparou, a Autora tomou a iniciativa de fazer a reparação: “A subempreiteira tinha assumido que fazia a reparação, mas chegou a altura de a executar, no verão, não apareceu para fazer o trabalho e a Autora procedeu à reparação dos trabalhos”. Mais mencionou que a correção dos trabalhos decorreu em finais de agosto/setembro de há um ano (a audiência final teve lugar em 23/10/2017). Instada pelo Senhor Juiz da sua razão de ciência, disse saber que a Ré assumiu a responsabilidade da reparação da obra por via da correspondência trocada com a Autora. Confirmou que não foi combinada data para iniciar a reparação, mas a Ré ficou de dar resposta.
H… referiu ser empregado da Autora desde há quase 7 anos, exercendo as funções de trolha. Disse conhecer a obra do lar de idosos F…, por lá ter andado a pintar a obra toda. Sobre o aspeto das paredes, referiu “Tinha paredes mal pintadas, todas sujas de coisas pretas, algumas já desbotadas. Lavámos tudo com máquina de pressão, demos uma mão de isolante e pintámos tudo”. Perguntado como se apresentava antes da intervenção, explicou: “Estava pintado, aquilo deve ser defeito de tinta ou do material, não sei. Lavar as paredes, o tal isolante e a pintura. Andaram lá 3 funcionários. Agora sou funcionário da B…, depois é que me mudaram para a I”.
I… narrou ser o presidente do lar de idosos F… e conhecer “a B1…, se é 2 ou 1 não sei”, mas não conheceu a Ré, embora tivesse visto lá carros com o nome da Ré: “Andavam lá viaturas que tinham não sei quê C…”. Disse não saber que trabalhos foram feitos por essa empresa (a Ré) e referiu que, para aí 1 ou 2 anos depois de ter sido pintado, ficou tudo negro. Houve uma reunião e o lar reclamou e “a pintura foi reparada toda”. Instado sobre quando é que isso foi executado, disse: “Penso eu que deve ter sido este verão 2 anos ou 1 ano; foi no verão”. Explicou que a obra foi contratada com a B1… e ouviu falar que ela passou a B…, mas nunca se apercebeu.
D… referiu que conheceu a empresa B1…, porque trabalha para a Ré desde há cerca de 8 anos, como encarregado geral, e esta prestou serviços à B1…. Disse que se recorda de ter executado trabalhos no lar F… por conta da B1…, na aplicação de capoto. Mencionou ter acompanhado a obra do princípio ao fim e ter a obra sido entregue, na presença de pessoal do lar de idosos. Referiu que a Ré nunca aceitou a responsabilidade na situação reclamada, porque achava que os defeitos não eram da sua responsabilidade. A propósito da B1… e B…, disse: “Eu soube na altura que havia duas empresas… Fizemos tudo junto do nosso fornecedor mas não conseguimos resolver o assunto”. Aquilo “não tem nada a ver com a execução da obra”. (…) “Da parte do nosso fornecedor foram lá ver e a resposta foi no sentido de que ao produto faltava um antifúngico”. Disse saber que há um valor que a B1… não pagou à Ré, embora sem saber concretizar o montante. Confirmou que foi a Ré que comprou e aplicou a tinta, dizendo: “Fizemos de tudo para resolver o problema… mas não fizemos nada porque estávamos à espera que o nosso fornecedor nos desse uma resposta… nunca mais disse nada.” Sob a instância do Senhor Juiz, explicou: “A reclamação foi feita uns anos depois, não sei agora precisar quantos anos foi… o nosso fornecedor, eles foram lá, ficámos à espera. Havia na parte cima algumas manchas só, aí uns 20 metros, era bastante maior. Cerca de 5% da obra, o resto estava tudo bem.”
A circunstância das testemunhas não terem referenciado o valor da reparação dos trabalhos de pintura executados pela Ré não nos impressiona porque, em regra, os trabalhos são faturados pela empresa executante e a respetiva fatura é remetida à devedora. Por isso, não sendo inquirido, como no caso, pessoal dos serviços administrativos das empresas envolvidas, não estão reunidas condições para alcançar prova testemunhal no sentido da confirmação da emissão e conteúdo das faturas. No entanto, os autos exibem o contrato de subempreitada outorgado pela B1… com a Ré em 17/01/2012, mediante o qual esta se vinculou a executar na construção do Lar de Idosos F… o capotto da referida empreitada por aplicação dos preços unitários acordados para cada espécie de trabalho a realizar (fls. 96 a 101). Os autos de medições encerram o valor global de 4.421,51 € (fls. 80 e 81). Está também junta aos autos a troca de correspondência eletrónica entre a Ré e a Fabylak (fls. 73 a 75) por via da problemática da tinta e dos fungos originados. A carta de fls. 76 e 77, subscrita pelo ilustre mandatário da Ré, regista os defeitos da obra executada pela Ré, cuja causa reconhece estar no produto que a empresa E… lhe forneceu, prestando-se a agir judicialmente contra ela. Estes dados documentais asseveram a vinculação contratual da B1… com a Ré e a aceitação, da parte desta, da desconformidade dos trabalhos por si executados. A par disso, estão juntos a fatura e o auto de medição respeitantes à reparação desses trabalhos, no valor de 8.250,00€, deduzido de 2.000,00€ retidos pela empreiteira (fls. 17 e 18). O auto de medição que descreve os trabalhos executados, todos conformes à natureza da reparação a efetivar, designadamente ao nível do pessoal que interveio, em absoluta consonância com os depoimentos das testemunhas G… e H….
Também exibem os autos os documentos relativos à cessão de créditos da B1… à B… e notificação à Ré, na qualidade de devedora (fls. 19 e 20, 28 a 32). Poderemos questionar o facto de a reparação ser superior ao valor da obra inicial, mas isso parece-nos confirmado pelos depoimentos das indicadas testemunhas que, em função do que ditam as regras da experiência comum, falaram em limpar a base com jacto de água e produto de remoção, e só depois, então, aplicar e a tinta, num conjunto de atos preparatórios de que a execução inicial prescindiu. Tudo ponderado, cremos conterem os autos elementos probatórios suficientes para sustentar a posição das Autora quanto ao valor despendido na reparação da obra executada pela demandada. Portanto, aditamos aos factos provados, sob o n.º 28, com a consequente eliminação dos factos não provados, o seguinte item: “O valor dos trabalhos efetuados pela autora para a cedente para correção do descrito em 24. cifrava em 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros)”.
Já quanto a um conjunto de factos não provados que o tribunal a quo considerou, de forma genérica, “careceram do necessário suporte probatório, e a demais matéria alegada e não mencionada representa substância irrelevante, conclusiva ou de argumentação jurídica, insuscetível de aproveitamento como facto”, nos parece que não há fundamentos probatórios bastantes para os reputar como demonstrados. Alguns deles constam da factualidade apurada mas de forma mais restritiva do que a pretendida pela Recorrente. Assim, diz ter alegado no n.° 37 da petição inicial que os defeitos foram, várias vezes, reconhecidos e assumidos pela Ré, tal como concretizou, em 15 e 47 da resposta, que a Ré reconheceu os defeitos denunciados e assumiu como sendo a sua reparação da responsabilidade de uma empresa por si subcontratada para fornecer material para a obra em causa, e nos n.ºs 38 da petição inicial e 16 e 48 da resposta, que a Ré garantiu, inclusivamente por escrito, que iria resolver o problema. Só que estes “factos”, para além de serem juízos conclusivos que o tribunal tem de extrair e a sentença apelada extraiu da realidade factual apurada, são irrelevantes para a matéria que, em via recursiva, deve ser apreciada.
Em verdade, a sentença recorrida decidiu que a Ré admitiu os defeitos da obra por si executada e considerou que isso traduziu a assunção dos defeitos. Só que, na análise da sentença recorrida, operou a caducidade do direito da Autora à tutela judiciária pretendida porque tinha um ano para interpor a ação desde a denúncia e veio a instaurá-la somente em 2017. Ora, todos os “factos” a que se reporta giram em torno da denúncia dos defeitos e da data em que ocorreu, questão que foi decidida em termos que lhe são favoráveis.
Identicamente, é também insignificante para a decisão jurídica a ampliação da matéria de facto provada quanto à especificação dos “defeitos” da obra realizada pela Ré, que estão apurados com suficiência bastante para garantir a procedência da ação, já que o que está verdadeiramente em causa é a caducidade do direito de ação. Pela mesma razão nos parece indiferente a pretendida prova de que os defeitos consistentes se ficaram a dever a problemas verificados na tinta adquirida pela Ré e por esta aplicada na obra e que isso era do conhecimento da Ré, que apesar disso ter sido confirmado pela testemunha D….
Defende o aditamento dos seguintes factos: “A Ré sabia que os defeitos consistentes na existência de machas pretas na pintura das fachadas se ficaram a dever a problemas verificados na tinta adquirida pela Ré/Apelada e aplicada por esta na obra em apreço, desde que «fez ver» o defeito ao seu fornecedor de tinta”, “Atribuía a responsabilidade pela eliminação dos defeitos nas fachadas à sua fornecedora da tinta que aquela aplicou nas fachadas da obra em apreço”; “Praticou vários atos com o objetivo de a sua fornecedora de tinta defeituosa reparar os defeitos”; “Intimou a sua fornecedora de tinta defeituosa para que reparasse os defeitos; “Assumiu, por escrito, que esses defeitos se deviam, então, única a exclusivamente a defeito do produto que a firma E… forneceu à Ré/Apelada para a realização da obra”; “Considerando fundamentada a insatisfação expressada pela cedente B1…, S.A., relativamente à qualidade dos produtos/serviços que aquela lhe havia fornecido; “Transmitiu à B1…, S.A., por escrito, ser sua política, nesse particular, a clareza e retidão no tratamento das queixas dos seus clientes e que sendo a queixa em causa fundamentada e por si verificada se impunha compensar a cedente B1…, S.A. pelas dificuldades que se vinham levantando, conforme vinha relatando”; e “Transmitiu à B1…., S.A., por escrito, que resultava imperioso resolver definitivamente os problemas até então existentes”.
Neste conspecto, a testemunha D… confirmou que a Ré executou bem os trabalhos e os fungos tiveram a sua origem na tinta aplicada, o que foi reclamado junto do fornecedor. E junto aos autos encontra-se a troca de correspondência eletrónica entre a Ré, a E…, fornecedora da tinta, e a empreiteira, toda ela datada de abril de 2013, na qual a Ré interpela a E… por causa das patologias, inscrevendo “estamos a ser pressionados pelo nosso cliente, que quer saber quem irá reparar as patologias descritas no e-mail anterior (…) caso queiram que seja a nossa empresa a reparar, queiram por favor adjudicar os valores do orçamento já dado e a fornecerem os materiais para se poder iniciar a reparação” (fls. 73 a 75). O documento de fls. 76, que corresponde a uma carta dirigida pelo ilustre mandatário da Ré à B1…, fundou a resposta dada pelo tribunal à “assunção” dos defeitos da obra, exarado sob o n.º 25 dos fundamentos de facto.
O teor destes documentos não foi impugnado pelas partes, que antes o aceitam e foi confirmado pela testemunha D…, por isso, damos por provado sob o n.º 29 “Em abril de 2013 a Ré assumiu que as patologias da obra resultaram da tinta aplicada e reclamou junto do seu fornecedor a sua reparação”.
No tocante à pretendida prova de “a cedente B1…, S.A. e a Ré/Apelada acordaram em que ficasse retida a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) pela B1…, S.A., até se resolver a situação com a E…” não lhe assiste razão. O contrato de subempreitada expressa a não retenção de quaisquer valores para efeitos de garantia de boa execução dos trabalhos (cl. 4.ª), mas a Autora assumiu reter a quantia de 2.000,00€ para tal efeito e comunicou-o à Ré, matéria já exarada sob o n.º 14 dos factos provados.
No que tange às missivas que a Autora dirigiu à Ré, encontram-se as mesmas juntas aos autos e não foram impugnadas pela Ré, mas as mesmas já se encontram referidas sob os n.ºs 13 a 19 e 26 dos factos provados. Quanto à não eliminação dos defeitos pela Ré está admitida pelas partes e não sofreu qualquer contestação da parte da Ré, resultando já da restante factualidade apurada, sem que seja necessário expressá-lo, não havendo lugar à menção de que os defeitos foram reconhecidos pela Ré, por envolver um juízo jurídicos que o tribunal só pode deduzir em sede de aplicação do direito.
Do expendido resulta a parcial procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, aditando-se aos factos provados os n.ºs 28 e 29 com o teor supra explicitado.
2. Factos provados
1. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à indústria de construção civil e obras Públicas e ao comércio de compra e venda de prédios.
2. No exercício da sua atividade, foi a Autora contratada pela sociedade comercial B1…, S.A., pessoa coletiva n.º ………, para executar trabalhos de reparação de pintura numa obra em que esta é empreiteira.
4. Os trabalhos supra referidos consistiram na reparação da pintura das fachadas da obra mencionada, eliminando os fungos nela existentes, e implementando as necessárias medidas de prevenção do seu reaparecimento no futuro
5. Estes trabalhos foram executados pela Autora.
6. E aceites pela Empreiteira e pelo dono da obra.
7. Tendo a Autora, no dia 10/10/2016, procedido à emissão e envio da respetiva fatura à empresa que a contratou (fatura n.º …../.. e respetivo Auto de Medição), a empreiteira referida em 2, no valor de 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros).
8. Remetida a citada fatura à Empreiteira, veio esta acordar com a Autora que uma parte do montante titulado pela mesma seria pago mediante cessão de um crédito da primeira sobre a Ré, na quantia de 6.250,00€ (seis mil duzentos e cinquenta euros).
9. Para formalização do acordo supramencionado, e da referida cessão de crédito, endereçou a Empreiteira à Autora uma missiva, datada de 13/10/2016.
10. Mediante a qual lhe transmitiu o seguinte: "No seguimento da execução dos trabalhos de reparação de pinturas das fachadas do Lar de Idosos da Associação para o Desenvolvimento da F…, eliminação dos fungos e prevenção da sua ocorrência no futuro, que vos encomendamos, pelo preço de 8.250,00€, constatamos que os referidos trabalhos foram devidamente executados, tendo sido dados por aceites por aquela Instituição."
11. Informou, ainda, a Empreiteira à Autora, que: “As deficiências verificadas na pintura, a cuja reparação V. Exas. procederam, são da responsabilidade do subempreiteiro C…, Lda., com sede na RUA … …. - … - VALONGO, que contratámos no âmbito daquela empreitada, para a execução da especialidade da pintura (conforme contrato de subempreitada anexo), o qual, por não ter utilizado tintas adequadas acabou por executar um trabalho com defeitos que, até esta data não se dignou a reparar, como estava contratualmente obrigado".
12. Nesta senda, explicou a Empreiteira, através da supramencionada carta, que não tendo a Ré cumprido a obrigação que lhe incumbia de reparar os defeitos verificados na pintura, seriam a esta última imputados os custos em que a Empreiteira incorreu com a contratação da Autora para executar essas reparações.
13. Tendo procedido, para o efeito, à emissão e envio da correspondente fatura à Ré, no preciso montante de 8.250,00€ (oito mil duzentos e cinquenta euros), conforme fatura n.º ……./..
14. Concluiu, a Empreiteira, a sua missiva, comunicando à Autora que, embora credora da Ré, nos termos vindos de expor, era também devedora da mesma na quantia de 2.000,00€ (dois mil euros), motivo pelo qual se impôs a devida compensação entre os dois créditos, da qual resultou, então, o crédito de 6.250,00€ (seis mil, duzentos e cinquenta euros), então cedido.
15. Assim, a Autora remeteu à Ré, no dia 14/10/2016, notificação da cessão de crédito atrás explicitada.
16. Acompanhada da fatura n.º …../. e a nota de pagamento da qual resulta o invocado crédito de 2.000,00€ (dois mil euros), de que seria detentora a Ré.
17. Através dessa missiva, a Autora interpelou a Ré para que efetuasse o pagamento dos 6.250,00€ (seis mil duzentos e cinquenta euros) no prazo de 30 (trinta) dias.
18. Interpelação que, não tendo sido atendida pela Ré, veio a reiterar mediante nova missiva, remetida no dia 10/11/2016.
19. Concedido então o novo prazo de 20 dias para a Ré satisfazer o crédito de que a Autora é sobre ela detentora, manteve-se, a mesma, em incumprimento.
20. No contrato de subempreitada que celebrou com a aqui Ré, datado de 17/01/2012 - mediante o qual, foi a aqui Ré contratada pela Empreiteira para a execução da subempreitada de fornecimento e execução do sistema “capotto” da empreitada “Construção do Lar de Idosos F… – …”, adjudicada à última, pela Associação para o Desenvolvimento da Freguesia F… -, encontra-se prevista a obrigação de a subempreiteira - Ré na presente ação - proceder às reparações que lhe forem solicitadas para corrigir quaisquer defeitos imputáveis à imperfeita execução dos trabalhos e/ou deficiência de equipamento, em prazo a indicar pela Empreiteira, nunca superior a 10 (dez) dias após a denúncia dos defeitos - cfr. cláusula 5.a b) do Contrato de Subempreitada.
21. Tendo as partes no contrato clausulado, ainda que “Se o 2.º OUTORGANTE [Le. a subempreiteira, aqui Ré] não efetuar as reparações previstas na cláusula anterior, poderá PRIMEIRO OUTORGANTE [a Empreiteira] proceder às reparações que se mostrem necessárias, sendo os custos daí provenientes imputados à subempreiteira.
22. Este contrato estipula a finalização dos trabalhos até ao dia 06/08/2012.
23. E dispõe que, "O período de garantia de todos os trabalhos que constituem a subempreitada [ ... ] é de sessenta meses a contar da realização da receção provisória - conforme cláusula 5.a a) do Contrato de Subempreitada.
24. A existência de fungos na pintura exterior da obra resultantes da tinta aplicada pela Ré foi comunicada pela empreiteira à aqui Ré, em 9 de maio de 2013.
25. E esta admitiu a sua existência e a necessidade do seu arranjo em 20 de junho de 2013.
26. Por carta datada de 27 de julho de 2016, a cedente esclareceu a Autora, que os defeitos de pintura a que se referiu no passado se tratam de “manchas escuras”/“pintas negras” verificadas em alguns locais do edifício objeto da subempreitada, resultantes da existência de fungos na tinta adquirida e aplicada pela aqui Ré, nesses locais.
27. A empreiteira/cedente tem sede no lugar …, …, em Lousada.
28. O valor dos trabalhos efetuados pela autora para a cedente para correção do descrito em 24 cifrava-se em 8.250,00€ (oito mil, duzentos e cinquenta euros) (aditado pela Relação).
29. Em abril de 2013 a Ré assumiu que as patologias da obra resultaram da tinta aplicada e reclamou junto do seu fornecedor a sua reparação (aditado pela Relação).
3. Enquadramento jurídico
3.1. Cessão de créditos
Como afirma sentença recorrida, o crédito reclamado pela Autora foi-lhe cedido pela empreiteira B1…, S.A., que havia celebrado com o Lar de Idosos F… a execução de uma construção que envolveu, além do mais, a execução de capotto e pintura de uma determinada parte da obra que foi subempreitada à demandada e veio a revelar patologias.
No que respeita à cessão de créditos, tal como reconhece a decisão impugnada, não se antolha qualquer obstáculo à sua operatividade.
A cessão de créditos consiste na sua transmissão, total ou parcial, para um terceiro, podendo ocorrer independentemente do consentimento do devedor (artigo 577º/1 do CC). Não havendo, no caso, qualquer limitação convencional à cessão de créditos, também ela não está excluída pela própria natureza da prestação, ligada à pessoa do credor, pois se assim fosse não faria sentido obrigar o devedor a prestar perante pessoa diferente. Estão nessa situação “(…) os créditos de onde resulte uma dependência pessoal entre credor e devedor, como o contrato de serviço doméstico, e ainda os créditos em que se tomem em especial consideração as qualidades ou condições do credor, como a prestação de serviço dos médicos ou dos advogados. Em todas estas situações a prestação encontra-se intimamente ligada à pessoa do credor, não sendo assim admitida a cessão, uma vez que ela implicaria sujeitar o devedor a ter que realizar a prestação a pessoa diferente daquela em relação à qual a prestação se encontra, por natureza, intimamente ligada” [1]. Portanto, por esta via de enquadramento, estão excluídos da cessão os créditos cuja prestação se traduz numa conduta cuja natureza está ligada à pessoa do credor, devendo representar para o devedor uma diferença relevante entre cumprir a prestação perante o credor inicial ou perante o cessionário.
In casu, trata-se da cedência a terceiro de um crédito da empreiteira sobre a subempreiteira resultante da reparação dos defeitos da obra por esta executada, que corresponde, no fundo, à cedência a outrem do seu direito de receber o valor pecuniário derivado da eliminação dos defeitos da obra executada pela subempreiteira, aqui demandada pelo cessionário. Está em causa uma prestação de natureza pecuniária, sendo irrelevante para o seu cumprimento uma alteração do credor. Para a devedora é indiferente que a pessoa a quem deve satisfazer a prestação seja diversa daquela perante quem assumiu a obrigação de executar a obra em conformidade com o contratado.
As qualidades do credor e do devedor podem ser relevantes na celebração do contrato de empreitada ou subempreitada, se estiver em jogo a tarefa a executar, porque está ligada, além do mais, à capacidade técnica do devedor. Contudo, já não está em causa a execução da obra, mas o pagamento do preço correspondente à eliminação do défice da sua execução, elemento de natureza estritamente pecuniária que não tem influência no devedor, que sempre estará adstrito, se ocorrerem os respetivos pressupostos, a realizar o pagamento[2].
Ademais, com a cessão mantêm-se incólumes os meios de defesa do devedor que pode opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com ressalva dos que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão (artigo 585º do CC).
Ante o exposto, sendo válida e eficaz a cessão à Autora do crédito aqui reclamado, cabe-nos indagar da sustentabilidade dos argumentos opostos pela devedora para enjeitar a sua responsabilidade.
3.2. A subempreitada
A subempreitada é o contrato pelo qual alguém (o subempreiteiro) assume a obrigação de realizar a obra ou parte da obra que o empreiteiro se comprometeu a executar pela celebração do contrato de empreitada, mediante o recebimento de um preço a pagar pelo empreiteiro (artigo 1213º/1 do CC). Trata-se de um tipo específico de subcontrato, adveniente de um contrato de empreitada celebrado pelo empreiteiro com o dono da obra. Neste contrato de subempreitada o empreiteiro assume a posição do dono da obra e a sua necessária funcionalização em relação ao contrato de empreitada pode fazer repercutir as vicissitudes da execução deste naquele. Por isso se afirma que se trata de um fenómeno de conexação internegocial, com reflexo no regime jurídico destes dois contratos[3].
Ainda assim, apesar de o subempreiteiro se vincular a realizar, parcial ou totalmente, a prestação que o empreiteiro assumiu perante o dono da obra, aquele não tem com este qualquer vinculação negocial, mas são aplicáveis à subempreitada as regras especialmente previstas para o contrato de empreitada, assumindo, como antecipámos, o empreiteiro a posição do dono da obra e o subempreiteiro o papel do empreiteiro. Por isso, as consequências do cumprimento defeituoso da prestação por parte do subempreiteiro repercutem-se no contrato base e desencadeiam reações do dono da obra perante o empreiteiro que, por sua vez, tem de reagir junto do subempreiteiro. Não obstante a situação não se encontrar claramente delineada pela Autora, intuímos que foi precisamente o que ocorreu na situação submetida à nossa apreciação: o subempreiteiro, a sociedade ora demandada, executou deficitariamente a parte da obra cuja realização contratou com a empreiteira e o dono da obra reclamou junto desta a eliminação dos defeitos. Ora, assim como o empreiteiro é responsável perante o dono da obra pela eliminação dos defeitos também o subempreiteiro assume idêntica responsabilidade perante o empreiteiro. Com efeito, à subempreitada aplicam-se as regras da empreitada, incluindo os prazos de caducidade, estabelecidos em favor do dono da obra mas também do empreiteiro e válidos, portanto, em relação ao subempreiteiro[4].
Ante a factualidade provada, é patente que a subempreita executou a parte da obra contratada com a empreiteira com deficiências, traduzidas em vícios qualitativos, quando constitui obrigação do subempreiteiro executar a obra sem defeitos, os quais são tidos como os vícios que excluem ou reduzem o valor da obra ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato, e as desconformidades com o que foi convencionado (artigos 1208º e 1218º do CC).
O cumprimento defeituoso, designado na doutrina alemã por violação contratual positiva, faz impender sobre o empreiteiro a correspondente responsabilidade contratual, ou seja, faz recair sobre ele a obrigação de reparar os danos causados ao dono da obra com o seu comportamento inadimplente. É uma das espécies da figura genérica do cumprimento inexato, aquele em que a prestação efetuada não tem os requisitos idóneos a fazê-la coincidir com o conteúdo do programa obrigacional, tal como resulta do contrato e do princípio geral de correção e boa fé[5]. Foi no cumprimento deste dever que o empreiteiro incumbiu terceiro de eliminar os defeitos, executando a obra em conformidade com as especificidades técnicas exigidas, porque a subempreiteira o não fez. Esta, admitindo a deficiente execução da obra, considerou que as deficiências em causa não resultaram de culpa sua mas da qualidade, ou falta dela, dos produtos por si usados, em concreto da tinta comprada à E…. Posição que assumiu e que expressou junto da fornecedora de tintas que, contudo, não assumiu a sua responsabilidade. Daí que esteja demonstrado que, em 09/05/2013, a empreiteira tenha comunicado à Ré a existência de fungos na pintura exterior da obra resultantes da tinta aplicada e esta admitiu tais defeitos e a necessidade da sua reparação em 20/06/2013 (n.os 24 e 25 dos factos provados).
Recai sobre o dono da obra (leia-se, aqui, empreiteiro) o ónus da denúncia dos defeitos, em prazos curtos, após o seu conhecimento, sob pena de caducidade dos direitos que lhe assistem em consequência do cumprimento defeituoso. Assim, estatui-se um prazo geral de 30 dias para o dono da obra denunciar ao empreiteiro os defeitos de que tomou conhecimento (artigo 1220º, 1, do Código Civil), mas no caso de empreitadas que tenham por objeto a construção, modificação ou reparação de imóveis destinados por sua natureza a longa duração, a denúncia dos defeitos deverá ser feita no prazo de um ano a contar da sua descoberta (artigo 1225º, 2, do Código Civil[6]). É um prazo de caducidade, que se não suspende nem interrompe e que se conta desde o dia seguinte àquele em que o dono da obra teve conhecimento do defeito, mas não basta que ele tenha suspeitado da sua existência, é necessária a prova de um conhecimento perfeito, efetivo e seguro da deficiência da obra[7]. Prazo que representa o equilíbrio entre o interesse do empreiteiro na rápida definição da sua responsabilidade e o interesse do dono da obra em que a denúncia só lhe seja exigível após indagação que lhe permita estar ciente da existência do vício e apto a concluir pela sua gravidade[8].
A denúncia pode operar-se por qualquer forma e torna-se eficaz logo que chega ao conhecimento do empreiteiro, valendo apenas para os defeitos especificamente denunciados, sem qualquer eficácia relativamente àqueles que não constam dessa declaração denunciativa.
A este respeito está adquirido que, no tocante aos defeitos em causa, a empreiteira os denunciou à Ré em 09/05/2013 e a sentença recorrida considerou que a demandada assumiu, em 20/06/2013, a existência de tais defeitos, mas concluiu que o empreiteiro tinha, desde então, o prazo de um ano para reclamar os seus direitos junto do subempreiteiro e como a ação só foi interposta em 31/03/2017, foi esse seu direito afetado pela caducidade.
3. A caducidade do direito da demandante a tutela judiciária
Não estando em causa uma empreitada de consumo, o exercício do direito à eliminação dos defeitos deve ser feito no prazo de um ano a contar da denúncia (artigo 1225º, 2 e 3, do CC). Prazo que se destina a proporcionar a ambas as partes o apuramento da imputabilidade do defeito, consequente ao seu conhecimento por ambas, e, obtido um juízo de certeza, proporcionar a sua subsequente eliminação ou reparação pelo empreiteiro ou o recurso do dono da obra a juízo[9]. Ora, é seguro que nem a empreiteira nem a cessionária instauraram a ação no prazo de um ano a contar da denúncia, juízo simplista que levou a sentença recorrida a concluir pela caducidade desse direito. Porém, a caducidade pode ser impedida pelo reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido (artigo 331º/2 do CC). Só que o “simples reconhecimento do direito, antes do termo da caducidade, por aquele contra quem deve ser exercido, não tem relevância se, através desse reconhecimento, se não produzir o mesmo resultado que se alcançaria com a prática tempestiva do acto a que a lei ou uma convenção atribuam efeito impeditivo. Só nos casos em que o reconhecimento assuma o mesmo valor do acto normalmente impeditivo é que deixará de verificar-se a caducidade”[10]. Aqui está em causa a caducidade do direito de propositura de uma ação e, nesse âmbito, o reconhecimento deve ser franco, certo, inequívoco, ou seja, “deve ser tal que torne o direito certo e faça as vezes da sentença pela qual o direito fosse reconhecido”[11].
A sentença recorrida considerou que a assunção pelo empreiteiro dos defeitos equivale à sua denúncia, mas omitiu qualquer referência aos efeitos que daí pudessem advir, antes fazendo crer, ao declarar a caducidade, que aquela assunção não correspondeu a reconhecimento do direito da empreiteira/cessionária. Portanto, tudo está em saber se esta atitude da Ré tornou certa, consolidou e esclareceu a situação jurídica da titular do direito[12]. E temos alguma dificuldade em antever a inequivocidade da assunção de responsabilidade pela Ré quando está também demonstrado que, antes, em abril de 2013, ela assumiu que as patologias da obra resultaram da tinta aplicada e reclamou junto do seu fornecedor a sua reparação. É claro que esse “deferimento” da responsabilidade para o fornecedor não a libera da sua própria responsabilidade, que resulta da lei, e que poderá exercitar também, ao menos em via de regresso, junto do seu fornecedor.
Movemo-nos em matéria não excluída da disponibilidade das partes e, portanto, consideramos que se é a subempreiteira a reconhecer a existência do direito da empreiteira, mesmo que não pratique os atos equivalentes à sua realização, não há fundada razão para manter a proteção de uma situação de incerteza que já se não verifica[13].
A mera admissão dos defeitos e a necessidade da sua reparação não traduz, só por si, a inequivocidade do direito da cessionária à realização da eliminação dos defeitos e, portanto, não existindo reconhecimento que impeça a caducidade, caducou o direito da Autora à eliminação dos defeitos. Cremos ser menos rigorista o reconhecimento, para efeitos do impedimento do prazo de caducidade da denúncia dos defeitos, do que para o impedimento da caducidade do direito de ação. Naquele exige-se apenas um ato demonstrativo do conhecimento pelo subempreiteiro da existência de defeitos na obra por si realizada e não a assunção da responsabilidade pela sua eliminação, mas para impedir a caducidade do direito de ação o reconhecimento deve tornar o direito certo, porque tem o mesmo efeito que a sentença que reconhece o direito.
A jurisprudência tem entendido que equivale ao reconhecimento do direito do empreiteiro as tentativas de correção dos vícios da obra, embora infrutíferas, com uma dupla ordem de razões. Por um lado, o princípio da confiança, integrado na cláusula geral da boa fé no cumprimento dos contratos e resultante da proscrição do abuso de direito, que obsta a que o contraente que tentou corrigir o defeito denunciado venha ulteriormente, contra facto próprio, invocar a caducidade, em consequência da conduta daquele que confiou justificadamente na seriedade do propósito da correção do vício e, por via disso, não atuou antes em juízo, na expetativa da resolução do problema. Por outro lado, valoriza-se a desnecessidade de tutela judiciária do dono da obra enquanto persistirem indícios consistentes de que o empreiteiro se compromete a realizar as intervenções técnicas necessárias e adequadas para identificar e remover os defeitos[14].
Se, por um lado, não dispõe o tribunal de elementos factuais bastantes para aferir no sentido de qualquer conduta da Ré violadora da boa fé, por outro, não está demonstrado que a Ré envidasse uma qualquer tentativa de correção dos vícios da obra. Ao invés, antes nos parece que os seus contactos com a empreiteira no sentido de lhe transmitir que estava a comunicar ao seu fornecedor os defeitos da tinta e que aguardava que o mesmo se responsabilizasse, antes faz intuir, a qualquer médio declaratário, que não está disponível para suprir tais vícios. Logo, teria sido avisado da parte da empreiteira acionar a Ré em observância dos prazos legais estabelecidos e, não o tendo feito, antes cedeu o crédito correspondente a terceiro que se vê confrontado com a exceção da caducidade. E se não há justificação para a tutela da eventual boa fé da empreiteira também não há para a proteção da cessionária, aqui demandante, que estava em condições de averiguar, antes da cessão, a realizabilidade do seu direito. A cessão só ocorreu em 2016, cerca de três anos depois da denúncia dos defeitos pela cedente, o que teria permitido à cessionária acautelar previamente os direitos derivados da cessão.
Defende-se que o direito de indemnização do incumprimento definitivo de um dos direitos cujo exercício está sujeito àqueles curtos prazos de caducidade está sujeito ao prazo de prescrição ordinária dos direitos (artigo 309º do CC). Já quando esse direito de indemnização não resulta de um incumprimento definitivo, mas de uma simples substituição da modalidade de indemnização a que o subempreiteiro ficou adstrito pelo cumprimento defeituoso, continuam a aplicar-se aqueles prazos curtos de caducidade[15].
É certo ter a Ré alegado, na resposta, que a Ré incumpriu definitivamente a obrigação de eliminar os defeitos, mas não caracterizou factualmente essa alegação e a verdade é que vem exercitar o direito ao reembolso dos custos do seu direito à eliminação dos defeitos.
O contrato de subempreitada clausulava a possibilidade de ser a empreiteira a proceder à reparação dos defeitos da obra e imputar os custos à subempreiteira caso esta não efetuasse a respetiva reparação [cláusula 56.ª, c)]. Ora, o que está exatamente aqui pedido, tal como o expressa a Recorrente, é o custo desses trabalhos de reparação, que representam a substituição do direito da Autora à eliminação dos defeitos. Donde continuem a convocar-se estes curtos prazos de caducidade, impondo-se a confirmação da sentença recorrida.
O artigo 1226º do CC confere ao empreiteiro o direito de regresso contra o subempreiteiro quanto aos direitos que lhe são conferidos pelas específicas normas da empreitada. Direito que caduca se este não comunicar ao subempreiteiro a denúncia dos defeitos efetuada pelo dono da obra nos 30 dias seguintes à sua receção. Prazo esse que, embora curtíssimo, também extensivo aos imóveis de longa duração, o que bem se compreende porque, neste caso, basta ao empreiteiro transmitir a comunicação do dono da obra a propósito dos defeitos. Neste âmbito, recai sobre o dono da obra o ónus de denunciar ao empreiteiro os defeitos para este poder exercitar o seu direito de regresso sobre o subempreiteiro. Esta comunicação constitui uma condição do exercício do direito de regresso do empreiteiro, cujo ónus da prova sobre ele impende (artigo 342º/1 do CC)[16]. A autora omitiu qualquer alegação sobre essa matéria, embora resulte dos articulados de ambas as partes a aceitação de que o dono da obra comunicou os defeitos à empreiteira e esta à subempreiteira. Contudo, não vem exercitado o direito de regresso, porque este deve corresponder ao direito que o dono da obra exerceu perante o empreiteiro e aqui vem pedida a indemnização pelos custos de eliminação dos defeitos realizada por terceiro[17]. Ainda assim, mesmo no exercício do direito de regresso seria convocável o prazo de caducidade do direito de ação excecionado pela Ré.

Regime de custas: Decaindo na apelação, cabe à Recorrente o encargo com as respetivas custas (artigo 527º/1 do CPC).
IV. Dispositivo
Na defluência do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, em confirmar a sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo da Recorrente.
*
Porto, 13 de junho de 2018.
Maria Cecília Agante
José Carvalho
Rodrigues Pires
______
[1] Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. II, Almedina, 2016, 10ª ed., págs. 20/21.
[2] In www.dgsi.pt: Ac do STJ de 23/11/2017, processo 1083/16.7T8VNG.P1.S1.
[3] João Cura Mariano, Responsabilidade do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, 2013, 5.ª ed., revista e aumentada, pág. 212.
[4] Pedro Romano Martinez, Contrato de Empreitada, Almedina, 1994, pág. 126.
[5] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 7ª ed., pág. 948, nota 1.
[6] Na redação dada pelo Decreto-Lei 267/1994, de 25 de Outubro, à qual se reportará a norma sempre que a mencionarmos; Pedro Romano Martinez, Contrato de Empreitada, 1994, pág. 218.
[7] João Cura Mariano, ibidem, pág. 11; Pedro Romano Martinez, ibidem, pág. 204.
[8] Lebre de Freitas, in “O Direito”, ano 131, 1999, I-II (Janeiro/Junho), pág. 243.
[9] Lebre de Freitas, ibidem, pág. 244.
[10] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, Coimbra Editora, 4.ª ed. revista e atualizada, págs. 295 e 296.
[11] Vaz Serra, in BMJ n.º 107, sob o n.º 118.
[12] Vaz Serra, in RLJ, ano 107º, pág. 24.
[13] João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Almedina, 2013, 5.ª ed. revista e aumentada, págs. págs. 152/153.
[14] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 18/09/2014, processo 1857/09.9TJVNF.P1.S1; 09/07/2015, processo 3137/09.7TBCSC.L1.S1; 01/10/2015, processo 279/10.0TBSTR.E1.S1.
[15] João Cura Mariano, ibidem, pág. 155.
[16] João Cura Mariano, ibidem, pág. 218.
[17] João Cura Mariano, ibidem, pág. 220.