Acórdão do Tribunal da Relação do Porto  | |||
| Processo: | 
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | DOMINGOS MORAIS | ||
| Descritores: |  INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS LABORAIS TRABALHADOR COM RESPONSABILIDADES FAMILIARES HORÁRIO DE TRABALHO ALTERAÇÃO FLEXIBILIDADE FUNCIONAL APOIO À FAMILIA  | ||
| Nº do Documento: | RP2021041914789/20.7T8PRT.P1 | ||
| Data do Acordão: | 04/19/2021 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
| Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: |  I - A alteração/flexibilização do horário de trabalho de trabalhador com responsabilidades familiares é um direito constitucional consagrado nos artigos 59.º, n.º 1, b) e 67.º, n.º 2, h) da Constituição República Portuguesa, bem como no artigo 56.º do Código do Trabalho.  II - Na interpretação dos citados normativos, são de aplicar as regras gerais do artigo 9.º do Código Civil, bem como as regras especiais do Código do Trabalho, como o princípio do favor laboratoris, não devendo o intérprete ignorar o contexto social dessa aplicação: uma sociedade que envelhece a “olhos vistos”, por força da baixa natalidade, e na qual aumentam as famílias monoparentais. III - A circunstância de trabalhadora com filho menor de 12 anos, cujo infantário fecha às 18.00h, e sem qualquer outro apoio – familiar ou institucional -, constitui exigência substancial que limita o empregador na sua faculdade de alterar o horário de trabalho para além dessa hora. IV - Diferente interpretação dos citados normativos vota ao fracasso a prescrição constitucional da conciliação da actividade profissional com a vida familiar do trabalhador.  | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: |  Proc. n.º 14789/20120.7T8PRT.P1   Origem: Comarca do Porto Porto Juízo Trabalho J1 Relator - Domingos Morais – Registo 905Adjuntos - Paula Leal de Carvalho Rui Penha Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:  1. - B… instaurou procedimento cautelar, não especificado, na Comarca do Porto-Porto-Juízo Trabalho-J1, nos termos do artigo 32.º do Código do Trabalho, contra C…, S.A., alegando, em síntese, que: I – Relatório A requerente e a requerida assinaram um contrato individual de trabalho em Maio de 2011. Por esse contrato comprometeu-se a Requerente a prestar as funções inerentes à actual categoria profissional de Operadora, na loja D…/…, Porto. Em 05 de maio de 2020, a Requerente enviou aos recursos humanos da Requerida um requerimento solicitando a atribuição da modalidade de trabalho em regime de horário flexível organizado das 08h00 às 18h30, nos termos dos artigos 56º e 57º do Código do Trabalho. (doc.1). Tal pedido deve-se às dificuldades crescentes que a Requerente enfrenta para cuidar do seu filho menor, com idade inferior a 2 anos, que dela depende em termos de apoio, assistência, e acompanhamento, uma vez que o seu companheiro trabalha na E…, Lda. e não consegue prestar auxílio, nem requereu a flexibilidade de horário. O pedido recepcionado pela Requerida obteve resposta a 14.05.2020 (ref. DRH- 466/2020). (Doc 2). Segue-se inúmera correspondência que termina após parecer do CITE com uma proposta de horário, nos termos que se seguem: (doc.3) Na verdade, a Requerida vem fixar um período de segunda a sexta-feira obrigatório entre as 15h15m e as 19h15m. Um intervalo de descanso de 1 hora e meia, exceto aos sábados e feriados em que o intervalo de descanso será de 1 hora, atento o período de funcionamento da loja. Um período de entrada de segunda a sexta-feira entre as 09h45m e as 10h45m e um período de saída entre as 19h15m e as 20h15m. Aos sábados e feriados, o período de entrada situar-se-á entre as 08h45 e as 09h15 e o período de saída entre as 17h45 e as 18h15. Ou seja, a Requerida não aceita a posição favorável emanada pelo Parecer CITE – Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego - n.º 288/CITE/2020 e fixa um período obrigatório das 15h15 às 19h15m, diferente daquele que foi requerido, e que se traduz numa recusa do pedido de flexibilidade da trabalhadora e que compromete irremediavelmente a possibilidade de assistência a filho menor, uma vez que contende com o horário de fecho do infantário, 18h00, conforme é do conhecimento da C…. (doc.3) A Requerente respondeu esclarecendo que não há qualquer aceitação do pedido, mas antes um incumprimento do Parecer do CITE, em violação do disposto no n.º 7 do art. 57º do Código de Trabalho, persistindo intencional e ilicitamente em não adequar o horário de trabalho nos termos requeridos. (doc.4). Terminou, pedindo: “deve a presente providencia cautelar ser decretada e, por conseguinte, requer-se a V. Exa.: a) A declaração da ilicitude da recusa da Requerida em atribuir à Requerente o horário de trabalho dentro dos períodos de início e termo por esta solicitada, para poder apoiar e acompanhar o seu filho menor. b) A fixação, ainda que provisória, à Requerente do horário dentro do período solicitado e a imediata suspensão da aplicação do horário de fecho, 10h 45, 20h15m.” c) A condenação em custas e procuradoria na parte disponível. Termos em que deve, provisoriamente, ser decretada a presente Providência sem audiência da requerida, após o que se deverá citar esta para que conteste, querendo, seguindo os demais termos até final.”. 2. – A requerida deduziu oposição, alegando, em síntese, que: “A Requerida desconhece se a factualidade apresentada é verdadeira, porém sabe que até ao pedido de flexibilidade a Requerente cumpriu com os horários que lhe foram ordenados sem levantar qualquer questão, E que mesmo depois dessa data, como aliás confessa a Requerente, também continuou a cumprir com os horários fixados, Com mais ou menor facilidade, como aliás é o normal para todas as pessoas que trabalham e têm filhos. Razão pela qual, e em suma, nenhuma urgência ou perigo existe para o putativo direito alegado pela Requerente, termos em que, não se verificando qualquer perigo na demora, nenhuma razão haverá para se decretar a presente providência.”. 3. - Realizada a audiência final, a Mma Juiz proferiu decisão: “Termos em que julgo parcialmente procedente a presente providência cautelar e, em consequência: ………………………………….. ………………………………….. ………………………………….. 5. - A requerente contra-alegou, concluindo: ………………………………….. ………………………………….. ………………………………….. 6. - A Mma. Juiz proferiu despacho: “Por legal e tempestivo, admito o recurso interposto pela Requerida, como apelação para o Tribunal da relação do Porto, com subida imediata, nos autos – cfr. artigos 644.º, n.º 1, al. a) e 645.º, n.º, al. a), ambos do C.P.C.. Do efeito do recurso: Veio a recorrente requerer o efeito suspensivo ao abrigo do disposto no artigo 647.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, referindo que “esta decisão causa prejuízo considerável à Recorrente pelo facto de ser obrigada a fixar um horário incompatível com o horário de funcionamento da loja (ver facto 14 da matéria de facto). Além disso, a responsável de loja e superiora hierárquica da Recorrida (F…) manifestou já em Julho de 2020 através de uma carta que lhe foi dirigida o seu descontentamento e revolta perante o peticionado pela mesma (dando-se o seu conteúdo aqui por integralmente reproduzido), pois tal obrigaria (como irá obrigar caso não seja atribuído efeito suspensivo ao presente recurso) a mesma a fazer sempre o horário de encerramento da loja – cfr. documento que se junta para todos os devidos efeitos legais como Doc.1.” A Requerente/recorrida opôs-se à atribuição do efeito suspensivo ao recurso. Cumpre decidir: Como resulta do facto provado em 18 “Até 18 de Setembro a Requerente conseguiu que a Requerida mantivesse horário compatível com o infantário do menor.” Da motivação aos factos não provados resulta que a Requerente “explicou que na loja em que trabalha, além de duas funcionárias com horário de 8h diárias (ela e a responsável F…), ainda trabalham duas funcionárias a tempo parcial e que cobrem três turnos: das 11h-15h; das 13h-17h; das 16h-20h.” Por outro lado, não obstante a data da carta que a recorrente agora junta sob doc.1, desconhece-se a data em que o mesmo foi emitido ou enviado à Requerida. E, tal documento não foi junto com os articulados, pelo que não pode ser considerado – cfr. art.º 425.º do C.P.C.. Não se afigura, pois, poder concluir pelo “prejuízo” a que alude a recorrente. Termos em que atribuo efeito devolutivo ao presente recurso. * Das nulidades da sentença, invocadas pela recorrente:Não se verificam as nulidades invocadas. A recorrente invoca que a sentença é: “i) nula por estar assente numa conclusão (e não em factos);” “ii) nula por omissão de pronuncia pois revelou-se uma “Decisão Surpresa” No que à alegação de se revelar uma “Decisão Surpresa” diz respeito, foi cumprido o contraditório da requerida e a sentença apenas aprecia as questões suscitadas pelas partes, não se verificando a apontada nulidade. No que à alegação de a sentença ser nula por estar assente numa conclusão (e não em factos), admitindo-se que o facto provado em 17 seja algo conclusivo, no âmbito das providências cautelares estamos perante factos indiciários, nem sempre concretizados com a mesma precisão. Não obstante, a decisão proferida não assenta neste facto, como pretende a recorrente. Refere-se na decisão recorrida: “Consta ainda da factualidade (indiciariamente) assente que o infantário do filho da Requerente fecha às 18h; que a Requerente não tem meios, nem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30; e que até 18 de setembro a Requerente conseguiu que a Requerida mantivesse horário compatível com o infantário do menor. “Ora, fixar o período de presença obrigatória da Requerente entre as entre as 15h15m e as 19h15m, de segunda a sexta, limitando o período para o termo do trabalho normal diário a uma hora (entre as 19h15 e as 20h15, dado ser esta a hora de fecho do estabelecimento), não cumpre o limite legal previsto no art.º 56.º, n.º 3, al. b) do Código do Trabalho, que prevê que tal período não possa ter duração inferior a um terço do período normal de trabalho diário, sem que a Requerida tenha aduzido qualquer razão justificativa para tal, sendo certo que resulta também da factualidade indiciariamente apurada que até 18 de Setembro a Requerente conseguiu que a Requerida mantivesse horário compatível com o infantário do menor. Não se compreende o que mudou, até porque a Requerida não o refere, não apresentando qualquer razão que implique a presença obrigatória da Requerida até às 19h15, de segunda a sexta.” Ainda que suprimindo o facto “a Requerente não tem meios, nem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30”, a decisão está devidamente fundamentada.”. 7. - O M.º Público emitiu parecer, no sentido da improcedência do recurso. 8. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * 1. - Na primeira instância, foi proferida a seguinte decisão de facto:II. - Fundamentação de facto 1. Requerente e Requerida assinaram um contrato individual de trabalho em maio de 2011, mediante o qual a Requerente comprometeu-se a prestar as funções inerentes à actual categoria profissional de Operadora, na loja D…/…, Porto. 2. Em 05 de maio de 2020 a Requerente enviou aos recursos humanos da Requerida um requerimento solicitando a atribuição da modalidade de trabalho em regime de horário flexível organizado das 08h00 às 18h30, nos termos dos artigos 56º e 57º do Código do Trabalho. (cfr. doc.1 junto com o requerimento inicial) 3. A Requerente tem um filho menor, com idade de 2 anos (nascido em 20/08/2018). 4. O pedido rececionado pela Requerida obteve resposta a 14.05.2020 (ref. DRH-466/2020) (cfr. Doc 2 junto com a petição inicial). 5. Seguiu-se inúmera correspondência que termina após parecer do CITE com uma proposta de horário, em que a Requerida fixou um período de segunda a sexta-feira obrigatório entre as 15h15m e as 19h15m (cfr. doc. 3 junto com o requerimento inicial). 6. Fixou um intervalo de descanso de 1 hora e meia, exceto aos sábados e feriados em que o intervalo de descanso será de 1 hora atento o período de funcionamento da loja. 7. Fixou um período de entrada de segunda a sexta-feira entre as 09h45m e as 10h45m e um período de saída entre as 19h15m e as 20h15m. 8. Fixou, aos sábados e feriados, o período de entrada entre as 08h45 e as 09h15 e o período de saída entre as 17h45 e as 18h15. 9. A Requerida não aceitou a posição favorável emanada pelo parecer da CITE, n.º 288/CITE/2020 e fixou um período obrigatório das 15h15 às 19h15m. 10. A Requerente respondeu à Requerida referindo: “… a resposta apresentada corresponde a uma recusa no cumprimento do Parecer do CITE n.º 288/CITE/2020.” “Na verdade pese embora referirem aceitar a “recente posição emanada pela CITE”.. referem que o mesmo não será “nos termos por si preconizados”, avançando com a fixação de um período obrigatório das 15h15m às 19h15m que inviabiliza o pedido de horário flexível e corresponde em rigor ao incumprimento do determinado no Parecer a que se alude em violação do disposto no art. 57º n.º 7 do CT.” (…) “Ora conforme se encontra claramente vertido no ponto 2.31 o que transcreve, “2.31 quanto ao argumento da entidade empregadora onde alega que o horário proposto pela trabalhadora não se enquadra no esquema organizativo da empresa, cumpre referir que tal argumento é improcedente, uma vez que a trabalhadora oferece uma amplitude de 9h 30m (8 horas -18.30) que permite à entidade empregadora atribuir-lhe um horário, em pelo menos, um dos turnos existentes na Loja (Loja 8h 45m – 18h 15 m)” e no ponto 2.32 e 2.33 onde esclarece que o trabalhador deve indicar os limites de inicio e termo diário e semanal do seu horário de trabalho, por ser a única forma de cumprir o desiderato das normas em apreço que é “a conciliação da atividade profissional com a vida familiar” podendo em última instancia acabar por corresponder a um horário fixo.”. 11. A Requerida não intentou nenhuma ação judicial. 12. O local de trabalho da Requerente tem a particularidade de ter fixado um dia para a encomenda de produtos. Neste momento até tem dois dias fixos, segunda e quarta-feira, receção de camião às quartas e sextas e recolha de valores no mesmo dia de manhã (quarta-feira). 13. Sendo difícil, estando uma funcionária sozinha, fazer essas tarefas e ainda fazer caixa e atendimento ao cliente. 14. O horário da loja onde trabalha a Requerente é o seguinte: - Nos dias de semana, com abertura às 08:45h e fecho às 20:15h; - Nos sábados e dias feriados, com abertura às 08:45h e fecho às 18:15h; - A loja encerra aos domingos. 15. O infantário do filho da requerente fecha às 18h. 16. Com início no dia 21 de setembro, a Requerente tem fixado um horário das 10h45m às 20h15m. 17. A Requerente não tem meios, nem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30. – alterada a sua redacção, nos termos infra consignados, para: “17. A Requerente não tem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”. 18. Até 18 de Setembro a Requerente conseguiu que a Requerida mantivesse horário compatível com o infantário do menor. Factos não provados com interesse à decisão: 1. A presença da Requerente no período obrigatório que a empresa vem atribuir (15h15 às 19h15) em nada beneficia a dinâmica do trabalho da loja uma vez que os pedidos de produtos, receção de mercadoria, contagens manuais e automáticas, devoluções, entre outros, são sempre efetuados da parte da manhã. 2. No caso de pedidos de produtos a empresa exige que seja enviado até à 13h da tarde no máximo. 3. O turno da manhã, ou manhã e a hora de almoço, é a hora de maior trabalho e fluxo de clientes. 4. Nesse período a Requerente poderia dar um maior apoio à responsável. 5. O período considerado obrigatório pela Requerida é o período de menor fluxo de vendas, e onde, desde sempre, as funcionárias ficaram sozinhas. 6. A própria responsável de loja pediu e pede várias vezes às colegas para trocar horário de forma a cobrir a manhã e a hora de almoço, que são as horas de mais trabalho. * A demais factualidade alegada é conclusiva, encerra matéria de direito ou é irrelevante à decisão a proferir nestes autos, tal como as partes também consideraram.”.* 1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC, aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do CPT, e salvo questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões do recorrente.III. – Fundamentação de direito Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre. * - Nulidades da sentença,2. - O objecto do recurso: - Impugnação da matéria de facto. - Incorrecta aplicação do disposto nos artigos 56.º, n.º 3, 127.º, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b), todos do Código do Trabalho. * 3.1. - A recorrente entende que “Esta decisão é: i) nula por estar assente numa conclusão (e não em factos); ii) nula por omissão de pronúncia, pois, revelou-se uma “Decisão Surpresa”, alegando:3. - Das nulidades da sentença “(…), considera a Recorrente que a Douta Sentença aplicou erroneamente o disposto nos artigos 127, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b), ambos do CT, porque o exercício do direito da Recorrida foi feito ao abrigo do regime previsto no artigo 56.º do CT. Como tal, não cabia a este Tribunal “dar a mão” à Recorrida e porque o regime previsto no artigo 56.º do CT não permitia o resultado pretendido, aplicar outro regime que nunca foi invocado nem requerido em sede judicial. Ora dispõe o artigo 3.º, n.º 3 do CPC que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”. Conforme supra exposto, esse contraditório nunca foi dado à Recorrente. Sendo por isso a Douta Sentença a quo nula por omissão de pronúncia nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, uma vez que não foi respeitado o princípio do contraditório previsto no artigo 3.º, n.º 3 do CPC”. 3.2. - Como é sabido, as nulidades podem ser processuais, se derivarem de actos ou omissões que forem praticados antes da prolação da sentença, ou da sentença, se derivarem de actos ou omissões praticados pelo juiz na própria sentença. As nulidades processuais, constituindo anomalia do processado, devem ser conhecidas no Tribunal onde ocorreram e, discordando-se do despacho que as conhecer, ele pode ser impugnado através de recurso de apelação. As nulidades da sentença, tendo sido praticadas pelo juiz, podem ser invocadas e fundamentadas nos termos do artigo 77.º, n.º 1 do CPT, na redacção dada pela Lei n.º 107/2019, de 09.09. 3.3. – Das causas de nulidades da sentença 3.3.1. - As causas de nulidade da sentença são as previstas no artigo 615.º, n.º 1, alíneas a) a e) do CPC. Ora, a recorrente não indicou qual dessas causas integra a alegada nulidade da sentença “por estar assente numa conclusão (e não em factos)”. E não indicou dado que em nenhuma dessas alíneas se enquadra a alegada nulidade. No que reporta à segunda nulidade invocada – “ii) nula por omissão de pronúncia, pois, revelou-se uma “Decisão Surpresa” – importa dizer o seguinte: Por despacho de 17.09.2020, a Mma Juiz determinou: “Assim, em respeito ao princípio geral do contraditório, determino a citação da Requerida para os termos da presente providência – cfr. art.º 366.º, n.º 1 do C.P.C.”. E a requerida deduziu oposição e esteve presente na audiência de discussão e julgamento, com pleno conhecimento do fundamento do procedimento cautelar deduzido pela requerente. Além disso, e como infra desenvolveremos, o artigo 56.º do CT consagra um direito para o trabalhador com filho menor de 12 anos e os artigos 127, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b), do mesmo diploma, impõem deveres ao empregador numa relação laboral. Ora, não só a recorrente não pode ignorar esses deveres legais, tanto mais que a ignorância da lei não lhe aproveita – cf. artigo 6.º do C. Civil -, como o juiz, no exercício do seu múnus judicial, está obrigado a aplicar a lei, como decorre do artigo 8.º do mesmo C. Civil. Daí o estatuído no citado artigo 5.º, n.º 3, do CPC. Inexistem, assim, as invocadas nulidades da sentença. * 4.1. - Atento o disposto no artigo 662.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil (CPC), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. 4. – Da impugnação da matéria de facto Para o efeito da alteração da decisão de facto, o artigo 640.º, do novo CPC, dispõe: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de poder proceder à respectiva transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)”. Ora, atentas as conclusões do recurso, a recorrente não impugnou a decisão sobre a matéria de facto, nos termos do citado artigo 640.º do CPC. A recorrente limitou-se a pedir a eliminação do ponto 17 dos factos indiciariamente provados por, no seu entender, ser conclusivo. Pronunciando-se sobre as alegadas nulidades da sentença, a Mma Juiz escreveu: “admitindo-se que o facto provado em 17 seja algo conclusivo, no âmbito das providências cautelares estamos perante factos indiciários, nem sempre concretizados com a mesma precisão. Não obstante, a decisão proferida não assenta neste facto, como pretende a recorrente”. O ponto 17 dos factos provados tem a seguinte redacção: “17. A Requerente não tem meios, nem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”. Se, neste contexto cautelar, a expressão “não tem meios” é conclusiva, já o segmento restante, do ponto 17, não o é. O vocábulo “quem” é um pronome pessoal indeterminado, referente a pessoa ou pessoas não especificadas, qualquer um, alguém que – cf. Dicionário Enciclopédico de Língua Portuguesa, pág. 988. Assim, o segmento “nem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”, significa que a requerente não tem ninguém, não tem pessoa alguma, familiar ou outra, “para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”. Neste sentido, o ponto 17 dos factos provados passa a ter a seguinte redacção: “17. A Requerente não tem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”. * “Da análise deste regime legal resulta que os requisitos para aceder ao mesmo consistem em o trabalhador ter um filho menor de 12 anos (ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica), que com ele viva em comunhão de mesa e habitação, devendo o trabalhador solicitar a aplicação de tal regime por escrito com antecedência de 30 dias, indicando o prazo dentro do limite aplicável, e apresentando uma declaração onde conste que o menor vive com ele em comunhão de mesa e habitação (cfr. artigos 56.º, n.º 1 e 57.º, n.º 1).5. – Da incorrecta aplicação do disposto nos artigos 56.º, n.º 3, 127.º, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b), todos do Código do Trabalho. 5.1. - Na sentença recorrida, a Mma Juiz consignou: No caso dos autos, a Requerente tem um filho com menos de 12 anos, que com a mesma vive em comunhão de mesa e habitação, pelo que reúne os requisitos necessários para aceder a tal regime, encontrando-se indiciariamente provada a probabilidade da existência do direito a aceder ao mesmo. (…), o horário flexível, elaborado/estabelecido pelo empregador, deve obedecer aos limites legais. Ora, dentro dos limites legais, além das regras previstas no n.º 3 do art.º 56.º do Código do Trabalho, incluem-se as normas dos artigos 127.º, n.º 3 e 212.º, al. b), do Código do Trabalho e que, como já se referiu, materializam os princípios constitucionais de protecção dos direitos dos trabalhadores, da família, da paternidade e da maternidade, consagrados nos artigos 59.º, n.º 1, alínea b), 67.º, n.º 1 e 68.º, n.ºs 1 e 4, todos da Constituição da República Portuguesa. (…). Por sua vez, os direitos ao livre exercício da iniciativa económica privada e à liberdade de organização empresarial, encontram-se consagrados nos artigos 61.º e 82.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa. Mas a estes direitos sobrepõem-se os direitos à conciliação da atividade profissional com a vida familiar, o direito à proteção da família como elemento fundamental da sociedade e o direito à maternidade e paternidade em condições de satisfazer os interesses da criança e as necessidades do agregado familiar, cedendo estes últimos perante os primeiros, apenas quando em presença de interesses imperiosos. (…). Conclui-se, pois, que o horário flexível que a Requerida estabeleceu não respeitou o limite imposto pelo art.º 56.º, n.º 3, al. b) do Código do Trabalho, sem qualquer razão justificativa, nem respeitou os limites legais impostos pelas normas dos artigos 127.º, n.º 3 e 212.º, al. b), do Código do Trabalho. Nesta sequência, e com estas considerações, deve dar-se por preenchido o requisito da probabilidade séria da existência do direito da Requerente, no sentido de lhe ser atribuído um regime de horário flexível, como já vimos, bem como de tal horário respeitar as suais limitações pessoais e familiares, por forma a que a mesma possa conciliar a sua atividade profissional com a sua vida familiar.”. 5.2. – Em sede de recurso, mormente, nas alíneas U a X das conclusões, a recorrente invoca a incorrecta aplicação do disposto nos artigos 56.º, n.º 3, 127.º, n.º 3 e 212.º, n.º 2, alínea b), todos do Código do Trabalho. 5.3. – Quid iuris? 5.3.1. - O artigo 59.º - Direitos dos trabalhadores - da Constituição da República Portuguesa (CRP), estatui: “1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: a) (…); b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar;”. (negrito nosso). E o artigo 67.º - Família - consagra: “1. A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros. 2. Incumbe, designadamente, ao Estado para protecção da família: a) a g) (…); h) Promover, através da concertação das várias políticas sectoriais, a conciliação da actividade profissional com a vida familiar.”. (negrito nosso). Por sua vez, o artigo 68.º - Paternidade e maternidade – prescreve: 1. Os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país. 2. A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes. 3. (…). 4. (…). Como escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira, in CRP Anotada Vol. I, pág. 773, “O direito à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, tem por destinatários, simultaneamente, os empregadores e o Estado, que deve tomar medidas no sentido apontado e de forma a facultar a realização pessoal (nº 1/b), pressupõe a ideia de que o trabalho pode ser pessoalmente gratificante, não podendo ser, de qualquer forma, prestado em condições socialmente degradantes ou contrárias à dignidade humana ou impeditivas da conciliação da actividade profissional com a vida familiar. Trata-se aqui também de um modo de protecção da família.” (negrito nosso) E a págs. 860-861 acrescentam: “A conciliação da actividade profissional com a vida familiar impõe a concertação de várias políticas sectoriais e a possibilidade, se não mesmo a obrigação, de discriminações positivas a favor da família (justificando derrogações do princípio da igualdade em abstracto): política do trabalho, desde logo contra despedimentos por motivos ligados a maternidade; licença por maternidade e licença parental pelo nascimento ou adopção de um filho; promoção e segurança da saúde de trabalhadoras grávidas; direito a férias em consonância com os interesses da família; institucionalização de horários de trabalho flexíveis, declinação familiar do regime de trabalho em tempo parcial, do trabalho domiciliário, e do acesso à rede de creches, preferências de colocação profissional na proximidade do outro cônjuge ou parceiro, etc.”. (negrito e sublinhado nossos). 5.3.2. - Na lei ordinária, o artigo 56.º - Horário flexível de trabalhador com responsabilidades familiares – do CT dispõe: “1 - O trabalhador com filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação tem direito a trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, podendo o direito ser exercido por qualquer dos progenitores ou por ambos. 2 - Entende-se por horário flexível aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário. 3 - O horário flexível, a elaborar pelo empregador, deve: a) Conter um ou dois períodos de presença obrigatória, com duração igual a metade do período normal de trabalho diário; b) Indicar os períodos para início e termo do trabalho normal diário, cada um com duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário, podendo esta duração ser reduzida na medida do necessário para que o horário se contenha dentro do período de funcionamento do estabelecimento; c) Estabelecer um período para intervalo de descanso não superior a duas horas. 4 - O trabalhador que trabalhe em regime de horário flexível pode efectuar até seis horas consecutivas de trabalho e até dez horas de trabalho em cada dia e deve cumprir o correspondente período normal de trabalho semanal, em média de cada período de quatro semanas. 5 - O trabalhador que opte pelo trabalho em regime de horário flexível, nos termos do presente artigo, não pode ser penalizado em matéria de avaliação e de progressão na carreira.” E o artigo 57.º - Autorização de trabalho a tempo parcial ou em regime de horário flexível – acrescenta: “1 - O trabalhador que pretenda trabalhar a tempo parcial ou em regime de horário de trabalho flexível deve solicitá-lo ao empregador, por escrito, com a antecedência de 30 dias, com os seguintes elementos: a) Indicação do prazo previsto, dentro do limite aplicável; b) Declaração da qual conste: i) Que o menor vive com ele em comunhão de mesa e habitação; ii) No regime de trabalho a tempo parcial, que não está esgotado o período máximo de duração; iii) No regime de trabalho a tempo parcial, que o outro progenitor tem actividade profissional e não se encontra ao mesmo tempo em situação de trabalho a tempo parcial ou que está impedido ou inibido totalmente de exercer o poder paternal; c) A modalidade pretendida de organização do trabalho a tempo parcial. 2 - O empregador apenas pode recusar o pedido com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.”. Por sua vez, o artigo 127.º - Deveres do empregador – prescreve: “3 - O empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e pessoal.”. E o artigo 212.º - Elaboração de horário de trabalho – estatui: “1 - Compete ao empregador determinar o horário de trabalho do trabalhador, dentro dos limites da lei, designadamente do regime de período de funcionamento aplicável. 2 - Na elaboração do horário de trabalho, o empregador deve: a) (…); b) Facilitar ao trabalhador a conciliação da actividade profissional com a vida familiar;”. (negritos nossos) 5.3.3. – Este é o quadro legislativo que cabe ao intérprete aplicar. No dizer de Maria do Rosário Palma Ramalho, in Tratado de Direito do Trabalho. Parte I, 5.ª ed., págs.328 e segs., “Especificamente no que toca a interpretação das normas laborais, são de aplicar as regras gerais do art 9.º do Código Civil, mas levanta-se a questão da admissibilidade do princípio do tratamento mais favorável como recurso genérico e de interpretação dessas normas. A admitir-se como regra geral, este princípio teria duas aplicações: - uma aplicação interpretativa pura, que permitisse que, em caso de dúvida sobre o sentido a atribuir à norma, prevalecesse o sentido mais favorável ao trabalhador; - uma aplicação interpretativo-aplicativa (portanto, ao nível de um conflito de fontes ou da relação entre as fontes e o contrato de trabalho), na qual o princípio do favor laboratoris teria a função de criar no intérprete a presunção de que as normas laborais seriam imperativas apenas quanto às condições mínimas que estabelecessem, podendo, por isso, ser afastadas, desde que em sentido mais favorável ao trabalhador e tanto pelas fontes inferiores como pelo contrato de trabalho. (N)a operação de pura interpretação das normas laborais, entendemos que, perante o actual grau de maturidade do Direito do Trabalho e designadamente, perante o reconhecimento do seu carácter compromissório (que faz prevalecer ora os interesses dos trabalhadores ora os interesses de gestão dos empregadores nas normas e nos regimes que estabelece), não faz sentido reconhecer a existência de um prius geral de interpretação das fontes laborais em favor do trabalhador. Assim, em caso de dúvida sobre o sentido a atribuir à norma, apenas será de adaptar o sentido que mais favoreça o trabalhador se, no caso concreto, se observar a necessidade de protecção do trabalhador como parte mais fraca.”. A questão da alteração/flexibilização do horário de trabalho, por parte do empregador, não vem sendo um assunto pacífico na doutrina e na jurisprudência, dado que a lei não responde expressamente ou pelo menos de forma clara e inequívoca sobre essa matéria. Como escreve Joana Nunes Vicente, in Breves Notas sobre Fixação e Modificação do horário de trabalho, in Para Jorge Leite, Escritos Jurídico-Laborais, I, págs. 1051 e segs., “o problema delicado que se coloca é o de saber se o exercício desta faculdade está ou não vinculado à observância de certos limites materiais, se o ordenamento jurídico português faz depender a licitude do exercício do comando patronal do cumprimento de certas exigências substanciais, designadamente a necessidade de alicerçar a referida alteração [do HT] num fundamento objectivo da empresa, mas e sobretudo, a necessidade de atender à/ponderar a esfera de interesses do trabalhador”.... E quanto à necessidade do empregador dever “facilitar ao trabalhador a conciliação da actividade profissional e a vida familiar”, afirma: “é difícil reconhecer a esta indicação normativa um preciso e intencional valor significante”. Com todo o respeito, o intérprete não pode, não deve ignorar que a prescrição constitucional “permitir e promover a conciliação da actividade profissional com a vida familiar” consta em dois normativos da CRP, o artigo 59.º, n.º 1, alínea b) e o artigo 67.º, n.º 2, alínea h), ao ponto de Gomes Canotilho e Vital Moreira, in obra citada, afirmarem: “A conciliação da actividade profissional com a vida familiar impõe a concertação de várias políticas sectoriais e a possibilidade, se não mesmo a obrigação, de discriminações positivas a favor da família, (…), com a institucionalização de horários de trabalho flexíveis”. O artigo 56.º do CT consagra a flexibilização do horário de trabalho para trabalhador com filho menor de 12 anos. No caso em apreço, está provado no ponto 15.º, que “O infantário do filho da requerente fecha às 18h.” e no ponto 17.º que “A Requerente não tem a quem recorrer para deixar o filho menor, a partir das 18h30.”. Esta realidade factual constitui a exigência substancial que limita a recorrente na sua faculdade de alterar o horário de trabalho da autora para além das 18.00h. Se assim não forem interpretadas as normas supra citadas, está votada ao fracasso a prescrição constitucional da conciliação da actividade profissional com a vida familiar.”, Joana Nunes Vicente, in obra citada, na nota de rodapé n.º 31, dá como exemplo de limite material para o empregador, a “hipótese de trabalhador (mãe/pai solteiro/sem rede de apoio social-familiar) que, acatando uma determinada alteração do horário, fica sem qualquer possibilidade de continuar a realizar o transporte do seu filho ao infantário (...)”. Na verdade, numa sociedade que envelhece a “olhos vistos”, por força da baixa natalidade, e na qual aumentam as famílias monoparentais, tais preceitos constitucionais têm cada vez maior relevo e o intérprete não deve ficar-lhes indiferente. Acresce, no caso sub judice, que a recorrente não fez prova de motivo que justificasse a alteração do horário de saída da recorrida, a partir de 21 de Setembro de 2020, quando “Até 18 de Setembro a Requerente conseguiu que a Requerida mantivesse horário compatível com o infantário do menor” – cf. ponto 18.º dos factos provados. Assim sendo, improcedendo o recurso da recorrente, mantem-se a decisão recorrida. * Atento o exposto, acórdão os Juízes que compõem esta Secção Social, julgar a apelação improcedente, e em consequência, confirmar a sentença recorrida.IV. – A decisão As custas do recurso de apelação são a cargo da recorrente. Porto, 2021.04.19 Domingos Morais Paula Leal de Carvalho Rui Penha  |